Volume Único
Capítulo 25: Revanche
Por boa parte do caminho, ambos permaneceram em silêncio. O que para Hiroshi era agradável, para Sota era um grande incômodo. Não ansiedade, nem medo da morte, como no primeiro duelo, apenas uma sensação desagradável. A situação se inverteu, Sota começou a falar.
— Como você tem cabelos pretos nessa idade?
— Quantos anos você acha que eu tenho?
— Você deve ser um pouco mais velho que meu pai então uns... cinquenta?
— Errou e por muito.
— Por acaso descobriu o elixir da imortalidade para parecer tão jovem com muito mais de cinquenta anos? — Pelas suas recentes experiências de combates até a morte, Sota havia percebido alguns fatores que se tornavam difíceis de acreditar que Hiroshi fosse muito mais novo ao invés de muito mais velho. — Descobri que há diversos rumores sobre quando você foi professor de esgrima do imperador, algo que é impossível de se conseguir sem uma alta posição no exército, também impossível de se conseguir sem décadas de serviço, algo que só pode ser contornado caso você fosse parente próximo de algum general, o que é bastante improvável. Fora isso, suas habilidades são incomparáveis a todos com menos de trinta anos e sua aura ameaçadora que mostrou no primeiro duelo também é inigualável a todos que vi, com exceção de meu professor que estimo que tem ao menos quarenta anos.
— Vinte e dois, mas só até amanhã.
— Vinte e dois o que!? Décadas? Séculos? — Hiroshi fez um olhar decepcionado, então balançou negativamente a cabeça. — Você é quase da minha idade então? Isso não faz sentido... Como ficou tão forte tão jovem?
— Treinando. Assim como você.
— Nem se eu treinasse desde os quatro anos de idade te alcançaria, tem que ter um segredo.
— É só ter uma boa motivação.
— ...Eu acreditaria se me falasse isso da última vez. Já derrotei pessoas com motivações muito maiores que a minha, isso pode ser importante, mas não é o suficiente.
— Chegamos.
— Se eu perder, me explique isso direito!
— Não seria ganhar?
— Se eu ganhar, então já terei a resposta.
Sota imediatamente deixou sua dúvida para trás, se concentrando apenas no duelo, começou a se aquecer, saltando, se alongando e correndo, enquanto Hiroshi, parado, notava algumas características estranhas: a pele de Sota estava um pouco mais pálida que a um mês atrás, os olhos, antes avermelhados, haviam voltado para sua cor original e não só os músculos haviam mudado, olhando mais atentamente, até os ossos haviam se tornado mais proeminentes e a pele mais limpa.
— Espero que não tenha se enferrujado! — gritou Sota.
E sua postura dessa vez era mais defensiva e estava incomparavelmente melhor que antes, sem tantas brechas e com mais possibilidades de contra-ataque, graças a mudança para uma espada razoável e a experiência de vários combates.
— Olha só, dessa vez não está mais olhando para o nada... — Só de perceber que Hiroshi agora prestava atenção em seus movimentos ao invés de apreciar a paisagem, trazia uma felicidade que fazia valer o treinamento infernal que passou. — Podemos começar?
— Podemos. — E acima de tudo, Sota não tinha mais medo nem ansiedade de morrer.
“Três ataques, três ataques...” — A última batalha havia se repetido várias vezes todos os dias, mas mesmo que pensasse e discutisse com Will, ele ainda não tinha como ter um plano claro de vitória, fazer Hiroshi usar toda sua força era seu objetivo, pois sem isso, não havia nem como se planejar.
— Dessa vez não vou perder tão rápido!
Hiroshi tomou a iniciativa, se aproveitando da mesma brecha que a última vez, executando três ataques consecutivos. Cada ataque empurrava Sota um pouco mais para trás, porém o real ataque vinha depois disso, se aproveitando do contra-ataque de Sota, Hiroshi se abaixou e deu um chute na panturrilha de Sota com o objetivo de o derrubar, mas acabou se surpreendendo.
“O que?”
