O Retorno da Gula Coreana

Tradução: Teverrr

Revisão: Melão


Volume 1

Capítulo 9: O Despertar (2)

Remetente: O Guia 

  • Escape do auditório e vá para a área de espera no segundo andar do prédio principal antes que o tempo acabe.
  • Tempo restante: 03:59:38.

KWANG!!

A porta estava quase se quebrando enquanto o som metálico continuava.

KWANG, KWANG!!

Mesmo vendo toda a cena era difícil acreditar que uma porta daquelas, toda de metal, estava sendo destruída com tanta facilidade. Várias dobradiças já haviam afrouxado e estavam prestes a cair.

— P-precisamos fazer uma barricada!! — sugeriu uma voz, com mais medo do que confiança.

A força dos humanos quando estão prestes a morrer é algo surpreendente. Yi Seol-Ah, seguida de várias pessoas, saiu correndo em direção à porta. Alguns até trouxeram mais de uma cadeira, outros verificaram se alguma coisa estava escondida atrás do palco e o resto usou o próprio corpo como auxílio para conter os impactos.

Kkheuk!

O som que continuava a bater na porta continha raiva, e a força do próximo impacto jogou cinco pessoas para longe como se não fossem nada.

— Saiam da frente!

Um grupo conseguiu jogar o púlpito do palco na direção da porta, reforçando a barricada. Em seguida, mais cadeiras foram colocadas e cerca de 20 pessoas pressionaram a porta para reforçar a proteção. Por fim, um homem posicionou uma das cadeiras embaixo da maçaneta.

Haa… — Ouvia-se suspiros de alívio por todo o auditório.

Seol-Ah parou de forçar a porta com as costas e se deitou no chão como se estivesse tonta.

— Você até que é bem esperta pra alguém da sua idade — disse um homem, referindo-se ao fato de que foi Seol-Ah quem fez o primeiro movimento para bloquear a porta.

Várias pessoas concordaram com o que foi dito, já que se não fosse pelo pensamento rápido da garota, a porta poderia estar quebrada.

— N-não foi bem assim — respondeu com timidez.

— Eu mesmo congelei. Mas, cara, foi por ver você tentando fazer alguma coisa que comecei a me mexer.

— Todos ajudaram. Eu não conseguiria bloquear a entrada sozinha.

A vergonha de Yi Seol-Ah ajudou a melhorar um pouco o clima. A sua personalidade combinava bem com a linda aparência. Além disso, o fato de ela ter sido uma Invocada e a primeira a tentar fazer algo foi o suficiente para o resto das pessoas terem  uma boa impressão.

— O que faremos agora? — A pergunta trouxe todos de volta à realidade. Alguns até viraram para a jovem, mas ela também estava perdida.

Assim que tudo se acalmou, Seol voltou a olhar para o seu celular. Além da mensagem do Guia, havia recebido outras duas. Uma era do “Diário de um Estudante Desconhecido”.

Remetente: Desconhecido

#Auditório (trecho do Diário de um Estudante Desconhecido, página 2.)

 Havia apenas uma saída no auditório. Conseguimos bloqueá-la, mas também perdemos o nosso único caminho para sair dali.

O lado de fora estava silencioso.

Infelizmente, meus colegas de classe foram divididos em dois grupos.

Um grupo queria esperar mais um pouco, enquanto o outro queria explorar o lado de fora.

Com o debate, nos esquecemos do exterior.

Logo  aprendemos que “aquela coisa” não era um simples monstro ou zumbi.

#Auditório (trecho do Diário de um Estudante Desconhecido, página 3) 

Virou um pandemônio. Nada mais poderia descrever a situação.

A porta que tentamos desesperadamente bloquear tornou-se inútil.

Durante o caos, eu consegui descobrir o “buraco”.

“Buraco?”

Quando acabou de ler a última linha, Seol levantou a cabeça e percebeu que os Contratados haviam o cercado.

— Merda. É só o começo e eles já estão complicando. Tô todo arrepiado, olha só! — falou Kang Seok enquanto esfregava o seu braço. — Agora que bloqueamos a porta, a gente podia… — O jeito que pronunciou essas palavras deixou a todos mais esperançosos. — Vamos dar uma olhada por aí — disse, fazendo questão de levar apenas Magrelo e Bolo Fofo consigo, acabando com a expectativa de várias pessoas.

Um homem de meia idade, vestindo um terno velho de negócios e usando óculos, o cara que elogiou Yi Seol-Ah antes,logo foi para a frente dos dois homens.

— C-com licença.

— Ei, Hyungsik, vai dar uma olhada atrás do palco. E, Minwoo, você…

— Com licença, jovem!

— Quem, eu? — A resposta de Kang Seok veio depois de algumas bufadas.

— O que vocês estão fazendo?

— Investigando o entorno do auditório...?

— Entorno do auditório?

— Sim. Igual aqueles dois. — Apontou na direção do palco, onde Yun Seora e Hyun Sangmin, o cara do boné verde, estavam.

— Procurando o que exatamente?

— Não tenho certeza. Agora que a saída está toda bloqueada, tenho a impressão de que deveríamos achar algo. De qualquer forma, não sabemos o que vem depois.

— Sim, sim. Claro. — O homem de meia idade concordou balançando tanto a cabeça que precisou ajeitar o óculos que quase caíra.

— Quer ajuda?

— Oi? — Nóia franziu o cenho. — Por que você… O que o senhor quer? Eu não sou o chefe daqui nem nada do tipo.

— Sim, eu concordo. Bem, como eu posso dizer. Hmm, vocês são diferentes, certo?

— Claro, somos diferentes. Mas o que o senhor quer dizer? — O tom de voz de Kang Seok continuou rude. Até lembrou um pouco a forma com que o Guia soou quando falou com os Contratados.

