Volume 1 – Arco 1
Capítulo 1: O nascimento da Pequena Princesa
O que será que acontece após a morte?
Talvez nunca saberemos, mas aquela maga… Ah! Aquela maga deveria ter a oportunidade de saber, quando a corda enrolada em seu pescoço finalmente levou sua vida, por longos oito minutos de agonia.
O mais aceitável seria que ela cometeu suicidio, mas como raios isso iria acontecer se ela foi dita como a responsável por trazer a vitória, ou trégua, da guerra que durava quase cinquenta anos.
Seu nascimento era dito como o que mudou o rumo da guerra, e agora seu corpo pendia ali, sem vida, roxo sem ar, não chegava a ser uma sombra daquilo que um dia foi, aquilo mal chegava a ser ela.
Mas voltemos à pergunta: O que será que acontece após a morte?
Para aquela maga foi um abrir de olhos:
—Ela acordou! —Ouviu uma voz gritar.
Aquela maga poderia ter muitas reações, mas a primeira foi… Chorar.
Não um choro comum, um choro carregado de incertezas, tal qual um choro de um bebê, por que… Ela era um bebê!
Pessoas seguravam seu corpinho diminuto, todas elas pareciam estar cheias de um alivio enorme, mas não conseguia entender por que, nem por que raios não parava de chorar a cada minuto:
— Minha rainha! É uma menina!
Aquilo fez todos da sala rirem em comemoração, enquanto aquela bebê era levada até uma mulher de pele tão alva quanto a neve, assim como seus cabelos, estava cansada, desgrenhada, suada, mas ria finalmente pegando sua pequena filha nos braços:
— Ela tem a pele do pai… — A mulher de cabelos brancos falou, tocando o rosto da criança chorona.
Ela era pequena de pele escura, mal tinha cabelo, cílios ou sobrancelhas, os poucos fiapos que tinham ali eram brancos, assim como os cabelos da mãe da bebê.
Mas pareciam todos extremamente alertas, ansiosos para algo, algo que o bebê sequer entendia, mas finalmente ela parou de chorar, mexendo os bracinhos e perninhas de forma desengonçada, mas era tão bonitinho por ser um bebê gordinho e recém nascido.
Então finalmente os olhos se abriram, e ali estava.
Dois olhos vermelhos cor de sangue, tão belos que pareciam quase hipnotizar todos que estavam ao redor, mas logo veio as exclamações de alegria:
— Ela tem olhos vermelhos! Vermelhos como o rei! — Comemoraram animados toda aquela equipe.
Parecia que aquilo era importante para eles, mas por que era? Era algo realmente importante, ao menos para eles.
Então finalmente as portas do quarto luxuoso se abriram, um homem grande, de pele negra e cabelos tão escuros quanto a noite entrou, seus olhos eram vermelhos como sangue. Vermelhos como os da bebê:
— Ela nasceu, senhor.
A bebê, que até agora estava com a expressão completamente confusa, arregalou os olhos finalmente, reconhecendo o rei do reino inimigo, do reino de Serphs, Ricardo…
Não sabia o que estava acontecendo, era algum tipo de castigo? Por que era um bebê, e estava ali no quarto daquele homem? Se ele estava ali, isso queria dizer que aquela mulher que estava com ela nos braços, cansada e ofegante… Era a mulher dele! Aquela era a rainha de Serphs!
Não lembrava o nome dela, de fato não lembrava, mas o pouco que sabia dela, era que era uma mulher doente que não parecia ter facilidade de conceber um herdeiro, tanto que o que soube era que o rei tomou duas consortes fora ela, para que conseguisse um herdeiro, afinal ele precisava de um herdeiro, e agora… Ela tinha nascido:
— Minha pequena princesa…
O homem grande lhe pegou, com todo carinho do mundo, mesmo sendo um homem grande, de guerra, ele nunca pareceu ter olhos tão amorosos como agora, e isso deixou o coração da maga reencarnada derretido:
— Já decidiu o nome dela?
— Sim eu… Eu gostaria de Eliassandra, era o nome da minha avó e eu sempre achei lindo.
— Oh, então é isso… Eliassandra, minha pequena princesa, minha joia bela.
Ele tinha um olhar tão amoroso, tão paternal, será que era paternal? Não sabia, nunca teve um pai e a melhor figura paterna que teve foi o general da sua brigada durante a guerra.
