Our Satellites Brasileira

Autor(a): Augusto Nunes


Volume 1

Capítulo 4: Afinal, Takahashi Kuroshima fala bem ①

Naquelas duas semanas em que comecei a frequentar as aulas, meus problemas de comunicação se tornaram não apenas um limitador para mim, mas também uma característica de ser quieto por conta da máscara.

Takahashi e seus amigos Kuwasabe, Nana e um tal de Ota sempre me cumprimentavam chamando pelo meu nome e complementavam com um “zumbi escritor” já acostumado com aquele apelido. Era uma relação da qual não sabia se podia chamar de amizade por não ser próximo deles e nem sentir algo próximo àquilo.

Nossa relação se conectava através das informações do jornal e em se pudesse manter como uma fonte de dados útil. A julgar pelas suas interações constantes nossa comunicação iria se manter até que seus interesses fossem saciados, por mais que soubesse que não poderia obter tais informações com tanta facilidade assim. E, por mais que eu odiasse tal coisa, não podia fazer sozinho.

Ei, sou solitário, não um faz-tudo. Se você pensa que sou aqueles protagonistas de filmes e séries escolares que faz milagres apenas com a dedução e estalos de dedos está redondamente enganado.

Se devo pedir ajuda seria para aquele grupo interativo. Claro, supus a partir dos nossos momentos curtos de cumprimento que iriam me ajudar. Talvez para Takahashi isto se tornasse algo interessante, mas...

— Minhas pernas estão tremendo! Não consigo ir até eles e falar!

Eu dava batidas constantes nas pernas, mas não paravam de tremer. Não era do meu costume incitar conversas com poucos conhecidos... seria aquilo o que chamam de sintomas de sociopatia? Tal como foi com Yonagi tinha certeza de que agiria normalmente se tratando de negócios ou conflitos!

No entanto, era fácil falar do que fazer. Decidi conversar com eles uma outra hora quando estivesse mais tranquilo para discutir minhas ideias. Saí da classe no intervalo para comprar o usual cappuccino na máquina de bebidas e ao retirar a lata do compartimento quase me desequilibrei por levar um chute na perna. Ao me virar, me deparei com a professora de braços cruzados me fitando com seus olhos afiados.

— Ah...

— Está com tempo para conversar, Shiroyama? — indagou ela.

***

Estávamos na sala dos professores. Havíamos nos sentado um de frente ao outro, solvi um pouco do meu café e o deixei em cima da mesa de centro.

— O que houve, professora? — perguntei.

A professora Harashima suspirou um pouco e me fitou atentamente.

— A semana já está terminando e o prazo também. Yonagi está tendo que lidar com dezenas de temas sobre os referenciais históricos e por conta da pressão de completar tudo o quanto antes se adoeceu e não veio hoje.

— Espera! O quê?! Dezenas de temas?! Não era apenas um texto autoexplicativo sobre os referenciais históricos? E isso já tomou muito esforço dela...

— A julgar pela sua cara você realmente não soube de nada...

Esmurrei o sofá de raiva. Agora tudo fez sentido. O clube de jornalismo reuniu várias antologias, Kumiko Horie disse sobre usar outros métodos para vencer Yonagi, enquanto ainda escrevia temas variados diariamente e ainda realizava a mesma pesquisa... aquilo se descontrolou em um patamar muito mais elevado do que sequer imaginei.

— Se a Yonagi não puder continuar, então isso vai ser vitória do...

— Não quero declarar nada, pois confio em Yonagi. Ainda não acabou... — Ela me interrompeu de imediato. Sua atitude me acalmou por ter me equivocado, apesar de ainda me sentir assustado em sua presença...

— Como assim? Sem ela o clube de literatura não pode continuar, além disso, eu...

Ia continuar falando, mas notei onde a professora quis chegar. Se Yonagi não podia continuar eu que deverei assumir aquela responsabilidade como membro do clube, apesar de não estar há algum tempo participando das atividades. Tinha me esquecido que havia este detalhe.

— Você entendeu rápido... — suspirou a professora fazendo pose. — Neste caso, não tenho escolha senão deixar tudo isso com você caso ela não consiga. Não imaginei que as coisas poderiam chegar nesse estado.

