Sangue Azul Brasileira

Autor(a): NAI


Volume 1 – Arco 3

Capítulo 18: A legião.

Dia 03. Submundo. Algumas horas depois, na virada da noite.

“Talvez eu só devesse dormir”, pensou enquanto arrumava a cama “Aquele mordomo ter cedido esse quarto, foi um milagre.”

Sentou-se na cama, apagou o candelabro ao seu lado e se permitiu deitar. Antes que conseguisse fechar os olhos, a porta do quarto caiu com um estrondo. Levantou-se rapidamente e, ao olhar para a porta, viu Nihilo fora da espada, segurando-a.

— Que droga você está fazendo? — indagou Nihilo — estou te procurando a horas! pretende ficar aí mais quanto tempo?

— Me surpreende que você foi  líder de um grande exército… — disse, colocando a mão na testa — você acha que eu não preciso descansar? Diferente de você eu ainda sou mortal e humano.

Nihilo franzia a testa, ficando com força a espada no chão de madeira.

— Antes de você nascer, eu lutei mil batalhas. Não havia tempo sequer para cochilar. — Se aproximou. — Ainda não sei em que tipo de confusão você está metido, mas se prepare para experimentar o mesmo.

Louis respirou fundo e se levantou lentamente. Seu olhar permanecia firme encarando Ken’jin.

— O mordomo tinha uma chave — estendeu a mão, de onde surgiu uma energia vermelha que revelou uma chave dourada — aparentemente ela tem acesso a área de serviço ao fim do corredor.

Os dois se encararam seriamente por alguns segundos. Louis passou por Ken’jin e, ao parar ao lado da porta, pegou a espada fincada no chão com certa facilidade. Ele a ergueu ao seu lado e fitou Nihilo em sua costa.

— Vamos acabar com isso então.

Quando saíram do quarto, encontraram-se em um imenso corredor com várias outras portas. À direita, o corredor levava a uma área de serviço; à esquerda, retornava ao saguão principal onde estavam anteriormente.

Correu a toda velocidade para o lado direito e, ao alcançar a porta da área de serviço, usou a chave dourada para abri-la lentamente, ouvindo o rangido a cada movimento. Quando a porta se abriu completamente, ele se deparou com um grupo de 8 mordomos limpando armas e roupas encharcadas de sangue, em tanques velhos. No centro da sala, havia uma mesa de madeira onde o corpo do garçom, que havia sido chutado pelo Lumis, estava sendo lentamente dissecado. Seu sangue era coletado em potes de vidro.

— Esse lugar só tem maluco. — Louis erguia a espada em frente ao rosto.

Quando o primeiro deles notou a presença de Louis e Nihilo, foi tomado por algum tipo de ira e avançou em direção a eles com um enorme facão ensanguentado. Antes que tivesse tempo de alcançá-los, Bellmore passou por ele com um passo limpo e rápido, fatiando-o ao meio.

Os demais deram um passo para trás ao ver a cena, mas em seguida tentaram realizar o mesmo movimento de seu companheiro. Nihilo, porém, passou à frente de Louis e com um único soco criou uma rajada de vento tão poderosa que lançou todos os outros com força contra a parede.

— Eles iriam levar aqueles potes com sangue para algum lugar — conforme se aproximava, o cheiro de sangue se misturava no ar com o podre cheiro de carne. 

Aquela pequena área de serviço possuía alguns armários velhos e desgastados, diversos tanques e uma estranha janela fechada. Louis se aproximava dela a passos lentos, observando o local sanguinário em que estava. Quando a alcançou, a abriu para cima e viu uma grande escada lisa levando para baixo.

Olhou para trás e acenou para que Nihilo o seguisse, depois entrou sem pensar duas vezes. Só então percebeu que o local era apertado até para ele. Enquanto descia, olhou para trás novamente e viu Ken’jin retornando para dentro da espada. Após alguns segundos de longa descida, avistou uma luz ao fim do caminho. Foi engolido por ela e, ao abrir os olhos novamente, encontrou-se caindo em direção a um enorme buraco cheio de um líquido verde.

Antes que caísse nele, cortou a própria mão e lançou um jato de sangue para trás, impulsionando-se alguns metros à frente. Só então parou em cima do que seria uma outra pedreira, dessa vez a sua frente se erguia uma enorme caverna, com algumas tochas e trilhas de madeira, indicando caminho.

Calmamente, Louis seguiu em frente, enquanto Nihilo flutuava atrás de si. A cada passo, sentia uma leve sensação de enjoo, que aumentava gradualmente conforme avançava mais fundo naquela trilha. Após alguns segundos andando por ali, Louis caiu de joelhos, colocando as duas mãos sobre a cabeça. Sentia sua mente sendo invadida por pensamentos que não eram seus, cada vez mais intensos

No segundo seguinte, jogou-se para trás, agora em agonia, batendo os pés com força no chão e cerrando os dentes com tanta intensidade que pareciam prestes a se rachar. Nihilo rapidamente entrou em sua força espectral, mas já era tarde, Louis havia perdido a consciência.

