Sakurai Brasileira

Autor(a): Pedro Suzuki


Volume Único

Capítulo 7: Lago Biwa

O dia raiou, e, após fazer seus afazeres diários, Hiroshi retornou à residência dos vizinhos, na esperança de os convencer a ensiná-lo a cozinhar. 

 — Já disse que não. — Confirmando suas suspeitas, tudo que pôde ouvir foi a negação de Sua diante de sua proposta. No fim das contas, o resultado foi o mesmo. 

O dia raiou. Após fazer seus afazeres diários, Hiroshi foi a residência dos vizinhos — novamente. 

— Não. 

O dia raiou. Hiroshi, dessa vez, foi diretamente à casa vizinha. 

— Cedo demais... E  não — respondeu Fuyuki bocejando. 

E o dia raiou... E o dia raiou. Mas Hiroshi não conseguia os convencer de jeito nenhum. 

Nesse meio tempo, Hiroshi tentou outros hobbies, mas depois de matar todas as plantas da pequena horta que cuidava, criar uma pintura dolorosa de se olhar, não encontrar inspiração para compor um poema, ter seus vizinhos implorando para que parasse de tocar shamisen, perder um dinheiro considerável apostando, se machucar na primeira tentativa de dança, cair de uma altura mortal na escalada e sair vivo por pouco, não ter com quem jogar shogi e falhar em costurar, Hiroshi chegou à conclusão de que só servia para lutar. 

— Você não vai parar com isso nunca?... O que é isso? 

Hiroshi entregou uma caixa. 

Ao abrirem o recipiente, toparam com uma grande barra de ouro, que, aos olhos deles, valia mais do que o bastante para contraírem dívidas com o samurai. 

— Por que quer tanto cozinhar? — perguntou Fuyu. 

— É simples, eu quero porque... Porque... 

— Pegue isso de volta. — E devolveu a caixa. — Só volte aqui quando tiver uma resposta apropriada. 

No dia seguinte, finalmente os Sakurai tiveram paz pela manhã. 

— Akira... Qual é sua motivação para cozinhar? — perguntou Hiroshi. 

— Uau, tá tentando ser filósofo agora? — E parou para pensar. — Hm... A felicidade das pessoas... Melhorar o dia dos meus clientes é o que me inspira! 

— Seja sincera. 

— O dinheiro — respondeu instantaneamente. 

Ha... Isso não é uma resposta apropriada... 

— Qual sabor você quer hoje? 

— Pêssego. 

Ela retirou de sua bolsa de palha um mochi laranja e quadrado, então entregou para Hiroshi. 

— Por que não é uma resposta apropriada? 

— É simples demais. 

— E sua motivação tem que ser complicada? 

— Tem que ser convincente. 

— Tipo resolver a fome do mundo? 

— Não, nem tanto assim. 

— Que complicado...Acho que para encontrar motivação, você tem que estar em um lugar motivador! Sabe aquele lago que eu te falei antes? 

— Sei. 

— Quer ir lá? 

— Agora? 

Aham. 

Hiroshi, que não possuía nada melhor para fazer concordou. 

— Só vou lá em casa buscar minha filha e já volto. 

— Tudo bem. 

Hiroshi mordeu o mochi. 

“Espera, isso não é uma ótima oportunidade para convencer eles?”, pensou enquanto mastigava. 

Depois de terminar de comer, Hiroshi se levantou, se espreguiçando e foi a casa ao lado. 

— Demorou dessa vez... Encontrou uma resposta? — perguntou Fuyuki. 

— Quer ir para o lago Biwa? — disse Hiroshi. 

— O que? 

— Eu quero! — concordou Aki, animado. 

— Parece legal — disse Sue. 

— Vocês estão mesmo concordando em ir para um lugar que a gente nem conhece com um cara que é conhecido por matar pessoas? 

— Voltei — disse Akira, que voltou usando um vestido de banho, acompanhada de uma garota. 

— Sua filha? — perguntou Hiroshi. 

— Ah, eu ainda não te apresentei. Essa é a Nailah, minha filha. — Apesar de ter a aparência parecida com a de sua mãe, o seu cabelo era mais curto.  

Além disso, não demonstrava ser astuta como ela. Se perguntasse a Hiroshi, ele diria que não parecia uma raposa como Akira. Ela era mais parecida com um gato de rua. 

— … Senhor Mizutani, quem é ela? — perguntou Fuyuki. 