Ah… A guerra, perdeu sua juventude naquela guerra que ela nunca procurou, e no final, quando a paz finalmente foi alcançada ela só não pode desfrutar aquela paz por que simplesmente a mataram!
Não lembrava como foi morta. Mas lembrava da falta de ar, de seus pés fora do chão, talvez tenha sido pendurada, provavelmente para dizerem que ela se matou ao inves de assassinato, mas por que raios fizeram isso? Talvez nunca ficasse sabendo, agora estava em outro reino, não apenas reino, em outro continente, talvez nunca mais pisasse no continente que nasceu… Ou morreu, afinal agora era desse continente, do reino de Serphs.
De tudo que lembrava da guerra, do que fez na guerra, duvidava que seus pais sequer deixassem ela ter contato com o reino inimigo. E eles estavam certos.
Mas… Ainda não entendia bem o que aconteceu, morreu e agora estava ali… Era isso que tinha depois da morte? Uma nova vida? Ou talvez ela fosse obrigada a reencarnar até ser uma pessoa melhor e não ser condenada ao abismo?
Não tinha como saber de fato, afinal não lembrava daqueles momentos após morrer, se é que teve momentos após morrer, se veio direto para cá ou passou um tempo no abismo, se fosse assim… Merecia.
Sim, sabia que merecia, foi uma pessoa terrível enquanto estava na guerra, e até entre os grandes generais de guerra, ela era considerada uma pessoa cruel em batalha, um animal que só seguia ordens até matar todos que precisava.
Tinha completa noção disso, fez o que foi preciso para sobreviver, mas depois que sobreviveu a conta cobra.
Será que quem a matou era parente de alguém que lhe matou? Se fosse estava no direito, faria o mesmo se pudesse, mas não podia, afinal seu pai morreu antes mesmo de seu nascimento, sua mãe… Nem sabia quem era direito, afinal o vento a levou quando ainda era apenas uma menina pequena.
E agora estava ali, com uma suposta família feliz, ainda se perguntava como raios aquilo aconteceu, por que estava ali? Será que merecia aquela felicidade?
Uma família amorosa, uma vida boa, afinal agora seria princesa, vida de princesa não deveria ser ruim, definitivamente não deveria ser, mesmo com um reino maculado pela guerra, sua vida seria melhor que na guerra.
Qualquer coisa seria melhor que a guerra provavelmente:
— Ela vai ser uma linda princesa, imagina quando começar a receber convites e propostas de casamento. — Um dos criados ali falou.
O rei Ricardo olhou feio para o criado, franzindo as sobrancelhas e com a boca bem fechada numa linha, parece que ele seria o típico pai de menina.
A mãe, que finalmente lembrou o nome sendo esse Elengaria, riu pedindo sua pequena filha de volta.
Ela foi chamada de rainha estéril, em quase dez anos de casamento, não conseguiu conceber, logo o encanto pela sua aparência delicada se perdeu. Era uma mulher formosa, sofrendo de uma condição que tirava toda pigmentação, para ela, aquilo foi benção. Seus cabelos e pele eram brancos como a neve, os olhos rosados por ausência de pigmento, todos esperavam um lindo herdeiro por conta de sua aparência.
Mas esse não veio.
Não, não.
Nos primeiros dez anos de casamento, nunca conseguiu conceber, e quando engravidava o bebê parecia não ficar em sua barriga, Ricardo, mesmo apaixonado, foi pressionado a deixá-la, mas eles eram apaixonados. Ricardo casou com ela quando tinha apenas 16 anos, completamente apaixonado por sua personalidade.
Mas ela insistiu.
Por meio disso, Ricardo agora tinha mais duas consortes, e delas vieram seus filhos, um deles o futuro herdeiro.
Mas agora estava ali, com seu pequeno milagre nos braços, que lhe olhava com olhinhos tão curiosos:
— Meu pequeno milagre… — A rainha sorriu ternamente olhando sua pequena princesa.
Por tanto tempo quis seu próprio filho, quase dez anos e finalmente, após o fim da guerra, ela finalmente estava ali, uma criança bela e saudável, com olhos atentos e curiosos, ela era perfeita, era seu pequeno mundo ali, sendo segurado.
Mas para a maga que finalmente descobriu que seu nome seria Eliassandra, muito grande, diga-se de passagem, era tudo uma confusão sem precedentes, ainda queria entender se aquilo não era algum tipo de purgatório por todos seus crimes,ou realmente teve uma segunda chance? Mas se fosse a última, por que raios se lembrava de sua vida passada inteira?
