Volume 1
Capítulo 5: O Resgate
— Extra, extra, extra! Jornal com as últimas notícias; garoto é preso acusado de assassinato! — bradava o jornaleiro, com a voz alta e urgente. Realmente, notícias ruins se espalhavam como fogo em palha seca.
— Eu quero um exemplar — pediu um homem, seus olhos fixos no jornaleiro, com uma expressão que misturava ansiedade e curiosidade.
— Certamente — respondeu o jornaleiro, passando o jornal com um gesto quase solene. — Aqui está, aproveite... As notícias de hoje são realmente escabrosas...
O homem, inicialmente alheio à gravidade do conteúdo, forçou um sorriso amarelo e pegou o jornal. Contudo, ao ler a manchete, a expressão em seu rosto mudou drasticamente. As palavras pareciam ganhar vida, envolvendo-o como uma mordaça invisível. Com o semblante pálido e tremendo, não suportou o choque e caiu ao chão com um baque seco. O jornaleiro, visivelmente alarmado, começou a gritar desesperadamente.
— Senhor? Senhor! Alguém, por favor, me ajude!
Uma mulher idosa, que passava apressada, correu para o socorro. Com o auxílio de um grupo de curiosos, ela ajudou o homem a se levantar e o levou para sua casa, enquanto ele continuava a vacilar entre a consciência e a perda de controle.
Gideon, que havia saído depois do tumulto causado pelo episódio com seu irmão, chegou à residência e encontrou o avô, Dolbrian, já presente, com uma expressão que mesclava preocupação e agitação.
— Vovô? O que está acontecendo? — perguntou Gideon, com um olhar confuso. — Senhorita Andra? O que faz aqui?
— Sente-se, Gideon — pediu Andra, com um tom grave, muito mais sério que o comum dela.
Gideon, com um olhar desconfiado, se acomodou na cadeira, observando a seriedade no rosto de Andra. Sua inquietação era visível, mas ele se sentou mesmo assim, com as mãos nervosamente entrelaçadas.
— Então? — indagou, a perplexidade transparecendo em sua voz.
Dolbrian respirou fundo, até que encontrou coragem para começar:
— Alaric... — A voz do ancião estava embargada, carregada de pesar.
— Ah! Eu estava prestes a falar sobre ele, vovô. Ele decidiu começar um treinamento intenso para se tornar mais forte, acredita? Haha! Embora, de algum modo, isso me deixe um pouco preocupado... — Gideon sorriu nervosamente, passando a mão na cabeça com uma expressão preocupada.
Dolbrian permaneceu em silêncio, os olhos fixos no chão enquanto lutava para encontrar as palavras certas. Finalmente, com um esforço visível, ele se ajoelhou diante do jovem, um gesto que evidenciava a gravidade da situação.
— Gideon... — começou, a voz cheia de dor — O Alaric foi preso. Acusado de assassinato.
Os olhos de Gideon se arregalaram instantaneamente, e seu rosto se contorceu em um misto de choque e desespero. Ele agarrou o encosto da cadeira com força, suas mãos tremendo enquanto tentava processar a notícia devastadora.
— Como? Isso não pode ser verdade! Por favor, diga que é uma brincadeira de mau gosto...
— Eu gostaria que fosse, Gideon, mas não é. Ele matou Galdric — Dolbrian falou com um tom de voz quebrado... Não importava o quanto tentasse, não conseguia impedir as lágrimas de escorrem pelo rosto envelhecido.
Gideon se levantou abruptamente, seus olhos brilhando com uma determinação feroz.
— Vamos resgatá-lo! — declarou, a firmeza em sua voz era quase constratante com a angústia de seu avô.
Dolbrian dirigiu os olhos inchados para Gideon, a surpresa misturada com uma sensação de desespero. Ele sabia que enfrentar um reino sozinho era uma tarefa hercúlea, quase suicida.
— Vovô? Não me diga que você vai ficar parado, sem fazer nada!? — Ele estava atônito, a indignação evidente em cada sílaba. — Como pode ser tão covarde? Ele também é seu neto!
