Volume 1
Prólogo: A Impressão do Vazio Sideral da Sociedade
— A importância da sociedade se faz presente no que constituem como valioso. Mesmo na Terra ou espaço, as comparações são as mesmas. Todos querem o especial — acima de qualquer coisa — e excluem o que estiver próximo de si, considerados falhos. Qual o verdadeiro valor de cada ser humano quando são menos que estrelas?
— Hisashi Masayoshi.
O trem apertado percorria seu caminho e tudo do lado de fora era distorcido pela sua velocidade. A cada vez que observava aquele cenário externo mudando, sentia que minha vida parecia estar sofrendo da mesma maneira, como se aquele veículo não parasse em nenhuma estação e continuaria correndo em direção nenhuma. Tentava — ao que parecia — cruzar o limite daquele planeta e se dirigir para outro lugar.
Nem mesmo o leite ou sopa de missô desaceleraram o ritmo que minha mente latejava após ler aquela frase antes de sair... aquele posfácio se repetia, dado que eram falas do meu autor favorito. Havia relido sua trilogia e finalizado seu último volume na noite anterior.
Sob tal pulso acelerado, iniciaria uma nova rotina em uma instituição que esperava não ser desinteressante como as que tinha presenciado durante meu período do ensino fundamental. Era um novo ano letivo para o meu ensino médio em seu segundo ano.
No entanto, deveria ter sido da forma como todo estudante transferido daria um novo passo em um local novo de estudo..., mas tive de parar na sala dos professores para entregar um novo relatório de entrada.
— Ah, você chegou... — falou uma professora com longos cabelos loiros em um rabo de cavalo. — Trouxe o novo relatório pronto?
— Sim, está aqui — disse sonolento ao entregar o papel preenchido sob a mesa da professora.
Dado cinco minutos de leitura aquela mulher voltou a me encarar: — Vai ter que ficar até refazer isso daqui, viu.
— De novo? — cocei a nuca. – O que foi que errei desta vez?
— Algo que move o ser humano não é algo como desejos de união, nem relacionamentos superficiais e sim seu egoísmo de querer ser maior que todos a sua volta. Se para estar com as pessoas for considerado algo falso, então prefiro estar sozinho para ser verdadeiro comigo mesmo... — Ela leu parte do que havia escrito naquela folha com um toque de ignorância: — ao menos escreveu mais do que na outra vez...
No dia anterior houve a cerimônia de abertura do calendário letivo e, além das apresentações costumeiras de época os alunos transferidos teriam de entregar seus relatórios de entrada na secretária.
Sob meu caso, interrompi o preparo da documentação necessária naquela noite para observar aquele céu estrelado como sempre fazia dentre tantas vezes. Emoções indescritíveis atravessam o meu ser e se transbordam quando surge a vontade de tocar naqueles pontos luminosos que condecoram aquele manto escuro.
E nessa ocasião não consegui dormir, tentando entender as diversas incertezas que me rodeavam naquela transição de transferência. De fato, tive momentos turbulentos antes daquela decisão que alteraria a trajetória que minha vida tomaria: — Como queria estar em um satélite...
Quando dei por mim estava dormindo sob o relatório e só notei quando escrevi aquela única frase apenas ao chegar na escola Daiichi, local onde iria frequentar o restante do meu ensino médio.
— Os alunos da Jimbocchi são todos avoados como você, por acaso? — indagou a professora.
— Acho que não preciso responder, né? — retruquei. — Foi apenas um descuido meu... é assim que escolas de alto nível se portam?
— Seu boletim é muito bom, mas apesar do uso de palavras parece que sua comunicação é péssima... falando nisso, recebeu o material de apoio antecipado?
— Sim... e gostaria de dizer que poderiam não ter exagerado em tantos deveres de casa mesmo sendo uma escola de elite... — resmunguei, já que boa parte da culpa de não ter dormido direito foi por culpa de tantas atividades.
Após mais algum tempo permanecendo naquela sala corrigi o relatório pela terceira vez. Aquela mulher suspirou ao ler o novo texto: — uma escrita normal após tantas anormalidades. Você é meio peculiar, já te disseram isso?
— Algumas vezes...
— Você subitamente escrever algo sobre satélites soa bem solitário, não acha? Relações sociais são muito importantes, sabia?