Era tudo tão confuso, mas acima de tudo aquele carinho parental, ter pessoas perto de si que realmente pareciam querer ela por perto, quanto tempo não tinha essa proximidade? Ter afeto das pessoas e não seu temor ou raiva era completamente estranho para ela.
E por incrível que pareça… Ela gostou disso.
Realmente gostou de ser querida daquele jeito, tudo que não teve nos seus quase 20 anos de existência, e agora tinha em poucas horas de nascimento:
— Senhora, precisamos dar um banho nela, e pôr para dormir, e a senhora também precisa tomar banho.
— Eu entendo…
Mesmo a contragosto, a rainha entregou a pequena princesa, que por sua vez começou a reclamar… Eu acho, não dava para entender:
“Não! Me deixa com a minha nova mãe!” Os pequenos braços se moviam durante esse pensamento, tudo que escutaram foram barulhos de bebê e um quase choro.
Eliassandra, como foi assim batizada nessa nova nova vida, não queria ir para longe de sua nova mãe, nela confiava, mas não nos estranhos que apareceram ali, mesmo sendo servos, ainda tinha muita desconfiança que não conseguia abandonar, cresceu num ambiente hostil de guerra, e agora estava ali com amor e carinho, tudo era estranho para ela.
Não queria ir pra longe do único rosto que se afeiçoou nessas poucas horas de nascimento, não queria ir para longe!
Mas sua resposta como um pequeno bebe nada se valia ali, nem falar sabia, como poderia ser ouvida daquele modo? Quando percebeu isso quis cruzar os braços emburrada, mas isso também não foi possível, pois não tinha controle suficiente de seus membros:
“Cara… Ser bebê é um porre!”
Tentava reclamar, mas apenas barulhos que as outras pessoas achariam fofa, até sorriam com aquilo, como se fosse a coisa mais fofa do mundo, e talvez fosse mesmo fofo, mas para ela não! Aquilo era humilhante demais:
— E então? Acham que ela…?
— Já devemos agradecer por essa criança ter nascido, imagina, toda enrolada no cordão, nem respirava quando a tiramos.
Não? Seria aquilo que fez ela vir para esse corpo? Afinal sua morte também foi por conta de enforcamento, talvez os céus tenham se confundido e mandado a alma errada de volta à terra, e deveria ser aquela pobre criança que mal chegou a nascer e já tinha partido.
Aquilo a deixou triste, quer dizer que ela tirou a vida de mais uma pessoa para continuar viva? Isso era tão cruel, por que o mundo era cruel daquele modo? Mas agora… Estava ali, precisava ser a melhor filha para aquele casal tão sofrido que mal conhecia, mas especialmente a mãe já lhe despertava tantos sentimentos bons…
Queria preservar aquela felicidade deles, nunca iria contar quem era de verdade, não podia.
Não devia.
Tinha que proteger sua nova mãe, pois ela precisava de si.
Em meio aos seus pensamentos, mal percebeu quando lhe era dado banho, só quando a água caiu em seu rosto, lhe fazendo engasgar, tossindo e arrancando algumas expressões assustadas das servas:
— Cuidado! Quer que mais um bebê morra, é?
— Não, foi um acidente, ela está bem.
Logo Eliassandra foi vestida com uma roupinha mais confortável branca, mas ainda sim mostrava nobreza, aquele pijama de bebê era mais caro que qualquer roupa que usou na vida passada, e aquilo era mesmo de se invejar! Como poderiam ter tanto? E o pior, sabia que aquilo não era nem metade do que teria nessa nova vida.
Quando foi levada de volta para o quarto, foi colocada num berço grande, sua mãe já parecia dormir, embalada pelo sono que tinha, não sabia quantas horas ela passou em trabalho de parto, mas deveria estar exausta, ela merecia o descanso. Já tinha visto mulheres morrerem naquela situação.
Sua mãe era mesmo uma mulher forte, uma mulher que admiraria de agora em diante, afinal, quem mais poderia? Ela parecia ser um exemplo a ser seguido.
Depois iria querer saber mais sobre sua nova “eu” mas por hora estava descobrindo que nascer também era cansativo quando seus olhos aos poucos iam se fechando, e o sono ia chegando de mansinho, fazendo carinho no seu rosto até que ela fosse pega por ele.