Our Satellites Brasileira

Autor(a): Augusto Nunes


Volume 4,5

Capítulo 5: O Resumo das Férias de Shiroyama Hideo

Sinceramente... não poderia resumir esse período de férias em: — Quero ficar em casa! — durante todo o tempo, não?

Não. É claro que não, né.

Se alguém fosse me analisar de fora, diria algo como: — Você é o tipo de pessoa que não faz muitos planejamentos nas férias de verão, certo? —, e se pudesse responder, diria: — Você está absolutamente certo! —.

Depois que ocorreu toda aquela confusão em Yokohama e retornei para casa, senti uma calmaria estranha. Era difícil para qualquer um se acostumar com uma mudança de rotina repentina e depois tudo voltar ao normal. Havia chegado em casa naquela noite chuvosa e apenas minha mãe estava acordada me esperando.

Ela me cumprimentou com um sorriso tenro, me despedi do Tio Ikishi e enquanto me preparava para tomar um banho, mandei uma mensagem para Himegi. Só após percebi o quão faminto me encontrava e sem sono algum.

De certo modo, ter toda essa calmaria em casa me deixou aliviado, mas também receoso. Tinha minhas dúvidas de que se falasse algo a respeito, tudo poderia virar ao avesso. Enquanto fazia uma refeição leve, minha mãe me acompanhou sentando-se à mesa.

Eu sabia qual era a expressão em seu rosto.

— Por que voltou antes do esperado?

— Tivemos alguns imprevistos, mas nada sério... — omiti. — Houve uma pequena comemoração depois do interescolar, mas decidi querer voltar e me trouxeram.

A necessidade foi de manter a mente vazia.

Minha mãe suspirou, mas não parecia nervosa.

— Tivemos uma longa conversa com sua irmã... — começou ela. — Eu e seu pai.

Prendi a respiração durante um breve momento, e prestei atenção.

— Ela não voltará a viver conosco no momento se é com isso que está preocupado. Harumi já leva sua vida independente sem a gente.

Exalei profundamente. Essa parecia ser a melhor notícia que havia recebido durante aquele dia inteiro.

— Mas devo dizer que não é por causa disso que irá deixar de aparecer em nossas vidas.

— Hein? Por que?

— Faz um ano que ela deixou de falar conosco, e agora quer restabelecer os laços. Foi isso o que nos disse.

Não soube como reagir àquilo. Eu retiro o que disse! Aquela foi a pior notícia que havia recebido naquele dia inteiro!

— Você está cansado da viagem, vá descansar... — entoou minha mãe, se levantando da cadeira e indo em direção ao seu quarto. — Boa noite, querido.

Quando a porta do quarto se fechou, tudo se mergulhou em um silêncio profundo.

Isso virou um grande problema. Não esperava contar que minha irmã tentaria fazer uma jogada do tipo. Na verdade, duvidava que se sentisse ressentida pelo que havia feito. Não era assim que ela costuma agir, e disso sei muito bem. Daqui em diante, as ocasiões em que a verei serão mais frequentes...

Que coisa irritante. Por que isso agora?

Só que, além do que me estressar com tal notícia, estou confuso. Tentava ao máximo querer entender quais as razões para essa decisão ter sido tomada. Minha irmã é do tipo que se importa mais consigo do que com os outros. Se a ocasião for pela pura conveniência, não fazia diferença. O que realmente me incomoda é qual motivo seria esse para tanto, em que simplesmente não faço ideia.

Devo me contentar com esse veredito? Não quero saber a resposta perguntando-a diretamente. Na verdade, não quero vê-la de jeito nenhum.

Ainda é julho, mas já me sinto exausto. Preciso me precaver sobre as mudanças significativas que podem ocorrer, e dessa vez o páreo será alguém de minha própria família. Em relação a como funciona as regras, Harumi sabe jogar melhor do que eu...

Mais uma vez estou sob suas amarras.

Senti uma pontada de dor no abdômen, o que me fez lembrar do que ocorreu horas atrás. Apesar de ter sido acudido, o golpe do bastão que recebi ao proteger Yonagi ainda foi significante e vai demorar um tempo pra se recuperar. Fiquei até surpreso de como agi normalmente sem que minha mãe percebesse... mães tem uma facilidade de captar problemas muito mais sensível do que o próprio Radar do Dragão!

Ignorando o fato de tentar apaziguar meu nervosismo, compreendi que durante todo o momento de tensão em tentar deter Oguro estive imerso sobre como devo lidar com Harumi.

As memórias que antes guardei num fundo escuro na mente vieram à tona, e reagi daquela forma com o primo de Yonagi pelas condições terem sido semelhantes. Me tomei por um impulso tão intenso que contra ataquei os comparsas de Oguro reativamente com o sentido de: — Isso é meramente autodefesa! —, mas isso não foi exatamente verdade.

Eu quis me testar? Atacaria Harumi se a visse como fiz com eles? Tal dúvida serpenteou pela cabeça tantas vezes que me tive a impressão de até ter falado dormindo no caminho para cá pela van...

Estou pensando demais, como sempre. O que aconteceu foi apenas uma reação do momento, isso. É isso o que devo acreditar e enxergar, no fim das contas.

***

Alguns dias depois, recebi mensagens de Himegi pedindo que nos encontrássemos no Centro Makuhari — quase achei que foi um ultimato! — para saber mais detalhes do que havia acontecido. Enquanto me arrumava para ir, Takahashi me contatou:

[Shiroyama. Você está livre hoje à tarde?]

[Vou ter um compromisso no Centro, mas depois disso estarei livre.]

[Bom saber... vamos nos encontrar em frente ao Tipster Dome no parque principal.]

[Hein? Por que?]

[Daqui a pouco mais de um mês será o Festival Esportivo. Temos que ver como está o seu nível e como faremos o treino.]

Ninguém tinha me dito nada que teria um arco de treinamento no meio das férias de verão! E ainda por cima é para um festival de esportes! Um. Festival. De. Esportes!

[Isso não está um pouco extremo, não?]

[Não me pergunte, foi ideia do Inuzuka. Todos estávamos com raiva por termos perdido o jogo do interclasse, então agora o Festival Esportivo é o nosso foco atual.]

E onde aquilo tinha a ver comigo?

[E acho que não se esqueceu de que iria dar tudo de si para que nós ganhássemos, certo? Foram palavras suas.]

Querer usar dos meus próprios argumentos foi dolorido, viu? Além disso, ainda há a questão de ele agora saber do meu rosto. Não queria pensar que isso seja um problema, mas Kumiko sempre tende a querer complicar tudo. Aquela dúvida ainda permaneceu residente, então não tinha opção de recusar seu pedido.

[Certo, no Tipster Dome no parque. Estarei lá.]

Não é como se tivesse algo mais importante para fazer depois. Na verdade, não queria fazer nada..., mas não tenho escolha. Apenas faria alguns exercícios e pronto. Será que voltarei vivo?

 

Me despedi de Himegi saindo na estação Chibaminato e peguei o monotrilho até a estação Chibakoen. Já era quase final de tarde quando cheguei no Tipster Dome, que fica ao norte do parque de Chiba. O domo é tão grande que pode ser visto durante todo o percurso do monotrilho.

Nunca havia estado ali, então fiquei aliviado em ver Takahashi e Inuzuka no portão de entrada. Eles usavam trajes esportivos, como se estivessem se preparando para uma maratona.

— Finalmente chegou... — comentou Takahashi.

— Vamos ver se é tão bom quanto é confiante! — provocou Inuzuka. — Hoje é o dia que vamos fazer aquela corrida!

Durante o intervalo antes do jogo preliminar da Daiichi em Yokohama, me encontrei com os dois e fiz uma aposta com Inuzuka em ver quem seria o mais rápido. Acho que me levei na emoção por ter corrido junto com Rentaro, mas pensando melhor no assunto, tomei uma ação muito precipitada.

— Uma corrida, certo... vamos, então.

Não tive como recuar, e nem como evitar. Para ter mais contato com Inuzuka pelo meu favor a Chinatsu, preciso me aproximar como um membro colaborativo ao Festival.

Entramos no domo e os dois me explicaram como funcionava ali. Era um centro esportivo para ciclistas, em que havia uma pista circular com inclinações em seu meio. Ali pode-se alugar as roupas apropriadas para o exercício, assim como um horário dos dias livres. O local possui sua própria lanchonete e lojas, além de um grande espaço para as arquibancadas. Parece que as escolas que possuem a modalidade no extracurricular escolar competiam em locais como esse.

As bicicletas usadas são profissionais, então teríamos que usar os EPI’s adequados. Aquilo foi apenas uma aposta inofensiva, mas para Inuzuka virou uma chance de poder experenciar algo do tipo. E não foi apenas nós três, o resto do clube de futebol também está presente.

— Reunimos o time pra treinar mais cedo, então agora vamos apenas fazer o percurso tranquilamente enquanto vocês dois fazem esta partida — explicou Takahashi, após ter apresentado todos a mim. — Se bem que, na minha opinião fazer uma aposta entre nós não seria ruim, pessoal.

— O perdedor vai comprar a pizza! — disse um deles, e houve uma salva de gargalhadas.

— Você fala isso porque não vai participar, Kikkawa! — exclamou Inuzuka, rindo. — Porque não se junta conosco e aposta algo também?

— Hein?! Não quero competir com você, Inuzuka! — retrucou ele. — Você ia me fazer pagar um mico se ganhasse!

— Kikkawa é um medroso, mesmo! — brincou Morita.

— Acho que ele perderia para qualquer um de nós, no entanto... — continuou Hiro.

— Se bem que não sei se perderia para o Shiroyama... — debochou Takahashi, que fez todos rirem. — Ele é um sedentário, afinal.

Aquilo não foi nada engraçado para mim.

Dito isso, fomos aos nossos lugares. O instrutor pegou as bicicletas enquanto nos fornecia informações. Eu e Inuzuka estávamos a frente dos outros, como que para fazer valer a aposta dada entre nós.

— Serão ao todo três voltas — entoou Takahashi para todos. Parece que aquilo se aplicava à corrida também.

— Shiroyama. — Inuzuka me chamou. — Fizemos a aposta, mas não colocamos um objetivo para ela. O que quer fará caso ganhe?