— Hm?
O chute não foi bloqueado, mas também não teve efeito.
“Será que ele não era tão forte assim, ele dependia apenas de sua... Velocidade? Mas mesmo assim para ser tão rápido ele tem que ter uma perna forte...” — Sota começou a vislumbrar um destino além da derrota unilateral.
Enquanto pensava, Sota rapidamente levantou sua perna para tentar pisar em Hiroshi.
— Droga! — Mas Hiroshi facilmente desviou pulando para trás.
“Desse jeito eu nunca vou acertar ele... Mas e se...”
Sem perder tempo Hiroshi avançou em sua velocidade absurda e com um ataque o som do choque das duas espadas ecoou até as estradas próximas, então inesperadamente ele pulou por cima de Sota que instintivamente se virou para se defender de um ataque por trás, mas ele não estava lá.
“Para onde ele...” Então uma dor imensa veio de seus dois calcanhares, o obrigando a enfincar sua espada no chão para servir de apoio e não cair.
— Eu sei que você não é dos mais justos... — E respirou ofegante, tentando suportar a dor. — Mas isso foi demais.
— Desiste? — Hiroshi então apareceu e ficou cara a cara com Sota.
— Até parece que você não me conhece.
E Sota soltou sua espada e se jogou para cima do pé de Hiroshi, em uma velocidade que o pegou desprevenido, Hiroshi fugiu, mas Sota conseguiu roubar uma de suas sandalhas, mas caiu no chão.
— Impressionante como você evoluiu — disse Hiroshi.
“Para se lançar mesmo com o calcanhar sangrando...”
Sota permaneceu em silêncio no chão.
— Você está...
Então começou a rir sem parar.
— Então é possível, eu consigo! — E retirou um frasco com o líquido vermelho, entregue por Will, de dentro sua roupa e virou de uma vez.
Hiroshi imediatamente jogou o sangue da katana no chão e ficou apreensivo para o próximo movimento de Sota.
— Hahaha, não importa quantas vezes eu tome isso, nunca perde a graça, será que ele coloca ópio aqui? — Então seus pés começaram a reconstruir as partes feridas, se regenerando em poucos segundos. — Um herói deve ter um poder secreto para derrotar o vilão não é mesmo!
— Ei, você está bem?
— Hiroshi! — gritou com toda sua força. — Eu descobri que estava mentindo na nossa última conversa, meu desejo de te matar apenas aumentou, então pare com essa merda!
— O que?
— Esse poder vem com um problema, não consigo garantir que cumprirei minha promessa, então dessa vez lute com toda sua força! Me mate! Caso contrário... — Cada vez que recorria a aquele frasco, pior os efeitos colaterais ficavam.
O olhar de Hiroshi mudou, seu ódio havia se tornado perceptível, mas não estava direcionado para Sota.
“Não pode ser... Devia ter percebido antes, o fluxo da vida dele está modificado, igual... Droga, ele está vindo atrás de mim!? Por que justo agora?”
Sota retirou sua espada do chão, se agachou forçando suas pernas até suas veias ficarem aparentes e quando Hiroshi percebeu, já estava no ar voando para trás.
O corte seria forte o suficiente para partir Hiroshi ao meio, mas Sota decidiu virar a lâmina para cima.
Hiroshi protegeu sua cabeça com seus braços então caiu no chão girando para tentar diminuir o impacto, mas após três batidas no chão, seus braços pernas e costas estavam ralados; nas piores partes havia carne viva banhada de um sangue que escorria lentamente.
“Por que justo agora? Se eu tivesse mais tempo..."
— Não... Esse olhar vago de novo não! Preste atenção em mim, lute de verdade!
— Lutar de verdade... Eu estou lutando de verdade, o que você quer dizer com isso? — sussurrou Hiroshi. — Você que recorreu ao que não devia...
Então uma voz semelhante à de uma criança sussurrou em seu ouvido.
— Está mesmo? E essa wakizashi guardada?
— Não, não tem motivo para eu usar algo assim contra ele.
