Raifurori Brasileira

Autor(a): NekoYasha


Volume 1

Capítulo 20: Em Direção à Capital

— Depois de alguns meses, quando eu já tinha me habituado mais ou menos à vida na mansão Sophiette, nós recebemos um relatório que o irmão da Ruthy, o Raul, estava vivendo como um escravo em uma cidade vizinha. Imediatamente, a Lady Sophia invadiu as terras, sequestrou ele e libertou outras crianças no processo... daí o nobre começou a difamar o nome da Lady Sophia… Legalmente, as crianças eram empregados, mas aquele porco adorava torturar elas… Não sei como, mas o bastardo conseguiu convencer todos que a Lady Sophia era uma tarada que sequestrava crianças para torturar elas...

Kurone ouvia atentamente a longa história contada pela empregada. 

O local era a carruagem que vieram até Fallen. Naquele momento, o grupo teve que dar prioridade a entregar os mantimentos na vila. Essa era a ordem de Sophia. A ordem da mestra, a qual considerava uma mãe, vinha acima de tudo. Noah era uma garota obediente que seguiria as ordens daquela que lhe salvou certa vez.

No caminho até a vila, a empregada contou a história de sua infância, de como conheceu e foi salva por Sophia.

Ao fim da história, Kurone lembrou-se da acusação de Edward, que apontou o fato dela ter sequestrado uma criança certa vez. Noah explicou que a criança sequestrada era o irmão de Ruthy, quem considerava uma irmã mais velha e que foi morta pela marquesa — esse último fato deixou Noah furiosa quando descobriu, mas isso é história para outra hora...

A acusação dessa vez também era sequestro, mas quem Sophia sequestrou e por que nem mesmo Noah sabia? Certamente, era alguém importante, já que, de acordo com Ana, aqueles que vieram buscar Sophia em Fallen eram guardas da capital, mandados apenas em casos especiais. 

— Devemos pedir ajuda ao Edward? 

— Não. A lady Sophia não gostaria da ajuda do Edward. 

— Nobres são complicados… 

Quem entrou na conversa no último momento foi a bruxa, Ana, quem contou detalhadamente como Sophia foi levada pelos guardas. 

— O julgamento de Sophia é daqui a três dias, até lá, ela ficará presa na capital. 

— Isso significa que após entregar os mantimentos temos que ir imediatamente até a capital… — Kurone completou. 

Sem Amélia, a velocidade de transporte diminuiu consideravelmente. De fato, era como ela mesma disse: "o que importa é o cocheiro".

A paisagem pacífica até a vila ia se repetindo pela janela, fazendo o jovem que observava ficar sonolento. Já era de praxe sentar ao lado da janela. Inicialmente, era para memorizar o percurso, mas naquele ponto, já havia se tornado um hobby. Ver a vegetação, pedras, animais — ou melhor, monstros — e as pessoas pelo caminho faziam o garoto se esquecer dos problemas.  

Os olhos se fecharam lentamente… quando percebeu, já estava no mundo dos sonhos...

Ao despertar, viu o cenário familiar. Estava na vila, de frente ao prédio com vidros quebrados: a guilda de aventureiros.

— Caraca! Já chegamos… 

Vários homens carregavam os sacos com grãos para guilda, uma mulher checava a qualidade do tecido e o médico atendia alguns doentes no fundo da carruagem. 

— Com a ajuda de todos vamos terminar de descarregar rápido… E então… 

"Vamos ajudar a Sophia?" Primeiramente, por que queria ajudá-la? 

A marquesa salvou a vila porque foi paga para o serviço. Mal conversou com ela, eram completos desconhecidos. Não tinha motivo algum para o jovem querer ajudar Sophia. O único motivo de ter ido à mansão Sophiette era para ajudar na compra de mantimentos… Não tinha qualquer relação com a mulher que agora estava atrás das grades.

— Parece pensativo. — Uma voz feminina tirou Kurone de outro dos seus momentos em que começava a pensar e se esquecia do resto do mundo. Esse foi o motivo de sua morte no Japão, enquanto pensava no futuro de suas irmãs.

Quem estava à frente era Brain, a empregada da mansão Soul Za que fazia todo o corpo do jovem tremer só de encarar aqueles olhos afiados.

Já fazia um dia que estava fora, mas não via sinal de que Rory e os demais retornaram da mansão com mantimentos.

— Já deve ter percebido… que o marquês não retornou…

Havia melancolia no tom de voz da empregada, sua expressão também não era das melhores. As olheiras que tentava esconder denunciavam que não dormiu na última noite.

— Brain… O que aconteceu…?

— Ehhh... Sinto muito te dizer isso de repente, mas a carruagem com o marquês e os demais foi atacada por um exército de orcs enquanto voltava para a mansão… aparentemente, alguém queria se livrar do marquês… Eles tentaram fugir mas…

Brain fez um breve silêncio antes de continuar. Considerando que Rory estava na carruagem, esperava algo como: "Rory matou todos os orcs sem esforço."

— A carruagem explodiu e todos dentro foram carbonizados.

O jovem ficou em choque com o fim inesperado.

Rory, a garotinha com um fuzil militar e status roubados, tecnicamente uma deusa, ela sozinha conseguiu eliminar uma quantidade absurda de orcs sem esforço.