— Se eu ganhar esta corrida... — suspirei, fitando a pista à minha frente. — Você fará um pedido meu, apenas isso.

— Então se eu vencer, você fará o mesmo! — Ele sibilou os lábios, animado. — Mas fazer uma corrida dessas por causa de um pedido é meio demais, não?

— É por isso que estou dizendo que isso foi um exagero!

Todos atrás de nós tornaram a rirem novamente e nos preparamos. Realmente não soube ao certo por que estou fazendo tudo isso por Chinatsu, mas não é como se não estivesse ansioso por alguma coisa. Nunca havia entrado em um centro esportivo e competido daquele jeito, então de certo modo se mostrou algo interessante.

Vamos ver como vai terminar.

O instrutor se afastou da pista e estendeu uma buzina, quando ela soou a corrida iniciou.

Eu e Inuzuka avançamos a toda velocidade primeiro. De longe a pista não parecia ser tão grande, mas me enganei. Cumprir três voltas nela será muito trabalhoso. Pedalava com toda intensidade, mas Inuzuka ganhou distância rapidamente, como esperado de um jogador ativo de futebol. Naquele momento, senti um pânico enorme em perder pois não sei o que aquele cara poderá pedir, dada sua personalidade imprevisível e pelo o que os outros falam ao seu respeito.

E não muito longe de mim está Takahashi e os outros, que logo vão me passar também. Estou sob o risco iminente de não perder apenas para Inuzuka, mas todo o time de futebol?!

Não, isso não pode acontecer. Não posso deixar essa possibilidade se concretizar.

E, no entanto, aos poucos os membros me ultrapassavam. Já quase não conseguia enxergar Inuzuka atravessando a curva ao outro lado. Estou ofegante e minhas pernas ardiam, essa corrida vai terminar assim?

Eu tenho que pensar. Pense! É a única coisa que um sedentário pode usar como arma! O que posso fazer naquele momento?

E o desespero me fez olhar ao redor. Não sou entendido do assunto, mas por qual razão as pistas de ciclismo possuem ângulos tão inclinados? A resposta apareceu quando visualizei um dos membros do time chamado Jinpei ultrapassando o outro usando essa inclinação. Foi uma jogada rápida, mas efetiva. O que foi ultrapassado (vulgo Kikkawa) tentou fazer o mesmo, porém, na hora em que tentou ganhar velocidade e alcançar uma inclinação mais íngreme, a bicicleta vacilou e ele caiu no meio da pista. Houve um susto, mas deveria estar bem por causa do equipamento de proteção.

Consegui entender a situação.

A bicicleta por ter um material leve e se suportar em duas rodas pode alcançar um grau elevado de inclinação do que parecia ser 45°, só que isso é possível por causa do seu formato. Bikes profissionais são modeladas para serem ainda mais leves que as tradicionais a fim de conseguirem realizar manobras ousadas mesmo em cenários com inclinações complicadas. Os ciclistas profissionais sabem lidar com o peso leve das bicicletas e usar o próprio corpo para criar uma estabilidade ao fazer as manobras. Não foi o mesmo caso com os membros do time de futebol por causa do ângulo usado, mas seu condicionamento físico os permite realizar algo próximo deste resultado.

Eu não tenho essa preparação física, mas apesar de ser um amador posso sentir o quanto a bicicleta era leve. E por ser capaz de usar aquele artifício ao meu favor, não deve ser uma má ideia.

Pedalei com mais força e me inclinei à direita, com uma angulação leve retornei à posição original e recebi maior velocidade. Já estava entrando na curva ao outro lado, então tenho de tomar uma ação rápida. Todos os outros na minha frente tentavam se inclinar para os lados e ganhar velocidade na curva, mas houve alguns que caíram por tentarem reduzir o avanço.

Então não devo reduzir a velocidade na curva, e sim aumentar?

Pedalei com força quatro, cinco vezes e usei o corpo para conduzir a inclinação, mantive a posição firme e consegui passar por dois membros fazendo isso. Não precisei fazer uma inclinação tão alta, mas a velocidade constante deu frutos.

Agora preciso avançar.

Fiz a mesma coisa no canto esquerdo, e fui trabalhando em zigue-zague pelas curvas. Quando dei por mim, duas voltas haviam se passado. Inuzuka ainda se encontra muito à frente, e já me sinto cansado. Minhas pernas parecem estar endurecendo como pedra, estou tão ofegante que sinto que poderia cair a qualquer momento.

Porém, tenho que continuar.

Takahashi também estava à minha frente e reduziu sua velocidade para me acompanhar:

— Três já caíram, e você ainda está aí? Você é durão mesmo, hein.

— É... por aí...

— Ainda acha que vai vencer o Inuzuka? — indagou Takahashi. — Ele nem parece cansado ainda...

— Ele é um monstro, por acaso? — retruquei, irritado.

— Bom, seja qual foi a aposta que fez com ele, esperado que esteja preparado para perder.

Takahashi ganhou distância, mas não foi tão longe. Suspirei fundo e olhei adiante. Inuzuka estava por volta de 25 metros de distância e já quase alcançando a próxima curva. Terei que manter uma velocidade de ao menos 5km/h para alcançá-lo em poucos minutos. É impossível para mim.

Mas a vitória é realmente algo esperado aqui?

Tomei fôlego e avancei, realizando mais inclinações e ganhando velocidade. Takahashi tentou repetir os movimentos, mas o ultrapassei rapidamente e rumei ao meu objetivo. Se tivesse que pegar um resultado, que fosse o melhor possível. Isso ainda não acabou.

Tinha que evitar o cansaço imediato, então me concentrei em diminuir a distância e aumentar a velocidade pelas inclinações, evitando de pedalar nos momentos certos. Ao alcançar a curva, me ousei a fazer uma inclinação mais elevada que durou poucos segundos, mas me forneceu o turbo que precisava. Usando esse Jet Boost, invoquei um planador usando as pernas como no SEGA All-Star Transformed e me aproximei de Inuzuka, quase encostando em sua velocidade.

— Você é duro na queda, hein?! Acha que está voando, por acaso?!

— Vamos continuar! — exclamei, ignorando-o. — O final está chegando!

Levantei do banco e pedalei com mais força, usando a energia restante que evitei nas inclinações. Nossas velocidades se igualaram e avançamos deste jeito até a última curva, com a linha de largada se aproximando cada vez mais rápido.

— Você é incrível, admito! Mas eu sou melhor! — Inuzuka fez o mesmo e levantou do banco. No momento da curva, usou seu corpo para se inclinar como peso e evitou de cair.

Decidi voltar a posição original e ousei novamente à inclinação de 45°, me sentindo como se fosse uma flecha sendo conduzida pelo vento, ou como um cometa entrando em rota de colisão com um planeta. Neste momento, não vi ninguém depois que cruzamos a curva. Apenas houve a linha de largada em minha visão.

A atravessei sem emitir som algum. Na verdade, meus ouvidos zumbiram pela da velocidade do vento. O quão rápido corri na pista?

Parei a bicicleta e vi Inuzuka pairando a dele também, ambos ofegamos. A nós só havia a expressão: — Quem ganhou?

Em poucos minutos, Takahashi e o restante do membro do time de futebol chegaram. Eles pareciam estar mais curiosos do que a gente. De repente, o instrutor apareceu para dar o veredito da corrida:

— Deu empate.

— !! — foi a expressão de todos. Nem mesmo pude acreditar que consegui me aproximar tanto durante a última volta. Senti a mesma coisa durante a corrida com Rentaro há alguns dias atrás em Yokohama. Sentei no chão, aturdido.

— Ah, que coisa! — exclamou Inuzuka. — Eu não esperava perder, mas ficar em empate?!

Takahashi se aproximou de mim e estendeu sua mão.

— Você não cansa de surpreender, não é?

— Não começa... — retruquei, aceitando o apoio para me levantar.

O restante do time se reuniu e todos aplaudiram. Foi uma corrida e tanto.

— Shiroyama! Toca aí! — Inuzuka se aproximou e batemos as mãos. Apesar do resultado, ele pareceu muito satisfeito. — Nunca pensei que seria um páreo duro. Fico feliz de ter me enganado por ter te achado apenas um sedentário que não quer fazer nada. Você é sensacional!

— Oh... que bom que sua opinião mudou, acho? — indaguei, confuso.

— Mas... — interveio Takahashi. — Se deu empate, o que farão com o resultado da aposta?

— Tenho uma ideia... — comentei. — Inuzuka, vamos conversar isso a sós.

— E pra começo de conversa, poderia ter vencido os dois a qualquer momento, viu... — provocou Takahashi. — Estava apenas me divertindo. Agora! Ao perdedor que caiu primeiro na pista, hora da pizza!

— O quê?! — exclamou Kikkawa. — Não era só pra aqueles dois?!

— Mas não teria graça se fosse apenas isso, certo? — indagou Hiro. — E você foi o que caiu de jeito engraçado tentando fazer manobra!

— Ah, fala sério!

Houve um grunhido de derrota e todos começaram a rir, mas eles se afastaram para irem à lanchonete do local. Quando conferi que estava apenas eu e Inuzuka, tornei a falar:

— E se discutíssemos qual é a melhor ideia para o outro fazer?

— Parece uma boa... — começou Inuzuka. — Mas, tem algo que quero te perguntar: por que esse interesse repentino de querer competir comigo?

— Na verdade, o interesse está em outra pessoa... — expliquei. — E isso foi o meu objetivo dessa aposta. O que queria que você fizesse caso eu ganhasse seria ir a um encontro com uma amiga minha.

— É o quê?! — Inuzuka recuou, chocado. — Se eu perdesse, teria que ir a um encontro?! Se soubesse disso não teria nem competido!

— Isso teria me poupado vários problemas, sabe... — murmurei, frustrado. — E então? O que me diz?

— Bom, é algo bom..., mas essa garota, ela é bonita?

Por que tive a impressão de que esse tipo de pergunta viria em algum momento? E por que fiquei frustrado achando que poderia escapar disso?

— Infelizmente não tenho nenhuma foto, mas ela é a presidente do clube de artes... quer dizer, vice-presidente.