— Ele é, sim! Mas eu não posso arriscar você também. Seja realista, Gideon! Não temos a mínima chance contra o reino sozinhos... Não seja imprudente!
— Covarde! Eu não serei como você. Se for preciso, eu salvarei Alaric!
— Não irá! — A voz de Dolbrian estava carregada de frustração e medo. — Não quero perder meu outro neto também...
— Não escutarei conselhos de um avô que se nega a salvar seu neto quando ele precisa — Gideon retrucou, a amargura em suas palavras revelando uma dor profunda e um desdém feroz.
Andra não suportando mais ver aquela cena horrível, avançou até Gideon, e, ainda que hesitante, lhe deu um tapa firme no rosto. A força do golpe reverberou, ecoando a tensão acumulada.
— Respeite seu avô! — sua voz era um misto de autoridade e arrependimento, tentando trazer uma dose de sensatez à cabeça turbulenta de Gideon.
O jovem, com o rosto corado pela dor e, ainda mais, pela indignação, virou-se e saiu correndo, seus passos ecoavam pela casa, até desaparecerem por completo.
Dolbrian, derrotado e com o semblante marcado pela frustração, murmurava para si mesmo enquanto seus ombros se curvavam sob o peso do desânimo:
— Eu sou fraco, fraco. Não consigo nem salvar meu neto... estou na mesma situação de anos atrás...
Andra, com o olhar suave e cheio de preocupação, aproximou-se dele, tentando oferecer um conforto que parecia impossível de alcançar.
— Você não teve culpa naquela época, e não tem culpa agora. Você só está sem alternativas. Gideon voltará para se desculpar; ele é um jovem com um coração gentil — ela passou a mão carinhosamente pela cabeça dele e o envolveu em um abraço reconfortante.
O ancião ergueu os olhos para ela, a expressão carregada de um amor cansado e resignado, e a beijou com ternura.
— É exatamente isso que me preocupa. Ele é gentil demais e excessivamente ingênuo. Acredita que pode enfrentar o mundo sozinho...
— Talvez seja por isso que ele é o "Escolhido", não é? — ela tentou o animar, sua voz suave como uma brisa fresca, em um campo florido.
— Sim, talvez. Vou precisar pensar em algo...
Enquanto isso, Gideon se encontrava em uma viela estreita da favela, sentado sobre uma caixa desgastada. A atmosfera opressiva do lugar parecia se refletir em seu estado interior. Seu coração batia descompassado e o ar parecia escasso, uma sensação angustiante que ele não conseguia dominar. Ele se perdia em pensamentos desesperados, lutando para encontrar uma forma de salvar seu irmão, enquanto a realidade crua do mundo ao seu redor o sufocava lentamente.
Uma figura envolta em mistério avançou com passos silenciosos. Gideon, imerso em sua crise, não percebeu a aproximação. A figura estendeu a mão e a pousou suavemente sobre a dele, trazendo um senso inesperado de calma.
— Quem é você? — perguntou Gideon, ao recuperar parcialmente os sentidos.
— Eu... você deseja salvar seu irmão, não é? — A voz da figura era suave, quase etérea.
Essas palavras fizeram os olhos de Gideon se arregalarem de surpresa. Como ela sabia? Apenas Dolbrian e Andra conheciam a profunda ligação entre ele e seu irmão.
— Eu vi — respondeu a figura, como se fosse capaz de ler pensamentos.
— Viu? Como? Onde? — Ele estava transbordando de perguntas, seu tom carregado de urgência e uma cautela visível.
A figura ergueu a mão e a tocou em sua própria testa, como se indicasse: Aqui. Gideon se lembrou de histórias sobre pessoas que tinham visões, profecias e intuições misteriosas. Desesperado, ele estava pronto para qualquer ajuda que pudesse surgir.
— Você quer salvar seu irmão? — a figura repetiu a pergunta, sua voz carregada de um tom que parecia penetrar a alma.
