Volume 1

Capítulo 11: Raiva (versão antiga)

 

Claire conseguiu chegar mais perto de Daniel e, num impulso, enquanto derramava lágrimas, lançou todas as suas adagas no canibal com força total, porém, para a surpresa dela, o ghoul simplesmente largou o corpo do atirador e, mesmo que algumas das lâminas tenham penetrado em seu corpo, ele não parecia se importar, e avançou com tudo na direção da morena. Mesmo que ficasse claro que ela não conseguiria escapar, Claire tentou se jogar para o lado.

A singular só sobreviveu porque vários tiros vindos de trás dela foram realizados, Ethan disparou nos membros e cabeça do canibal, errando somente o da cabeça.

Mas, justamente por ter acertado os braços e pernas dele, o golpe que iria acertar Claire em cheio foi evitado. A singular olhou para trás e viu o garoto com as pistolas miradas, bastante ofegante e suando de nervosismo, porém com menos temor que antes.

Mas como até mesmo ele previa, isso não foi suficiente para parar o ghoul, que se virou para tentar pegar Claire novamente, que com ódio e tristeza no olhar, cruzava seus braços e os abria. Isso fez as adagas que estavam presas no tronco do canibal se moverem e rasgarem o corpo dele, levando os braços no processo, fazendo jorrar sangue e manchar a moça com o líquido.

Com essa distração a mais, Claire conseguiu rolar para o lado e desviar de uma investida do ghoul, mas, antes que ela conseguisse raciocinar, a morena viu uma boca aberta chegando perto de seu rosto.

Para a sorte dela, Mary chegou a tempo e, como um relâmpago, empurrou Claire para o lado e colocou seu braço direito na frente do rosto. O canibal mordeu com tudo, mas apesar de ter fincado os dentes, não foi capaz de dilacerar ou sequer chegar na pele da albina, o que surpreendeu até mesmo Ethan. Todo aquele equipamento que ela tinha no braço direito não parecia ser uma simples braçadeira. E Mary sequer demonstrava medo, seu olhar era o mais puro foco de uma assassina.

Enquanto isso, David chegava rapidamente atrás do ghoul, deslizando por uma superfície de gelo. O singular então segurava o pescoço do canibal e este vai ficando com uma cor pálida e depois azulada, até que sua pele se torna uma textura cristalizada de gelo. Em seguida ele aperta o pescoço congelado e ele se quebra, fazendo a cabeça cair no chão e se espatifar em cristais.

Finalizado essa questão, o grupo respirava um pouco melhor agora. Mary guardava sua katana após limpar o sangue nela e em seu rosto, porém os respingos em sua roupa eram impossíveis de retirar, não que ela se importasse muito.

Ethan recarregava suas pistolas e as colocava nos coldres, Claire ficava se sentindo uma inútil e chorava enquanto ao lado de Daniel, agora só um cadáver perfurado ali. Ela olha para o sangue que pingava de seu rosto e mãos, apertando—as com ódio.

David era o único que não parava e, com um pilar de gelo, ele alcançava onde Lucy estava. A ruiva estava ainda de pé, porém com uma expressão de cansaço e ofegante, o ferimento em seu peito já estava fechado, porém sua camiseta não se regenerava que nem ela. O sangue em excesso no corpo dela ainda estava soltando vapor de tão quente que estava, e sua pele já estava na coloração mais clara novamente.

Lucy via David e sorria, quase apagando. Ela estendia a mão para ele enquanto seu amado a segurava nos braços, fazendo—a se sentir a princesa sendo resgatada, e dizendo de maneira cansada:

— Eu... Disse que conseguia. – e ela desmaiava nos braços de David, que estava mais do que aliviado que ela ainda estava viva.

— Eu sei que você se regenera, mas não esquece de tomar cuidado. – dizia enquanto carregava sua amada.

Ethan se aproximava de Mary, um pouco cabisbaixo, porém sua mestra logo percebia e colocava a mão em seu ombro, dizendo da maneira dela que o garoto já estava acostumado a ouvir:

— Foi um bom começo.