— Entendi. Quer dizer que não tenho escolha senão aceitar e ver na hora como vai ser, então... — expressou Inuzuka. — Você é corajoso, Shiroyama. Fazer tudo isso por uma amiga, gostei dessa atitude.

— Só peço que não me faça ter esse tipo de corrida novamente, por favor... — supliquei, mal estou sentindo as pernas. — E você? Qual é o seu pedido?

— Ah, nada demais. Na verdade, não tinha pensado direito sobre o que deveria pedir para você por não nos conhecermos. Aqui eles gravam as corridas por um preço. Me ajude com o valor e é isso.

Ele estendeu sua mão para mim, e disse:

— É um pouco tarde para isso, mas sou Inuzuka Hiyama. Vai ser ótimo ter alguém como você no time no Festival Esportivo. Conto com você!

— Sou Shiroyama Hideo. Estou ansioso para ver em como vai ser.

Após o aperto de mãos, nos reunimos com os outros. Apesar da pizza estar boa, minhas pernas não paravam de doer.

***

Depois que descobri que aquela foi a primeira vez que tinham ido para lá. Se soubesse disso não teria participado daquela competição!

No entanto, não senti hostilidade. Brincamos e comemos, como se todos nós fôssemos extrovertidos aproveitando suas vidas nas férias (exceto, eu).

No fim, não tive nenhuma informação se fui citado em algum tópico entre Takahashi e Kumiko. Bom, haverá mais oportunidades em algum momento, ao menos é o que acredito.

Logo, todos do time deram o veredito de que poderei contribuir bastante nas atividades escolares que virão. Eles agem como um bando de brincalhões, mas levavam suas agendas de treino a sério. Organizaram um longo cronograma que se estendia para além das férias.

— O início do Festival Esportivo será no começo de outubro — começou Takahashi. — Isso quer dizer que teremos apenas um mês após o retorno das aulas para continuar o treino. Isso significa que o treino deste mês de agosto é o mais significativo.

— Ainda não sabemos quais serão as atividades, então por ora temos que ter ciência das qualidades físicas de cada um! — continuou Inuzuka.

— Se nem todos daqui estão na mesma sala, porque todos vão treinar juntos? — indaguei.

— Ano passado... — respondeu Takahashi. — ...teve competições em grupo que proporcionaram unir alunos de outras salas. No fim, os pontos serão distribuídos igualmente aos integrantes. Este ano isso não será diferente, então poderemos focar em nosso time sem problemas.

Havia esquecido das competições em grupo... quer dizer, pensar em algo que não seja individual não me é uma vantagem, sabe.

Dito isso, aquilo não me foi interessante no momento. Ainda precisava saber de todos os detalhes para decidir se adentrar em um grupo durante as atividades trará vantagem. Pelo que a supervisora havia me dito, terei que lidar com os Exames Especiais a cada trimestre. Então, naquele momento, devo me concentrar no físico e conseguir o máximo de pontos de maneira objetiva.

— Eles costumam expulsar alunos com base na colocação no fim das atividades? — perguntei.

— Bom, é algo complicado... — expressou Takahashi. — Não é como se fosse obrigatório que todos os alunos sejam bons nas atividades físicas. As garotas, por exemplo, são as que menos praticam atividades.

Faz sentido. Não adianta ficar sob especulações se não pode obter informações concretas. Por ora, apenas decidi anotar as rotinas de treino deles e fui embora.

Enquanto pegava o monotrilho, minha mente fervilhava.

Sem dúvidas, os testes de aptidão física trarão um balanço na ordem das colocações gerais. Não é difícil imaginar que haverá contramedidas para evitar expulsões, mas também era fácil cogitar que poderá haver suspensões dependendo de atos agressivos cometidos durante as atividades. E pelo que Takahashi me disse no começo das férias, Kumiko já encontrou alguém que a represente em nossa disputa. Ela não compete para perder, então só consigo imaginar que a pessoa escolhida vai me dar trabalho.

Há muito a se pensar.

Deixando isso de lado, a partir daquele momento será o início das minhas árduas sessões de treino para o Festival Esportivo!

O foco era melhorar meu condicionamento físico, então devo fazer práticas como aquecimentos, alongamentos e corridas. É óbvio que meu fôlego será essencial em todas as práticas, por isso preciso reforçar esta parte primeiro do que as táticas de jogo.

A questão agora é desenvolver o costume de percorrer longas distâncias sem me desgastar — o que já considero um bom desafio —, então resolvi praticar caminhadas extensas de 8km todos os dias. Ida e volta. Com uma rota definida e sabendo tratar o treino de um jeito progressivo não seria um problema, mas...

— ...ainda é mais difícil do que se parece! — exclamei, arfando.

— Não fale, senão vai se cansar mais rápido — indagou Inuzuka, indiferente.

Takahashi ria ao lado dele, e então voltaram a conversar como se aquilo fosse algo normal. Na verdade, era algo que faziam diariamente e já não sentiam cansaço aparente. Como esperado dos jovens sadios que praticam esportes!

Já era o terceiro dia que seguia aquela rotina de treinos. Nunca havia bebido tanta água em tão pouco tempo como naqueles dias. Minhas pernas ardiam como fogo e a sola dos pés parecia que se quebrariam a qualquer momento. O percurso sempre começava às 9h da manhã e durava por volta de 2hrs até completar os 4km. E então, teríamos que voltar até chegar aos 8km. Aquilo era um treino para virar algum tipo de super-herói?

Andar tanto por dia me foi complicado e, para completar, Takahashi e Inuzuka não me acompanhavam sempre por causa dos treinos de futebol. Parece que Inuzuka também havia arranjado um trabalho de meio-período, então tinha que revezar entre os dias mais tranquilos para não se prejudicar.

— Shiroyama, faça esse percurso de segunda a sábado e descanse aos domingos — explicou Inuzuka. — Deve estar bom pra um sedentário como você se aquecer.

— Isso é só pra aquecer?! — retruquei. — E não fale como se eu fosse uma subespécie degradante como uma erva-daninha que só traz mal pra sociedade...

— Parando pra pensar, realmente traz mal à sociedade... — expressou Takahashi.

— Então o Shiroyama é uma erva-daninha! Shiroyama Zassou! — berrou Inuzuka, animado.

Ei, como eles quase acertaram o apelido que recebi na infância?! Se bem que ser chamado de Shiroyama Kaisou ainda foi melhor que Zassou...

— Se não consegue algo como isso, enterre sua cabeça no chão! — provocou Takahashi, rindo alto.

— Hum, mas então ele deveria ser um tipo de planta zumbi... só de olhar para os olhos dele te causa essa impressão — ressaltou Kikkawa.

Por acaso sou algum tipo de fungo que controla as pessoas e traz um apocalipse zumbi para a humanidade?!

— Não sei você, mas o sedentarismo parece isso mesmo!

— Mesmo com raiva, não posso discordar de você!

O que há com esses dois idiotas? Inuzuka já poderia até imaginar, mas até Takahashi resolveu agir como criança. Seria este o sentimento de estar com alguém por perto que não consegue se conter?

Aquela estranha atmosfera descontraída arrancou risadas. Podia entender que estavam me acompanhando diariamente pelo apoio, se bem que não podia deixar de achar que Takahashi o fazia apenas para ver se estou cumprindo com minha promessa. Ao menos poderei me sentir mais relaxado com a presença de Inuzuka quebrando essa inimizade entre a gente.

Nos dias que tinha que ir sozinho, senti que era menos trabalhoso por não ter que falar com ninguém. Colocando fones de ouvido e focando apenas no percurso, consegui o feito em até menos tempo (mas não disse isso aos dois), me rendendo um período maior de descanso. Por mais que tivesse dias chuvosos, apenas precisava colocar uma capa de chuva e levar um guarda-chuva que poderia lidar com o problema facilmente.

Quando me dei conta, metade de agosto havia se passado. Não restava muito mais tempo sobrando, mas foi algo que não preocupou os dois:

— Nós percebemos que o que você mais precisava era desenvolver resistência física — explicou Inuzuka.

— Isso. Não vai adiantar nada te colocarmos para treinar passes complexos ou de entender todas as regras dos jogos... — complementou Takahashi. — O mais importante é te deixar em forma para que possa servir como apoio.

Se eles estão bem com isso, não há o porquê de reclamar. Aos poucos, percorrer 8km por dia já não se tornou uma tarefa tão árdua assim. E notei que meu tempo de descanso também se reduziu aos poucos, além da dieta leve que adotei. Correr tanto cresceu meu apetite, então consumir mais proteínas me ajudou bastante.

Em dado momento, o grupo Shiroi Gamen voltou a ter suas conversas no LINE. Parece que apesar de ser a reta final das férias de verão, ainda havia muitas coisas para se fazer:

[Preciso de ajuda com as tarefas de matemática!] — foi uma mensagem de emergência de Himegi.

[Alguém mais está precisando de ajuda?] — Chinatsu notificou todos.

Kuroi mandou emojis desesperados como resposta.

Não houve mensagem nenhuma de Teru.

[Vamos todos nos encontrar na biblioteca de Chiba para encerrarmos as atividades.] — opinou Shiina.

[Isso é uma ótima ideia. Vocês vão ter outros planos depois dessa sessão de estudos?] — foi uma mensagem de Yonagi.

Oh, é mesmo. Himegi havia colocado o contato de Yonagi no grupo. Parece que agora todos do clube de literatura poderão se comunicar diretamente via LINE.

Foi particularmente surpreendente ela própria vir perguntar sobre realizar planos, mas era prova de que o que aconteceu antes não a abalou e resolveu seguir adiante. Como esperado da presidente do clube.

Por outro lado, Teru não visualizou as mensagens? Poderia perguntar diretamente no chat privado, mas descartei a interação por não a considerar necessária. Desde aquela noite em Yokohama percebi que houve muitas consequências, não foi preciso pensar muito para entender como se encontra a situação atual.

Respondi que não tinha nada em particular para fazer no dia, então todos combinamos de que iríamos fazer sessões de estudos na biblioteca de Chiba a partir do dia 18 de agosto. Como ainda tive o treino diário para fazer, fui perguntar para Inuzuka o que deveria fazer por mensagem:

[Podemos compensar fazendo o percurso a noite de bicicleta.] — foi sua resposta.

