Pôr do Sol Brasileira

Autor(a): Galimeu


Cidade Flutuante – O Orfanato

Capítulo 6: Sonho

Perante a noite silenciosa com um ar-condicionado que deixava o local à beira da antártica, uma cama dura, curativos espalhados pelos braços, fraqueza e… tristeza?   

Era Mark, um paciente que lentamente despertava em um hospital. Piscou... Sentiu o peso dos olhos com a falta de força. A visão embaçada dizia pouco, tão pouco que deixar os olhos fechados trazia uma sensação melhor.   

O cansaço crescia, só que outra coisa também. Estendeu mais a face em surpresa, os eventos reviram seu cérebro em função exponencial, o rosto assustado escalonou o respirar agitado como um susto. 

Buscou o resultado do fato, a morte de Will, levantou o corpo sobre pressa que balançaram a cama. Seu braço esquerdo doeu em uma pontada gelada; tinha um soro ligado a ele. 

Enfim, reconheceu um pós-acidente. 

O vento frio da janela trouxe calafrios. Ventos... estava traumatizado pelo ar que arranhava sua pele com delicadeza. Virou-se para a sua direita e percebeu uma janela com um borrão gigante e cinza na frente. Não identificava o que era, apenas via sua forma pulsante que almejava o tão esperado foco.  

Sua respiração, que demonstrava o pânico, travou com a percepção vaga se transformando em verdade crua, verdade na qual piscou mais de seis vezes para aceitar.  

Logo ao seu lado, seu irmão estava em uma cadeira ao dormir em paz.  

— Will?!  

— Ele está dormindo, caso você o acordar, vai fazê-lo surtar de novo. É, de novo. 

Na mesma hora, seu pescoço se tornou um ímã para as palavras. Uma observadora estava junto daquela sala escura. 

— Nirda? Como assim “surtar”? Por que estou aqui? Que... — Ergueu mais o corpo, desajeitado. 

— Ué? Não lembra do acidente? — Inclinou a cabeça. 

Não pode responder com clareza, o raciocino não pode ser convertido em som quando um fator inesperado constatou, as chamas de cor ciano. 

Os lábios tremiam quanto mais tentava processar, lembrou da neve, do lugar esquisito, da sensação de perder o... Perder o controle. "Eu não lembro como parei aqui".

Memórias não iam além do acender do fogo fantasioso, podia ser realmente um sonho do impacto com o banco? 

Atentou-se às pernas de seu irmão. "Nada. Nada?!". Algo sobrenatural havia acontecido diante dos seus olhos... ou não? 

Pôs suas mãos ao rosto e esfregou em protesto: “Machucado, fui até ele e… esse lugar. Pode ser uma alucinação, um sonho, ou talvez tenha acontecido de verdade”. Afastou os dedos do rosto, podia jurar ter visto o fogo nos mesmos dedos, que também foram manchados por neve. 

Muitas informações para processar, tinha medo do que acontecia, mas, com convicção, organizou seus pensamentos.  

— Cê tá bem? 

— Nirda, quanto tempo eu dormi? — perguntou, ansioso. 

— Acho que fooooi... três dias! — respondeu depois de levantar três dedos. 

Se assustou com a resposta. Abaixou um pouco o rosto com uma expressão abatida. “Cacetada, tô numa novel mesmo".  

Um coma de três dias podia ter conexão com os vislumbres que teve. Não queria acreditar em algo fantasioso. Independente do juízo que tivesse, só dúvidas surgiriam. Apenas a dor de cabeça era certa. 

— Por que você não está descansando? 

Naquela sala lotada de camas para possíveis pacientes, havia somente a menininha e seu irmão. 

— Ao contrário daquele ali, eu sei como é que se olha alguém. — Nirda não demonstrava nenhum sono ou cansaço. 

Atentou em sua volta para confirmar se aquilo não era um vislumbre. Tocou no travesseiro, triscou na parede e até passou a mão pela barriga, onde sua blusa azul estava desaparecida. 

— Tava bem preocupado, sim? 

— P-preocupado? — Olhou rapidamente para ela. 

— Sim! Você ficava se mexendo, disse o nome do Will, parecia que tava quase morto de frio e parou do nada! — Imitava os movimentos. 

