Sakurai Brasileira

Autor(a): Pedro Suzuki


Volume Único

Capítulo 27: Aniversário

— Parabéns para você, parabéns para você... — Akira cantarolava no caminho da casa de Hiroshi, segurando uma caixa que continha um pequeno bolo de aniversário, visualizando a cena de como seria quando chegasse. 

— Com licença, por acaso poderia ajudar esse pobre homem faminto? — perguntou um homem com o rosto coberto por faixas brancas, vestindo um grande chapéu e pesadas roupas de inverno.   

Antes que pudesse ouvir a resposta, ele desapareceu da vista de Akira, que rapidamente pegou sua adaga escondida em sua cintura. 

— Relaxe, não vim para perder tempo lutando. — Akira se virou e viu o homem comendo o bolo que havia preparado. — Que ótima entrada para começar o dia. 

“Eu não consegui ver ele, mesmo chegando tão perto de mim para pegar o bolo!?”, pensou Akira. 

Ela tomou uma decisão de imediato. Lançou sua adaga, mirando nas mãos do homem, que instintivamente a agarrou com facilidade, derrubando o resto do bolo, então ela correu na direção oposta com todas as suas forças. Esse era um adversário impossível de ser vencido, essa foi a conclusão de chegou em poucos segundos. 

 — Apesar de eu ter dito que não queria lutar — disse o homem. — Com você correndo fica difícil. 

O homem facilmente a alcançou, mas apenas continuou a acompanhando na corrida. Vendo que correr não iria adiantar, Akira parou. 

— O que quer comigo? — perguntou Akira. 

— Bom, eu vim apenas te avisar sobre outro evento muito interessante que está acontecendo na direção oposta do lugar para onde estava indo — respondeu. 

— Quer que eu desista de ir para a casa do Hiroshi?  

— Pode ir se quiser, eu não vou te impedir. Mas tenho quase certeza de que mudará de ideia assim que ouvir que sua filha... 

— Seu desgraçado! Está mantendo minha filha como refém? — Akira tirou uma agulha do bolso de sua camisa e arremessou em direção do homem. 

Ele desviou se virando de lado, mas em seguida, dez outras vieram em sua direção. 

— Veneno... — A visão do homem ficou turva, fazendo ele perder o equilíbrio. —  Você pode continuar tentando me matar e tal... Mas quanto mais tempo demorar... Digamos que o meu amigo não tem muita paciência. 

Akira continuou arremessando agulhas envenenadas, mas logo, seu coração pesou.  

— Onde ela está?  

O homem entregou um papel com um endereço, então foi embora para a direção da casa de Hiroshi. Akira olhou para ele, bateu no chão, então se virou e começou a correr na direção oposta. 

— É tão difícil educar eles no caminho certo... — Will arrancou as faixas de seu rosto, revelando um sorriso de orelha a orelha. — Acho que vou chegar atrasado... De novo. 

Então ele desmaiou e caiu no chão. 

O fluxo natural da vida. As pessoas nascem, recebem um tempo predestinado, como uma vela que lentamente se esgota, então apaga. A morte é algo inevitável, o tempo que temos na Terra é finito. Um conceito concreto tão básico, mas que foi desafiado diante dos olhos de Hiroshi desde muito novo. 

Hiroshi nasceu com um talento. Ele era capaz de dizer precisamente quantos anos restavam até a morte, para a pessoa que olhava, quando se concentrava nela, chamando o que via de energia. Todos os seres vivos perdem uma pequena porção dessa energia diariamente. Mortes por velhice, mortes por doença, isso sempre ocorria quando não havia mais dessa energia invisível para se perder. 

Desse fato, veio o primeiro choque. O primeiro assassinato que presenciou. Toda essa confiança em seu talento de prever a morte se foi em um instante. Seu amigo que possuía rios dessa energia restando, teve sua vida tomada por um acidente. Esse tipo de morte não é comum, mas ainda é natural.  

Para onde foi essa energia restante? Hiroshi a viu se perder em pleno ar. Apesar desse acontecimento horrível, posteriormente, ele não pode deixar de ficar encantado pelo espetáculo de cores que era a energia retornar para onde veio. Um dia, ele leu em um livro de contos que narrou sobre o fenômeno reservado apenas para aqueles que viviam em condições extremas, uma aurora boreal, e ligou essa descrição com a antiga imagem que havia visto a anos, fazendo a morte prematura se tornar ainda menos chocante. 

