Reino da Verdade Brasileira

Autor(a): Lucas Baldi


Volume 3

Capítulo 69: Montanhas nevadas, parte 5




Estar parado no meio de tudo elevou o tamanho do meu medo e da escuridão presente, passei minutos tentando raciocinar o que aconteceu; quem era eu ali. Spectro saiu da minha aura, seu olhar perplexo. Trocamos olhares vazios. De certa forma, eu me sentia assim. 

 

— Lotier não chegará a tempo… — sussurrei e peguei a Petrom em meu bolso. — É hora de chamar o rei — Deixei o item mágico tocar o chão. 

 

O verde escuro da Petrom se tornou claro e reluzente, iluminando boa parte do lugar. Poucos segundos se passaram e eu já me senti suar, pois nada havia acontecido. Lotier dissera que era preciso mudar de cor para confirmar o recebimento da mensagem, então eu aguardei. Minutos se passaram e o brilho continuara o mesmo, minhas mãos já formigavam. Até que a Petrom começou a escurecer, recebendo uma tonalidade azul cobalto. 

 

Ele havia recebido a mensagem, e senti o medo em minhas costas sumir.

 

Ativei o Olhar da Aura e varri o lugar. Não havia uma alma viva aqui. Seja lá o que atacou a Fortaleza, já não estava presente. E infelizmente descartei a chance de alguém ter sobrevivido. Quando dei um passo, no entanto, a insegurança nasceu. Os monstros de gelo se camuflaram na neve. E se houvesse outro monstro escondido no lugar? Engoli seco e apertei o passo para o primeiro corredor da Fortaleza. A iluminação era fraca, os mínimos brilhos de mana das paredes rachadas não iluminavam nem um quarto do lugar. o chão repleto de buracos só atrapalhou.

 

— O que você vai fazer? — A voz de Spectro ecoou pelo corredor escuro, uma tristeza nela.

 

—  Vou pegar o que sobrou de remédios e suprimentos aqui e ir buscá-los — Um peso em meu olhar. — Depois irei trazê-los até aqui. Nem que eu precise carregar os quatro. 

 

Dei os primeiros passos no corredor. Havia vários utensílios espalhados, como escova de dente, relógios, facas e adagas, mochilas rasgadas e… Pegadas grandes de um monstro. As pegadas seguiam até onde as fracas luzes me permitiam ver, e um arrepio surgiu em todo o meu corpo. O Olhar da Aura não me mostrava nada, mas eu não confiava mais nele. A relíquia fora disputada pelos Ritualistas, então eles teriam enviado essa coisa para cá? O quão cruel esse líder desgraçado era? Sendo acompanhado apenas por Spectro e o som dos nossos próprios passos no chão irregular, fiquei de frente para a primeira sala que achei com o coração na mão. Um corte perfeito na diagonal levara a parte de baixo da porta. Me esgueirei por baixo, me deparando com uma sala que tinha apenas uma mini bola de mana branca iluminando. Escura, bagunçada, silenciosa. Até o meu respirar parecia alto naquele momento. 

 

Peguei a pequena esfera de mana e deixei em minha palma, minha única visão nesse breu. A mesa estava repleta de papéis, canetas e destroços do teto. Olhar para cima, no entanto, me mostrava apenas um breu sem igual. Eu não sabia a exata altura, mas fiquei desconfortável por não ver o quão destruído estava. Na parede de frente para a porta, estava uma estante de livros. Metade dela, ao menos. Nada que me mostrasse o mapa do lugar, ou referente a remédios e-

 

Um vulto cruzou minha visão do teto ao chão, e um baque veio em seguida.

 

Eu paralisei e, tremendo, olhei para o que caiu. Era o corpo de uma pessoa, e ela tinha uma mordida nas costelas e morrera com medo no olhar. Usufruindo da última gota da lanterna improvisada, lancei-a para cima. Uma espada cravada no teto com sangue. Não queria mais ficar aqui.

 

Continuamos a procura de sala em sala. Durante o percurso pela Fortaleza, tinha, de vez em quando, outros corpos no chão, mantendo o padrão de ao menos uma mordida no corpo ou morrer cravado com alguma arma na parede ou no teto. Esse lugar certamente me traria lembranças horríveis em um futuro próximo, pois se eu não tivesse vomitado tudo que precisava, cada corpo morto de forma brutal seria um problema. Quase todas as salas estavam bagunçadas e tinham pouca iluminação, mesmo com a velocidade em que as revistamos era inútil. Xingando e chutando qualquer coisa que visse pela frente, derrubei a porta da última sala do corredor em que estávamos. 