Gideon, dominado pelo desalento, respondeu com um fervor quase desesperado:
— Sim. Não tenho mais opções.
Ela se inclinou mais perto dele, seus lábios tocaram suavemente sua bochecha em um gesto de conforto, e sua mão se entrelaçou com a de Gideon novamente. Embora ele não entendesse completamente o que estava acontecendo, seu coração disparou e um rubor quente subiu em seu rosto. A sensação era nova e desconcertante.
— En- então vamos salvá-lo — sussurrou ela, sua voz firme apesar da suavidade.
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— Onde ele está!? Por que Gideon ainda não voltou para casa!? — questionou Dolbrian, sua voz ressoando pela casa enquanto caminhava de um lado para o outro, a ansiedade moldava cada movimento.
Horas se passaram, e a escuridão da noite tomou conta das ruas. A única iluminação vinha da luz da lua, que lançava sombras fantasmagóricas sobre o pavimento, e dos postes de luz mágicas que lutavam contra a penumbra. A ponte, há muito deserta, era o limite entre a calma do centro da cidade e a aridez dos arredores. Poucos guardas, suas armaduras reluzindo à luz fraca, patrulhavam a área com passos lentos e cansados.
Gideon e a garota desconhecida avançavam em silêncio, sua silhueta recortada pela luz das lâmpadas que iluminavam suas cabeças. O destino deles era o calabouço, uma fortaleza sinistra situada perto da fronteira com Re'Loyal.
O jovem tomou a dianteira, movendo-se com a furtividade de um predador. A garota, por sua vez, seguia seus passos com a mesma discrição.
— Nem perguntei seu nome. Qual é? — sussurrou Gideon, sua voz quase um murmúrio na quietude da noite. Eles haviam percorrido um longo caminho sem trocar uma única palavra sequer.
A garota hesitou por um momento, seu olhar fixo no chão como se as pedras ao seu redor fossem mais seguras do que encarar os olhos do rapaz.
— M-meu… nome é Astrid — respondeu finalmente, a voz trêmula e o corpo um pouco inclinado, entrelaçando os dedos de forma nervosa.
Gideon ergueu uma sobrancelha, surpreso. O nome não era comum na região. Talvez ela fosse de outra parte do continente. No entanto, não havia tempo para especulações. Eles tinham que continuar.
À medida que se aproximavam do calabouço, um sentimento crescente de tensão pairava no ar. O cenário à frente era imponente e aterrorizante. O calabouço erguia-se majestoso, um colosso de pedra que se estendia por toda a fronteira com Re'Loyal. O portão de aço escuro, com seus detalhes intrincados, parecia quase uma boca gigantesca prestes a engolir qualquer um que se atrevesse a cruzá-lo.
O edifício era construído com blocos de pedra massiva, cada um emitindo uma aura de indestrutibilidade. Duas torres imensas, com refletores mágicos que lançavam uma luz azulada e espectral, flanqueavam o portão. Entre essas torres, uma estrutura menor, visivelmente desgastada pelos anos e pelos elementos, era identificada como a prisão, guardando os criminosos mais perigosos.
O chão era uma mistura de terra e areia, uma aparência precária que contrastava com a imponência do local. O deserto ao redor parecia se enroscar ao redor da fortaleza, como um lembrete constante da hostilidade da região.
Gideon olhava para o complexo com frustração, seu cérebro trabalhando freneticamente em busca de uma solução. "Como faremos para entrar sem sermos vistos?", pensava, sentindo a pressão do tempo e da necessidade.
Enquanto isso, Astrid, encostada no muro frio e áspero, estava consumida por seus próprios pensamentos. "Por que eu quis ajudá-lo? Por que eu o vi nas minhas visões? O que ele tem?", suas perguntas interiores ecoavam em sua mente, misturando-se com a inquietação e a dúvida.
— Astrid! Astrid! — O chamado de Gideon a trouxe de volta à realidade. Ela se sobressaltou ao ouvir seu nome, mas logo percebeu que era ele quem a chamava, gesticulando com urgência.