— Um conselho... Se continuar se segurando, vai acabar morrendo ainda hoje.
Hiroshi guardou sua katana e Kuro observou em silêncio, então ele segurou o cabo de sua wakizashi fazendo o rosto de Sota estremecer de alegria.
— Isso! Lute de verdade como o verdadeiro assassino que você é! — Durante esse mês, Sota havia estabelecido uma teoria e a investigando a fundo, não fazia sentido um Samurai não servir a nenhum Xogum, e ter uma velocidade tão absurda, o que fez ele ter certeza disso foram os passos de Hiroshi que não fizeram um ruído sequer no ataque ao seu calcanhar, a alta velocidade e passos silenciosos eram traços claros de um shinobi.
“Finalmente vou poder ver sua força total!”
— Você está se achando muito para alguém que recorreu a esse poder nojento... Mas se é isso que quer. — Hiroshi desembainhou sua wakizashi, uma aura brilhante o rodeou, então se abaixou e em um instante desapareceu.
As duas primeiras habilidades de Hiroshi faziam sentido uma vez que a terceira era adicionada, primeiro um ataque capaz de finalizar o oponente em um movimento, segundo um avanço que mais parecia um teletransporte para os olhos mal treinados, e terceiro, desaparecer, executados na ordem oposta, faziam de Hiroshi um assassino perfeito.
Sota tentou procurar por todos os lados, mas dessa vez a dor veio de sua nuca, depois de seus braços, depois de seus pés, e consecutivamente até o sangue cobrir seu corpo inteiro nem ao menos conseguir enxergar Hiroshi, Sota estava com um corpo de guerreiro, mas seus olhos ainda eram de um amador, depois de todos esses cortes superficiais, Hiroshi apunhalou Sota na região da barriga pelas costas e arrastou a lâmina para baixo.
“Mate ele.”
— Não, eu não vou. — Hiroshi pensou ter escutado Kuro, mas ele já havia ido embora.
Hiroshi ficou confuso, tentado procurar a origem dessa frase, mas cansou de pensar, se virou e foi embora, deixando Sota no chão, sangrando mais e mais, porém ele não parecia preocupado.
— Eu preciso voltar a treinar. — A nuca de Hiroshi brilhava como uma constelação de estrelas, que revelam o formato que os humanos acham melhor, mas de repente, logo quando ele parou, o brilho se cessou. — Ah, e respondendo sua pergunta, o medo de morrer me atormenta todos os dias, é bem eficiente.
— Do... Que alguém como você teria medo? — Sota vomitou sangue, mas continuou. — Você é o mais forte entre os humanos.
— Isso não é verdade. Você só conhece um minúsculo pedaço desse mundo assustador, espero que nunca encontre quem realmente merece ser chamado de mais forte.
— Cumpri minha parte — disse Sota logo depois de Hiroshi ir embora.
Por alguns segundos ninguém respondeu, rodeado e coberto da grama verde tingida de sangue, Sota aparentava estar sozinho, mas logo um portal feito de sombras se abriu no meio do ar ao lado de Sota.
— Ele está quase pronto, mas esse incentivo ainda não é o suficiente. — De dentro do portal uma voz masculina falava. — Mas o importante é que funcionou, logo ele terá a provação final, logo um humano estará apto a enfrentar os céus, só de pensar na cara deles ao verem isso...
Então Will saiu de lá, com o corpo inteiro coberto por panos e com uma luva branca ensanguentada que carregava uma grande caixa preta quadrada com um laço amarelo.
Quando ele saiu por completo, o portal fechou sem deixar rastros.
— Aqui está como prometido. — Então entregou a caixa e um frasco semelhante ao anterior para Sota, mas com um vermelho diferente, mais puro, e em seguida foi embora caminhando. — Que fome... Devo caçar algo de bom?
— Espere! Antes de ir me responda uma coisa.
— Claro.
— Ele me disse que há pessoas mais fortes até do que ele. Você é um deles Will?
— Não, estou longe disso.