Spirit Gate Brasileira

Autor(a): Lucas Henrique


Volume 1

Capítulo 3: Crianças Problemáticas III

Brendan estava parado no hall de entrada, não apenas torcendo para que a chuva parasse, mas também esperando por May e Sam, que haviam se dirigido para os armários.

Seu outro colega de classe, Alex Bong, havia sido o primeiro a sair, no maior pico de intensidade do aguaceiro, o que causou certa confusão entre os três que ficaram: “Ele é maluco? Sair nessa chuva?”

— Ei, o que esse desgraçado está fazendo aqui? — Ao ouvir aquela voz, Brendan imediatamente sentiu um arrepio percorrer sua espinha.

Flashes de lembranças de seu último ano naquela escola retornavam para relembrá-lo do quão desagradável era aquele lugar.

Relutantemente, virou-se para encontrar as pessoas que, se dependesse apenas dele, jamais voltaria a ver.

De pé à sua frente, estavam os três principais representantes do ódio, da raiva e do bullying que ele sofreu naquele ambiente.

Aqueles três garotos — Kevin, Josh e Jake — foram os responsáveis por dar forma a opinião da imensa maioria dos estudantes sobre ele.

— Ei, Luster, você não aprendeu nada, né? Aqui não é lugar para a sua laia — Josh disse, tomando a dianteira, mas mantendo-se próximo aos outros dois.

Brendan desprezava Josh; em sua opinião, o garoto não passava de um porco fedido que vivia parasitando a popularidade dos outros dois. Tinha certeza de que, sozinho, o menino mais baixo jamais teria coragem de agir assim.

— Vai responder não? Tá se mijando de medo, né não? Hahahahah — Kevin disse, colocando-se à frente do adolescente de menor estatura.

A opinião do herdeiro dos Luster sobre Kevin era que a voz dele era ridícula e irritante. Mas, por algum motivo que escapava ao seu conhecimento, aquele cara era popular com as garotas.

— Calem-se. Eu quero ouvir dele — falou Jake, agarrando o colarinho de Brendan e o empurrando contra a parede. — Por que você voltou? Sabemos da índole desta escola ao aceitar o dinheiro da sua família, mas pensei ter deixado bem claro que não fechamos com gente como você.

Visivelmente, aquele era o único que realmente causava desconforto ao garoto.

Jake era popular, bem visto por muitos professores e tinha um histórico de conquistas na área de esportes, especialmente em competições de muay thai.

Na opinião de Brendan, aquele era o pior tipo de pessoa. Embora fosse horrível, ele estava do lado das pessoas populares, e tudo o que fazia era ignorado.

— Não acho que minha resposta importe — respondeu Brendan, em tom monótono e com o olhar cansado. — Solte minha camisa e me esqueça.

Assim que as palavras escaparam de seus lábios, Brendan se arrependeu. Não era sua intenção parecer arrogante, mas ele não podia fazer nada a respeito; havia sangue Luster correndo em suas veias.

— Perdeu a noção do perigo, seu bosta? Vamos fazer da sua vida um inferno de novo, mas dessa vez vou garantir que você nunca mais se esqueça que não é bem-vindo aqui. — Jake apontava o dedo na cara de Brendan.

“Tá, cara, nada novo, só vaza daqui logo”, pensava Brendan.

— O que está acontecendo aqui? — A voz era suave, melodiosa e aparentemente calma; seu timbre límpido e cristalino soava como uma canção aos ouvidos de estranhos.

Porém, Brendan sabia muito bem que a dona daquela magnífica voz estava, por dentro, fervendo de raiva.

May passou por Josh e Kevin e colocou-se atrás de Jake. Este, por sua vez, soltou Brendan e virou-se para a garota.

O olhar da garota queimava com um brilho cerúleo venenoso.

O herdeiro dos Luster temia que isso escalasse. A Hayami sempre foi muito vingativa e, ele tinha medo do que isso poderia causar a ela.

“Deixa isso pra lá, May. Não quero colocar um alvo nas suas costas. Não são só esses três; é a escola toda. Por favor, esquece isso”, desejava Brendan.

— Fala, gatinha. Meu nome é Kevin e…

— Eu não perguntei seu nome. Perguntei o que estava acontecendo aqui. Parece que seu cérebro é tão defeituoso quanto sua voz de gaivota.

Apesar da situação, Brendan não conseguiu impedir que seus lábios se curvassem em um sorriso. Aquilo foi realmente engraçado, do seu ponto de vista.

— Hã? Não ache que pode ficar se achando só porque é gostosa, sua puta! — gritou Josh.

O grito atraiu os poucos estudantes que ainda estavam no local.

“Não importa o que façam comigo; podem ofender, bater, destruir minhas coisas e me excluir.

“Entretanto, eu não vou aceitar que tratem a May dessa forma.

“Ela é uma pessoa muito melhor que todos vocês juntos”, pensava Brendan, enquanto apertava com muita força seu punho.

Jake percebeu o comportamento do Luster e tentou empurrá-lo novamente, mas sem sucesso.