— Mas... Eu não acertei na cabeça. – respondeu com um visível nervosismo.

— Seu treinamento ainda não acabou, lembra? Está aprendendo, foi um bom começo. – após confortar o garoto, ela aproximava do corpo morto de Daniel e via David chegar, carregando Lucy nas costas.

— Seu irmão idiota... Você prometeu que não ia me abandonar. – dizia Claire enquanto lacrimejava e segurava a mão de seu falecido parente. Ele não teve chance de revidar e nem de ter uma morte honrosa, somente havia morrido de maneira brutal. David entendia essa dor e pelo menos ficava ao lado de Claire para ajudá-la no luto.

Ethan olhava um pouco mais de longe e agora parecia que ele tinha acabado de aprender o que é ficar triste pela morte de alguém, além de ter levado para o lado pessoal quando Claire citou “abandonar”. Quando ele olhou mais ao lado, perto do estabelecimento em que Mary e David estavam fazendo a linha de frente, a albina estava ajoelhada, analisando o corpo da Ghoul que ela matou. Assim que o garoto chegou perto e se ajoelhou ao lado dela, ela contou o que estava pensando:

— Ethan, você já consegue diferenciar? – perguntou para o garoto.

— Hm? Ah, diferenciar as energias de cada singular? Mais ou menos. – dizia um pouco decepcionado.

— Não tem problema, ainda temos que praticar isso. De qualquer forma, você sentiu a energia vindo de trás, e sim, eu estava achando bem estranho, tanto essa daqui quanto os que estavam vindo por cima e por trás tinham energias diferentes dos ghouls que encontramos na vila. – apontou Mary para as direções que citou, isso deixava Ethan confuso e um pouco intrigado, fazendo-o pensar a respeito.

— Eu consegui sentir na vila, os dois ghouls tinham uma energia bem parecida. – respondeu.

— Sim, os ghouls tem energias praticamente iguais, mas essa que sentimos agora, é completamente diferente. – ela terminava de falar e agora Ethan estava assustado com essa conclusão.

— Então... Esses aqui já estavam mortos antes de chegarmos? – o garoto chega a mais um esclarecimento.  

— Espera aqui um pouco. – disse Mary enquanto se levantava e ia na direção do estabelecimento próximo novamente.

— Mary, aonde você tá indo? – David falava alto enquanto chegava mais perto de Ethan.

A albina pegava impulso, e era possível ver as veias das pernas de Mary ficando aparentes e saltadas, e logo após ela dava um salto bem grande para um humano, chegando até o terraço daquele estabelecimento abandonado.

 Mary encontrou o canibal que Daniel deu um disparo na cabeça, ela então analisava o corpo dele e reparava em algo um pouco diferente: bem na nuca havia uma espécie de corte de um lado ao outro da parte de trás do pescoço, porém, era muito redondo e preciso para ser um corte feito por lâmina, nem mesmo ela, com a experiência em espadas que ela tinha, conseguiria tal feito. Era circular ao ponto que parecia que uma esfera tivesse passado e arrancado um pedaço dali.

A albina pensava em jeitos de aquilo ser possível. De tantos poderes que ela já viu em sua jornada procurando os Heróis, quem teria algo parecido com esferas e que fossem precisas a esse ponto. Até que, após pensar por alguns segundos, uma memória veio a sua mente, pois ela sim já havia visto uma habilidade similar à aquela. Por um lado, ela sabia que isso a levaria para mais perto dos Heróis, porém, por outro, ela sabia em partes que aquele poder era perigoso a um nível que até ela, a Assassina de Heróis, temia.

Mary, após analisar o que precisava, retornava para o chão retornava ao grupo. Claire estava ainda lamentando por Daniel, mesmo que os dois tivessem crescido com ensinamentos de tentar seguir em frente não importando o que acontecesse, na prática era mais difícil que na teoria. David estava sentado em um carro destruído, servindo de apoio para Lucy, que ainda permanecia desmaiada, e Ethan estava de guarda praticamente, com as pistolas em mãos, e também estava achando estranho nenhum ghoul ter se manifestado naquele ponto.