Ela viu Gideon, com um olhar determinado, indicando que havia encontrado um meio de entrar.
O mesmo apontou para uma passagem, coberta de sujeira e exalando um odor fétido que denunciava sua origem: uma saída de esgoto da prisão. Gideon, com o coração acelerado e a mente focada em um único objetivo, avançou sem hesitar, determinado a salvar seu irmão.
— Ei... e-eu. — A voz da jovem atrás dele era um sussurro trêmulo, quase abafado pelo nervosismo.
Gideon, captando o murmúrio quase imperceptível, parou por um momento e virou-se.
— Você queria dizer alguma coisa? — perguntou, o tom afável, e preocupado.
Ela corou ligeiramente, e baixou os olhos.
— Nã-não.
Sem perder o ímpeto, Gideon retomou seu caminho. Após alguns minutos de caminhada pelo corredor úmido e sombrio, chegaram a um ralo que parecia ser o único ponto de saída do esgoto. Acima, dois guardas estavam de pé, envolvidos em uma conversa que exalava uma inquietação silenciosa.
— Há uma movimentação estranha na fronteira — disse o primeiro guarda, o semblante preocupado.
— Sério? Não tinha percebido — respondeu o segundo guarda, sua expressão denotando surpresa e desconforto.
Gideon ignorou a conversa dos guardas, seu foco absoluto em uma única missão. A determinação em seus olhos brilhava mais intensamente que qualquer outro sentimento. Ele seguiu em frente, ignorando qualquer outra coisa.
Os dois braços do rapaz estavam estendidos em direções opostas, seus pulsos acorrentados a correntes pesadas que o prendiam ao chão frio e úmido da cela. Ele se encontrava sentado, com as pernas encolhidas e a cabeça inclinada, como se tentasse encolher a própria dor. A expressão em seu rosto era um mosaico de sentimentos conflitantes: a tristeza profunda e um ódio silencioso que parecia borbulhar sob a superfície. Seus olhos, antes vibrantes, agora pareciam apagados, como se estivessem lutando para se adaptar à escuridão que o envolvia.
O único guarda na porta da cela observava com uma vigilância quase impiedosa. Sua presença era um lembrete constante da crueldade que poderia desabar a qualquer momento. Armado e com um olhar endurecido, ele aguardava pacientemente qualquer sinal de movimento que pudesse justificar uma execução imediata.
A cela, com suas paredes de pedra nua e o cheiro de umidade misturado com um leve odor metálico, parecia absorver o desespero e a desesperança que emanavam do prisioneiro.
Na sua mente, uma tempestade de pensamentos se agitava, confusa e caótica, como uma massa de nuvens densas e escuras que não deixava o sol entrar. Cada fragmento de memória, cada sentimento, parecia se chocar e se misturar, criando uma confusão desconcertante.
— Um assassino não merece estar vivo — murmurou ele, a voz arrastada e embargada pela dor e pelo desespero.
Com cada palavra, e, uma fúria quase autodestrutiva, ele batia a cabeça contra a parede fria e úmida, fazendo ecoar um som oco e perturbador.
— Alaric! Alaric!
O som de seu nome, repetido com urgência, atravessou a névoa de seus pensamentos. Ele ergueu a cabeça dolorida pelas batidas, os olhos marejados e atordoados, e olhou na direção do ralo próximo. Lá, à sombra da luz trêmula e instável, viu uma silhueta familiar... era Gideon, lutando para se fazer notar através da pequena abertura.
— Espere, eu irei te tirar daí! — gritou, a determinação em na voz clara e firme.
— Gideon!? O que faz aqui? Como chegou até aqui? — As palavras saíam atropeladas, um misto de surpresa e confusão, antes que o peso da culpa se fizesse sentir. — Gideon, me ouça... Eu agora sou um assassino... Me deixe aqui, devo pagar por meus crimes.
