Rei dos Melhores Brasileira

Autor(a): Eme


Volume 1

Capítulo 34: ROUND 1

Gabrio esfregava os olhos, ainda caído entre os destroços, tentando entender o que estava acontecendo, a chuva caia forte sobre eles, como uma cachoeira. Bel estava cruzando as adagas na sua frente, olhando de um lado para o outro.

— O que foi isso?! — perguntou Gabrio, ainda desorientado.

Bel virou na sua direção, com o braço direito cortou o ar próximo do nariz dele. A lâmina da adaga ricocheteou algo. Analogamente, abaixou-se de súbito e, a centímetros de sua perna, rebateu o ar novamente.

A ruiva realizou o movimento repetidas vezes em torno de Gabrio, mas sua visão não conseguia identificar do que estava sendo protegido, apenas riscos do que seria uma descarga elétrica.

— Tem que sair daqui! — gritou Bel, ofegante, na sua direção.

— O que...

A ruiva o empurrou pelo ombro, jogando o novato no chão. Em seguida, defendeu com as adagas cruzadas o ataque da espada que descia em sua cabeça.

A arma era feita de raios, finalmente avistou quem a empunhava.

Os cabelos pretos e compridos do garoto que segurava a arma caiam sobre seus ombros, lábios e olhos pequenos o deixavam com características andróginas, algo incompatível com seu corpo de músculos definidos.

— Olá! Scarlet — disse ele, foçando a arma para baixo. — Há quanto tempo?

O jogador vestia uma camisa azul sem mangas, uma calça branca com vários rasgos na região das pernas e sua pele clara emitia pequenas centelhas de descargas elétricas.

Bel não respondeu, concentrava-se em prender a sua espada, sustentando com as adagas posicionadas como uma tesoura.

A ruiva dobrou levemente os joelhos e, com um impulso, os estendeu forçando a espada para trás. De imediato, seu oponente se desequilibrou, devido à intensidade do empurrão. Em cerca de meio segundo, Bel avançou com as adagas para perfurá-lo no peito.

O garoto utilizou a espada para bloquear uma das armas e movimentou seu corpo evitando que a outra cravasse em seu coração, porém, metade da lâmina entrou em seu ombro.

Gabrio se distanciava assustado, se arrastando de costas pelo chão, mais uma vez, seus olhos não conseguiam acompanhar os movimentos daquela batalha.

“Como eu posso te ajudar?”, pensou ele, em alguma possibilidade, mas seu bom senso exclamava que manter a distância era a melhor alternativa naquele momento.

— Libe... merda! — xingou Bel, puxando a adaga que estava cravada no ombro do oponente.

Uma espiral de correntes emergiu do chão os cercando. Com um salto, a ruiva pulou pisando sobre a cabeça do jogador, dando um giro de costas no ar.

As correntes enrolaram seu oponente cobrindo todo seu corpo.

Bel não conseguiria ativar sua explosão de energia e fugir daquilo ao mesmo tempo.

Rayo! — Uma voz feminina gritou furiosa. — Eu disse para esperar!

As correntes o arrastaram pelo chão para longe. Da direção que era puxado surgia a figura de duas pessoas caminhando lentamente, lá estava a responsável pelos berros e, do seu lado, um homem alto que segurava um largo guarda-chuva transparente protegendo-a da chuva.

A garota de cabelo castanho-claros e encaracolados segurava a ponta da corrente na mão direita, assim que ele chegou do seu lado, afrouxou-as e caíram no chão se desfazendo. Sua expressão era tranquila e exibia um sorriso meigo, possuía bochechas rosadas, lábios finos e olhos que exibiam um azul-celeste notável.

— Foi mal! Há muito tempo que espero por isso! Tinha que confirmar se ela ainda vale a pena! — Rayo levou a mão ao ombro ferido. — Tá meio fora de forma, mas... continua impressionante!

A menina era pequena, seu corpo magro e estatura lhe assemelhavam a uma criança, além disso, usava um vestido longo cheio de detalhes de renda e sapatilhas brancas que combinavam com as meias, as suas feições em conjunto com sua roupa a faziam parecer com uma clássica boneca de porcelana.

— Se me desobedecer de novo. — A voz dela saia com um timbre infantil. — Eu uso minhas correntes para arrancar sua cabeça.

Imediatamente, ele curvou-se de modo respeitoso e ficou parado ao seu lado.

Por sua vez, o jogador que segurava o guarda-chuva usava uma máscara branca que cobria todo o rosto, o desenho de olhos com as lágrimas escorrendo eram os únicos detalhes nela e o capuz da túnica preta que usava ocultava o restante do corpo, apenas as mãos pálidas ficavam de fora.

— Scarlet! — saudou a garota, acenando animada. — Então é mesmo você.

Bel permanecia com a adaga erguida, começava a caminhar lateralmente, na direção oposta à de Gabrio, não podia deixar que ela o notasse.

— Nossa! Sabe o trabalho que tivemos para encontrá-la? — Seguia a ruiva com os olhos, mas não demonstrava preocupação. — Podia ao menos me dá um abraço.