Parece que ele vai para o trabalho de meio-período de bicicleta todos os dias, e ainda treinava arduamente. O quanto de energia ele tem? Ele é um Saiyajin, por acaso?

A partir daí, comecei a frequentar o grupo de estudos durante o dia e a andar de bicicleta a noite com Inuzuka. Achei que Takahashi iria nos acompanhar, mas foi em apenas alguns dias aleatórios. Ao contrário do que se pode imaginar, percorríamos mais quilômetros estando com as nossas bicicletas do que se fosse a pé, então não deixei o treino de lado em nenhum momento. Por causa do clima gelado da noite, não sentia um desgaste tão instantâneo, então pude cumprir o exercício sem maiores problemas.

Inuzuka, apesar de orgulhoso e explosivo, quando estava sozinho aparentava ser alguém recluso e observador. Era um jeito de ser dele que só conseguia ver quando não há mais ninguém nos rodeando.

— Ei, Shiroyama.

— O que foi?

— Você acha que é certo mudar pelos outros?

Pelo tom de voz, me parece um tópico bem reflexivo de sua parte.

— O ato de mudar em si já é algo difícil... — respondi, indiferente. — E a primeira coisa que precisa vir em sua cabeça é querer mudar por si mesmo, e não por outra pessoa. Sentir estímulos e corresponder a eles também é uma maneira de dizer que esteja se influenciando pelos outros.

— Por que você está treinando com todo este afinco, então? — indagou. — Isso não é algo que você normalmente faz, certo? Está querendo provar algo para Takahashi ou algo assim?

— Não exatamente... — continuei. — Ele já sabe que sou o tipo de pessoa que não remede o que tenho que fazer. Acontece que o confrontei neste Festival Esportivo e preciso mostrar que estou à altura. Além disso...

— Além disso...?

— Senti que fazer esse tipo de coisa possa me fazer querer entender melhor... ou algo assim, não sei.

Inuzuka suspirou.

— Eu parei de querer tentar entender as pessoas... — murmurou Inuzuka. — Por isso quis saber qual seria seu motivo de querer se dedicar tanto por algo que não tem costume.

— Bom, não é como se nunca tivesse tentado nenhuma prática física, sabe...

— Oh? Então você já praticou algum tipo de esporte?

— Sim... — respondi, francamente. — Natação. Pratiquei por dois anos durante o ensino fundamental, mas não fui um aluno destacado. Tentei praticar karatê, mas nunca tive tempo para desenvolver algum tipo de afinco. Até mesmo tentei praticar futebol, mas não gostei.

— Isso explica muita coisa. Você é realmente ágil, mesmo sendo um sedentário... — sibilou Inuzuka. — E por que quis fazer isso antes?

— Digamos que o incentivo que recebi foi ter um condicionamento melhor para minha saúde. Nada mais. Nem mesmo tinha interesse em qualquer tipo de esporte antes disso.

— Oh, entendo...

— É por isso que desta vez estou dedicado por estar escolhendo essa opção — continuei. — Bom, ao menos foi o que minhas escolhas até agora me levaram a fazer. Mas não estou achando isso de todo ruim.

Ele deu uma risada franca.

— Você é interessante. Também não tenho interesse nos esportes, apenas faço isso porque é divertido.

— Divertido? — indaguei. — Mas você até mesmo chegou a ir num interescolar...

— Tenho que descontar meus impulsos em alguma coisa, certo? — Inuzuka olhava em outra direção, não particularmente para a estrada. — Neste caso, concordo que pratico esportes com a mesma pretensão que você tinha antes.

— Não diria que seja a mesma coisa, mas... — expressei, com um sorriso triste. — Mas podem ser parecidos, talvez.

Esse é o Inuzuka Hiyama que frequenta a mesma sala de aula durante quatro meses e apenas o conheci profundamente naquele momento? O quanto pessoas estranhas em nossa volta têm de histórias diferentes e interessantes para se ouvir a respeito?

E não era apenas em sala de aula, mas no clube também. Depois de tanto tempo, ainda estou tentando compreender todos os membros, que parecem estar fazendo o mesmo. As relações sempre me foram tão superficiais que apenas chegavam no: — Como você está? —, — Isso está difícil de fazer, não é? — ou — Não sou bom nesse tipo de coisa —.

Não tinha ideia se vou continuar interagindo com Inuzuka após o teste acontecer e quando se relacionar com Chinatsu. Toda essa construção relativa foi apenas um mero objeto resultado por esse meio. O mesmo até pode ser dito sobre Takahashi, mas será que devo deixar por isso como foi com ele?

— Sabe... — Ele continuou. — Quando você disse suas intenções no fim da nossa competição, cheguei a pensar que fosse algum tipo de piada. Você é o típico de pessoa que não se relaciona muito com os outros, e justamente veio para me apresentar a uma garota.

— É... olhando por esse ângulo, talvez tenha sido estranho mesmo... — ponderei. — As coisas só se seguiram nesse rumo porque sabia que iria concordar com os meus termos.

— Hum... tem razão. Ganhando ou perdendo, você teria seu objetivo... — murmurou Inuzuka. — Isso me intriga. Essa garota é tão importante para você, assim? Se for, por que você mesmo não fica com ela?

— De... de onde tirou essa conclusão?! — retruquei. — Uma coisa... não tem nada a ver com outra!

— É que me intriga mesmo, ter uma proximidade destas e não querer nada em troca. Não ter uma relação mais profunda, sabe?

— Bom, posso dizer que foi por uma razão parecida com a de Takahashi...

— Hein? E por acaso você vai ficar de um lado a outro cumprindo tratos de acordos? — indagou, incomodado. — Você não tem nenhum senso de valor próprio, não?

— Não estou particularmente incomodado com as consequências... — respondi, indiferente. — Se for pra pensar a respeito, estive fazendo muitas coisas do jeito que quis. Bom, são apenas reações.

— ...

— Além disso, não é algo bom você receber confiança de alguém que esteja sendo benéfico? Não sou de confiar muito nos outros, só que pessoas boas são confiáveis. Meio que não tem escolha senão confiar nelas, pois elas confiarão em você.

— E está bom para você se manter nisso?

— Enquanto houver pessoas boas neste mundo, quero estar ao lado delas. Sinto que isso é o que deve ser mais importante.

— Mais do que querer se relacionar com elas?

— Não estou procurando isso. Na verdade, não tenho chances de algo assim. Minhas interações com os outros não visam este caminho, se apenas estiver tranquilo com quem conversar, pra mim está bom.

Inuzuka ficou sem falar nada por algum tempo, e isso me deixou um pouco apreensivo. Tendia a falar demais quando me empolgava em um assunto, o que afasta os outros.

— Como pensei... você é mesmo esquisito e interessante. — Ele sorriu travesso.

 

Em dado momento, me encontrei e contei a Chinatsu sobre meu avanço na interação com Inuzuka, deixando-a muito feliz:

— Ah, estou achando tão bonitinho o fato de estarem virando amigos! — respondeu ela, radiante. — Não seria legal a possibilidade de sairmos todos juntos para nos divertir?

— Você... não está muito animada com isso, não?

— Não se incomode, Shiroyan. Ela é assim quando se trata de suas emoções.

— Shiina!

— Bom, o plano está funcionando. Então, não me surpreende tanto estar feliz com os resultados...

— Escute aqui, Shiroyama. — Ela me apontou o dedo, séria. — O fato de estar se dando bem com ele prova sim que as coisas estão fluindo como esperado, mas o que é mais importante... é que você está sendo mais do que um intermediário entre nós dois.

— Você acha?

— Sim, é o que eu acho! — Ela continuou. — É assim que as coisas precisam ser, senão não seria natural. Você estar sendo amigo dele o torna um amigo muito mais especial para mim.

— Ah, entendi... — balbuciei, nervoso. — Que bom que está tudo dando certo...

Oh, não faça isso comigo! Sentir tanta graciosidade dela amoleceu meu coração! Que perigo!

Depois de uma semana de sessão de estudos, todos decidimos que iríamos passar os últimos dias das férias sem estudar. Yonagi quis esperar o nosso último encontro na biblioteca para comentar:

— Bem... hum... está havendo um festival hoje no Centro Makuhari. Queria saber se... alguém vai querer ir lá?

— Onde vai ser? — indagou Himegi.

— Vai ser próximo do Chiba Marine Stadium e do Makuhari Gesse. Parece que vão isolar as ruas próximas para um show de fogos de artifício no limiar da noite — explicou Yonagi, estranhamente detalhista.

Ela parece estar ansiosa para o evento pelo rosto levemente corado, curiosamente Kuroi ficou surpresa com a proposta.

Que seja, o local do destino era pouco importante, já que por causa daquele pedido fofo me foi impossível de se recusar.

Todos concordaram de irem. Teru não compareceu a nenhuma das sessões de estudo, e parece que não vai aparecer naquele festival. Não é como se estivesse preocupado com o estado em que se encontra, já que passei pela mesma coisa... Kuroi agia normalmente, até se comunicava a sós com Yonagi.

Parecem estar discutindo um assunto particular, e não consigo imaginar as duas sendo tão próximas, mas por não ser algo ruim de ver e nem ser da minha conta, as ignorei.

Todavia, seguindo o rumo da conversa não houve objeções quanto à proposta de Yonagi... espera. Quer dizer, que todas elas vão para lá mesmo?

— Isso vai ser hoje à noite, certo...?

— Justamente por causa disso que quis saber a opinião de todo mundo... — ressaltou ela. — Já que com isso poderemos encerrar por aqui agora mesmo e nos prepararmos.

Hein? Já foi decidido? Que plano ardiloso é esse?

— Eu já tinha planejado com Shiina de irmos juntas! — expressou Chinatsu, radiante. — Vai ter várias festividades e isso vai nos animar!

Realmente não houve ninguém se opondo...

— Bom, eu não quero ir... — tentei me esvair dessa situação ao me levantar rapidamente.

— De jeito nenhum! Você vai! — Himegi grunhiu para mim, forçando-me a me sentar novamente. — Você já teve de pagar o cinema pra todo mundo, não aprendeu ainda sua lição?

Ora... seria submetido àquela ameaça toda vez que fôssemos sair? Não é como se devesse participar de todos os encontros! Por favor, Himegi, leia o clima! O ambiente está pesado, não consegue sentir?! No entanto, até mesmo Chinatsu e Shiina a apoiaram naquela imposição.