O rosto de Mark pareceu vazio, deixou sua mente a deriva de novo 

— Te-tem alguma coisa no meu rosto? — perguntou Nirda, um pouco envergonhada. 

— Não, não. Só lembrei de outra coisa. 

Se tocou sobre o encontro repentino no dia anterior do acidente. Pode jurar que conversou com alguém na escola, um alguém que devia realmente estar em suas lembranças. 

Queria que lhe confirmassem o que é ou não um fato. Sua mente estava num estado embaralhado e angustiado, era algo que nunca passou antes. Assim, se deitou novamente, olhou para teto. “Cacetada, e das grandes". 

Com toda a sequência, talvez acreditasse que estava conectado com pessoas de outro lado do mundo e que viu alguém que podia ser considerado até sobrenatural. Apenas talvez. 

— Tá mais pensativo do que o normal — comentou a menina, preocupada. 

— Muita coisa para processar, sinto que não foi normal. 

— Normal? Mas, se fosse “normal", não seria chamado de "acidente". 

— Tá bom, tá bom, espertinha. Tem só nós três aqui?  

— Não, tem uma enfermeira, a recepcionista, dois seguranças e mais um médico aqui no hospital. Então eu e a enfermeira trocamos de lugar. 

A reação de Mark não podia estar mais surpresa com a conclusão. Tentavam matá-lo com cada informação absurda que seus ouvidos e olhos captavam: 

— Ela estava tão cansada, aí decidi fazer um acordo com e... —c ontinuou 

— Simplesmente, deixaram uma criança cuidar de alguém internado? — adivinhou, incrédulo. 

Aff! O que devia fazer isso tá aí do seu lado, babando. A enfermeira não estava bem, e só fiquei aqui para olhar. — Se emburrou. 

O olhar singelo de Mark foi o lado de fora, onde tentava ter uma noção de que horas eram. Nirda apontou para um relógio que havia na parede, leu o comportamento do irmão como um livro. 04:27 era o horário. Ele certificava que a menina não estava cansada. Apesar de tudo, admirava a determinação da pequena. 

— Obrigado, sério mesmo. 

— Por nada. É o mínimo que deveria fazer. — Desmanchou a cara fechada em uma feliz. 

— Vá dormir, eu já estou bem. — Ajeitou a cama.  

Viu ela pegar umas das camas ali ao lado e, antes que terminasse de se acomodar, continuou: 

— Não conte para o Will que acordei.  

Ela sorriu com os lábios, os dois já sabiam o que poderia acontecer se ele soubesse que Mark chegou a acordar antes dele — no mínimo, um apocalipse.  

Depois disso, a menina adormeceu e deixou o outro desperto, que permaneceu ali a encarar o teto, franzia o cenho para cada questão que surgia em sua mente. Em todas essas ideias, sempre dizia que não se deixaria esquecer — uma palavra que tinha muito peso para ele. 

— Esquecer...  

Tentaria achar uma resposta para isso, afinal, era algo tão fantasioso como chamas de cor ciano, que curam e não machucam. 

Chuva calma começou a atingir o hospital. Enquanto escutava as gotas atingirem a janela, o sono o encontrou, o fez adormecer e a insônia sumir junto de suas preocupações.  

Não teve tempo para perceber a estranha silhueta que o observava na janela. 

 

【 Alguns minutos atrás 】 

 

Ainda nessa mesma noite, havia um homem dentro de uma casa grande e muito, muito chique. Residência bem perto dos morros que eram um pouco mais afastados da cidade. 

Tinha um cabelo amarelo-claro, franja cinza, era alto e estava vestido com uma roupa que parecia uma armadura de caçador. Tomava leite com café na cozinha, aproveitava o momento anormalmente tarde para apreciar o gosto casual. 

 

— Terei que fazer mais alguma coisa em breve... 

De repente, uma chamada tocou no seu telefone em cima da mesa, tentou pegá-lo, mas, pouco antes de atendê-lo, uma forte dor de cabeça o atingiu.  

Rapidamente se recompôs, nem sequer importou com a dor intensa que reverberava por todo o seu interior — uma recorrência que já havia se acostumado. 

— Péssimo sinal — disse baixinho enquanto colocava a mão sobre a testa, frustrado. 