— Ha, ha, já chego aí — respondeu, com um tom calmo e resoluto, ignorando o apelo de Alaric. Ele se movia com precisão e agilidade, procurando uma maneira de alcançar o amigo. Ele não podia, não iria permitir que o desespero de seu irmão, o consumisse por completo.
Ao avançar mais um pouco pelo imundo e lamacento esgoto, Gideon se deparou com uma escadaria antiga, cujos degraus rangiam sob seu peso. A cada passo, o som de água pingando das paredes e o cheiro de mofo e podridão se intensificavam. Ao fim da escadaria, seus olhos encontraram uma porta enferrujada e visivelmente desgastada. Por sorte, a porta estava destrancada.
Com um impulso, o jovem se lançou através da abertura, adentrando um corredor estreito e sombrio, onde as paredes eram feitas de pedras maciças, frias e úmidas. As tochas fixadas nas paredes lançavam uma luz vacilante e dramática, criando sombras que dançavam nas superfícies irregulares. Gideon, surpreso pela ausência de qualquer forma de iluminação mágica, rapidamente se recuperou e prosseguiu pelo corredor até alcançar as celas da prisão no fundo.
Ao atravessar o mar de celas, Astrid se deparava com uma cena de desolação. Cada cela parecia uma página de um livro sombrio, preenchida com vidas quebradas. Em uma delas, um elfo estava de joelhos, sua postura de súplica evidenciava a intensidade de sua oração, os lábios movendo-se silenciosamente em um desespero silencioso. Em outra cela, uma jovem, que a princípio parecia comum, revelava seus olhos demoníacos, um brilho sobrenatural e aterrador que causou um estremecimento em Astrid.
Sem poder suportar a cena, Astrid começou a correr. À medida que seus passos ecoavam pelo corredor úmido e sombrio, visões perturbadoras assaltaram sua mente. Embora já estivesse acostumada com essas aparições, a intensidade era inédita, como se cada imagem fosse um peso esmagador.
Em sua mente, uma cena se repetia incessantemente: "Vá, Alaric, e me deixe aqui. Salve-a também… Amo você, irmão…" A visão era um grito desesperado, um apelo que parecia atravessar o tempo e o espaço, aterrorizando-a de uma forma que ela nunca havia experimentado antes. A intensidade da visão a fez vomitar, mas a necessidade de continuar era maior. Astrid enxugou as lágrimas que escorriam pelo rosto e prosseguiu, seu coração batendo freneticamente.
Quando Astrid chegou à cela de Alaric, o cenário era desolador. O chão frio de pedra parecia refletir o estado de espírito de Alaric, que estava sentado ali, com a postura encurvada e o olhar perdido. Seu rosto exibia uma resignação profunda, como se há muito tivesse abandonado qualquer esperança de redenção.
— Quem é você? — a voz de Alaric era um sussurro rouco, carregado de cansaço e tristeza, como se cada palavra fosse um esforço doloroso.
— Eu sou… amiga de Gideon — a jovem lutava para articular cada palavra, seu medo e a gravidade da situação tornava a fala um desafio quase intransponível.
— …Vá embora e convença-o a ir também — Alaric soluçava, o olhar fixo no chão frio e áspero, como se cada palavra fosse um peso adicional a sua carga emocional. A tristeza em seus olhos era palpável, uma dor que parecia quase física.
"Eu preciso ajudar ele… mas eu não consigo falar sem gaguejar ou me envergonhar muito", pensava Astrid, temorosa.
— Me deixe! — gritou, batendo a cabeça com mais força na parede, agora salpicada de manchas de sangue seco.
"Uma única palavra, por favor mente… uma única palavra", tentava se convencer Astrid, lutando contra a própria hesitação.
— Vai!
— Não! — exclamou ela, a face ruborizada, mas com um brilho de determinação nos olhos ligeiramente amarelados. — Nã-Não irei te deixar aqui! Não sei o que aconteceu, mas não quero ver um homem em situação tão deplorável! — gritava, agitando-se completamente, seus cabelos prateados esvoaçando desordenadamente.