 

A partir daqui, o chão estava completamente desnivelado, sendo até mesmo difícil enxergar o que tinha do outro lado. Olhando para trás, vi a pequena luz da sala que me traumatizou, a qual eu logo teria que enfrentar de novo. Passei pelo caminho horrível, e a situação parecia piorar. Agora havia buracos grandes nas paredes, cortes em todos os lugares, corpos preenchendo o chão de vermelho. Parte do teto também tinha caído, mas o pior era o grande vão preto em nossa frente.

 

Que levava para baixo.

 

Era um enorme buraco negro no chão onde devia ser a interseção entre os corredores da Fortaleza. Nada além de escuro, e nenhum vestígio de mana. O teto ainda estava inteiro e aqui era distante de qualquer janela para o frio. Lancei uma das bolas de mana que peguei. Tinha um morrinho de terra que levava até o chão, mas eu teria que pular. Respirei fundo e me joguei no escuro, passando pela barreira de mana, até que meus pés tocaram na terra e eu deslizei rumo ao chão. 

 

De repente eu não me senti mais sozinho ao olhar o imenso escuro daqui.

 

Meu coração bateu forte, meus pelos eriçaram. Joguei uma bola de fogo no lugar. Eu estava sozinho. O sono devia estar me atrapalhando, ou a fome. A sala era vazia ao todo, tendo apenas uma coisa no meio. Era como uma meia coluna de pedra escura que emitia magia com restos do que já fora um quadrado de vidro no topo. Onde a relíquia devia estar. Então eu passei a enxergar os vestígios de mana sombria aqui, o que me fez pensar que eu realmente podia não estar sozinho. Os corpos de soldados aqui estavam próximos as paredes, suas próprias armas os prendiam. Além de a possível criatura ter passado da barreira específica que protegia só aqui. 

 

E se não fosse um monstro que atacou?

 

As duas passagens existentes aqui em baixo foram preenchidas com pedra e terra até o topo. Chamei Spectro. Alguns instantes se passaram para que ele jogasse uma corda. Com dificuldade de segurar na corda, eu consegui subir. 

 

— Achei algumas ataduras e roupas quentes em uma sala próxima. Podemos contornar essa cratera se usarmos o caminho feito pelas paredes.

 

— Isso é ótimo — Uma pequena ponta de esperança. 

 

— A relíquia foi levada? — Seu olhar cansado. — Um objeto de tal poder com eles?

 

— Sim, é o provável. Mas depois pensamos nisso.

 

Mantivemos a procura por pouco mais de meia hora. Um lugar grande desse era assustador por estar vazio e em silêncio, além de escuros. Raramente víamos um corpo que fora morto em pé, com a arma atravessada no corpo e cravada no chão. Esses, em específico, faziam-me tremer. Apesar de não terem aura, a energia do ambiente era pesada, e eu nunca sabia se estavam ou não realmente mortos. Acreditei que a adrenalina constante era o que me mantinha de pé. Os remédios, roupas quentes, duas poções de cura e ataduras que encontramos eram suficientes. Bastou ajeitar em uma bolsa improvisada. Aproveitei para usar uma das roupas de frio e partes de armadura de metal. Eu podia salvar o grupo.

 

Um sentimento de euforia chegou. Eu iria salvá-los, e isso não parecia real. Cheguei a me beliscar para tentar acreditar. Com a chegada de Lot aqui, todos voltaríamos bem.

 

Por favor, aguentem só mais um pouco.

 

Tínhamos descido cerca de três andares, então voamos em direção a sala principal. Manter a velocidade atual — que já não era grande coisa — era difícil na subida. Desviar de corpos e pedras, além de armas e meias paredes, apenas atrapalhou. Até que finalmente alcançamos o grande corredor que levava a saída. Quanto mais corríamos mais parecia não ter fim, aquela luz nunca chegava. Rezei para que eu estivesse realmente acordado e freei bruscamente, apoiando na parede para recuperar o fôlego. Spectro me esperou, e eu xinguei por parecer tão longe. 

