Volume 1
Capítulo 17: Domínio Inerte
A caverna estava um breu, a temperatura baixa. Não era para menos levando em conta que ainda estavam no norte.
O círculo ao chão havia desaparecido, no momento que o pacto de ligação chegou ao fim. Levando consigo parte da luz presente.
A única fonte de iluminação eram os símbolos e marcas, brilhando em azul claro, na pele do lobo.
— Fuxi — disse, coçando os cabelos vermelhos. — Né?
— Certamente.
Alaric subitamente sentiu sua pressão cair, tudo começou a girar. Não resistindo mais, caiu de joelho no chão e levou a mão à cabeça, onde a dor pulsava intensamente.
— O que é isso? — questionava sentido como se uma marreta atingisse seu cérebro inúmeras vezes.
— Consequências por mexer na sua alma. — O lobo observava o garoto agonizar em dor. — Vai passar, aguente firme.
— Fácil falar… Aí!
O lobo aproximou-se de Alaric, e parou ao seu lado.
— Vamos, apoie-se.
— O que!? — Mesmo estranhando, Alaric não tinha muitas opções, então, apoiou-se no lobo.
Foi a primeira vez que Fuxi demonstrou qualquer gentileza. O lobo até o momento se mostrava centrado e frio, sem deixar qualquer emoção transparecer.
Talvez ajudou Alaric apenas por sua importância no plano de vingança. De qualquer forma, mostrou gentileza.
— Consegue ficar em pé? — Alaric podia ser apenas um jovem, mas seus músculos já geravam um peso desconfortável para Fuxi.
— O que foi grande lobo. — Dando um sorrisinho, levantou-se em um impulso. — Não é forte o suficiente para me aguentar?
Alaric aparentava melhora, a dor em sua cabeça havia cessado. Agora, sentia apenas um peso…na alma? Seja como for, não importava, pois o jovem momentaneamente ansiava por respostas.
— Me dê as respostas, lobo. — Andou até a parede mais próxima e apoiou seu ombro nela. — Até porque como sabe, não agirei sem elas.
— Sei bem. — O lobo sentou à frente dele — E se não percebeu, o pacto também é válido para mim.
Alaric sentiu certa surpresa; afinal, Fuxi não demonstrou qualquer desconforto, muito menos dor durante o pacto. Para Alaric, a experiência assemelhou-se a ter uma parte do seu corpo arrancada. Se o lobo tivesse sentido o mesmo, uivos teriam ecoado por todo o norte.
Franzindo o olhar intrigado, e fixou em Fuxi, indagando: — E porque você não sentiu nada!?
— O motivo é simples, você está dentro do meu domínio inerte.
O olhar intrigado de Alaric reforçou-se intensamente, afinal, nunca tinha ouvido tal termo. Aparentava ser algo formidável, pelo menos o nome era.
— E o que seria isso!? — Sua expressão confusa forneceu respostas para perguntas que Fuxi nem mesmo havia formulado.
— Ahh! — O lobo balançou sua cabeça de um lado para o outro. — Mas era óbvio que nem esse termo estaria em seu conhecimento sócio-cultural né.
Realmente o conhecimento sócio-cultural de Alaric era bem limitado. Até porque, pouco tinha estudado e nunca havia saído de Aldemere.
O pouco que havia estudado foi com Galdric, e no máximo aprendeu a ler e escrever.
— Me explique então. — Seu conhecimento podia ser limitado, mas sempre foi de rápido aprendizado e, logo entendeu o funcionamento do pacto. — A final está no pacto.
— Aprende rápido mesmo né, Tá bom. — O lobo fixou seu olhar em Alaric. — Domínio inerte, é uma habilidade portada na alma, é a capacidade de criar um espaço separado do espaço-tempo universal.
— Então me está dizendo. — levou o dedo próximo a boca, refletindo intensamente. — Que você cria um local, que não respeita as leis universais? — Ainda com o dedo próximo a boca, franziu o olhar e continuou: — Tipo; gravidade, conservação de energia, ação e retração?
— Para quem pouco estudou, conhece bastante de física — indagou o lobo, estranhando um garoto com apenas conhecimentos básicos, saber sobre teorias da física. — Onde aprendeu sobre essas leis?
— Ah, foi lendo um livro, que Galdric havia falado que era conhecimento das civilizações antigas.
— Oh… Interessante, civilização antiga. — Fuxi não estava esperando Alaric ter tais conhecimentos, afinal, todo material das civilizações antigas foram destruídos pela segunda guerra celestial.
O jovem não entendeu a reação de Fuxi, ao falar sobre as civilizações antigas. Entretanto, realmente havia estudado física em livros considerados antigos e, graças a seu rápido aprendizado, absorveu tudo facilmente.