— No fim das contas, ela ainda é um ser humano...

— Tem razão. Admito que me precipitei em alguns pontos, mas sempre é bom termos um plano B. No caso, seria você.

— Você fala isso como se eu fosse a última opção confiável... isso machuca.

— Não diga isso! Não é como se fosse exatamente isso, não é? —Ela começou a dar tapinhas nas minhas costas e a rir envergonhada. Fala sério, se isso não fosse uma desculpa o que mais deveria ser?

Eu parei para pensar um momento e analisar a situação. Se fosse mesmo aquilo a Yonagi poderia estar ilesa de alguma forma. Assumindo o seu lugar poderia lidar com a Kumiko sem me preocupar com alguma consequência séria.

Mas aquilo era o certo a se fazer?

Ao olhar para aquela professora esperando a minha reação sobre a notícia, tive mais certeza de que o que escolhesse recairia sob o alcance.

Porém, decidi impor mais a minha própria situação naquela escola no jogo: — Se você fala que isso não é uma desculpa há pelo menos uma razão maior para que isso tenha chegado a esse ponto, não é?

Ela me encarou incrédula com o que disse.

— Onde você está querendo chegar?

— Me refiro à posição da supervisora. Disse para mim desde o primeiro dia que entrei nesta escola que ela vai avaliar minhas ações. Porém, durante todo este tempo também fui envolvido com a disputa entre os dois clubes. Eu acredito que no mínimo esta decisão de avaliação foi adiada, certo?

Diante de todos aqueles acontecimentos imaginei que a professora teria até adiado a decisão da supervisora de aparecer para me avaliar. Não que isso parecesse algo importante para ser feito de imediato, a menos...

— ...a menos que tenha algo a mais nesta avaliação da supervisora, não é?

Ficamos alguns segundos apenas nos encarando.

— Alguém veio lhe explicar sobre isso?

— Não... apenas parei para pensar melhor sobre o assunto... — a julgar pelo tom de voz da professora cogitei não comentar que foi Senjou Hana que me deu essa dica indireta. — Talvez isto seja porque sou um aluno transferido?

— Desde o começo imaginava que não era apenas a sua escrita que era afiada, mas também a sua mente... está correto.

— Parece que agora é a hora da explicação, hein... — me endireitei no sofá para prestar mais atenção na explicação que viria a seguir.

— Aqui na escola Daiichi temos a tradição de instruir os alunos com o intuito da elite desde o primeiro ano. Por isso, todos os alunos que se formam aqui possuem um grau de sucesso muito mais elevado que as outras escolas. Entendendo tudo isso onde você enxerga a posição dos alunos que se transferem?

— Vendo por esse ângulo a escola não se interessaria em abrir transferências já que os alunos vindos de fora não estariam aptos para se adaptar e acompanhar o ritmo que os outros alunos que entraram desde o primeiro ano teriam, não é?

— Correto. Mas apesar disso, esta escola tem essa exceção e aceita transferências. No entanto, o aluno que entrar aqui não poderá se transferir para outra escola a menos que seja expulso. Uma pessoa que almeja se tornar alguém de elite não pode querer cogitar se contentar com um grau menor que este.

Após ouvir aquelas palavras senti uma forte pressão crescer dentro de mim. Dava para entender a lógica da escola de querer formar alunos que podem ganhar muitas oportunidades e até a aceitar quem for de fora. Mas o rumo daquela conversa se aprofundou mais:

— Ainda não vi esta supervisora por aqui. Quer dizer que ela apenas aparece em momentos especiais, certo?

— Isso mesmo. Ela apenas comparece em eventos e em questões internas. Neste caso, sua aparição será por vocês, os alunos transferidos.

Cerrei meus punhos. Aquele grau de seriedade era tamanho a ponto de suar frio. Aquela supervisora era o Darth Vader indo atrás da resistência rebelde, por acaso? Se ela própria iria aparecer ali por minha causa então deveria haver algum tipo de teste, no mínimo.