Essas palavras despertaram Alaric de seu torpor, e ele começou a refletir sobre a situação em que se encontrava. Lembrava-se das últimas palavras de seu amigo: "Descubra suas origens." Ele não compreendia plenamente o significado daquela mensagem, mas sabia que não poderia sucumbir antes de cumprir o último desejo de seu amigo e mestre.
Ele deu um impulso, tentando quebrar as correntes, mas elas eram espessas demais para sucumbir à sua força. Astrid se aproximou com cautela, seus passos quase silenciosos no chão frio da cela. Ela colocou as mãos sobre seus ombros largos e musculosos, que haviam se desenvolvido consideravelmente com os anos de treinamento intenso. Ao sentir o toque, Alaric se arrepiou por inteiro.
Astrid afastou as mãos, seus dedos ainda ligeiramente aquecidos pelo contato. Com um movimento firme e decidido, ela desferiu um golpe poderoso na direção das correntes, que se despedaçaram com um estalo ensurdecedor.
— Que força é essa? — perguntou Alaric, espantado. — Você é de alguma classe?
— S-sim, eu sou — respondeu Astrid, com uma leve hesitação na voz.
"Quem é essa garota, afinal? Ela parece um pouco tímida, mas isso não importa agora. Precisamos sair daqui", pensou Alaric, enquanto sua mente começava a planejar a próxima etapa de sua fuga. No entanto, ele foi interrompido pelo som autoritário de uma voz.
— Ei, você aí, volte para sua cela agora! — gritou o guarda, com a espada pressionada contra o pescoço de Gideon, deixando claro que qualquer resistência seria fatal.
Gideon respirou profundamente, o ar frio e pesado em seus pulmões. Não havia mais solução para sua situação; ele sabia que ali seria seu fim, mas aceitava isso com uma serenidade incomum. A única coisa que importava era que seu irmão finalmente seria livre, e essa perspectiva lhe dava um alívio inexplicável.
Um sorriso melancólico se formou em seus lábios enquanto ele refletia: "Haha! O 'escolhido' irá morrer em uma prisão em ruínas, sem que ninguém jamais saiba da minha partida. No fim, ser escolhido nunca foi um papel que eu realmente desempenhei." Com essa última resolução, preparava-se para o inevitável.
— Alaric! — exclamou Gideon, sua voz ressoando com uma paz transcendente e um sorriso puro no rosto.
No mesmo instante, Alaric voltou seu olhar para Gideon, a expressão de desespero e determinação marcando seu semblante. Ele estava posicionado à frente de Astrid, sua postura protetora como um escudo humano. O guarda, que estava a cerca de dez metros à frente, parecia congelado no tempo, como se o mundo inteiro tivesse cessado seu movimento por um breve momento.
— Alaric, fuja. Já cumpri meu papel neste mundo — Gideon falou, seu sorriso ainda radiante e imperturbável, como se estivesse orgulhoso da vida que levara.
— Não! Não vou te abandonar! Eu voltarei para a cela, está bem? Solte-o! — Alaric implorou, sua voz carregada de urgência e desespero.
Alaric tentava negociar com o guarda, abaixando-se cuidadosamente, as mãos erguidas em um gesto de rendição.
— Fuja! — ordenou, sua voz carregada de uma determinação inabalável. Seus olhos fixavam-se intensamente em Alaric, sem hesitação.
Os prisioneiros ao redor observavam a cena com atenção, o ambiente carregado de uma tensão palpável. A mulher demônio ao fundo sussurrou algo para si mesma, um murmurinho quase inaudível.
Eu sou só um assassino, me deixe… — murmurou Alaric, a voz oscilando enquanto ele pousava a mão em seu próprio rosto.
Seus olhos encontraram os da garota apavorada atrás de seu corpo, e ele segurou suas mãos trêmulas com um gesto de proteção.
O caos se desenrolava ao redor, uma tempestade de emoções e movimentos descontrolados. Cada segundo parecia se esticar, carregado de uma tensão insuportável.