Brendan passou por Jake sem qualquer dificuldade; o segundanista parecia confuso com a diferença de força entre eles.

— Josh, seu…

— Pela sua aparência, é claro como a água que será muito difícil para você conseguir uma parceira. Agindo dessa forma, seu futuro estará fadado ao celibato — disse May, com a voz carregada de frieza. Interrompendo seu amigo de infância.

“Ela é realmente cruel, não é? Graças a Deus eu estou do lado bom dela”, refletiu Brendan.

— Kevin, Josh, já basta — falou Jake, andando até o lado de Brendan. Olhando para May, continuou: — Para responder sua pergunta, eu estou apenas falando com um velho conhecido. Você não tem motivos para se intrometer.

— Você por acaso fala usando as mãos? E você não é ninguém, para dizer se eu tenho ou não motivos para me intrometer — disse May.

A garota caminhou até Brendan e, colocando suas mãos em seu colarinho, tentou ajeitar o tecido que havia amassado.

— Você já não tinha feito isso direito mesmo — sussurrou May.

O hálito da jovem podia ser sentido pelo garoto, o que fez seu coração disparar.

“Não é hora de marcar território, May”, rogava Brendan.

— Ah, agora tudo faz sentido. Você está defendendo seu namorado… Ele é um Luster, você sabe? Tem noção do que esses caras fizeram? Eles têm uma dívida com todos os elysianos que durará para sempre —  disse Jake, caminhando em círculos com os braços abertos.

Aquilo era obviamente proposital; aquela ação chamou ainda mais a atenção dos presentes, que se aproximaram, formando uma pequena multidão naquele lugar.

— Não seja ridículo; o Brendan não tem nada a ver com isso. Você só está usando isso como desculpa para validar todo o ódio jogado contra ele! — esbravejou May, uma veia saltava da testa da garota.

A atenção dos espectadores estava sobre Jake; por mais que houvesse uma evidente preferência do público por Jake em detrimento de Brendan e, por consequência, de May, a resposta do garoto loiro seria crucial para o julgamento do público.

Como um flash que surgiu e desapareceu com a mesma rapidez, um sorriso vil pôde ser visto no rosto do segundanista.

— Minha avó sofre até hoje; uma das crianças que foram levadas pela família Luster foi meu tio avô, irmão mais velho da minha avó. Mesmo aquilo tendo acontecido em sua infância, ela lembra de cada detalhe do dia em que seu irmão saiu para comprar o café da manhã e nunca mais voltou.

Jake colocou sua mão esquerda em seu peito e continuou:

— As vidas perdidas não voltam mais! Acha justo que a dor deixada por aqueles que partiram seja esquecida?! Tudo por que esses malditos são intocáveis. Os poderosos fazem o que querem e quem está embaixo que se foda, não é?!

A multidão confirmou seu lado ao ouvir o discurso de Jake; gritos contra Brendan ecoavam pelo hall de entrada.

May baixou seu rosto e apertou seu punho com força.

A garota procurava uma resposta à altura, mas sabia que o pecado cravado na família do amigo era muito grave.

Não havia uma resposta que mudaria a opinião da multidão.

Era claro que, na verdade, eles só queriam alguém para odiar. Os crimes cometidos haviam acontecido muitos anos antes de Brendan nascer; o garoto não tinha parte nenhuma com aquilo.

“Isso é frustrante, injusto, baixo… Ele não tem nada a ver com isso… Que droga”, lamentava May.

Enquanto os xingamentos e ofensas eram proferidos a ele, Brendan apenas respirou fundo e olhou para cima.

A primeira vez que ele ouvira aquela história foi aos cinco anos de idade; sua mãe decidiu que ele deveria saber do motivo de todos os odiarem.

Na época, ele não se importou muito — o que era esperado —, nenhuma criança normal se interessaria por uma história como aquela.

Aos seus nove anos, entretanto, teve que ouvir essa história uma vez mais. Dessa vez, contada por seu avô e com muito mais detalhes — o que marcou fortemente aquela informação na sua mente.

A lembrança de seu avô voltou à tona. Brendan ainda podia ouvir sua voz carregada de amargura, como se revivesse o momento uma vez mais…

  • ••

Depois de mais uma chamada à diretoria de sua escola, o pequeno Brendan foi convocado ao escritório de seu avô. Mesmo sem culpa, a responsabilidade recaiu sobre ele, e aqueles que poderiam ajudar preferiram se omitir.

Era uma das raras ocasiões em que sua mãe não pôde acompanhá-lo. O Luster mais novo queria chorar, mas sabia que não podia fazer isso diante do avô e teria que ouvir as broncas em silêncio.

Quando o avô começou a falar, o tom amargo o surpreendeu.

— Eu tinha apenas oito anos quando tudo aconteceu. Meu pai, junto aos líderes das famílias Heaven e Gordon, planejou algo para superar a Anemesis e garantir a segurança de Elysium. Os guardiões raptaram crianças ao redor do país e as usaram como cobaias para aperfeiçoar o plano.