Sinos melódicos coçaram as orelhas, entretanto, em um bônus valioso para sua pessoa, imagens de um hospital brotavam em sua visão feito imagens de alta resolução. Teve um vislumbre de um hospital que reconhecia de longe. 

De forma ágil, saiu da cozinha e foi para a garagem, encontrou um carro esportivo que tinha grande destaque em roxo. Nele; ferramentas tecnológicas de puro modelo atualizado.  

O veículo já havia ligado, saiu sozinho da garagem em direção à saída. O volante surgiu em sua frente, o que possibilitou que tomasse o controle. Foi para o mesmo local que viu a toda velocidade. 

Devido ao céu noturno e fechado, o caminho era escuro demais. A situação piorava com a água da chuva que surgiu antes de tocar o vidro da frente. Raiva. Enorme raiva tocou sem semblante, apertou o volante quase para arrancá-lo. 

— Não existe humor para isto agora. 

Acelerou um pouco mais o carro, mas a chuva ainda o acompanhava. 

Já havia chegado ao destino. Estacionou ali perto e percebeu existir algo de errado, já que, alguns cômodos do hospital estavam com as luzes apagadas, um detalhe estranho para um lugar como este. Não teriam apagado as luzes de um hospital em plantão, mesmo em salas vazias da frente, exceto se estivesse algo muito específico a acontecer. 

Saiu do carro com cautela, afinal, pode se acontecer muita coisa em fração de segundos. O sinal, que recebeu dos sinos, o deixava em alerta.  

Atenção boba e impulsiva. Sem querer, pisou em uma poça de água que estava logo ao lado da porta do motorista. 

— Nuvem traiçoeira — reclamou. 

Não gostava de chuvas, sempre pensava em como são perfeitas para disfarçar barulhos, deixam tudo molhado, o que facilitava para se sujar, mas um motivo primordial também não esquecia, que eram grandes sinônimos de sua tristeza. 

Olhava para cima, apenas notava a luz da lua ser, lentamente, bloqueada pelas nuvens. “Foco”. Atentou-se para as luzes apagadas de duas salas, ambas ao lado das janelas do prédio. Não queria causar transtornos, decidiu simplesmente... ir direto.  

Ao chegar perto das paredes, saltou bem alto em direção à janela mais próxima e, após ser pendurar nas beiras, avistou uma mulher que dormia com uniforme de enfermagem. Continuou a escalar com uma velocidade incrível até chegar na outra janela. 

Quando se agarrou, viu um jovem de cabelos brancos adormecido em uma cadeira e outras duas pessoas deitadas em camas diferentes, um deles capturou completamento seus olhos acelerados para cada detalhe do cômodo: Mark.  

Se houvesse um motivo para o sinal, precisava ser dele. Sabia que o hospital era mesmo o local onde deveria estar. 

Entrou pela janela devagar para que acordasse nenhum dos três. Se aproximou de dele e ficou curioso ao perceber o soro. Só podia significar que estava internado, por pelo menos, um dia naquela sala.  

Estendeu sua mão em direção a sua testa com cautela, e disse: 

— Contradição. 

Energia como eletricidade em cor marrom surgiu de suas mãos, iluminava toda a sala sem produzir nenhum barulho. 

Conseguia ver as memórias do garoto, viu suas preocupações antes de dormir e toda a conversa recente com Nirda. Rebobinava na perspectiva que também as viu. “Não. Não. Hum...”. Era como se estivesse numa biblioteca, apenas averiguava por um livro que lhe interessasse.  

Ficou surpreso ao ter visto o acidente junto a todos os detalhes e coisas que o jovem de cabelo hipérbole não lembra. "Ferva, então", cena que prendeu todo seu interesse com facilidade. Apesar de já ter descoberto o que causou o alerta de antes, continuou a rebobinar para que pudesse ver a conversa que deu início. 

— Que bom que parecia apenas um pai, pena que não pode ver, Quiral — sussurrou. 

Saiu do hospital e voltou para onde estava na mesma velocidade que chegou. Aquele homem era a razão que traria mudança a todos na vida de Mark. Porém, era impulsivo nas coisas que envolviam ele.  

Não reparou na menina, que o observava com um olhar macabro por baixo do cobertor. 

— Já começou. 

 

 

 



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