— Claro! Vem aqui, Halley! — Bel esboçou sorriso debochado — Faço questão de te abraçar com muito carinho... cadelinha! 

O jogador com a espada de raio fez menção de partir para atacá-la por aquelas palavras, mas cessou assim que a menina atuou o gesto com a mão para que ficasse em seu lugar.

— Rayo, quieto! Não caia na provocação! — advertiu, dando umas tapinhas nos seus braços. — Scarlet, xingar os outros é feio! Você continua mal-educada.

A ruiva ergueu o dedo do meio na sua direção arrancando um suspiro de desaprovação.

— Sempre foi assim — relatou exasperada. — Sua amiga veio pessoalmente te ver e como corresponde... a insultando?!

— Cala a boca! Fedelha irritante! — rebateu Bel.

Gabrio já estava cerca de trezentos metros das duas jogadoras que se encaravam trocando farpas.

— Não sei se você sabe, mas sou muito ocupada! — falava no tom choroso, enquanto limpava os olhos com as mãos —, depois de tanto tempo procurando você, sua chata!

“Talvez um ataque surpresa...” Gabrio percebeu que o foco deles caía inteiramente sobre sua parceira.

A garota embaixo do guarda-chuva alterava de humor de forma espontânea revelando sua felicidade ou tristeza no seu tom de voz, os dois do seu lado permaneciam em silêncio.

— Isso magoa... bem... que... a... sua... — murmurou Halley, coisas inaudíveis entre as palavras. — Cheguei até a pensar que Rose não queria nos contar como achá-la. Se bem que...

“Se criar uma abertura...” Gabrio avaliava suas possibilidades.

Halley parou pensativa colocando a mão no queixo.

— Verdade, não faz sentido, afinal vocês duas se odeiam — sorriu largamente e continuou. — De melhores amigas a rivais no amor! Que história lin... 

Bel lançou a adaga na direção dela interrompendo-a.

A garota permaneceu imóvel, algumas correntes saíram do chão interceptando a arma na metade do seu trajeto.

— Você late demais, cadelinha!

Bel fez o movimento para que a adaga retornasse.

— Volta para seu dono e me deixa em paz.

Novamente, a ruiva recolocou as adagas cruzadas na sua frente.

— Sabe... estávamos todo esse tempo procurando Hihi... aquela Rainha Demônio Hihi... — Halley enfatizou o título, entre risos. — Ah! Mas... graças a uma ajudinha...

Apontou para o mascarado ao seu lado. De imediato, o jogador enfiou as mãos na túnica escura, vasculhando os bolsos, em seguida, retirou algo e jogou na direção da ruiva.

Uma cabeça decepada.

Bel percebeu seu primeiro erro.

— Se não fosse por esse idiota! Ainda estaríamos perdidos — informou Halley, do seu jeito risonho. — Depois dos relatos dele... começamos a procurar a... Scarlet, a boa samaritana!

A cabeça desmembrada rolou pelo chão, parando próximo ao pé dela. Os olhos arregalados e a boca aberta do jogador careca, o mesmo do jogo na Time Square.

Gabrio também reconheceu aquele jogador, foi ele quem salvou o careca, que impediu sua morte na partida.

— Ouvimos cada absurdo! — relatou Rayo, cuspindo no chão. — Que usou sua ascensão para salvar jogadores... pra salvar?! Logo... você?! O que se tornou?! Hein?! Me diz?!

Shii... — Halley ergueu o dedo, exigindo silêncio.

Rayo travou o maxilar irritado, porém obedeceu à ordem.

Bel apertou forte as adagas, o silêncio da garota indicava o início da batalha.

“Preciso ajudar!”, concluiu Gabrio, percebendo o aumento da tensão. “Uma distração?! Isso! Posso fazer isso!”

Na sua condição de novato, sabia que nada do que fizesse machucaria aquelas figuras estranhas, os jogadores na sua frente exibiam uma imponência, mas se pudesse criar uma abertura para Bel seria o suficiente.

Gabrio teria que usar tudo que aprendeu com a ruiva. Rapidamente, juntou as palmas das mãos e as chamas azuis começaram a fluir por seu corpo.

— Dark! Não! — gritou Bel, mas já era tarde, ele atraiu a atenção da menina dos cabelos cacheados.

Bel avançou na sua direção, mas a espada de raios a bloqueou, obrigando-a se defender do ataque novamente. Ambos iniciaram uma disputa veloz de defesa e contra-ataque, exibindo suas perícias na esgrima.

O mascarado recolheu o guarda-chuva e afastou-se para o lado, esperando o comando.

“Talvez se fizer...” Gabrio não teve tempo de completar seu raciocínio.

A garota que o notou de longe, em um piscar de olhos, estava a um palmo de distância.

— Quem é você? — disse ela, ao chegar colocando a mão atrás do pescoço dele e o puxando para perto.

Gabrio demorou para entender a intenção do movimento dela. O puxão que levou na nuca o fez cair ajoelhado, não conseguiu mais recuar, seus lábios colaram nos dela.