 

Chegar a grande sala trouxe de volta o ar frio, pois uma grande nevasca havia chegado, entrando aos poucos pelo grande portão duplo entreaberto. Quando andei em direção a ela, eu me senti desconfortável. A dúvida alcançou meu rosto quando senti meu coração acelerar sem entender o porquê. Supus que ia desmaiar, mas quando olhei a saída um imenso medo me cercou. Eu consigo. Respirei fundo, mas quando dei um passo…

 

Meu coração bateu forte, e o mundo pareceu parar. Uma grande tensão tomou conta do ar a ponto de eu não conseguir respirar. Spectro também fora paralisado pela pressão, e um passo, que tremeu tudo aqui, surgiu no exterior.

 

Por que meu corpo não se mexe? Que porra de aura era essa? Caralho!

 

Outro passo, pedras caíram do teto. A pressão maligna estava cada vez mais presente no ar.

 

Garras grandes apareceram na brecha da porta, rasgando a parte de metal como se não fosse nada. Passo, o vento frio entrou. Metade de um corpo branco humanoide apareceu, logo o outro braço longo com garras agarrou o outro lado da porta. A barreira começou a reagir, tentava repelir o corpo branco, sugar sua energia, mas era em vão. E minhas pernas não paravam de tremer.

 

Meus olhos se arregalaram quando o ser inteiro apareceu. Mais de três metros de altura, um enorme olho vermelho. A pele branca acinzentada cheia de cicatrizes, garras recheadas de sangue e dentes afiados que ainda carregavam um braço humano. Um braço familiar para mim. Não, por favor, não. Meus dentes cerrados, os lábios curvados para baixo. Esse medo me impedia de realizar qualquer movimento. Por que isso estava acontecendo? Por que eu tinha que sofrer tanto? Minha mandíbula já estava doendo, eu estava sentindo meu rosto roxo por estar sem ar, enquanto Spectro tremia constantemente. Os corpos no chão, já mortos, fizeram expressões de medo, tiveram espasmos para tentar se afastar do que chegara. Abri a boca para falar, mas nada saiu.

 

Lentamente virei meu pescoço na direção do monstro outra vez, encarando seu olho escarlate. O Laiky deu dois passos para dentro da sala, trazendo um tremor para o lugar, sua energia pesada aqui. O efeito da barreira mágica fora destruído, e ele estava simplesmente a cinco passos de me matar. Os segundos seguintes pareceram horas, enquanto apenas nos encaramos. A criatura perigosa até para um cavaleiro real estava aqui comigo, eu não tinha nenhuma chance de sair vivo! 

 

Porra, porra, porra!

 

Com os braços tremendo, apontei a espada de Lotier para ele. O medo extremo ainda estava no meu coração, e em nenhum momento consegui deixar de arregalar os olhos. Meu corpo sabia do perigo, eu sentia a todo custo que ele queria fugir. Mas eu já não conseguia mais tirar os olhos da criatura que deixou o Cirlan em coma. Cadê a determinação de vingar meu líder? Era impossível, aquilo não podia morrer.

 

— Você ousa me desafiar? — Sua voz pesada, grossa, maligna.

 

Sua pressão esmagadora veio como uma imensa onda do mar, esmagando as paredes, afastando os corpos, amassando meu corpo contra o chão. Minha pressão de aura desapareceu antes mesmo de surgir, e nada nesse mundo conseguiria me levantar daqui. Era como se a gravidade tivesse sido aumentada muitas vezes, pois apenas ser esmagado no chão doía mais e mais. Com o rosto virado, vi o Laiky me encarar, mas nem meu dedo mindinho se movia. 

 

Até que a pressão parou, e eu fiquei ofegante. Gotas de suor caíam do meu rosto enquanto eu me levantava. Sem chance, sem chance! 

 

Apenas rezei para que o grupo não viesse para cá, eles precisavam ter sentido isso e fugido para bem longe! Eu precisava sair daqui a todo custo.

 

Levei alguns instantes para ficar de pé e, após encarar a criatura por um segundo, gritei para Spectro correr. Disparamos para o corredor deixando tudo para trás. O local estava mais danificado do que antes, usei a habilidade de esquivar para impulsionar minha velocidade. Todo o medo e a pressão causada lá levaram meu cansaço embora, substituindo-o pela vontade de sobreviver. Corremos até perto do grande buraco onde guardavam a relíquia, e eu olhei de relance para trás.