— Não quero forçar ninguém a ir... — exasperou Yonagi. — Mas sabe o que irá causar caso decida isso, certo?

Ela me encarou friamente, o que não me deixou escolha... após um suspiro, levantei a mão aceitando a proposta. Não consigo acreditar que fui submetido por alguém mais nova que eu... quando que o mundo vai parar de me sacanear, pra variar? Se aquilo era um sinal de que não deveria seguir uma carreira política, já tive o bastante!

***

Quando você pensa sobre festivais de verão, o que surge na mente é justamente aquelas passarelas cheias de barracas de pratos típicos, brincadeiras, fogos de artificio, mulheres vestidas de yukata e muita, muita gente.

O percurso até a estação de Chiba da biblioteca foi de dez minutos, mas mesmo estando cedo o local já se encontrou cheio. Pessoas de todas as idades lotavam a estação já trajadas para o festival, o que me deixou realmente surpreso:

— Esse festival já estava sendo divulgado há tanto tempo assim? Não soube dele em nenhum momento...

— Aposto que não prestou atenção em nenhum comercial ou nem mesmo ligou a TV... — retrucou Yonagi.

O que tinha de errado em não assistir propagandas? Comerciais não foram criados para serem ignorados?

— Vamos todos nos encontrar na estação Kaihimmakuhari, certo? — indagou Chinatsu.

— Isso mesmo. Iremos chegar quase na hora dos fogos de artifício, mas acho que ainda dará certo... — expressou Himegi.

— Oh... — murmurou Kuroi. — ...os fogos de artifício...

— Então nos encontraremos em duas horas — concluiu Shiina.

Elas adentraram o trem, enquanto permaneci pensativo se deveria realmente ir e enfrentar a fúria delas depois. Não era um exagero dizer que pessoas solitárias se tornam muito vulneráveis estando tão expostas a multidões... ainda mais em locais apertados quanto trens e ônibus. Ainda, há muitas chances em que as pessoas interpretem esse tipo de contato como algo perigoso.

Esbarrar com alguém sem querer em transportes públicos é certamente como uma ação agourenta. Veja, se você se esbarrar com uma garota por não conseguir se segurar direito por causa da imensa quantidade de gente, ela te olhará torto e todo o resto te julgará como alguém suspeito. Mesmo que tente desviar o olhar, não haverá para onde escapar a não ser se prostrar como um condenado e ser pisoteado por todos aqueles desconhecidos enquanto pede desculpas... a sociedade é realmente algo cruel!

Quer dizer, poderia apenas dizer que tinha uma doença que me impossibilita em ficar tanto tempo dentro de multidões, mas só receberia esporros e até mesmo ofensas... mesmo uma parte de mim querendo insistir em não prosseguir adiante, notei alguém próxima parecendo encarar para todo aquele aglomerado de gente da mesma forma que eu.

Yonagi Kaede franzia o cenho para todos que a encaravam, que se a afastavam pelos seus olhares gélidos. Enquanto toda aquela multidão voltava a se aproximar dela (por falta de escolha devido ao espaço), o barulho do trem a fez se desequilibrar até minha direção, detendo-a para que tropeçasse e caísse.

— Ah, obrigada...

— Cuidado onde pisa, é melhor segurar firme nas barras... — disse, indiferente.

— Eu... eu sei disso... — Ela virou o rosto, procurando outro lugar para ficar.

Desviei rapidamente o olhar para outra direção, permanecendo imóvel e em silêncio. O ato em si poderia chamar atenção, então o melhor a se fazer era simplesmente agir como se não fosse nada demais. Já esperava que poderia ser facilmente insultado por qualquer ação que fizesse. Sim, o silêncio é o nosso maior aliado!

Apesar de sentir o olhar de Yonagi sob mim de onde ela ficou...

***

Quando desci na minha estação, não tive tempo de me despedir das outras garotas. Apenas dei um breve aceno brando e segui para casa. Conforme atravessava aquele imenso aglomerado de pessoas vestidos de yukata e jinbei, fiquei me perguntando se deveria realmente vestir o mesmo.

Não... está calor demais para usar jinbei!

Tinha cerca de duas horas livres até o horário do encontro. Como certamente as estações estarão ainda mais lotadas à tarde, o melhor a ser feito será trocar de roupa rapidamente e esperar no ponto de encontro o mais cedo possível.

Eu costumava frequentar bastante os festivais quando mais novo, mas houve vários momentos em que eventos como aquele deixaram de ser divertidos e proveitosos. Parecia mais uma apresentação vista ao receber um ticket para “aprender a se portar em meio a sociedade”. Minha vida se resumiu a presenciar vivências do tipo, então as coisas pararam de ter outro sentido senão esse.

Ao chegar em casa, a encontrei vazia. Provavelmente, Takashi foi passear em algum fliperama com os amigos, se meu pai não teve hora extra no trabalho, foi se exercitar. Minha mãe deve ter ido ao festival com suas amigas, portanto decidi aproveitar um pouco daquele tempo sozinho para pensar no que devo fazer depois.

Diante disso, me apressei em ir ao banheiro. Troquei rapidamente de roupa e saí de casa meia-hora depois, apenas. Gostaria de poder apreciar aquele festival à minha maneira, ao menos.

Por conta do evento, a quantidade de metrôs tinha aumentado. Não tive muita espera, mas me senti uma autêntica sardinha enlatada! Seria aquela uma das cinco calamidades do continente negro?!

Após quase uma hora de viagem, consegui sair do metrô vivo e inteiro. A estação Kaihimmakuhari está tão lotada de gente que não conseguia nem mesmo enxergar o piso da plataforma. As barracas estão concentradas por entre uma rua adjacente da estação. Restava cerca de meia hora para que as garotas cheguem, acho que daria tempo para um breve reconhecimento do local.

Caminhando lentamente entre a enchente de pessoas, observei em silêncio as barracas. Desejava profundamente que não encontrasse nenhum conhecido por perto. Meu sentido aranha está à postos! Mesmo que venha um Doc. Octopus, eu saberei!

As barracas de Takoyaki me foram muito atrativas, como saí de casa apressado, esqueci de comer algo. Pelas filas não estarem imensas, resolvi esperar ali. É estranho quando se sente inerte sob algo, pois tudo ao seu redor parece ser mais interessante do que seu objetivo... há muitas mulheres bonitas trajando Yukata. Entretanto, em meio a tantas belas vistas, me deparei com uma da qual não queria ver.

Kirisaki andava em bando com suas amigas, soube disso por tê-las reconhecido nos jogos do interescolar. Junto a elas está Ichika Yari, uma garota que mantém contato com Kumiko Horie..., mas o problema não é nela, e sim na própria Kirisaki! Ela lidera o grupo, chamando atenção de todos ao seu redor com sua presença deslumbrante. Seu rosto tinha uma deformação parecida com a minha, e usei disso para me aproximar dela, que me recusou.

Não é que esteja melhor que Teru, nesse sentido. O fato de não estar acuado dentro de casa foi pelo fato de não ter descansado minha mente o suficiente pra refletir sobre o assunto. Durante a estadia em Yokohama, tentei compreender melhor Yonagi e achei que isso me daria mais movimentos para me aproximar de Kirisaki, mas foi um completo engano.

A questão atual é que da forma como nos despedimos, tenho certeza de que ela não deseja me ver. Ficamos tão desconfortáveis que o que devo fazer é me afastar o máximo que puder. Droga, ela se aproxima a cada passo dado até mim e não sei o que fazer! Mesmo que saia correndo, notarão a ação sucinta..., mas, porque estou me preocupando tanto com isso?

Que seja... no fim das contas, não dará tempo de sair de seu campo de visão. Apenas cobri o rosto e permaneci absorto nos pensamentos até desejar não estar mais ali. Ao dar por mim e abrir os olhos, Kirisaki e seu grupo passaram e já se encontravam distantes.

Oh... será que isso é pela questão de me misturar tão bem no ambiente? Pelo visto realmente me tornei um ninja...

Apesar de sorrir abobalhado por passar despercebido, no instante em que visualizei Ichika Yari se virando em minha direção, me acuei na tentativa de escapar de sua visão. Querendo ou não, o melhor é não ceder nenhum tipo de informação à Kumiko. Finalmente, peguei meu Takoyaki e me retirei dali o mais sucinto possível. Segui o rumo contrário dos recém-chegados até a entrada da estação, a fim de esperar as garotas chegarem.

Conforme caminho, a multidão se dispersa. Depois de degustar o Takoyaki, uma presença se aproxima de mim. Pelo meu desagrado, é justamente a própria Ichika me encarando:

— Achou mesmo que não veria um cara irritante como você se destoando de todos daqui?

— Todo mundo quer contar com a sorte, de vez em quando...

— Finalmente resolveu se afastar da Kirisaki? Ela o avistou e fingiu demência, sabia?

— Quanta gentileza a dela... — tentei manter a calma, mas minhas mãos suavam de tão nervoso. — Veio até aqui só pra me dizer isso?

— Sei que ameaçou Higusa e Kumiko — proferiu Ichika. — É bom que saiba que não ficarei calada quanto ao que aconteceu no interescolar entre você e Kirisaki... quer dizer, ao que não rolou, na verdade.

Por que é que as pessoas acham que fazer ameaças do tipo possam atingir qualquer um? Na realidade, o ideal é que nem se aproximem de mim diante de tantas vezes que escapei de seus planos ardilosos. Essa insistência é completamente fútil e irritante.

— Deixe isso pra lá. Nem mesmo a Kirisaki quer se lembrar disso, e você não quer envolvê-la, certo?

— E pensa que ligo pro que ela acha? — indagou a garota. — Você e as outras já nos atrapalharam demais, já passou da hora de dar o troco no principal culpado...

Ela caminhou em minha direção, carregada de um ímpeto que por mais que não me seja uma ameaça, ainda pode ser capaz de me causar inconveniência. Ao meu ver, não compreendo nenhum dos comparsas de Kumiko.

Higusa Amari foi aquela que se arriscou demais tentando atrair o antigo secretário do Conselho Estudantil Hiyatetsu Bara pra fora de cena. Ela não parece muito inteligente, então lidá-la não me foi difícil. Quanto aos outros, suas personalidades me são completas incógnitas, apesar de achar Todo Himura um cara metido, cheio de si.