— É quem me convidou para ir lá. Tem problema eles irem também? — perguntou Hiroshi. 

— Não me incomodaria — respondeu a vendedora. 

Ah, o lago fica bem longe daqui — acrescentou Hiroshi. 

— Temos uma criança e uma ovelha, então vamos pensar melhor nis... 

Quando Fuyu deu uma olhada para trás, todos os membros da família — inclusive a ovelha — já estavam preparados para seguir viagem. 

— Deixa disso, vamos lá! — disse Sue. 

Akira e sua filha, que já conheciam o caminho, partiram sem perder tempo, seguidas por Sue, Aki e a ovelha. Apesar de demorar, Fuyu saiu suspirando junto de Hiroshi, que ficaram para trancar as duas casas. 

— Eu já estou aposentado, mas não há problema em você sair de repente, assim? — perguntou Hiroshi. 

— Não. 

— Por acaso você é... Desempregado? 

— Não... Sim?... É que… Meu trabalho não é muito normal... 

— O meu também não era, pode falar. 

— ...Mas logo abrirei uma pousada!  

— Legal. — Hiroshi viu que esse era um assunto delicado, então não insistiu mais. 

Os dois permaneceram em silêncio até chegarem aos outros. 

A viagem seguiu pacífica até Aki ficar sem energia no meio do caminho. A ovelha se recusou a andar mais, então Hiroshi teve que levá-la nas costas. Fuyuki carregou o filho. 

— Quando é que a gente vai chegar? — disse Aki. 

— Daqui a pouco — respondeu Akira. 

— Quantos insetos — disse Hiroshi, pronto para usar a espada para picotar os mosquitos. — E por que eles não seguem vocês? 

— Eles devem ter gostado de você! E o que um bichinho desse tamanho faria com um grande samurai? — disse Nailah , que já usara um repelente natural antes de sair. 

— Que pesado… — disse Fuyuki, ofegante. 

— Ei, eu não sou pesado! — disse Aki para seu pai. 

— Como vocês reclamam! — gritou Akira. 

Apesar de tudo, chegaram ao lago mais rápido do que Hiroshi imaginava, sem grandes problemas no caminho. 

— É só passar esse morro e já estaremos lá — disse a garota, Nailah. 

— Uau! — Aki saltou do colo do pai, animadíssimo, e foi correndo ver o lago. 

Antes de subir a pequena elevação, Fuyuki prendeu a ovelha em uma coleira que possuía um sino, tornando-a ainda mais fofa. 

— Isso é mesmo um lago? — questionou Hiroshi, em voz alta. 

O lago, que esbanjava uma água cristalina — que ia muito além das enormes montanhas pintadas de verde vivo — parecia infinita e, junto ao céu azul desse dia, formava uma paisagem que mais parecia uma pintura. 

Hiroshi admirou essa visão por um tempo. 

Ao olhar para a costa, percebeu que diversas famílias se divertiam nas águas, o que era esperado para um dia de verão. Aqueles que não se banhavam compravam comida de algumas lojas de lanches e doces. Um pouco mais longe, Hiroshi viu o que pareciam ser alguns barcos pesqueiros. 

— Akira, onde você encontrou este lugar tão agradá- 

— Olha só, se não é o inimigo da justiça, Hiroshi Mizutani! — Dentre as pessoas presentes no lago estava Sota, que, com uma incrível visão, percebeu a chegada de Hiroshi e não teve dúvidas em o desafiá-lo (sua paciência, é claro) de prontidão. Nada mais esperado de seu rival mortal. — Já que estamos na praia, nada mais justo que um duelo de pesca! 

Algo parecia diferente em Sota, ele não possuía mais tanta sede de vingança. 

— Não aceito — respondeu Hiroshi, imediatamente. — E por que raios eu seria o inimigo da justiça? 

— Não é simples? EU sou a justiça! — exclamou Sota, deixando escapar uma risada digna de um vilão. 

Ignorando a resposta de seu adversário, ele pegou duas varas de pesca do chão e jogou uma para Hiroshi. O ex-samurai ficou apavorado, pois sabia que Sota as guardou precisamente para uma ocasião como essa. 

— Não tem como eu perder até mesmo na pesca, não é?! — exclamou Sota. 

Hiroshi, após negar diversas vezes, cedeu e aceitou a disputa. 

“Se eu não aceitar logo, ele pode vir com algo pior…”, pensou. 

Os dois, então, entraram em um barco alugado e foram pescar. 



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