 

E o Laiky estava parado ao meu lado, seu rosto a três centímetros do meu. 

 

Gritei enquanto caía de susto, o corredor era pequeno para ele. Pela pouca luz, percebi que o Laiky estava com o corpo contorcido, que se agarrou de alguma forma na parede. Ele girou seu pescoço em um ângulo impossível para um humano e aproximou suas presas de mim. Tentei me afastar, mas minhas costas encontraram uma parede. 

 

— Você sentirá o que os outros sentiram — Malícia em sua voz, e sua mandíbula começou a abrir.

 

Até sua boca ficar grande o suficiente para engolir um cavalo inteiro. Horrorizado com os inúmeros dentes que não eram visíveis antes, me joguei para o lado com um impulso de mana, e parte da parede foi devorada. Escombros caíram do teto, e eu atirei duas bolas de fogo na direção dele. A aura dele estava consideravelmente menor desde que ele entrou. A barreira foi efetiva, então? 

 

Voltei a correr com Spectro, contornando o grande buraco pelas brechas nas paredes. Quando me virei para trás, eu vi, nas poucas luzes, aquela boca imensa vindo nos pegar. Suas pernas e braços se contorceram para que ele corresse como um quadrúpede, e eu não pude impedir o horror de alcançar o meu rosto ao imaginar como todos aqui sofreram. Mas infelizmente ele era muito mais rápido do que nós e nos alcançou em segundos.

 

Puxei Spectro para a primeira sala que vi, o jogando no chão. Cerca de dois dentes rasgaram parte do meu braço enquanto eu caía, e eu grunhi com a dor. Spectro era afetado pelo medo, e parte de mim também tinha dificuldade para se controlar. 

 

— Ele está perdendo energia rápido, a barreira deve estar afetando ele — falei, nos afastando da porta cheia de fumaça. — Precisamos contornar e fugir.

 

— Não teremos chance no campo aberto — disse Spectro, seus olhos na porta. — Vamos para a sala da relíquia, a barreira de lá pode nos dar uma chance!

 

O Laiky ficou de pé. Só de vê-lo se agachar para entrar na sala o medo já retornou, mas eu respirei fundo ao sacar novamente minha arma. Ele tinha que estar mais fraco

 

— Você é esperto — Ele sorriu. — Estou apenas com uma pequena parcela do meu poder — Ele olhou para as próprias garras ensanguentadas. — Que tal irmos para uma árvore de pétalas rosas?

 

O que? Como ele sabia?

 

Antes de eu sequer pensar, senti seu punho afundar em meu estômago. Mesmo usando a espada para reduzir o impacto, eu voei até minhas costas atingirem uma parede. Era rápido demais para que eu pudesse ver. Quando pisei no chão, vomitei sangue, mas olhar para frente me trouxe um chute. Desta vez, eu derrubei a parede e rolei alguns metros. Minha consciência me abandonava, usei mana na cabeça para tentar me manter acordado. Vários hematomas e cortes novos no corpo. Levantei com pressa e o Laiky já estava na minha frente. Tentei bloquear com a espada, mas seu soco me lançou para outra parede. Fechei os olhos por apenas meio segundo e ele já estava em minha frente de novo.

 

O soco, desta vez, fez meus ossos estalarem e afundou minhas costas na pedra. Vomitei mais sangue do que podia, minhas costelas pareciam ter saído do lugar. Caí de joelhos tossindo e agoniado, puxar ar era difícil, resistindo ao máximo a escuridão que alcançava meus olhos. 

 

Mas ele já preparou outro soco.

 

Spectro pulou e deu um murro no queixo dele, mas não surtira efeito. Então o goblin o agarrou com tentou o morder, mas nem suas garras nem seus dentes perfuraram aquela pele. O Laiky pegou o corpo de Spectro, mas meu amigo desapareceu como fumaça. A confusão chegou tanto para mim quanto para os Laiky nos próximos segundos, até ouvimos Spectro o chamar.

 

— Ei, Laiky — disse meu amigo da porta, e, na minha visão, havia cinco Spectros. — Tente me pegar.