Em relação a Ichika Yari, não conheço nada a seu respeito. Pra mim, é alguém com uma existência tão apagada que usa da presença de quem se aproxima como forma de conseguir o que deseja, como uma parasita. Será por essa razão que se mantém próxima de Kirisaki? Que coisa mais sem sentido...

Analisando a situação, estamos rodeados por pessoas de todos os lados. Essa garota se aproxima de mim sob um olhar gélido, como se ela estivesse congelada no tempo. Ela não usava um Yukata, somente vestes comuns do dia-a-dia. Seu cabelo castanho desbotado prendido num rabo de cavalo se movia de um lado a outro como um pêndulo, conforme pôs as mãos em seus bolsos sorrateiramente.

Ela pretende apenas vir me provocar?

— O que está fazendo? — Antes que pudesse reagir ao que posteriormente aconteceu, alguém interviu entre nós e agarrou o braço de Ichika que veio em minha direção, onde apenas pude enxergar borrões vindos de suas unhas.

A segunda garota que apareceu é mais velha que nós dois. Senjou Hana a afastou com o movimento do braço, fazendo-a recuar alguns passos.

— O quê?

— Pelo visto, você não deixa de ser uma enxerida, né? — retrucou Ichika, alterada. — Não sabe quando precisa ficar quieta no seu canto, Senjou?!

— Espero poder estar enganada sobre você, na verdade... pouco me importa o que pensa de mim. — Nossa veterana se manteve firme. — Sua interação era furar o olho dele, por acaso?

— E se for? Não estamos na escola, sabe... — Ela riu. — Aqui fora as regras podem ser facilmente dobradas, dependendo da situação ou do que seja.

— Você não pode estar falando sério...

Senjou a encarava horrorizada, sem saber como reagir. Parece que essa garota é muito mais do que apenas uma existência apagada por aqueles ao seu redor... que problema. Exasperei nervoso e avancei alguns passos pela veterana e segui em sua direção, sem hesitar. Já tive de arcar com um problemático em uma viagem que deveria ter sido tranquila, não quero que o mesmo aconteça hoje nessa ocasião.

— O que você...!

Antes que Ichika recuasse, agarrei seu braço e cravei suas unhas contra minha mão. Pressionei sua palma e a mantive numa pose baixa o suficiente para que não gerasse suspeitas externas. Ela grunhiu e tentou conter a imobilização, falha.

— Não era você tentando me ferir? Então, fique à vontade... — forcei ainda mais o aperto, sentindo as pontas das unhas postiças afundarem contra minha carne. A dor me atingiu, mas permaneci inalterado, ao contrário de Ichika que se contorcia, grunhindo.

— Shi... Shiroyama?! — Senjou ficou aturdida.

— Me larga! Está esmagando meus dedos! — exclamou Ichika. — Faça isso agora, senão eu vou gritar!

— Oh? Me pergunto se o que queria era apenas me arranhar... o que acha?

— Só queria... te intimidar, seu maldito...!

— Veja, só. Pelo visto fizemos a mesma coisa... — A empurrei de forma súbita. Abri o punho, em que filetes de sangue escorriam nos furos causados pelas unhas. — ...e conseguiu me atingir como planejou. Está satisfeita, agora?

— ...

— Sendo assim, suma daqui. Tenha certeza de que se houver uma próxima vez, não vou pegar leve.

Ela fitou a própria mão, simplesmente avermelhada. Grunhiu para mim e saiu correndo, desaparecendo entre a multidão. Observei o latejo em minha mão, em que cessou o sangramento. De repente, Senjou se aproximou e a cobriu usando um pano.

— Quem imaginaria que fosse fazer isso... você só pode ser um doido!

— Dei a ela o que quis... seu olhar indicou o quão determinada essa garota estava de querer me ferir... — comentei. — Obrigado. Se não fosse por sua ajuda, talvez a situação tivesse se tornado algo pior.

— Fala sério... nunca imaginei que o faria me dever um favor... o que se passa na mente dessa garota, afinal?!

Algo me diz que há muito nas aparências que tentam nos enganar, e que vários segredos conseguem ser tão encobertos que mesmo se observarmos de perto, podemos não conseguir ver. De qualquer forma, não devo mais baixar a guarda assim...

A palma ardia, mas com a bandagem improvisada de Senjou, ainda posso aproveitar o festival sem ter problemas. Ela me fitou, cautelosa:

— Não fui ver o interescolar, mas Kirisaki me contou tudo... até mesmo sobre o fato de ter recusado seu convite.

Em questão de segundos, minha mente vacilou e não tive como não ficar chocado, Senjou Hana veio justamente para conversar comigo sobre esse assunto? O que devo fazer?

— Eu...

— Shiroyama, primeiro de tudo... venho aqui te pedir pra que siga o conselho que ela deu. — Senjou me afuzilou. — Você não soube reagir da forma correta com minha amiga e ela se sentiu abalada..., mas, saiba que temos ciência de que nunca faria nada sério para magoar os outros.

— Entendo...

— Eu pensei em te apoiar com ela, até ver aquele desenho que fez no concurso de artes — continuou ela. — Sinceramente, não sei o que se passou desde que paramos de nos falar, mas há momentos que temos que parar pra pensar sobre nossos verdadeiros sentimentos.

— ...

— Não quis agir dessa forma pra realmente pedir isso... não te pedirei nada além do que disse. Dê espaço para Kirisaki e... sei que as circunstâncias podem ter acarretado no resultado, mas...

— Claro, você tem toda razão.

— Hein? Não vai querer discutir sobre isso?

— Não, na verdade... nem mesmo quero me aproximar mais dela. Pode ser estranho o que vou dizer, mas achava que interagindo com Kirisaki pudesse ter uma noção de como enxergar a mim mesmo. Errei feio nessa decisão. E do mesmo jeito, quero evitar de fitá-la da mesma forma.

— Oh, compreendo...

— Então, o melhor é seguirmos caminhos diferentes. Ainda estou abalado com tudo o que aconteceu, mas não foi culpa dela... nem quero comentar sobre méritos ou deméritos, tenho certeza de que ela deve querer o mesmo.

— Agradeço pela sua compreensão. Em segundo lugar... peço que tenha cuidado com Ichika, ando tentando conversar com Kirisaki pra se desvencilhar de sua amizade, mas é como se ela simplesmente não enxerga no quanto essas pessoas podem ser ruins.

— Bom, continue tentando convencê-la. Concordo plenamente com você...

Nossa relação foi conturbada desde o início, e já bati o martelo de que nunca mais tirarei informações vindas dela. Senjou Hana curvou-se rapidamente e se retirou. Fitei minha mão ferida e conferi as mensagens recém recebidas no celular, tornei a andar ao ver que o número de pessoas cresceu exponencialmente.

***

Na programação do evento, os fogos de artifício começarão às 20h. Apesar de ter chego no horário previsto, terei de esperar um pouco mais de uma hora até que as garotas cheguem.

[Shiro, estamos terminando de nos arrumar... só que o trânsito está terrível por aqui! Vamos demorar mais do que o esperado...] — Himegi.

[Alguma previsão se todas vão chegar atrasadas para os fogos?] — perguntei.

[Vamos tentar sair daqui o mais rápido que conseguirmos! No mais tardar, é capaz de chegarmos aí às 19h30!] — Chitose.

O relógio constava 18h25, se elas se apressarem em pegar o trem no horário mais próximo podem conseguir chegar a tempo.

[Boa sorte, então. Estou aqui na espera de vocês.]

Pelo visto foi uma boa ideia ter saído de casa mais cedo... quer dizer, mais ou menos. Nunca interprete os sinais da vida como bons ou ruins, já que no meu caso só me trouxe problemas!

Dado o recado a elas, tornei a andar pelo ambiente, ainda atento de não me deparar novamente com o grupo de Kirisaki — ou mesmo só a Ichika... —, me direcionei a um ponto de encontro combinado de imediato com outra pessoa presente ali.

— Que bom que estávamos próximos, é muito fácil de se perder em uma multidão como essa...

Hiyatetsu Bara se manifestou ao me ver chegando. Combinamos de nos encontrar próximo a escadaria da entrada daquela estação. Por mais que tivesse mantido o contato, a última vez que o próprio quis me chamar para conversar foi logo após o início das férias, então se passou bastante tempo para obter novas informações.

— Já tive o desprazer de me deparar com uma das comparsas de Kumiko hoje... fiquei surpreso de ter vindo me chamar justamente nesse dia.

Quando retornei de Yokohama, pedi para Hiyatetsu se encontrar comigo assim que obtivesse mais informações de Kumiko e Mitsuhara Kobune. Levou mais de um mês pra que encontrasse mais informações?

— Vou direto ao ponto, Shiroyama... — Ele se manteve encostado na parede da escadaria, com os braços cruzados. — Sobre Kumiko, fiquei na espera durante esse tempo inteiro pra ver se realizava qualquer ação suspeita e, mesmo que tenha dito antes a você que ela está agindo diferente, parece que andou discutindo sobre algo interessante.

— Certo, e o que seria?

— Ela indicou Todo Himura a candidato para primeiro secretário do Conselho Estudantil... — proferiu. — É quase uma certeza de que no segundo semestre já começará a agir após o anúncio oficial de sua ingressão. Foi o próprio vice-presidente que me disse, pessoalmente.

Como esperado de Hiyatetsu, sua rede de informações é bastante competente. Não conheço o vice-presidente, mas devido a presença de Kiboumori Suzune, duvido que sua influência seja baixa.

— Parece que ele quer falar com você, o vice-presidente... — continuou Hiyatetsu. — Shindo Kurata, é um conhecido meu de longa data. Quer saber como é o responsável por me tirar do Conselho...

Apesar do tom amargurado de sua voz, não me importei em como andam me chamando pelos cantos. De certo modo, foi o que realmente aconteceu, indiretamente.

— Pelo visto, teremos mais trabalho nesse retorno às aulas do que o imaginado... e sobre a supervisora?