O corpo de Gabrio estremeceu, um arrepio que sentiu até os ossos.

Clin!

O aplicativo bipou.

RESTRIÇÃO!!!

A habilidade Elo Inexorável...

 ...Negada!

Gabrio permaneceu de joelhos diante da garota, além de forçá-lo a se abaixar, ela precisou ficar na ponta dos pés para conseguir efetuar o beijo.

...Negada!

“Mas... que...  tá... acontecendo?!”, pensou Gabrio, tentando empurrá-la, mas foi como forçar uma parede sólida, não conseguiu se mover um centímetro.

...Negada!

O novato permaneceu ali, preso ao beijo até que ela decidiu soltá-lo.

— Hum... quem diria?! — falou Halley, com uma expressão de surpresa.

 Ao se libertar, Gabrio se jogou para trás, caindo no chão desajeitado.

— Você é interessante... — comunicou, com um sorriso alegre e levando os dedos aos lábios.

As correntes saíram do chão e lançaram Halley para o alto.

O movimento impediu o corte das armas de Bel, que surgiram acertando o local onde estava.

A ruiva disparou as adagas para acertá-la ainda em cima, porém o mascarado a salvou no momento exato, pegando Halley no colo antes que a atingissem, pousando alguns metros adiante.

— Liberar! — ordenou Bel.

A adaga soltou a energia em uma explosão cinzenta, gerando uma larga cortina de fumaça.

— Vamos! — gritou ela.

Bel o segurou pelas mãos e correu, dando as costas para seus oponentes.

De longe, Rayo levantava depois que a ruiva o derrubou, tendo perdido a disputa, preparou-se para acompanhá-la, em busca de outro round, mas foi impedido, as duas correntes prenderam sua perna o parando.

—  Halley, ela vai fugir! — protestou ele, esbravejante.

— Rayo, você é tão apressado — falou calmamente, enquanto era colocada de volta no chão pelo mascarado.

— Ah! Não! Vamos perdê-la! Droga! — gritou revoltado.

 — Não grite comigo! — Halley acertou com a mão na testa dele. — As coisas mudaram, ela sabe as consequências do que fiz — passou a língua entre os lábios —, parece que finalmente temos um refém para usar contra Scarlet Moon.

***

Gabrio corria pela floresta, arrastado pela ruiva, atravessando a mata fechada e úmida, em poucos segundos alcançaram a praia.

— Você é um idiota! — gritou Bel, parando de correr — Eu disse para sair de lá!

Ela levou as mãos ao joelho ofegante.

— Por que você não me escuta?!

— Eu queria te ajudar... — falou Gabrio, envergonhado. — Desculpa!

A ruiva abaixou a cabeça, sua expressão séria congelou.  

— Me ajudar?! — Bel foi na sua direção. — Um fraco como você... nem em sonhos!

Com força, colocou o dedo no peito dele.

— Você só me atrapalha! — vociferou ela. — A culpa disso é toda sua! Foi você que me obrigou a cometer erros!

— Eu... Eu... — Gabrio não conseguia compor uma frase para rebater aquelas palavras.

— Conseguiria vencer eles sozinha com as mãos amarradas. — Ela pressionou ainda mais o dedo sobre ele. — Mas tenho que perder meu tempo salvando sua pele.

— Foi você que me colocou nesse jogo idiota! — bramiu Gabrio, batendo na mão dela. — Você que é a culpada por eu estar aqui!

— Como é?! — Bel o empurrou pelo ombro. — Eu salvei você de uma morte medíocre! — O empurrou novamente. — Tirei você de um mundo sem emoção!

No terceiro empurrão, Gabrio caiu de costas na areia molhada.

— Eu não pedi nada disso! — berrou Gabrio, o mais alto que pode. — Você que é uma maluca se divertindo nesse mundo de psicopatas!

Bel cerrou os punhos e mordeu os lábios inferiores exibindo uma expressão de fúria.

— Pensei que era interessante pela forma que entrou no RDM — assumiu um tom frio —, que me ajudaria a acabar com o tédio desse jogo.

A ruiva o encarou de cima erguendo seu queixo.

— Estava errada! Não passa de um impostor, alguém que nunca deveria ter chegado aqui.

Gabrio não rebateu, apenas escutava com seus olhos pasmos.

— Dark, você morreu naquele trem — disse Bel, virando de costas para ele. — Suas ações até aqui são de um cadáver que não percebeu isso — Ela deu uma pausa e puxou forte o ar para prosseguir. — Não preciso de um covarde do meu lado!

Gabrio levantou-se com a amargura o preenchendo, o choro começava a surgir em seus olhos.

— Bel, eu...

— Vai embora! — gritou ela, não o deixando terminar. — Some da minha frente!

Gabrio deu um passo, estendendo a mão na direção das costas de Bel, mas desistiu do movimento, correu na direção contraria tirando seu celular do bolso, com cliques apressados acionou a pedra de transporte no aplicativo.

Deu mais alguns passos e parou, quando olhou para trás, a ruiva não estava mais lá.

Um flash o transportou.



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