— Não, Alaric, você não é um assassino. Você nunca mataria ninguém, não enquanto ainda tem controle de si mesmo.
O guarda hesitou, a mão que segurava a espada afrouxou a pressão, permitindo que a lâmina se afastasse lentamente do pescoço de Gideon. Aproveitando o instante, Alaric fez um movimento brusco, saltando em direção ao homem. Seus olhos, agora estreitos e ferozes, brilhavam com uma determinação implacável. A expressão em seu rosto transmitia apenas uma vontade ardente e mortal, uma vontade de matar.
Gideon, observando a situação com crescente inquietação, aplicou uma cotovelada firme no estômago do guarda, forçando-o a soltá-lo. Alaric, ágil como um raio, cruzou os dez metros que os separavam em um instante. Sem hesitar, agarrou o pescoço do homem, começando a estrangulá-lo com uma força impressionante. O guarda, em uma luta desesperada por sua vida, se debatia violentamente, mas parecia que a força de Alaric era inabalável.
— Solte-o, Alaric! — gritou Gideon, enquanto tentava puxar seu irmão para longe do homem. — Ele já está desacordado!
Alaric, finalmente, largou o guarda. As marcas profundas de suas mãos eram visíveis no pescoço do homem, agora quase sem vida. O jovem então se dirigiu para a espada caída no chão, pegou-a com um gesto brusco e caminhou de volta até o corpo inconsciente do guarda. Com passos lentos e deliberados, aproximou-se, mantendo um olhar frio e impassível. Sem qualquer sinal de aviso, desferiu uma estocada letal no peito do homem, a lâmina penetrando com precisão fatal e causando sua morte instantânea.
Seu rosto permanecia uma máscara de neutralidade, sem traços de emoção. Gideon, perplexo, deu um passo para trás, incapaz de reconhecer o irmão em sua frente. Astrid, assustada e confusa, se ocultava atrás dele, tremendo visivelmente.
Alaric fixou o olhar em Gideon, sua expressão neutra, quase mórbida, fez seu irmão hesitar. — Eu estou em posse de minha mente — disse ele, a voz fria e implacável, enquanto segurava a espada ensanguentada com firmeza. Logo após, a largou com um gesto resoluto.
Antes que Gideon pudesse responder, uma explosão ensurdecedora sacudiu as estruturas da prisão, fazendo os alicerces tremeluzirem. O som de pedras caindo e gritos distantes indicava que algo grave estava acontecendo lá fora. Sem hesitar, todos correram para averiguar a situação.
Alaric pensou em seguir o grupo, mas uma ideia repentina o fez parar. Caminhando com passos decididos até o corpo do guarda caído, ele se inclinou para pegar as chaves das celas que estavam penduradas em um cordão em seu pescoço.
Após pegar as chaves, ele avançou em direção à cela da jovem demônio. Com um movimento ágil, destrancou a porta e a abriu, olhando para ela com um olhar que misturava gratidão e urgência.
— Obrigado. Sua magia sussurrante desestabilizou o guarda — disse ele, estendendo a mão para ela com um gesto de reconhecimento.
A garota, confusa e desorientada, olhou para ele com incredulidade. Ninguém ali deveria ter percebido o que ela fizera, mas havia um garoto que notara o impacto sutil de seu poder.
"Quem é ele? E por que sinto uma aura divina ao seu redor?" Ela pensava, confusa e inquieta. Seu sangue demoníaco alertava para a necessidade de cautela, como se estivesse diante de uma divindade. Ainda assim, em um gesto de gratidão por sua libertação, estendeu a mão e a apertou com firmeza.
Os dois correram para fora juntos, seus passos ecoando pela escuridão. Gideon já estava no local, mas seus olhos não podiam acreditar no que viam.
Nada preparava para o que se desenrolava diante deles. Um vasto exército, com as insígnias imponentes de Re'Loyal, avançava em direção à fronteira. O horizonte se enchia de tropas e estandartes, sinalizando a iminência de uma guerra que ameaçava o reino de Aldemere.
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Notas:
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