— Os membros do Conselho Estudantil andaram interagindo com ela, ultimamente. Sabemos que é devido o Festival Esportivo, mas ainda foi algo incomum para eles. Geralmente, a supervisora é sempre a última a saber dos detalhes dos eventos...

Não faço ideia do que essa mulher é capaz, dada sua atitude comigo em nossa última interação, o que poderá inventar de usar nesse festival de esportes? Provavelmente, a resposta para tal será em investigar suas atividades externas da escola.

— Parece que ela alugou equipamentos de vídeo para gravarem as atrações do evento — prosseguiu Hiyatetsu. — Segundo Shindo, será pra estimular no uso do marketing e divulgação nos canais oficias da escola a todas as instituições de apoio. Bom, foi o que pude descobrir nesse meio tempo.

Então, o fato dela estar envolvida com alguma clínica é devido a ser algum patrocinador? Se for realmente visto desta forma, minha zona de busca pode ser menor do que temia.

Nisso, peguei o celular e o mostrei uma foto.

— O que é isso? Um uniforme?

— Exatamente. É o próximo item que pretendo saber mais a respeito: o que uniformes da Escola Jimbocchi foram fazer em Yokohama.

— Escola Jimbocchi? Não é uma escola da cidade de Kawasaki?

— Sim. Quero investigar o local, se possível — guardei o celular. — Claro, só poderemos fazer isso quando as aulas retornarem...

O fato de ter sido um ex-estudante de lá me facilitará as coisas. O melhor a ser feito seria deixar aquele assunto sobre Oguro de lado, mas a artimanha de terem usado uniformes falsos me intrigou profundamente. Veja, Hiyatetsu nem percebeu que a vestimenta vista na foto não era a oficial. Qualquer um seria enganado facilmente.

— Bom... se é isso o que pretende, o ajudarei com o que puder. Sei que deve ter boas razões, então não vou questionar...

— Obrigado, ajudou bastante. Contarei com sua ajuda, então. As informações que trouxe foram muito úteis.

— Hum? Tem certeza? Ainda não consigo imaginar que tipo de ajuda essas informações podem te trazer...

— Não se preocupe. E peça para o vice-presidente Shindo vir falar comigo quando puder... vamos tentar discutir todo tipo de coisa, você incluso.

— Oh... agradeço!

O objetivo de Hiyatetsu é tentar obter de volta o cargo no Conselho Estudantil, assim como Chinatsu. Igualmente, deseja dar o troco em Kumiko por ter sido usado como um mero peão. Não tenho objeções de suas intenções, e meu papel no meio disso tudo é planejar a melhor forma que seus objetivos se cumpram.

***

O relógio consta 19h40, e quando já ficava preocupado em saber onde estavam, as garotas surgiram do interior da estação.

Sinceramente... não sei por quanto tempo fiquei boquiaberto sobre como ficaram todas lindas de Yukata. Cada uma trajou uma estampa diferente em seus quimonos, assim como suas cores. Yonagi tomou a dianteira do grupo com seu traje azul com cerejeiras, seu cabelo foi ajeitado em um coque lateral e uma pequena haste imbuído com um lírio foi usado como base. Sua maquiagem realçou a cor de seus olhos, bochechas e lábios num tom salmão-avermelhado.

— Ah... — balbuciei, aturdido. Subitamente, ela desviou o olhar e fiz o mesmo por reflexo.

— Que cara de tapado, Shiroyama! — exclamou Kuroi. — Todas nós o encantamos, hein!

A garota usava um yukata marrom com flores e ornamentos amarelados, uma rosa pendeu em seu cabelo preso.

— Tadinho, mas estamos lindas mesmo! — Chinatsu irradiava com seu traje dourado e detalhes prateados. — Não é mesmo, Shiina?

— Quero comer polvo, estou faminta... — Os olhos mornos de Shiina contratavam com o quimono verde glacial.

— Ah, sim. Estamos morrendo de fome! — Himegi assumiu a dianteira trajando uma veste vermelha. — Vamos logo, Shiro!

O lugar ficou tão lotado pelo decorrer do tempo que considerei que demoraríamos nas filas, mas me enganei. A maioria das pessoas deixaram as barracas para arranjarem locais específicos à vista da queima dos fogos. O grupo rapidamente se dispersou atrás das fontes de comida, ao passo que as acompanhei sozinho.

 

Pelo visto vários alunos da escola se encontram por ali, já que consegui reconhecer alguns devido ao rosto (não lembro do nome da maioria). Dada a liberdade, posso me desfrutar em observar os arredores com tranquilidade, até que encontrei duas figuras juntas.

— Que bom que conseguiu chegar a tempo! — exclamou Kuroi para Rentaro, que acabara de surgir.

— Desculpe... os trens estão péssimos! Te fiz esperar muito?

— Não, também sofremos com a demora das linhas. Chegamos no mesmo horário...

Fiquei surpreso de vê-lo por aí... espera, ele não é residente de Yokohama? E pelo fato de ter vindo falar com Kuroi primeiro... não veio por causa de Yonagi? Será que os dois haviam marcado de se encontrar de antemão? Se não soubesse do fato de que já se conheciam, teria ficado chocado com tal revelação de final de volume...

Eles conversavam animados, então decidi não me aproximar. Na verdade, não quero ser visto por Rentaro... mesmo sem entender o porquê de manter a distância. Mas deve ser o meu inconsciente agindo no modo automático, já que ao redor daqueles dois parecia ter uma placa dizendo “NÃO SE APROXIME!”.

Por isso, tomei outra direção e voltei a minha atenção às barracas. Sim, hora de comer doces ou salgados! Vejamos, onde estão as lulas fritas e o algodão doce?

Enquanto procurava inutilmente por algum caminho contrário que me deixasse longe do casal, me deparei com Yonagi absorta ao céu noturno acima de nossas cabeças, não tive a intenção de me aproximar, mas ela me notou chegando.

— Ah, Shiroyama.

— ...

Se desconsiderasse as sessões de estudo (em que mal interagíamos por causa dos outros), havia passado mais de um mês desde aquele incidente. Muitos pensamentos passaram na mente: em como ela deve ter ficado chocada com a minha aparição sucinta, ou ficado com raiva em algum momento por causa da atitude que tomei, ou ainda que não quisesse falar comigo para não lembrar do que aconteceu...

De todo jeito, tudo levava ao cenário em que era melhor não aparecer e não interagir.

— Já faz algum tempo, não é...

Mas apesar disso, ela esboçou um sorriso e uma voz tranquila. Parece que está emotiva com alguma coisa, mas não imaginei o que seria naquele momento. Responder algo apropriado aqui seria o melhor a se fazer:

— Verdade, agora que lembrei... parabéns pela sua promoção.

Dias atrás, ela realizou a cerimônia de transição em um dojo de Karatê. Nunca imaginei que Yonagi era quase uma faixa preta! Mesmo tendo dito algumas palavras, fazer o elogio pessoalmente é realmente algo diferente de qualquer outra experiência.

Resolvi começar por algo corriqueiro, em vez de trazer assunto à tona de uma só vez.

— Ah... obrigada. Oh, nunca havia dito que praticava karatê antes do exame final, certo?

— Bem, tem razão... — concordei. — Tentei aprender quando era criança, mas nunca tive tempo para isso.

— É mesmo?

— Não consegui nem mesmo decorar o Shoudan... — ri, nervoso. — O meu irmão, por outro lado, conseguiu chegar até a faixa laranja. Ele é bem habilidoso.

— Isso é incrível... — expressou Yonagi. — Fico aqui imaginando como seria treinar com você no mesmo dojo. Iria afastar todo mundo com o seu jeito de zumbi, sem sombra de dúvidas.

— Você diz isso, mas eu poderia desenvolver um novo estilo de combate que levaria a melhor quando alguém desdenhasse de como sou!

— Interessante — Ela riu. — Mas pode tentar quais artimanhas que tiver, nunca iria desdenhar de um oponente à minha frente.

— Eu já correria desse seu olhar afiado que pode esmagar minha alma...

— Você disse alguma coisa? Não escutei.       

— Não... nada!

Ainda bem que há um fluxo considerável de pessoas nos rodeando! Viva o festival por ser barulhento! No entanto, Yonagi se aproximou e mesmo com a voz reduzida, suas palavras me foram totalmente compreendidas:

— Então é por isso que veio me ajudar? — Ela me indagou, mantendo sua voz tranquila. — Por que eu não iria recuar?

— Por que você poderia recuar — disse. — Mas não o fez porque era com você, não com outra pessoa.

— ...

— O meu medo foi de que tentassem algo injusto... — fitei as barracas ao nosso redor. — Que não tivesse nada que pudesse fazer senão contar com outra pessoa.

— Devo dizer que estou aliviada em ver que não possui nenhum ferimento... — expressou Yonagi. — Só esses olhos caídos que realmente me preocupam...

— Ei, esses olhos são assim mesmo! E não estão tão ruins quanto antes, viu!

Aquela conversa sem sentido poderia continuar para sempre sem um final. Mas fiquei surpreso, ela por acaso andou me reparando com essa preocupação durante todos esses dias?

— Achei que estivesse frustrado de alguma forma por causa do que aconteceu... — Ela murmurou.

Fiquei sem o que responder naquele instante. Apesar de tudo, essa é a presidente do clube de literatura, Yonagi Kaede. Mesmo que seja reservada a seus próprios assuntos e interesses, ela ainda demonstra preocupação com aqueles ao seu redor.

— Ah, sim. Eu fiquei... e como.

Poderia deixar dito aqui vários tipos de desculpas. Omitir desejos e opiniões pode ser tão simples quanto mudar a página de um livro, mas também há o caso de não poder encontrar as mesmas palavras de uma página a outra. Por essa razão, decidi ser verdadeiro.

— Por um momento, pensei que a viagem sucinta tirada no começo de minhas férias seria arruinada por um cara qualquer.

— ...

— E onde você entra nessa frustração, é o que quer me perguntar? — continuei. — Simplesmente, em lugar nenhum.

— Hein...?

— Tudo pelo qual me frustrei é sobre um cara idiota que cometeu vários erros e quis estragar os planos do clube, apenas isso. Por outro lado, agi para proteger uma garota que é quase faixa preta em karatê e que luta melhor do que eu. Isso não é um pouco injusto? Com certeza tem algo fora do lugar aqui.

