Ronan Brasileira

Autor(a): Raphael Fiamoncini


Volume 1

Capítulo 70: Presentes e Problemas (2)

Horas depois, Dario, Anna e Nathalia estavam sentados no gramado do Centro de Práticas Arcanas, testemunhando em primeira mão o sofrimento do colega.

— Você consegue, só precisa se concentrar mais.

— Eu estou te falando professor, eu não consigo, eu não entendo. Eu já li o livro de cabo a rabo, pratiquei em casa, pesquisei na biblioteca, mas não consigo manifestar essa porcaria de energia pura.

— Você também teve dificuldades com a manipulação do vento, não é verdade? — perguntou o professor.

— Sim, mas isso é diferente. Já faz mais de um mês… que eu estudo e pratico todos os dias, mas de alguma forma… — sua face contraiu numa expressão feroz —… de alguma forma eu não consigo — grunhiu irado.

Com as pupilas dilatadas o rapaz contemplou os demais colegas. Cada um tinha as mãos envoltas numa discreta aura azul que dançava conforme o ritmo ditado pela canalização. Até Jonas, o menos empenhado da turma inteira já se divertia com o brilho irradiado por suas mãos. Ronan então olhou para as suas, idealizou-as irradiando como as de todos os colegas, mas tudo o que via era a cor da sua pele, numa tonalidade pálida, sem graça alguma.

Tudo isso em vão? Todo o tempo perdido estudando e praticando para nada?

Anna engatinhou para perto de Ronan.

— Eu posso te ajudar. Podemos parar com a minha pesquisa por um tempo. É o Mínimo que posso fazer depois de toda ajuda que você me deu até hoje.

Ele levou a mão aos olhos, secou alguns princípios de lágrimas e agradeceu a oferta:

— Obrigado — sua voz saiu um pouco tremida.

O professor entusiasmou-se com a demonstração de solidariedade.

— É isso que eu gosto de ver, amigos se ajudando em momentos de necessidade e retribuindo o espírito de seguir em frente.

Enquanto Anna ajudava Ronan com seu problema, Nathalia Aproximou-se de Dario e puxou a manga do casaco dele.

— Vem comigo, precisamos conversar. — Ela levantou e o arrastou para um canto.

Após chegarem a um espaço onde ninguém poderia ouvi-los, Dario a questionou:

— E agora?

— Você já sabia que ele tinha dificuldades, não é mesmo?

Notou que ela não estava para brincadeiras.

— Fiquei sabendo faz uma semana.

— Mas você fez alguma coisa para ajudá-lo desde então?

Ele amaldiçoou em sua cabeça aquela pergunta e respondeu pausadamente com um sorriso falso:

— Eu, não sou bom, com esse tipo de coisa.

— É a sua cara mesmo, mas ajude-o como puder. Não suporto ver o coitado sofrendo. Ainda mais após a derrota no torneio.

Dario irritou-a quando irrompeu em risadas.

— Você esta rindo do que?

— É muito esquisito te ver tão preocupada com ele. Não faz seis meses que você queria ferrar com nós dois. Achei essa ironia engraçada, foi só isso. — A gola do seu casaco foi puxada contra ela.

— Eu estou falando sério. Deixa essa infantilidade de lado uma vez na vida e faça um favor a esse coitado. Seja útil, nem que for só uma vez.

A feição bem humorada no rosto dele sumiu para uma seriedade destoante toar seu lugar.

— Desde quando você se importa com nós dois mais do que a sua amiga? — disse apontando para Karen, ela treinava sozinha ali perto. — Eu já entendi o que você quis dizer, não precisa continuar me ameaçando. — Desvencilhou-se da mão que o segurava pela gola. — Se não gosta de como eu lido com problemas, eu não posso fazer nada. E me perdoe se eu não sou tão arrogante quanto você é com os outros. — Então deu as costas a ela, mas pouco antes de dar o primeiro passo, olhou por detrás do ombro.

— Você está melhorando — suspirou. — Continue se esforçando. — E voltou para o espaço onde Ronan continuava treinando sob a supervisão de Anna.

De pé, mas agora sozinha, Nathalia suspirou, fechou os olhos e sussurrou ao vento:

— Francamente.

A espada permanecia na bainha, repousando na mesa onde o ferreiro guardava suas inúmeras ferramentas. Ian tirou-a de lá e a desembainhou com um sorriso no rosto.

— Eu não acredito…

— Não vai dizer que ela é falsificada — Ronan resmungou num bocejo.

— Pelo contrario, fui eu que a forjei.

— Impossível. Ela foi presenteada ao vencedor do torneio.

Em vez de falar o ferreiro mostrou o detalhe talhado na guarda do florete. Os olhos de Ronan se arregalaram ao ver as iniciais: “I.S.” dentro da proteção da guarda.

Ian relembrou com saudosismo:

— Eu lembro bem daquele dia. Foi a minha primeira encomenda de grande valor. Talvez porque que meus últimos trabalhos chamaram a atenção das pessoas certas. — Ian alargou o sorriso. — E tudo graças ao seu livrinho abençoado.

Ronan não sorriu, pelo contrário.

— Queria eu estar deslanchando na minha carreira.

— O que aconteceu? Transformasse algum professor em sapo?

— Não!

— Transformasse alguém em sapo?

— Também não.

— Transformasse alguém em alguma outra coisa?

Ronan sacudiu a cabeça.

— Dei de cara no muro. Não consigo manipular a energia arcana nem ferrando.

Tais conceitos confundiram a cabeça do ferreiro.

— Mas você já não consegue fazer feitiçaria?

Aquele termo arrancou algumas risadas de Ronan.

— Eu consigo manipular o vento. Mas agora estamos aprendendo a manifestar a energia em seu estado puro.

— Estado puro? — Ian coçou o queixo.

— Esquece! Vai por mim, a ignorância é uma benção.

— Desculpe, mas devo discordar. Se não fosse por você eu estaria me matando em forjar besteiras a um preço meramente simbólico. E olha só. — Ele estendeu os braços para demonstrar seu ambiente de trabalho renovado. — Agora eu posso fazer pausas quando eu bem quiser. Até nunca mais longas e malditas jornadas sem descanso. — Então encarou o amigo com seriedade. — Me prometa que não irá desistir.

— Tá bom pai, eu prometo — pigarreou. — Mudando de assunto. Eles vieram a você pedindo por uma espada, assim, sem mais nem menos?

— Bem — Ian começou coçando a nuca. — Não foi bem assim. Na verdade foi aberta uma competição aqui no bairro para ver quem forjava a arma mais elegante e eficiente ao mesmo tempo.

— E você ganhou?

— Não exatamente. Eu terminei em segundo. O primeiro lugar ganhou o prêmio em dinheiro. Era uma maça de uma mão. Ela foi entregue a um aristocrata que eu desconheço. Mas pensando bem, foi até melhor eu não ter ganhado. Ver minha criação em suas mãos é… como eu posso dizer… gratificante.

— Então como ela terminou como o prêmio do torneio?

— Veio aqui um tal de Rafael. Ele já parecia saber sobre o florete que eu inscrevi na competição, então me ofereceu mil moedas de ouro por ele, não tive como recusar né.

— Mil moedas? — disse Ronan erguendo a voz. — Uau, incrível…

Entusiasmado pelo sucesso do amigo de infância, Ronan prometeu seguir o exemplo dele, e não desistir por pior que tudo pareça.

 



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