— Que droga, garoto! Acorde! — sacudia-o incessantemente. — Isso não é obra deste lugar, deve... — foi subitamente interrompido por uma voz feminina ao fundo da trilha.

— Desde que pisei nesse lixo de condado, senti algumas presenças estranhas — a silhueta nas sombras aos poucos ia avançando — agora me diz, quem são vocês?

Das sombras, emergiu Nyx, vestindo sua roupa usual, mas agora com uma coroa vermelha na cabeça.

— Você! Não sei qual é a briga que você tem com o garoto aqui, mas agora ele está comigo — disse, levantando-se e estalando os braços. — Então, como vai querer resolver? — ele sorria.

— Já que você não quer responder, eu mesma descubro. 

Num piscar de olhos, Nyx surgiu à frente de Nihilo e, ao tocar sua barriga, lançou-o com uma pressão avassaladora em direção ao grande lago verde atrás deles. Em seguida, ela se virou para Louis caído no chão. Entretanto, antes que conseguisse tocá-lo, todo o líquido no lago evaporou, e no segundo seguinte, Ken’jin apareceu ao seu lado, desferindo um soco tão forte e rápido que Nyx mal teve tempo de se proteger. Foi lançada com força ao fundo da caverna. Gerando um estrondo tão forte, que a sacudiu por inteiro.

— Tão jovem e já tem gente querendo te matar? HAHA Que merda você fez?!

À distância, podia-se ouvir o som de ossos sendo realocados. Em seguida, o som cessou e Nyx retornou, limpando o sangue ao redor da boca. Nihilo estufava o peito confiante, mas ao olhar para seu braço esquerdo, viu que ele começou a ficar roxo e a descoloração se espalhava rapidamente. Antes que pudesse avançar mais, ele o decepou e deu um leve pulo para trás.

“Veneno? Não, meu corpo é imune. Então…Deve ser alguma arte…Não! Essa geração não usa mais”

— Hmm — Ela levava a mão ao queixo — agora quem sabe você possa me responder, o que um jovem e um velho, que mais parece uma múmia, fazem aqui?

Nihilo franzia a testa, porém em seguida soltava uma enorme gargalhada, que ecoou por toda a caverna.

— Costumavam me respeitar…Bom tudo bem, afinal pra essa geração eu sequer existi.

— Sua vestimenta e modo de luta, realmente… — Começou a andar em círculos — você não parece ser dessa época — parou e colocou o dedão entre os lábios — então tem outros fazendo isso também…

— Da para você calar a porra da boca Nyx?! — Louis se erguia lentamente — confesso que demorei um pouco para me livrar desse teu feitiço. —  Com as mãos apoiadas no chão, se levantou. — É bom ver um rosto “conhecido” depois de 8 anos.

— Então os rumores eram verdadeiros…Esse lugar só tem gente sem cérebro. Me desculpa meu jovem, mas eu deveria te conhecer?

— Pensando bem... Acho que não. — Avançou até a espada caída no chão e a pegou. — Eu pretendia matar todos vocês juntos, mas vai um por um mesmo. — Ergueu a espada diante do rosto.

Louis colocou as duas mãos sobre a espada, de olhos fechados. Sua aura avermelhada começou a se espalhar pelo local como uma fumaça. Quando reabriu os olhos, encontrava-se novamente na visão quadriculada.

— 1 técnica… — foi subitamente interrompido.

— Não. — Nihilo colocou sua mão sobre o ombro de Louis. — Se você usar os dois ao mesmo tempo, vai gastar muita energia. Quantas das artes você aprendeu? Na verdade, isso não importa. — Ele retornou o espectro para dentro da espada. — Essa mulher está escondendo algo. Use seu Mukai focado em defender o corpo. Vamos matá-la em artes marciais.

Louis acenou com a cabeça, e toda energia retornou para dentro de seu corpo, criando uma fina camada vermelha em sua volta. Ele posicionou a espada com sua mão direita para trás e entrou em posição de luta.

Nyx estendeu a mão esquerda e dela criou seis lanças roxas de Mukai. Com a mesma mão, lançou-as em direção a Louis. Ele avançou rapidamente, segurando a espada, e desferiu o primeiro golpe, quebrando uma das lanças. Em seguida, uma segunda lança veio de cima; Louis pulou para trás, desviando, e num giro ágil, quebrou-a ao meio. As demais continuaram a vir incessantemente; ele as defendia uma por uma, aguardando o momento certo para quebrá-las.

Quando a terceira lança tentou atacá-lo por trás, Louis jogou a espada para trás e a defendeu. As demais vinham com toda velocidade, mas ele, de mãos nuas, lançou um soco no ar. Uma onda de energia surgiu dele, quebrando todas as lanças a sua frente ao mesmo tempo. A última que estava em suas costas, havia se inficado no chão, ele se aproximou dela e usando sua mão esquerda a quebrou em dois.