Yonagi riu alto da minha declaração autoproclamada séria. Foi uma ação tão genuína que me deixou sem reação.

— Acho que teria sido ainda mais engraçado se depois de tê-los vencido, ainda te bater por engano por confundi-lo com um dos punks! Há! Há! Há!

— Infelizmente, tem toda razão.

Nós rimos juntos.

— Então, posso pensar em te dar algumas aulas. O que acha, senhor Faixa Branca?

— Me recuso. Você me mataria... — cruzei meus braços, convicto. — Mas sinto que poderia ganhar de você em uma corrida.

— Oh, isso é uma aposta? Você não parecia tão rápido em Yokohama.

— Acontece que correr se tornou minha especialidade! — respondi, triunfante.

— O Festival Esportivo está a um mês de acontecer e a única coisa que treinou foi a resistência de correr, Shiroyama?

— Não precisa colocar desse jeito, sabe?! É um feito tão insignificante assim?!

Não importava como via isso, fui derrotado. Já tinha anunciado a derrota sem mesmo nada ter acontecido antes?

Deixando aquela discussão inútil de lado, Chinatsu, Shiina e Himegi haviam se aproximado. Kuroi e Rentaro apareceram logo em seguida, na qual ainda estou surpreso dele estar aqui. Não foi mesmo a Yonagi que o tinha chamado?

— Já que todos nós nos juntamos, por que não tiramos uma foto? — expressou Chinatsu, estendendo o seu celular.

As outras garotas gostaram da ideia e começaram a fazer poses, enquanto eu e Rentaro estávamos no meio delas.

— É bom vê-lo novamente, Shiroyama.

— Digo o mesmo, Rentaro... — comentei, indiferente. — As primas de Yonagi não vieram também?

— Acha que estamos sempre juntos, é? — gargalhou Rentaro. — Desta vez vim sozinho pra um assunto em particular...

— Entendo. Bom, seja bem-vindo à Chiba... — continuei. — Achei que fosse o tipo de pessoa que só se importasse com esportes.

— Ah, gosto de participar de festivais como esse, até mais do que praticar esportes.

— Um loiro social como você não poderia dar outra resposta do que essa, mesmo...

Rentaro não me respondeu por fazer uma pose para foto.

— Loiro social? Há! Há! Você é hilário... — brincou ele. — Bom, tenho minhas razões para ter vindo aqui.

Apesar de estar sorrindo, seus olhos estão sérios. Parece que todos guardam um ou dois segredos, hein...

As garotas parecem ter nos ignorado e resolveram tirar várias sequências de fotos juntas. Yonagi ficou entre elas sem saber o que deveria fazer.

— E você? — indagou Rentaro. — Foi você que a ajudou naquela noite, não é? O que realmente aconteceu?

— Eu? Não fiz nada... — respondi de imediato. — Quando sequer a encontrei, ela já tinha cuidado do problema. Não fiz nada de especial, como pode ver.

— Oh, entendi.

Até cogitei que fosse insistir em querer saber do que aconteceu, mas Rentaro simplesmente virou o rosto. Talvez até já soubesse, dada as circunstâncias, mas já é algo que ficará apenas como uma suposição para mim e não quero que passe disso.

Nós nos afastamos, e a visita às barracas continuou até os fogos de artifício começarem a queimar pelo céu, irradiando luzes multicoloridas para todos os lados, emitindo sons como se fossem pipocas eclodindo. Nós combinamos de irmos a um local com menos gente para vermos o espetáculo. Subimos uma colina próxima e ficamos em silêncio, admirando o show de faíscas cintilantes circundarem pelos céus. Rentaro permaneceu ao lado de Kuroi, em que não paravam de se fitarem, conversando. Vê-los assim me recordou de Teru, mas não há nada que posso fazer por ele no momento.

Senti um leve puxão em minha camisa, da qual uma Yonagi desajeitada se agarrou levemente, tirando os tamancos de seus pés.

— Desculpe... eles começaram a me machucar e...! — Ela perdeu o equilíbrio subitamente e a mantive em pé ao segurar seu braço. Nossos rostos ficaram absurdamente mais próximos que a ação de poucos segundos pareceu durar por muito mais tempo. Um aroma doce surgiu em meu olfato, a parecer pelo fato de estar próximo do pescoço dela.

— Sem problemas... — soltei seu braço sorrateiramente, enquanto não chamamos a atenção das outras garotas. Yonagi se afastou de mim e foi pairar ao lado de Himegi. Foi por pouco... meu coração bateu tão intensamente pelo seu rosto próximo e seu perfume que... tive de conter o impulso de alguma ação imprudente!

O show luminoso perdurou por mais alguns minutos, até se dar por encerrado. Saímos do Centro Makuhari e nos reunimos para a alameda principal em frente à estação. Aparentemente, Shiina e Kuroi também ficaram com os pés inchados por causa dos tamancos, então eu e Rentaro fomos a uma farmácia local pegar band-aid.

Resolvemos ficar contemplando o início da noite em um banco na praça em frente à praia. Como o sol já se pôs, a brisa dali está gelada e refrescante. Aquele frio me fez lembrar que o fim do verão se aproxima, como se tivesse recebido um abraço quentinho e sua falta me fizesse tremer.

Sim, também vou sentir saudades de você, Verão!

— Por que está fazendo essa cara tristonha, Shiro?

— Estou apenas prestando minhas condolências ao fim dos meus dias de descanso. Quer dizer... ei! Espera aí!

— O... o que foi, tão de repente?

— Tivemos dois meses de férias, certo?! Era para ser um longo período de descanso para que os estudantes possam relaxar! E, no entanto, isso não aconteceu comigo! Acho que estou ainda mais carregado de tarefas do que antes das férias!

— Nunca o vi falar tanto... — murmurou Yonagi. — Você conseguiu falar direto por quatro linhas...

— Não precisa quebrar a quarta parede desse jeito, sabia?!

Himegi parecia exaltada com alguma coisa, mas a ignorei. Em poucos dias terei aquela rotina mortal de volta, da qual não tenho escapatória.

Senhor Verão, volte aqui!

Apesar da minha frustração, as garotas acenderam fogos de artifício comprados numa loja de conveniência e tornaram a correr pela praia. Conforme a noite tomava forma, elas pareciam fontes luminosas se movimentado de um lado para outro.

Rentaro as acompanhava, mas notei que Yonagi se afastou delas. Me aproximei em silêncio, continuando a verificar o pega-pega animado dos outros.

— Nunca imaginei que uma realidade se tornaria diferente em apenas seis meses...

— Hum?

— Estar presente em um clube por tanto tempo te faz perceber coisas do tipo... — continuou Yonagi. — É interessante acompanhar as pessoas durante tanto tempo e aprender a compreendê-las.

— Concordo.

— Mas as coisas estão certas desse jeito, mesmo? — murmurou. — Nem tudo está nos eixos. Na verdade, parece que muitas coisas estão piores do que antes.

— Aproveitar o momento de agora já não está bom? — A indaguei. — Se há tantas coisas que podemos aprender observando, então esta situação pode ser uma delas.

— Se diz isso, é por que também está passando pela mesma coisa, não é?

— Isso mesmo — continuei. — Eu estive me questionando durante todo esse tempo se era uma coisa boa, e muitas vezes tropecei nas mesmas respostas, tentando enxergar algo além, mas posso só estar ansioso pelo futuro.

— O futuro te assusta?

— O futuro me anseia — complementei. — É intrigante e me deixa ansioso. Por isso, quero descobrir o que pode estar prestes a acontecer. Mas talvez esteja conseguindo poder aproveitar melhor os momentos no presente, quem sabe.

— Sinto que possa estar conseguindo a mesma coisa.

Aquilo era algo que nunca saberíamos com clareza. Ficar parando para pensar sobre o futuro é assustador por si só. Se for para pensar a respeito, nosso tempo juntos relativamente está se esgotando. Nossas decisões estúpidas como estudantes do ensino médio logo se tornarão irrelevantes em nossas vidas adultas, e essa realidade se aproxima a cada dia.

Porém, não é hora de pensar sobre aquilo. Esses pensamentos foram jogados ao fundo de minha mente, guardados sob uma gaveta que sei que será aberta em um futuro próximo.

Fitei aquela imensidão obscura acima de nós, certo de minhas decisões.

Já era a hora de voltar para casa.

Aparentemente, Rentaro ficará na residência de Yonagi. Andamos até a estação, e então eu disse:

— Preciso fazer algumas coisas primeiro, então podem ir sem mim.

— Tudo bem, Shiro! — disse Himegi, acenando para mim. — Nos vemos na escola, então!

— Até mais, Shiroyama. Obrigada por toda sua ajuda! — agradeceu Chinatsu.

— Nos vemos na escola... — comentou Yonagi, acenando para mim com um sorriso tímido.

“...há momentos que temos que parar pra pensar sobre nossos verdadeiros sentimentos.”

As palavras ditas por Senjou atingiram minha mente ao me ver atraído por aquela que direcionou sua despedida nessa direção. Tive uma súbita vontade de me aproximar, mas a hesitação imediata assegurou os segundos necessários para a ação dos outros se apossar do meu campo de visão.

Devolvi o cumprimento para todos e me distanciei da entrada da estação. Apesar de ser verão, o tempo está mudando. Uma brisa gelada veio com a chegada da noite, se não evitasse os lugares abertos poderei pegar um resfriado em algum momento. Se há uma coisa que me acostumei após ter feito tanta caminhada durante aquele tempo foi que era um bom momento para pensar.

Suspirei, pesaroso. Há quatro meses atrás, não me imaginava tendo tais interações com tanta intensidade. Isso não esteve dentro de meus planos, definitivamente foi um erro de cálculo. Poderia já tirar as minhas conclusões sobre tudo que experenciei até ali, mas decidi aguardar um pouco mais.

Dali em diante, as coisas podem nunca mais serem as mesmas. Cheguei a temer que não possa mais conter o meio de contato pra deter possíveis consequências.

Nisso, meu celular vibra no bolso. Ao pegá-lo, vi que recebi uma nova mensagem.

Assim como o tempo está lentamente descongelando, muitas coisas que ficaram no passado resolveram retornar aos poucos para me atormentar.

[Como está, irmãozinho estúpido?]

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