— Então ela virá me avaliar, certo? O que acontecerá com o resultado deste teste?

— Não é nada que precise se preocupar. Foque-se em demonstrar suas melhores habilidades e tudo ocorrerá bem.

Pela resposta rasa senti que não irei obter mais nenhuma informação além do esperado.

— Certo... quando será isso?

— Na quarta-feira da semana que vem. Ela já confirmou sua presença. Com tudo o que vem acontecendo pedi a cooperação dela para que combinássemos uma data sem turbulência.

Ela se referiu ao problema dos dois clubes e já planejavam encerrar aquela questão até a semana seguinte. Será que ela previu que aquela situação iria se resolver ou decidiu tomar alguma atitude mais severa?

— Fala sério, professora... — tentei conter o nervosismo. — Primeiro me alivia um peso que não era meu e agora me coloca para trabalhar no lugar de outra pessoa, além disso vou ter que resolver esta pendência da transferência... isso é muito chato, não?

Houve um momento de silêncio entre nós até que ela bateu seus punhos e me encarou com um sorriso cruel.

— Oh? Parece que há alguém aqui é tão podre que não quer assumir as responsabilidades do clube e da sua vida... isso é algo que um vice-presidente faria?!

Agora eu sou o vice-presidente? Então eu me demito!

— Como se isso pudesse acontecer! Isso aqui não é um departamento! — ela me deu um soco na cabeça com toda força e minha consciência quase se esvaiu por isso.

Ah, ela dá muito medo! O que é isso? Uma nova transformação?! Ela iria despertar um Cosmo ou algo assim?

— Há um motivo maior para você recusar a proposta além de não querer trabalhar? — a professora me fitou seriamente. — Você tomou essa decisão por você mesmo ou há algo maior nestas palavras?

Aquilo me surpreendeu. No começo das aulas havia entregado um formulário falando sobre mim e sobre não ligar para as pessoas. Se tratando disso você pode pensar que o óbvio era que eu dissesse que era para mim mesmo.

E o que respondi foi...

— Claro que é por mim mesmo. Eu adoro escrever, mas trabalhar de graça para os outros apenas para ganhar o benefício de ir bem numa prova não me parece certo.

Aquela professora continuou me fitando seriamente.

— E?

— E... sei que Yonagi fez isso por si mesma. Afinal, ela é um gênio, certo? Ela não precisa das pessoas e não ligo pra quem seja tampouco os outros estão se importando conosco. Tudo isso não me parece nada equivalente. É praticamente uma loucura querer continuar neste ritmo.

Respondi prontamente a professora, mas em vez desta resposta a fazer esbravejar e me bater na cabeça mais vezes ela exibiu um sorriso travesso.

— Você realmente é distorcido, não é?

— Sim, pode apostar... — sorri orgulhoso. — Não farei isso pois é ela quem fará. Yonagi não iria se dar por vencida apenas por ter adoecido. Além disso, tem coisas que devo fazer por mim mesmo e que odiaria que fizessem no meu lugar. Não seria algo comum de se pensar?

— Você pode ser distorcido, mas tem um lado atencioso. Isso não é nada ruim... — expressou a professora satisfeita. Ela tirou uma chave do bolso e me entregou. — Esta é a chave da biblioteca, ao menos ajude-a procurando referências. Devo dizer que isto é o máximo que você pode fazer neste momento para ajudá-la.

— Certo, é o que farei... — disse, pegando a chave dela e suspirando em seguida.

— E não se preocupe quanto ao teste da supervisora. Sei que você se sairá bem.

Apenas esbocei um sorriso cansado e me dirigi para a biblioteca enquanto ainda era intervalo para começar logo a procurar. Afinal... era uma maneira de escapar de toda aquela multidão na sala de aula e ficar sozinho em um lugar tranquilo.

Por mais que a professora tivesse me explicado melhor a situação ainda sabia que havia algo a mais. Era como se estivesse em uma ilha e achasse um baú de tesouro, mas saber que pode haver mais itens valiosos no local.

Se há algo em que acredito é que não existe coincidências. E cogitei que aquela avaliação da supervisora não será apenas um simples teste escrito.

***



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