Sakurai Brasileira

Autor(a): Pedro Suzuki


Volume Único

Capítulo 18: Gentileza

— O acordo sobre as armas deu certo — relatou um dos soldados, um amigo próximo do filho do Xogum. — Com todo esse dinheiro e nossos novos apoiadores, com certeza a vitória é só questão de tempo. 

— Então, o que estamos fazendo aqui? Tendo que perder tempo com um problema tão insignificante! 

— Também não consigo entender por que seu pai se preocupa tanto com uma família tão... 

— Nem ele parecia entender, foi ordem de outra pessoa. 

O soldado puxou as rédeas de seu cavalo, com uma cara de espanto. Essa guerra coroaria a família do Xogum como os governantes de todo Japão, mas essa frase insinuava que havia alguém dando ordens a ele. Uma ideia absurda, afinal, como poderia ter alguém acima do futuro imperador? 

— Quem é que tem a autoridade para mandar no Xogum? — perguntou, enfurecido. — Esse interesse nos Kōhei vem do imperador então? 

— Claro que não, estamos em guerra, por que ouviríamos a ele? Pense bem, o que pode conversar de igual para igual com o futuro imperador?  

— Outro imperador? 

— Sim, creio que seja o governador de outro país. 

— Droga, mal chegou no poder e já está lambendo as botas daqueles estrangeiros! 

— Cuidado com o que fala em público!  

De início o soldado pensou que estava sendo repreendido por ofender ao Xogum, mas vendo o seu amigo olhar para os arredores, preocupado; percebeu que apesar de estarem a alguns quilômetros da cidade, o fluxo de pessoas já era considerável. Seu erro estava em ignorar o risco de alguém indesejado acabar escutando e espalhar essas suposições como verdade. Boatos, principalmente em tempos de guerra, podiam ser fatais. 

— Me desculpe, me exaustei. 

— Como eu disse, isso tudo não passa de mera especulação. — Apesar de dizer isso, ele mesmo se sentia extremamente irritado com essa situação. — Vamos acabar com isso primeiro, depois nos preocupamos com o resto. 

Então seguiram em direção ao onsen em que Sota se hospedava. 

Os galhos secos de outono e o vazio incomum da cidade os recepcionou.  

— Tem algo de errado — disse o soldado. 

— Droga, será que descobriram?  

O filho do Xogum mandou todos ficarem alertas, tirou a arma de sua cintura e pulou do cavalo. 

Ele e seu amigo partiram na frente, correndo o mais rápido possível para o onsen, na esperança de o encontrar fugindo. 

O soldado viu a porta trancada, com a mensagem: “Fechados temporariamente”. Então tentou abri-la a chutes, mas falhou. 

— Tem alguma coisa atrás dessa porta, com certeza alguém vazou que a gente estava vindo. 

— Será que... O homem que nos mandou para cá estava armando para a gente? — Então o filho do Xogum gritou para os soldados. — Metade fica aqui fora! Isso pode ser uma armadilha! 

Os dois continuaram tentando arrombar a porta, sem sucesso.  

— Alguém tem uma arma pesada aqui? 

Com dois tiros, a porta se estilhaçou, revelando o que bloqueava a porta. Estantes, cadeiras, pedras e outros inúmeros outros móveis bloqueavam a passagem. 

— Teria algum motivo para ele fazer isso se ele tivesse fugido? Também, se isso fosse uma emboscada, eles tentariam facilitar nossa entrada, não dificultar... 

— Será que ele descobriu isso faz pouco tempo? 

— Mas como? — O filho do Xogum olhou para trás e gritou. — Por que estão parados!? Tirem isso tudo daqui! 

Os soldados jogaram violentamente os objetos para longe, a passagem se abriu. 

— Isso não parece certo... 

Depois da recepção, havia uma estrada que levava a uma área rodeada pela natureza morta. No verão, primavera e inverno, essa é apenas uma caminhada tranquila, rodeada de uma bela paisagem até as águas termais, porém para eles, à medida que entravam, o desconforto aumentava. 

— O que é isso na grama!? — E um soldado atirou sem pensar. Errou o tiro, e viu uma raposa fugir.  

— O que diabos está fazendo!? — gritou o filho do Xogum. 

O clima piorou ainda mais. 

— Quer saber, se espalhem e atirem em tudo que se mexer!  

Os soldados se espalharam pela pequena floresta, enquanto o filho do Xogum e seu amigo seguiram para a direção do som da água corrente.  

— Olha, uma pequena fonte... Água rica em cálcio e sódio — disse o soldado, para quebrar o clima pesado. — Quer um gole? 

— Vou passar. 

— Você que sabe. — O soldado formou uma concha com suas mãos, as levou até a fonte, enchendo-as de água e tomou um grande gole. — Hm... Um pouco salgado. 

— Não tem medo disso estar envenenado? 

— Isso é água natural, e como disse, ele só ficou sabendo disso faz pouco tempo. Não tem como ele ter envenenado a fonte nesse pouco tempo, e como bebi com minhas mãos, o risco caí para quase zero. 

Ao andar por mais cinco minutos, eles se depararam com três construções e uma grande cachoeira que caía em uma enorme piscina que parecia até um lago. A expressão dos dois mudou, a postura se tornou mais tensa e seus olhos, mais atentos. 

— Vou na direita — disse o soldado. 

— Então vou no meio. 

Sota começou a suar ao ouvir os passos dos dois e a morder seu lábio, quando um deles começou a soar mais próximo. Ele estava escondido em cima de um armário do depósito, um lugar que, com sorte, o daria alguns segundos antes que, quem quer que fosse, entrasse e o descobrisse. O tempo para ele pular e matar quem entrasse. 

Para piorar, ele ainda sentia fortemente os efeitos do processo de transformação que o Will havia feito, mesmo após uma hora. Sua carne o consumia de dentro para fora, todos seus músculos se rompiam e se reconstruíam infinitas vezes, seus ossos eram estilhaçados até se tornarem pó para então renascerem e sua pele se rasgava para adaptar a tudo isso. 

A porta se abriu, o intruso deu dois passos, olhou para as estantes e ao virar para cima, viu um rastro de cor ir em sua direção. A próxima coisa que sentiu, foi seu pescoço ser apertado, ele queria gritar, mas não conseguia, tudo que restou foi contemplar sua lenta e dolorosa morte, enquanto implorava por sua vida em seu olhar. 

Sota viu seu olhar de desespero, então decidiu o poupar.  

“Ele não tem nada a ver com isso.”, pensou. 

— Saia e diga que não encontrou nada — disse Sota. 

Ele o soltou e o soldado caiu ofegante, permanecendo nesse estado por algum tempo. Sota o observou e sentiu mais arrependimento. 

— Me desculpe por... 

Uma bala atravessou seu peito antes de terminar sua frase. 

— Aqui! Socorro! Ele está aqui! — Assim o soldado retribuiu a gentileza. 



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