Encerrar a vida dos outros, para Hiroshi, apesar de desconfortável, não era um problema, pois de qualquer forma, todos estavam retornando para o ciclo natural, mesmo que antes que o programado, toda a energia ainda viria a se perder no ar de qualquer forma. Isso não era um problema pois era natural. 

Esse conceito foi novamente quebrado. Enquanto vagava após o término de uma de suas primeiras batalhas, ele encontrou quatro homens conversando: um alto e careca, que esbanjava sua longa barba branca, um mais comum, de cabelos pretos e um olhar afiado, um familiar, aquele que o ensinou a esgrima, que o encontrou sozinho no vilarejo dizimado e um estranho. Suas feições, aparência, roupas, tudo estava nublado.  

Isso atiçou a curiosidade de Hiroshi, que decidiu se concentrar para espiar a energia restante de cada um, mas se arrependeu, vomitou de nojo. A energia tão bela, não só havia perdido totalmente a cor, mas também seguia um fluxo anormal. Ao invés de sair, ela retornava ao corpo de um dos quatro homens. 

Não importava se era vivo ou morto, humano, planta ou animal. Que desgraça foi perceber até a sua própria energia estava sendo roubada por aquele monstro. Hiroshi colocou sua mão sobre seu coração, tentando impedir a sua energia de escapar, mas ela a atravessou e foi levada a barriga daquele homem. 

“Seria ele o ceifador? Aquele que toma a vida das pessoas? O que acontece com aqueles que tem suas energias roubadas? Será que é natural mesmo as pessoas perderem energia durante a vida? Será que na verdade, todos poderiam viver muito mais se não fosse a ganância desse homem?”, pensou Hiroshi. 

Os seguindo por alguns dias, ele percebeu que assim como ele, o homem era um humano de carne e osso, o que o fez o repudiar ainda mais. 

“Como pode alguém roubar a vida das pessoas? Quem deu a ele esse direito?”  

Ele contrariava a natureza, ele roubava dos outros para estender sua própria vida. 

Todo o conceito florido de que as almas perdidas retornavam para o ciclo de reencarnação ou iam para alguma espécie de céu foi destruído. 

Assim, veio a culpa, então os pesadelos. Ele pensava que a vida seguiria após a morte para aqueles que matou, mas no fim só estava ajudando um porco ganancioso a se alimentar além de sua cota. Fazia diferença, Hiroshi não tinha mais o escudo moral que usava para defender seus próprios atos, suas ações faziam a diferença. 

Ele chorou incessantemente, implorou aos mortos por perdão, mas em sonho, eles voltaram para o acusá-lo. 

 As acusações dos mortos pela sua espada continuaram, noite após noite. A imagem daquele que roubava as almas dos mortos permaneceu gravada em sua mente todos os dias. 

Hiroshi não suportou tudo isso, então finalmente reuniu coragem para lutar contra o homem que roubava vidas. 

“No fim, ele ainda é um homem. No fim, ele pode... Não, deve ser morto!” 

Hiroshi se pôs no caminho do homem, apontou sua espada contra ele e foi humilhado completamente em uma derrota unilateral. 

Hiroshi se sentiu insignificante. Mesmo que usasse toda a sua determinação para fortalecer seu corpo além dos seus limites, ele nunca chegaria no nível daquele homem. Ele moldava as leis da natureza ao seu favor, ele brincava com a realidade. 

Tudo havia perdido o sentido, Hiroshi ficou de cama por dias, esperando o fatídico dia em que sua energia se expiraria e iria direto para a barriga do maldito homem poderoso demais. Nada que fizesse em vida mudaria esse destino. Ele estava vivendo para nada. 

— Anime-se criança! — Mas no dia de seu aniversário, um homem reacendeu sua vontade de viver. — Eu também senti o mesmo que você, sei como é difícil, por isso te peço para que permaneça firme, viva! Você é capaz de alcançar ele! Você é minha esperança, minha arma secreta para lutar contra esses malditos. Ainda temos como lutar contra eles! 

Will exclamou essas palavras, enquanto as provava na prática, executando um homem como aquele, provando ser possível vencer o que parecia impossível. 

Pela primeira vez, Hiroshi se sentiu genuinamente feliz por um presente daquele homem. 

Essa e tornou a motivação diária para seus treinos. Um dia, ele também seria capaz de vencer o destino de acabar na barriga daquele homem. 

Hiroshi acordou, olhou para os lados, agarrou sua wakizashi e se levantou. 

“Preciso voltar a treinar”, pensou. 

Ele sentiu algo diferente nessa manhã. Relembrando sua motivação, ele sentiu como se esse fosse o dia em que iria ultrapassar a parede que estava impedindo seu progresso. 



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