Volume 1
Capítulo 66: Duelos (2)
Após a derrota de Dario, o organizador aproveitou o intervalo para listar a ordens das lutas à plateia. Demorou, mas o nome de Ronan foi mencionado após dezenas de outros. Fora os dois malucos, ninguém mais da turma A-102 tinha se voluntariado para a competição.
Anna e Nathalia observaram as próximas lutas com relativo desinteresse. As duas discutiram por um instante e chegaram à conclusão de que a falta de um colega bobalhão na arena talvez fosse o motivo de tudo parecer tão monótono.
Com a lista em mãos, o organizador chamou os próximo competidores.
— Atenção pessoal, este será o penúltimo embate da primeira rodada. De um lado temos Loretto Virago do quarto semestre contra Ronan Briggs, do segundo.
Dezenas, quase uma centena de alunos se levantaram, gritaram ou aplaudiram seus colegas. Quando os dois adentraram na arena, o escândalo foi ainda maior, pois Anna e Nathalia se juntaram a multidão para participar da brincadeira.
— Nossa última esperança — disse uma Anna desanimada.
— Você realmente acredita que os dois bobões tinham alguma chance de vencer?
— O Dario não, mas o Ronan… — ela lembrou-se do dia que o encontrou com aqueles rapazes após terminarem de estudar. —… talvez ele possa ir mais longe.
— Quem está dizendo isso? Sua mente ou seu coração? — Nathalia sorriu.
— Ambos.
Sua amiga sacudiu a cabeça em dois gracejos.
— Se você diz… quem sou eu para contradizer.
Os duelistas estavam a postos, o organizador deu o sinal e a disputa começou.
Mas após uma breve troca de golpes, terminou.
— Não levante tanto o braço quando foi cortar pela diagonal, você deixou a guarda baixa — disse Ronan agachado com a ponta da espada raspando na barriga do oponente.
— Tá bom! — respondeu Loretto Virago. A tristeza em sua voz era de partir o coração.
No alto da arquibancada, as duas permaneciam boquiabertas.
— Que foi isso? — perguntou Nathalia.
— Não entendi foi nada.
— Você sabia que ele era… assim?
— Eu sabia que ele participava do Clube de Esgrima em segredo.
— Talvez ele não seja tão bobão e inofensivo quanto pareça.
— Talvez não…
Nathalia se aproximou de Anna, tomou-a em seus braços e com os lábios próximos do ouvido da amiga, sussurrou:
— Vai dar os parabéns pra ele depois?
— Para com isso! — Anna desvencilhou-se das garras dela. — Você tá insuportável hoje, Nat!
— É o amor que te deixa assim Anna.
— Estou falando sério, para com isso!
Aquele tom de voz a assustou.
— Tá bom, tá bom, parei, eu juro.
As duas voltaram a assistir as próximas disputas. A segunda rodada foi anunciada pelo organizador. Os duelistas remanescentes lutaram com vigor, precisão e habilidade.
Era como se todos os amadores fossem desqualificados na rodada anterior. A terceira luta foi anunciada.
Distraídas há algum tempo, Anna e Nathalia brincavam com seus cabelos enquanto os combatentes se digladiavam lá embaixo. A garota de cabelo dourado sentiu uma cutucada em seu ombro. Ela virou-se e viu a sua amiga apontando para arena.
— Olha isso Nat — ela disse com entusiasmo.
Obedecendo a amiga, Nathalia virou-se para contemplar aquele espetáculo. Os duelistas atacavam, esquivavam e aparavam com uma precisão cirúrgica. Moviam-se numa sincronia assustadora. O mais alto deles avançou e o de cabelo escuro bloqueou o corte vertical levantando sua arma.
Os polos se inverteram. O atacante recuou e o defensor avançou com uma estocada, mas o oponente esquivou. A dança mortal persistiu por minutos a fio. O silêncio era assustador, Anna correu o olhar para as outras três arquibancadas que fechavam a arena. Tudo que contemplou foram espectadores hipnotizados com a luta lá embaixo.
— Quem é aquele altão? — Nathalia sussurrou.
— Não sei amiga.
Ouvindo a única conversa ao redor, um dos espectadores se adiantou.
— Aquele lá. — Ele apontou para o duelista que Nathalia se referia. — É o campeão do ano passado, Lorde Reiner, do oitavo semestre.
— Lorde? — assustou-se Anna.
— Isso mesmo. É nosso amigo, ou melhor, colega de classe.
As duas se entreolharam admiradas, mas foi Nathalia quem disse:
— O Ronan está lutando contra um Lorde?
Lá embaixo na arena, o suor contornava as feições dos combatentes. Ronan sentiu a espada pesar uma tonelada. O ritmo da luta havia desacelerado. Cada golpe era telegrafado, fácil de esquivar, mas quase impossível de contra-atacar.
Ronan analisou a estocada vindo em sua direção e esquivou a tempo, mas o corte que desferiu não foi rápido o bastante, deixando espaço de sobra para Reiner esquivar em um salto lateral.
Ambos ofegavam de boca aberta. O ar quente era jogado para fora em respirações pesadas. Ronan caminhou para a direita. Reiner o acompanhou.
Os dois circularam a arena na direção horaria, mantendo uma distância de poucos metros um do outro. Eles pararam, estudaram o outro e se encararam. Um sorriso se desenhou na face de Reiner, que avançou com um feroz ataque segurando a espada apenas na mão direita.
Ronan aguardou o avanço e calculou as possibilidades nos segundos que tinha para reagir. Então levantou sua arma para aparar o golpe que previra. Após a lâmina passar na frente dos seus olhos, uma ardência incapacitou sua visão.
A espada caiu, suas mãos foram aos olhos e uma cutucada na cabeça foi sentida em meio às lágrimas da agonia. O silêncio foi rompido pelo clamor confuso da plateia.
Os colegas e amigos de Reiner se levantaram e vociferavam sua satisfação para que todos pudessem ouvir. Lá de cima, Anna e Nathalia contemplavam o amigo ajoelhado no chão, coçando os olhos nervosamente.
— O que aconteceu? — Anna perguntou.
— Não sei… Eu também não entendi nada. Ele ia se defender, mas ai. — Sua entonação mudou para um tom intrigado. — Ai algo entrou no olho?
— É o que parece.
Lá embaixo, Reiner aproximou-se de Ronan e o ajudou a se levantar. O organizador se intrometeu, trocou algumas palavras com os dois, e anunciou:
— Não se preocupem pessoal, nosso bravo combatente passa bem, parece que algo entrou em seu olho durante a batalha. É uma pena, mas infelizmente a regra é clara… Reiner avançara para a próxima rodada.
Anna levou suas mãos ao rosto e gritou um lamento abafado com toda força. Atenta ao desespero alheio, Nathalia se aproximou dela e a envolveu em seus braços, para consolá-la.