Antes que tivesse tempo de se agachar e pegar a espada, Nyx avançou tão ferozmente que seus olhos pareciam prestes a saltar para fora, seus dentes rangiam. Com as unhas afiadas, ela aproximou ambas as mãos do pescoço de Louis. No entanto, antes que pudesse cortar, uma enorme pancada a atingiu pelo lado direito, jogando-a com força contra a parede do lado esquerdo da caverna.

— O que foi isso?! — Louis pegava a espada e a apontava — você viu o que foi?.

— Não…E isso me incomoda.

Do outro lado, emergindo das fumaças, Nyx se levantava novamente, como se por algum milagre seu corpo não fosse afetado pelos ataques que recebera até então. Um sorriso se formou em seu rosto enquanto ela cuspia o restante de sangue da boca e sacudia a poeira de sua roupa. Ela pegou sua coroa vermelha do chão e avançou em direção aos dois.

— Quantos ratos mais vão aparecer? — Levantou seu braço esquerdo e o deixou reto apontando a extremidade da caverna — vocês dois…Não tem mais u — Antes que tivesse tempo para concluir uma outra voz, vindo de dentro da parede a interrompeu.

— STAR NA ÁREA!!!

A parede ao lado de Nyx explodiu, em um estrondo tão forte que a empurrou um pouco para o lado. Conforme a fumaça se dissipava, tornou-se possível ver uma garota com cerca de 1,87m de altura, vestindo uma calça marrom e uma blusa verde listrada. Seus olhos eram vermelhos, com pupilas em formato triangular, enquanto seu cabelo era alaranjado.

— Legião em ação!!  — Ela balançava lentamente seu martelo no ar, com um enorme sorriso no rosto.

— Quem é essa aí…? — Louis sussurrava.

— A velha Aldeni, me falou sobre vocês. São liderados pelo decrépito do Barrote Zarross, mas eu me pergunto e agora, querem vingança? Vocês não são meio grandinhos para isso? Esse é o ciclo da natureza, as minorias se rendem a maioria e assim será.

No segundo seguinte, o silêncio se instaurou pela caverna, sendo quebrado apenas pelo impacto da marreta de Star sobre o chão.

— Ei vocês dois! — Ela apontava — você estão com essa bruxa?

— Você é sonsa ou o que? Estávamos lutando até você atrapalhar, é claro que não estamos com ela.

— Ótimo — ela sorriu — então só teremos uma morte hoje — Ergueu novamente o martelo e estendeu a perna direita para trás.

Em um salto, ela avançou sobre Nyx, erguendo o martelo para trás no ar. No segundo seguinte, forçou-o em direção à mestra. Quando o martelo entrou em contato com a mão de Nyx, uma onda de ar se espalhou por todo o lugar, levando tudo pelo caminho. As paredes estremeceram com força, a trilha de madeira e as tochas voaram como folhas de papel, enquanto as estalactites no topo da caverna começaram a cair uma por uma.

Nihilo e Louis conseguiram se manter de pé, cobrindo os olhos enquanto esperavam que os detritos e a fumaça se dissipassem por completo. Ainda em meio aquela neblina de destroços, a única coisa que conseguiam ver eram pequenos flashes atravessando toda a caverna, juntamente do som dos corpos das duas se enfrentando.

“Sou eu quem deve matá-la”

Segurando com força a espada, voltou a liberar seu Mukai avermelhado à sua volta. Com sua espada erguida acima de sua cabeça, ele a lançou para frente e sussurrou:

— Segunda técnica: corte tridimensional. 

De sua espada escaparam diversos cortes, parecendo chicotes vermelhos que se alastravam e aumentavam cada vez mais por toda a caverna. As paredes se rachavam e explodiam em pedaços, enquanto o teto desmoronava em grandes blocos de pedra. Estalactites caíam, esmagando tudo em seu caminho, e o chão tremia violentamente com a força da destruição. A caverna inteira parecia prestes a desabar.

Tal destruição perdurou por mais de um minuto, enquanto Louis se mantinha envolto em uma pequena camada de seu próprio Mukai. Até que então, aquela sequência interminável de barulho e destruição cessou.

Ainda não era possível visualizar nada, entretanto ainda dentre a fumaça, Louis conseguia parcialmente visualizar alguma estrutura ainda mais gigante a sua frente. Nihilo impaciente, saiu de dentro da espada novamente e com o balançar dos braços dissipou boa parte daquela neblina à suas volta.

Foi então que enxergaram: estavam em uma floresta, mais precisamente no fim de uma. À sua frente, erguia-se uma enorme fortaleza de pedra. Seu portão tinha um formato triangular, e suas imensas muralhas se elevavam a mais de 200 metros de altura.

— Onde caralhos nós estamos…

— Aquela puta velha não parecia estar blefando, então… — Nihilo sorria.



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