— Só para quem realmente esteja disposto a isto — disse, sem rodeios. — E não acho que meu gosto pessoal e minhas relações combinem de alguma forma...
— Você age de acordo como um autêntico introvertido deve agir, então seus gostos pessoais podem refletir em suas ações externas, lembre-se disso! — explicou a professora.
— B-Bem, estou dizendo que a maioria das pessoas extrovertidas não sabem estabelecer o melhor tipo de relação com quem seja mais tímido, entende? — continuei a falar com a garganta seca. — Não tenho interesse em querer conversar com quem não entenda minhas razões.
— Bom, com esse tipo de diálogo e pelo tipo de pessoa que você aparenta ser dá para ver em qual tipo se encaixa — indagou a professora. — Aliás, esta máscara que está usando é a sua medida para evitar conversar com os outros em sua classe? Não me parece que está resfriado ou algo assim.
Meu corpo se enrijeceu naquele instante. Será que ela começaria a me julgar como um incapaz por estar agindo daquela maneira?
— Já entreguei o relatório correto... posso me retirar, não é? — Suspirei ansioso.
— Parece que estava certa... — exasperou a professora cansada. — Escute aqui. Isso pode funcionar em um ou dois dias, mas não pense que vai conseguir manter essa ignorância pra sempre. Não precisa agir desta forma para evitar de falar com os outros...
— As pessoas definem as coisas pelas formas como aparentam ser — ressaltei. — Se alguém inteligente for feio, a sociedade o julgará por isso e até que se prove o contrário, terá muito mais esforço em se adaptar com os padrões do que deveria ser normalmente.
— Você não está errado já que isso infelizmente acontece com frequência, mas... pretende estender essa linha de pensamento até quando for mais velho?
— Só penso em me preservar... e é o que provavelmente vá acontecer mesmo depois que me formar — continuei: — Por isso quero um trabalho em que ninguém me julgue pela minha aparência e pela maneira como aparento ser.
— Que baboseira. Esta ideia não passa de um conto de fadas, viu?! Se pensa que existe um serviço deste jeito, você endoideceu! Resta dizer que possui alguma “síndrome do ensino fundamental” ou algo assim...
— Você está partindo para a implicância agora... — grunhi. — Não acordei muito bem e vim de máscara, só isso.
A professora suspirou novamente.
— Que seja. Você tem razão... já concluiu seu relatório. Pode ir. — Ela cruzou os braços e concluiu: — Sou Harashima Miyagi e como professora de ciências sociais preciso pegar no pé de atrapalhados como você. Mas, talvez seja um pensamento interessante apesar de extremo. Isso te faz soar um pouco...
— ...autoconsciente? Nem um pouco — disse, soando mais debochado do que esperava. – Sou apenas um moleque que não quer se importar com os outros além do necessário.
— Eu diria pessimista pelas suas respostas terríveis, mas há ainda um pouco de autoconsciência de sua parte querer procurar o melhor para si.
Eu me abaixei para pegar a mochila e avancei para os corredores, mas ela me chamou novamente: — Neste caso, você não estava tentando parecer maneiro com seu jeito reservado e sim com suas palavras impactantes? Há realmente pessoas que criam relações mais sólidas pela sua forma de se expressar do que aqueles que criam relações de aparência.
— Bem... é o que dizem, né? Você consegue pescar os peixes pela boca, então por mais que não tenha boas qualidades de aparência posso ser interessante de outras formas.
— Apesar de que mesmo com as suas intenções, a posição social ainda vale muito, o que não surtiu muito efeito, não é?
Agir como um preguiçoso chamou atenção da supervisora, então supus que as minhas ações desleixadas haviam me deixado em apuros. Mas talvez não fosse algo muito complexo que uma meia dúzia de palavras não acalmassem a situação.
— Então... esteja preparado — concluiu a professora.
— Se apenas com a visão as pessoas definissem o status uns dos outros então o mundo estaria completamente perdido. Quando se começa sempre por baixo do que se esperam isso fica cada vez mais nítido.
Ainda com uma atitude deplorável me inclinei para fechar a porta da sala dos professores, onde podia jurar ter visto a expressão de surpresa da professora que parecia pensar algo como: — Ele estava falando de como a sociedade o vê ou estava falando dele mesmo?