— Bom, que seja, sua teoria está correta — afirmou, e levantou-se. — Venha aqui.
Alaric foi até Fuxi, o lobo começou a riscar o chão de pedra. Rapidamente os riscos transformaram-se em desenhos e o chão em uma lousa.
— Olhe — pediu, apontando para os desenhos. — Essa é a forma de um domínio inerte expandido — falou, apontando para um domo desenhado.
O jovem observou, agachou-se e passou a mão pelos desenhos.
— Ou seja, ele fica dessa forma, mas provavelmente quando criado não é assim.
O lobo ficou atônito; mal havia começado a explicar sobre o domínio inerte e, Alaric já criava afirmações precisas. De fato, o domo, ao ser criado, assumia inicialmente a forma de uma pequena esfera, expandindo-se posteriormente até atingir seu tamanho real. Contudo, o tamanho dependia do usuário e seus níveis de mana.
Com um olhar perplexo, mas sem perder a compostura, comentou:
— Exatamente, ao expandir inicialmente é apenas uma pequena esfera negra — confirmou Fuxi, e continuou: — O que pode ser vantajoso, afinal, você pode expandir antes da batalha e guardar, até realmente necessitar.
Fuxi estava coberto de razão, era de enorme vantagem anteceder a expansão. Porque assim que necessitasse não ia precisar parar a batalha e aí sim expandir.
Alaric ainda agachado, olhou para o lobo e, logo em seguida apontou para um desenho em específico no chão.
— Mas pelo que entendi do seu péssimo desenho, expandir o domínio inerte gasta uma massiva quantidade de mana e mantê-lo também.
— Exatamente, mais precisamente de 100% de mana, o domínio inerte utiliza 50%, sendo assim, um gasto totalmente alto para pessoas com poucas reservas.
De fato, o gasto de mana era extremamente alto, em base de comparação, as espadas de Alaric usavam apenas 15% ao serem invocadas, e 3% para mantê-las invocadas a cada minuto. Já o domínio inerte usava os 50% para ser expandido, e 10% a cada minuto passado para manter-se. Óbvio em um tamanho comum de apenas 10 metros de diâmetro, porque, a cada novos 10 metros acrescia-se o valor para manter-se em 10%.
Ressaltando que os 100% eram baseados em 100/100 pontos de mana. Alaric chutava que tinha seus 160/160 de mana, ou seja ao expandir gastaria apenas 50 pontos de sua mana. Uma pessoa comum sem treinar normalmente tem 100/100 de mana mesmo.
Fuxi estava boquiaberto; afinal, Alaric compreendeu tudo de imediato até aquele momento. O lobo esperava ter que explicar tudo repetidas vezes.
— Ei, mas como faço para ter o domínio inerte? — Era um indagação válida, um poder como esse poderia mudar o resultado de guerras e mais importante proteger Gideon.
O lobo ao ouvir, esboçou um pequeno sorriso, se sentia como um professor ou como seu deus criador Inari Ōkami, referia-se: “Sensei”.
— Existem algumas maneiras. — Então, apontou para o primeiro desenho que ao que parecia explicava a primeira maneira.
Primeira maneira: Inerente à própria essência, o domínio inerte se manifesta desde o nascimento, marcando a alma como classes, especializações, armas e outros poderes. Num mundo em que tudo se conecta à alma, esta é a raiz de todas as habilidades.
Segunda maneira: Adquirir o domínio inerte, por sua vez, diverge em pontos cruciais. Pode-se obtê-lo de uma entidade poderosa ou evoluir até atingir o nível de criar um por conta própria.
A segunda abordagem era a mais poderosa, pois ao nascer ou receber de uma entidade, o domínio já vinha prédefinido, impossibilitando a alteração de suas regras e aparência. No entanto, ao criá-lo do zero, tinha-se a capacidade de moldar suas regras a bel prazer.
Exemplo: criar um domínio inerte que confere imortalidade, desafiando a lei universal da morte, ou até mesmo abolir a gravidade.
Estes eram apenas exemplos, pois a criação de um domínio inerte transcendia essas possibilidades.
— Entendo, ou seja, no meu caso melhor criar meu próprio domínio inerte — afirmou, olhando para o teto de pedra.
— Certamente, mas qual a certeza de que você já não possui um? — questionou, o lobo enquanto fixava olhar perfurante em Alaric. — Afinal essas suas espadas de luz, me parecem algo divino.
Alaric captou as intenções das palavras de Fuxi, e realmente, suas espadas não tinham explicações plausíveis, mas a mais lógica era de serem divinas. Afinal, o forjador havia falado sobre serem marcadas na alma desde sua vida anterior.
Mas se fossem realmente divinas, o que estariam fazendo em sua alma? Qual a ligação? Alaric carecia dessas informações. Entretanto, entre esses questionamentos outros vieram.