— O que foi fazer lá? – perguntou David para Mary.

— Temos outro problema. – ela respondeu.

— O quê? – praticamente todos responderam da mesma forma, até Mike do outro lado da linha.

— O buraco é mais embaixo, eu tenho certeza que tem envolvimento dos Heróis nisso. Sugiro recuarmos um pouco e pensarmos em outra abordagem. – disse a albina, ajeitando sua máscara. Era visível que Claire havia ficado chocada com a decisão dela.

— Por que os Heróis estariam interessados em ir atrás de um grupo de canibais? Se esses aqui foram mortos por eles, então tentando torna-los armas é o que não estão tentando fazer, e muito menos formar aliança. – retrucou David.

— E se... Só querem usar a favor deles? – Ethan sugeriu.

— Não sabemos ainda, mas eu sei o quanto os Heróis são poderosos, nós apenas não vamos dar conta. – respondeu a albina.

— E o que sugere? Voltar? Acabamos de descobrir que os ghouls estão chegando mais e mais perto da vila, se voltarmos vamos só dar mais brecha para eles terem um banquete. E ainda mais, por que os Ghouls ainda não atacaram? Duvido que não tenham escutado toda essa barulheira aqui fora. – disse o singular gélido.

— Mike, alguma sugestão? – disse Mary, e Mike demorava um pouco para responder, tanto por estar processando a morte de Daniel, quanto na situação que a albina havia descrito.

— O que você acha, Bruno? – perguntou para o líder, que estava ao seu lado e já havia escutado tudo por parte de Mike. Bruno respirava fundo, andava calmamente pelo local e então responde:

— A prioridade de vocês é manter a segurança da vila, mas se virem que tem envolvimento maior dos Heróis, eu irei entender se recuarem, portanto irão ajudar na defesa caso ocorra um ataque direto. – disse para Mike, mostrando que, apesar de ter que lidar com mais uma morte em seus ombros, o líder continuava firme.

— É o que eu suspeito, não vão querer tirar a prova de que é um Herói de fato, não é? – disse Mary para todos ali, porém ao mesmo tempo parecia surpresa com algo atrás do grupo.

— Desde quando virou nossa líder? – questionou David, e, ao perceber o olhar de Mary, também virou seu olhar e percebeu que estava faltando um dos veículos ali, o carro em que Claire e Daniel vieram.

O corpo do rapaz ainda estava ali, porém nem o carro nem Claire estavam mais e, quando olharam para o lado que estava o prédio dos ghouls, viram o veículo indo em alta velocidade na direção dele. Claire se utilizou de sua telecinese para ir sem ninguém perceber e tentar impedi-la.

Ethan tentou, atirando com suas pistolas, porém não conseguiu atingir as rodas do veículo, então Mary e ele saíram correndo na direção de Claire. Por não querer machuca-la, David demorou mas conseguiu ativar seu poder na direção do carro, criando uma estaca de gelo do chão que perfurou um dos pneus de trás do veículo.

Porém, nem isso foi suficiente para parar totalmente, o carro perdeu o controle e capotou, entrando por um buraco que tinha na base do prédio e parando somente ao colidir com um pilar de concreto.

Claire chutou a porta do carro e saiu dele se arrastando, com vários cortes no corpo e algumas partes da camiseta rasgadas, ela se levantava cambaleando e Mary consegue chegar e agarra-la por trás.

— O que pensa que está fazendo?! – questionou a albina.

— Me larga, recuar uma ova! Eu vou é matar cada um desses canibais desgraçados! – Claire tentava se livrar de Mary, e ao mesmo tempo já empunhava suas adagas utilizando sua telecinese. – Venham aqui, me encarem seus animais! – ela gritava para o alto, onde era possível ver alguns buracos no teto daquele andar do prédio.

— Ethan! – Mary chama por ele.