— I-impossível…

— O marquês já suspeitava que alguém estava tentando matá-lo pelas sombras… mas nunca pensamos na possibilidade de uma explosão.

Edward, Rory, Amélia, Elsie…

Todos estavam mortos! Pessoas com quem lutou, sorriu e brincou até pouco tempo agora não existiam mais.

Mesmo perdendo essas pessoas, tudo que Kurone podia sentir agora era um… vazio imensurável. Era isso, certo?

Foram poucos dias, não foram? As relações não foram aprofundadas tanto... Sentia uma leve tristeza, mas isso não o fazia sentir vontade de chorar naquele momento, eles eram apenas pessoas randômicas desse mundo, certo?

Não houve qualquer desenvolvimento de personagem. Não teve a relação romântica que imaginava com a cocheira gentil, não foi tratado como um irmão mais velho por Rory, por que derramaria lágrimas por eles? Eram todos desconhecidos, certo?

Todos tinham uma personalidade própria… apenas Kurone, um jovem comum, não conseguiu se relacionar com eles...

Era tão fraco que não podia brincar enquanto lutava com Rory. Era tão idiota que não conseguia conversar com Amélia. Era tão vazio que acabou sendo esquecido, ignorado como um figurante. Não precisava chorar. Definitivamente não precisava chorar!

Nunca se imaginou como protagonista de um romance de fantasia. Esse papel pertencia a Rory. Sendo assim, teria que se agarrar na garotinha, na protagonista, para sobreviver naquele mundo… Para poder voltar para casa.

"Eu sou um idiota…"

Não precisava chorar, definitivamente não precisava!

Rory era apenas uma arma dada pela deusa. Uma arma que resmungava, o chamava de idiota, destruía tudo sem pensar duas vezes — parando para pensar, ela alguma vez o chamou pelo nome?

Não precisava chorar. Não precisava chorar. Não precisava chorar. Não precisava chorar. Não precisava chorar. Não precisava chorar... Se continuasse repetindo isso as lágrimas cessariam?

O sentimento de tristeza tomava conta do coração do jovem aos poucos. Ele estava prestes a gritar…

Perdeu uma irmã outra vez pela própria incompetência. Era como daquela vez, quando não conseguiu proteger aquela garota... Talvez, se estivesse lá, Rory poderia ter lutado com força total.

A história se repetia novamente. Era realmente tão fraco? Tudo que podia fazer era sentar e observar enquanto suas irmãs eram mortas?

— Teruhashi... Rory...

— Você!

— Quê?

O jovem de espírito abatido se virou para a dona da voz que se aproximava. Era uma garota jovem com um manto preto cobrindo o corpo esbelto.

— Tenho uma revelação para você, ela foi dada a mim pela grande deusa!

— R-revelação...

Kurone tentou se recompor, usando as mangas do sobretudo azulado como um lenço para enxugar as lágrimas que cobriam o rosto.

— Você é...

— Eu e meu grupo fomos salvos graças a você e sua companheira.

A sacerdotisa pertencia ao grupo formado por um arqueiro e um ladino. O ladino morreu durante o ataque por ser impulsivo, mas graça a Rory, a jovem, o arqueiro e um soldado foram salvos de terem o crânio aberto por uma clava.

— Agora escute. — A sacerdotisa juntou as mãos próximas ao peito voluptuoso. — A grande deusa deseja que você, Kurone Nakano, vá até a capital!

— O quê?

— Ela me revelou enquanto eu orava...

— Vá embora daqui, herege! — Brain assustou a garota.

— B-Brain!

— Não escute essa herege, Kurone. Essas pessoas usam “grande deusa” para se referir àquela traidora. São todos hereges!

— Mas, como ela sabe meu nome?

— A grande deusa me...

— É apenas um truque! Vamos, vá embora!

— Tudo bem... eu fiz meu trabalho como mensageira da grande deusa.

— Vá embora logo!

Não era a primeira vez que ouvia a expressão “grande deusa”. Aparentemente, as pessoas normalmente usavam essa expressão como o “oh meu deus!” da Terra.

— Dá pra acreditar nessa gente... não vai me dizer que acreditou no que ela falou?

— Eu realmente não tenho mais nada a perder...

— Espera, Kurone. Você não pode ser tão precipitado!

— Eu vou! Não sei o porquê, mas sinto que o que aconteceu Rory e os outros tá ligado à capital.

— Entendo... pelos seus olhos, sinto que você ainda tem esperança que sua irmãzinha ainda está viva... Olha Kurone, eu sei que é difícil... Kurone? Ei Kurone, tudo bem? O que foi? Sua expressão está horrível!

— ...Definitivamente, a Rory está viva, e eu só saberei onde ela está quando chegar na capital!

— Como pode ter tanta certeza? E que expressão foi essa de agora?

— É o meu instinto de irmão mais velho! Eu vou para a capital!

Poderia ter dito apenas que recebeu um choque no cérebro com uma voz familiar dizendo: “Eu estou viva, idiota”, mas não seria tão legal como o que acabou de dizer. De qualquer forma, era incrível como a técnica de telepatia funcionava mesmo quando estavam distantes, mesmo que fosse apenas por alguns segundos.

“Seu irmão tá indo te salvar!”



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