“Esse local… essa caverna, lembro de ter desmaiado na floresta e apareci aqui…. Será!?”
— Sim, você está dentro de meu domínio inerte — confirmou calmamente o lobo, à medida que sentava.
— Ahnnn!? Como!? — Isso era impossível na concepção de Alaric, afinal, Fuxi estaria mantendo esse domínio inerte a muito tempo. Entretanto, baseado nas porcentagens… Quanto de mana esse lobo escondia? — Como mantém o domínio!?
O lobo ao ver a enorme expressão de espanto do jovem que chegava a babar paralisado. Sentiu um orgulho imenso, ergueu seu focinho e então proclamou:
— Esse domínio é um presente de meu criador, Inari Ōkami.
Alaric recompôs-se, limpou a baba em sua boca e subiu seu olhar.
— Tô tentando me lembrar de onde ouvi esse nome. — De repente em sua memória, uma risada ressoou como um eco estridente e irritante, persistente como um som desagradável que se recusava a dissipar. — Ah! Aldebaram, ele havia me contado sobre esse deus e como criou os Lycaions.
Pelo que Alaric relembrava, Aldebaram havia o contado que Inari Ōkami criou os Lycaions a partir de seu sangue.
— Ele está certo, giganoides normalmente conhecem essa história perfeitamente. — Após confirmar, continuou: — Voltando ao assunto do domínio inerte, Inari Ōkami criou um para cada aldeia ou vila Lycaions para assim nos proteger dos outros seres-inteligentes.
O lobo falava a verdade, Inari Ōkami realmente criou todos os domínios inertes dos Lycaions, a fim de os proteger. Assim, para manter o domo custaria menos mana, ainda sim para um Lycaion mantê-lo sozinho…. O quão poderoso deveria ser…?
— Espera… — Alaric adquiriu um semblante intrigado, começando a coçar seus cabelos vermelhos. — Eu… invadi seu domínio? É possível invadir?
O lobo por um momento travou, realmente ele havia encontrado o garoto caído dentro dos limites do domo. Realmente o havia atravessado…. Como havia atravessado?
— Você… — A pausa dramática consumia Alaric por dentro, até que: — Você é algum deus!?
— Não sei… — Levantou uma das sobrancelhas, apontando para o lobo. — Afinal, era para você já saber… ou pelo menos ter compartilhado comigo, não acha?
— É, está correto em sua cobrança. — O lobo abaixou sua cabeça. — Eu deveria saber.
“Ahn?” Isso estava realmente acontecendo? O lobo que até o momento havia mantido a postura, sem demonstrar nenhum sentimento além do orgulho… acabava de baixar a cabeça em vergonha por não saber. Era como ver um rei ajoelhando-se perante a ralé.
Alaric, mesmo sendo um garoto com empatia seletiva e sarcástico, ficou desconfortável ao ver. Era como ver Aldebaram sem sorrir ou Gideon não querendo ajudar alguém, talvez Astrid perdendo a vergonha. Enfim, remetia a situações incomuns.
— É… não precisa disso cara. — Aproximou-se do lobo e acariciou sua cabeça. — Normal não ser o lobo do conhecimento.
— Fiz um pacto, lembra? E mesmo sem ele, eu tenho que saber. — Ao notar que Alaric não parava de acariciá-lo, cobrou: — Pode parar? Bom, não sou um cachorrinho ou lobo comum… Sabe?
— E-eita, foi mal! Foi mal!... — desculpou-se, avermelhando-se inteiro parecia um pimentão — É.. só que-
— Acalme-se, aprecio sua tentativa de ajudar — O lobo lambeu a mão de Alaric. Agora foi sua vez de ficar acanhado.
“Ele me lambeu!? Como um cachorrinho… Minha deusa que fofura!”
— Aham! Eu ainda posso ler mentes… — Afirmou embaraçado, se lobos pudessem avermelhar-se… Fuxi estaria mais vermelho que os cabelos de Alaric. — Por favor, não faça mais nada estranho.
Uma coisa era certa, o garoto que tentava parecer frio e sem sentimentos, perdia toda a postura por um cachorrinho… Normal, quem não ama animais. Bom, mas mesmo assim não podia deixar de parecer-se constrangido.
Entretanto, ao escutar a acusação do lobo, estranhou, ué, ele que o havia lambido… Não era o lobo o estranho da situação? Então com isso em sua mente apontou para lobo, e:
— Ah, claro eu que te lambi, né!? — Virou seu rosto e olhou para o teto. — Não jogue a culpa em mim Hump!
“Esse garoto… Vai me dar trabalho haha! Fazia décadas que não me sentia assim… Vivo”
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Notas:
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