— Sim! – ele tentava chegar o mais rápido que conseguia em Claire.

Ao mesmo tempo que Ethan respondeu, ele, Mary e Claire escutam um barulho enorme vindo de cima.

Assim que levantaram seus olhares, a morena conseguiu se soltar e correr na direção oposta à de Ethan, já o garoto, assim que ouviu o barulho e olhou para cima, começou a tentar parar desesperadamente e retornar de onde veio.

Vendo que não teria tempo para isso, em menos de um segundo Mary raciocinou que deveria ajudar Ethan, e foi o que ela fez.

Aquele barulho era o teto daquele andar do prédio, com cerca de 5 metros de altura, que levou um golpe vindo de cima dele e se desprendeu por completo, fazendo destroços enormes caírem na direção do chão.

 Ethan ainda estava dando meia volta, não conseguiria correr a tempo de escapar e seria soterrado pelos escombros.

Ele já estava fechando os olhos para aceitar a morte, porém, quando aquele pedaço enorme de concreto acertou o chão, o garoto percebeu que não estava esmagado e, assim que ele abriu os olhos, viu em sua frente uma moça alta segurando a ponta daquele destroço com as mãos.

Mary conseguiu chegar mais rápido que o menino e segurar aquele pedaço enorme de construção. Mas, ao mesmo tempo, era visível que ela estava fazendo um esforço tremendo, principalmente no braço direito dela, o principal dela.

O garoto ficava surpreso com a força de sua mestra, mas logo percebia que ela estava até agora dando sinal para ele sair debaixo daquele escombro. Ethan corria e conseguia enfim estar fora do alcance do concreto, para Mary poder soltar com tudo aquele pedaço, até mesmo levantando poeira.

— Desculpa... – ele respondeu enquanto recuperava o fôlego.

— Esquece isso, fez bem em entender a situação rápido. – dizia Mary enquanto ficava focada na entrada do prédio. Isso deixava o garoto um pouco mais feliz, e a atenção dele novamente voltava para a entrada em que, conforme a poeira ia abaixando, era possível ver os destroços no local, mas nenhuma visão de Claire ainda.

— Ei, vocês estão bem?! – David chegava por trás, segurando a mão de Lucy, que, apesar de ainda um pouco zonza, estava acordada enfim. – Cadê a Claire? Por que ela fez isso?

— Ela não conseguiu conter a própria raiva e achou que, se nenhum de nós fosse, ela iria sozinha. – Mary já se preparava para empunhar sua katana, prevendo um combate.

— Agora eu acho que não tem volta. – Ethan colocava sua mão no coldre nas coxas, preparando para sacar sua pistola.

— Droga. Claire, se eu te encontrar, é um chute que você recebe. – dizia David, enraivecido, e seus braços iam assumindo a cor pálida de gelo.

— Ai... Minha cabeça... Não podemos— — Lucy iria falar algo, porém foi interrompida por um som estridente.

Todos os quatro escutaram um som de vidro se quebrando vindo de cima deles, e, novamente, quando levantam seus olhares, conseguiram ver algo que foi arremessado do segundo andar do prédio, além de algo que pareciam ser respingos de sangue junto dos cacos de vidro. O susto foi tanto que os quatro ali, estavam com seus poderes preparados e armas em mãos.

Um corpo foi arremessado daquele andar e foi em direção ao chão, caindo bem na frente da entrada do prédio e, consequentemente, dos quatro singulares.

O corpo colidiu com a superfície e tudo que eles conseguiram reconhecer foram sons de ossos se quebrando por bater com força no chão e carne sendo espatifada junto deles. Para completar, o sangue respingou nos rostos de Mary, Ethan, David e Lucy, que agora observavam o cadáver.

Lucy e David estavam com expressões de choque pelo que viram, Ethan estava igualmente aterrorizado e Mary era a menos chocada, porém ainda era visível uma dúvida em seu olhar: se aquele era mesmo o cadáver de Claire, pois, apesar de um corpo feminino e moreno, o rosto dela estava sem a pele e os músculos.



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