Brendan já conhecia a história, mas ouvir de seu avô era diferente. Sentia uma estranha sensação que não conseguia identificar.

— Eu tinha uma irmã, Caroline Luster, uma prodígio que todos amavam… Com apenas quatro anos, ela descobriu a oficina mágica de nosso pai e encontrou os corpos das crianças desaparecidas. Correu para a polícia e revelou tudo o que sabia — disse o avô, com um olhar triste.

Era a primeira vez que Brendan via tal olhar em seu avô.

— Meu pai assumiu a culpa pela falha do plano, enquanto as outras famílias mantiveram sua imagem intacta. A justiça apenas fez com que a família Luster cedesse algumas terras.

Olhando nos olhos de Brendan, o mais velho continuou:

— Porém, a Anemesis foi diferente; todos os líderes das três famílias foram executados.

O avô fez uma pausa, e Brendan, ansioso, perguntou:

— E?

— Alguns meses depois, Caroline foi encontrada morta. Acreditamos que foi a Anemesis. Seu senso de justiça era um problema… — O avô amassava os papeis que segurava com força. — É por isso que somos odiados. Aprenda a conviver com isso… Agora saia.

Brendan saiu sem questionar. Não sabia como lidar com a informação, mas sabia que, enquanto tivesse sua mãe, não precisaria de mais ninguém.

  • ••

Saindo de seu devaneio, Brendan voltou seu olhar para May. Ele distinguia a dificuldade que ela tinha de lidar com aquilo.

Não havia defesa para o que aquelas pessoas fizeram no passado, mas também não fazia sentido jogar toda a culpa em quem não tinha nada a ver com o ocorrido.

“E pensar que os esforços de Caroline seriam interpretados dessa forma”, refletiu Brendan.

— Que algazarra toda é essa?!

Todos os alunos presentes olharam assustados para a mulher, que estava com as mãos na cintura e um olhar raivoso.

— Professora? — disse uma aluna na multidão.

“Professora? Aquela é… Mariana?”, pensou Brendan.

— Se não tiverem atividade nos clubes, vão embora! — esbravejou Mariana.

A contragosto, a multidão se dirigiu para a saída.

— Silva-san, há quanto tempo. Nunca imaginei que um dia você lecionaria na mesma escola em que estudamos — mencionou May, aproximando-se de Mariana.

— Faz mó tempão, né? O tempo passa rápido mesmo. A última vez que os vi, vocês eram tão pequenininhos e fofinhos.

— Você era a professora da nossa primeira aula? — perguntou Brendan.

— Ah, então vocês são da 1A. Me desculpem, fiquei ocupada com outro trabalho.

A conversa é interrompida quando Samantha Bellerose passa como um foguete por eles, dizendo que precisava ir, pois seus pais já estavam perguntando sobre sua demora.

Brendan e May se despediram de Mariana e se dirigiram até a saída. Contudo, pararam na porta.

Ainda estava chovendo, e o garoto não tinha um guarda-chuva. A garota, por sua vez, retirou de sua bolsa uma sombrinha e olhou para ele.

May alternava seu olhar entre Brendan e a sombrinha, sem dizer uma única palavra.

O Luster entendeu o que a Hayami queria lhe dizer e, após respirar fundo, perguntou:

— Você… é... dividiria seu guarda-chuva comigo?

— Hai — respondeu May, em um tom baixo, quase um sussurro.

O garoto pediu a mochila da garota, decidido a carregá-la para ela, pois acreditava ser o mínimo que poderia fazer.

Inicialmente, May tentou segurar o guarda-chuva, mas a diferença de altura tornava isso quase impossível. Assim, passou essa tarefa para Brendan, com a condição de que ele não a molhasse.

Na saída, avistaram alguns alunos parados no ponto de ônibus próximo à escola. Não era o mesmo que eles usariam, então seguiram pelo caminho oposto.

Entretanto, havia alguém naquela parada que os avistou e não pôde conter sua empolgação.

— Aaaaah! May, Brendan, vocês são tão fofos juntos! — gritou Sam.

May olhou na direção do ponto e viu a garota de óculos acenando para eles.

— Ei, aquele cara não a protegeu mais cedo? — perguntou outro aluno.

— Já estão assim? Cara, tô ficando pra trás — resmungou um outro aluno.

— Mas aquele cara é um Luster, ela deve ter algum outro motivo para querer ficar com ele… Aí! — falava um aluno baixinho até ser interrompido por uma cotovelada de uma garota.

— O amor pode surgir em qualquer situação — afirmou a garota.

Brendan e May olharam fixamente para frente, com os rostos brilhando em um vermelho cereja. Aceleraram seus passos, querendo se afastar o mais rápido possível dali.

— Bren-chan, qual é o problema com os alunos daqui?

— Eu realmente não sei, mas vou me lembrar de trazer meu guarda-chuva da próxima vez.

Com esse último evento clichê de comédia romântica, seguiram seu caminho para casa.

 

Notas

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