 

Os cinco sacaram uma espada. Eu estava desmaiando? Cinco? O primeiro goblin correu para o Laiky e foi recebido com um soco, mas desapareceu. Eram ilusões? Dos quatro que sobraram, dois contornaram o Laiky. O monstro branco disparou e agarrou o Spectro que estava na porta, mas ele também desapareceu. Até que ele me olhou, irritado, e um leve brilho chegou ao seu olho. Deixei meu queixo cair quando me toquei o que era.

 

Os três Spectro restantes ficaram na minha frente quando a criatura rugiu como um demônio, tremendo todo o lugar.

 

— Spectro, saí daí —Meu grito rouco. — Ele tem o Olhar da-

 

O Laiky pegou o Spectro verdadeiro e os outros desapareceram como mana. Com uma bocada, ele arrancou o braço do meu amigo e largou o corpo no chão. Spectro ao cair, gemendo de dor. Ele não ia regenerar pela minha falta de mana. Fiquei de pé, o sangue escorrendo quente por todo o meu rosto. Disparei uma bola de chamas contra o rosto dele, e uma fumaça surgiu. Quando ele ergueu o braço para me atacar, usei uma explosão de mana nos meus pés e disparei contra. Apoiei minha espada na parte de cima de seu braço e a usei para deslizar pelo corpo dele até o outro lado. Ela arranhava a pele do Laiky como ferro. Com as faíscas feitas, deixei o fogo percorrer a lâmina, e logo mirei em seu único olho. Ele contorceu seu pescoço para trás e eu passei direto, caindo bem na porta. Se eu fosse mais rápido, teria acertado! Spectro voltou a mim e eu corri como um condenado à morte.

 

Talvez eu realmente estivesse.

 

Lâminas de mana vermelhas voaram em todas as direções. Destruíram partes da parede, do teto e do chão, rasgando-os como se não fossem nada. Vários desses vestígios deste ataque me alcançaram. Não consegui evitar todos os cortes quentes e agonizantes, mas nenhum ponto fatal meu foi atingido. Só uma lâmina mágica foi mais veloz do que eu. Me joguei para o chão e parte da minha perna esquerda fora cortada. Antes de eu tocar o chão, no entanto, o Laiky apareceu ao meu lado com sua enorme boca de novo. Usei a espada de Lotier para impedi-lo de fechá-la e caí longe.

 

A energia dela me salvou.

 

A linda arma que interagia com magia foi destruída na boca do ser, e eu me vi em um beco sem saída. O Laiky uniu as mãos e uma espécie de chicote negro saiu do chão e se agarrou a minha perna direita. Não, merda. O mundo pareceu parar quando ele tentou abocanhar minha perna. Meu coração mais acelerado do que nunca, me preparei para a dor. Spectro saiu com um soco carregado de poder no seu único braço e acertou o rosto do Laiky, mas sua mão quebrou. O Laiky atingiu o Spectro com um soco, destruindo o escudo de metal que ele usava e lançou meu goblin para longe. 

 

A energia do Laiky estava menor!

 

Um soco na minha perna, meus ossos estalaram. Não pude resistir às lágrimas dessa vez, ao salivamento. Doeu demais. Outro soco em meu estômago e costelas, eu comecei a ficar desnorteado. Algumas costelas quebraram, eu tinha muitas dores internas e externas. Torcia para que nenhum órgão fosse me fazer ceder agora. Ele me socou outra vez, mas o escudo vermelho do bracelete se ativou. Meu braço foi quebrado por não aguentar a pressão, igual a quando Grannus quebrou ele destruindo meu escudo de madeira. Minha perna estalou de um jeito horrível quando me soltei dos tentáculos e voei até uma parada próxima. 

 

Batendo contra a parede, senti meus dentes moles. Eu estava zonzo, o mundo girava. Meu braço direito estava quebrado e minha perna direita deslocada. O lado esquerdo mal se aguentava de pé.

 

No chão, coberto de destroços e sangue, eu me vi. Me virei para cima e dei meu melhor para ficar ajoelhado, mas o Laiky fincou sua garra afiada no meu olho direito, rasgando-o, puxando para fora. Novamente eu me vi em desespero enquanto gritava e me debatia no chão. Meu olho estava sobre uma pedra, destroçado e amassado. A armadura não servira de nada, os ataques dele eram potentes demais. Levei alguns segundos para me esforçar ao máximo e ficar sobre uma perna, meu corpo rezando para cair. Minha sede de sangue veio novamente, surgiu pela raiva e pelas muitas dores, e o Laiky parou por um mísero momento.

 

Perto da morte, ele não parecia mais tão assustador.

 

Spectro veio gritando do teto. O que sobrou da espada em sua mão ardia em chamas vermelhas com traços azuis. O Laiky cobriu o braço com a mana vermelha e rebateu Spectro para longe. Enquanto o goblin destruiu várias paredes, a espada voava em minha direção. O único olho do Laiky a acompanhou, mas ele não conseguiu pegá-la. Então o mundo ficou lento de novo, e eu agarrei o pedaço de arma e gritei. O monstro se virou furiosamente para mim, suas garras cobertas de poder. 

 

Me lembrou um pouco quando tive a ajuda da Voz para vencer o goblin.

 

Nossos poderes colidiram, destruindo tudo aqui. Eu sabia que não podia vencê-lo, então direcionei parte das minhas explosões para baixo. Se eu conseguisse manipular o fogo com perfeição, completaria essa espada maravilhosa… Mas meu braço se quebrou e o resto da espada se partiu. Cortes me trouxeram dor, mas depois de tentar gritar eu apenas caí. Sem dor, sem som. Era como estar morto. Agora, não era uma sensação ruim…

 

Até que eu acordei próximo ao móvel em que a relíquia estava. Parte do chão do andar de cima desabou, havia fumaça para todo lado. Minha visão estava turva, meu corpo não conseguia mais se mover. O Laiky parou no andar de cima, a barreira não o deixava passar. Ainda bem. Eu só precisava aguentar aqui. Quase chorando de dor, apoiei minhas costas no encosto da madeira. 

 

Ia ficar tudo bem, eu só precisava suportar até o Lot-

 

O Laiky pulou aqui, e seu corpo foi coberto por uma estranha energia vermelha. 

 

E o medo de tudo voltou com força. Eu não conseguia mais fazer nada além de chorar.

 

Sua enorme boca quase me devorou por completo, mas meu corpo foi puxado por Spectro, que usou a boca para isso. Minha perna direita ficara presa nos dentes deles, enviando uma dor agoniante para mim. O corpo do Laiky estava sumindo, só precisava aguentar mais um pouco. O olhar de raiva dele veio acompanhado de puro poder sombrio quando ele arrancou minha perna fora. Os momentos seguintes ficaram estranhos na minha visão. Meu cérebro estava se desligando, estava difícil de entender. O Laiky se debatia e gritava de um jeito bizarro, mas o som estava cada vez mais distante para mim. Spectro mordeu parte da minha calça e tentou fazer uma atadura às pressas no membro perdido.

 

Meu corpo estava muito quente, e o Laiky se debateu como se quisesse tirar a energia do corpo. Bateu em paredes, no chão. Ele parecia desesperado. Seu olhar de sangue veio a mim, e seu corpo estava finalmente desaparecendo. A criatura correu em minha direção. Simplesmente não podia fazer nada. Respirar doía. Spectro entrou na frente e foi perfurado pelas garras, logo jogado de lado. Quando o Laiky foi me perfurar no peito, Spectro o segurou com a boca. Até que ele recuou e enfiou a garra no que restou da minha perna.

 

— Esse é o meu regalo para você, Kai — Sua voz parecia a de um demônio agora. A energia escura apareceu ao redor do que já fora minha perna e eu gritei. — Ela não vai salvar você dessa vez. 

 

Então, dando-me um sorriso que arrepiou cada pelo do meu corpo, ele desapareceu. A pressão sumiu, e eu consegui respirar apenas com dor. Demorou alguns minutos até tudo voltar ao normal, e Spectro apoiou minhas costas no encosto de novo. Apenas fechei os olhos e apoiei minha cabeça. Spectro continuou desesperado a parar o sangramento, mas eu disse:

 

— Spectro — Baixo, com dor. — Eu… não vou morrer aqui.

 

— Claro que você não vai, Lumi — Medo em seus olhos.

— Não- — Tossi sangue. — Não-não é isso… A árvore de pétalas rosas, eu vou morrer próximo a ela.

 

— Do que está falando? Economize suas palavras.

 

— A vidente me disse depois… depois que você morreu. Por favor, me estabilize e vá — pausei. — ajudar os outros. Traga-os para cá. Lotier está vindo.

 

Spectro começou a falar… e eu me vi incapaz de continuar consciente.





Música de encerramento



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