— O que eu quero dizer é que nós devíamos nos ajudar. Só isso — respondeu o homem de meia idade, mas o que conseguiu em troca foi apenas uma risada debochada.

— Terei que recusar o pedido. Seria bem ruim ter mais gente conosco, então eu não quero.

— O que você quer dizer com “ruim”?

— Faz a sua parte que eu faço a minha, beleza? Nós três ficaremos sozinhos. — Kang Seok declinou a oferta do homem de meia idade sem pensar duas vezes e virou-se para sair.

— Ei, espere um pouco, jovem! — gritou o senhor, mas Nóia, Bolo Fofo e Magrelo continuaram andando.

  — Que cara chato.

Kang Seok parou imediatamente no meio do caminho. Suspirou e deu meia volta, procurando quem tinha dito aquilo.

Uma mulher sentada no chão de pernas cruzadas o encarava. Era Shin Sang-Ah.

— Do que você me chamou?

— Você é um egoísta de bosta. Só quer tirar o seu da frente.

— Mas que porra… Ei, você está errada. Eu me importo com esses caras também, sabe? — Colocou seus braços em volta dos seus dois lacaios e deu um sorriso. Percebendo a forma como Shin Sang-Ah o encarava, ele continuou: — Ah, cara. Olha só o rosto dela. Você pode matar alguém com esse olhar, senhorita. Cuidado.

— Ei, não é a mesma mulher que estava de birra até agora pouco perguntando se também não ganharia uma bolsa? — Riram Hyungsik e Minwoo.

— Não está vendo? Tem mulheres e crianças aqui! — reclamou Shin Sang-Ah.

— Eu consigo ver muito bem. Não sou cego.

— E vocês três querem sobreviver sozinhos?

— O que você queria que fizéssemos? Também estamos com pressa.

— Por isso dissemos que iríamos ajudar.

— Deus, como você consegue ser tão burra? Escuta aqui. Não precisamos e nem queremos a porra da sua ajuda. Tá achando que todo mundo aqui é um inútil igual a você?

— Inútil!?

— É. Você é uma inútil. Qualquer um consegue ver que você tá tentando se aproveitar da gente. Então, xô, xô. Vaza!

— Vocês três são mesmo humanos?

— Oi? Se é assim, então talvez vocês sejam todos uns parasitas.

Shin Sang-Ah não conseguiu mais segurar a sua raiva e deu a impressão de que iria bater nos três. Kang Seok riu e tirou os braços dos ombros dos seus amigos.

Antes de tudo piorar, uma jovem garota interveio e ficou parada no meio dos dois. Era Yi Seol-Ah.

— Por favor, parem!

Shin Sang-Ah abriu a boca para dizer algo, mas preferiu ficar quieta. No entanto, seus punhos continuavam tremendo de raiva. Kang Seok apenas riu.

— Nós mal conseguimos defender a saída com todo mundo trabalhando junto, então por que vocês dois estão brigando?

— Trabalhando juntos é a cabeça do meu pau — respondeu com raiva o Nóia. — Nós três nos conhecemos há muito tempo. Antes mesmo disso tudo aqui. Por isso temos um plano próprio.

— Mas!

— Mas, mas, mas. Vá à merda. Você também é uma Invocada, então já deve ter percebido — disse, oferecendo a mão à garota. — Vamos parar de discutir por isso, tudo bem? Por que não vem com a gente? Seu irmão, Sungjin, pode vir também.

— Por que você está me oferecendo ajuda?

— Não é óbvio? Diferente dos outros, vocês serão muito úteis.

— Seu insensível. — As palavras soaram fracas, demonstrando a tristeza de Yi Seol-Ah com toda situação. — Eu pensei que você fosse uma boa pessoa…

Kang Seok deu de ombros e levantou a mão.

— Ei, irmão! E você?

Aquele “irmão” provavelmente se referia a alguém que estava bem longe daquela confusão toda, Seol.

— Não quer terminar logo com essa merda de Tutorial, não? Não vai demorar muito pra acabar se você vier.

Claro, todos sabiam o valor que ele tinha. Afinal, até o Guia ficara surpreso com a Classificação da Marca daquele rapaz.

— Por favor, nos ajude! — Até mesmo Yi Seol-Ah o chamou. Por favor, ajude essas pessoas!

Encontrava-se em um dilema. Não imaginava que isso aconteceria.

De um lado, Kang Seok, do outro, Yi-Seol Ah. Um lado racional, o outro emocional.

Na dúvida, decidiu ativar a sua habilidade. Todo o auditório ficou coberto por cores.

“Mas o que…?”

Por um momento, achou que estava se afogando em um mar de sangue.

E não, ele não estava errado.

As cores da saída, agora bloqueada, variaram de um laranja para um verde. No entanto, era Kang Seok que agora possuía aquele brilho laranja. Yi Seol-Ah não emitia nenhuma cor.

Porém, Seol não teve tempo para se importar com essas mudanças. O motivo? Todo o chão estava vermelho.

“Recuar imediatamente, não é?”

Segundos depois, um alarme tocou na sua cabeça.

Bump!

De repente, o assoalho do auditório moveu-se para cima. A madeira velha começou a se partir e pedaços começaram a voar.

— O-o que foi isso!?

— Um terremoto? — Uma dedução modesta.

Foi tudo muito rápido.

O chão foi destruído como se uma bomba tivesse explodido logo abaixo. No meio dos pedaços de madeira e poeira que voavam pelo ambiente, apareceu um comprido braço podre. Havia cerca de seis coisas parecidas com um gancho agarradas ao final daquele membro.

O braço descreveu uma trajetória em formato de um arco, saindo do buraco no chão e depois movendo-se para baixo até conseguir agarrar os cabelos de uma Yi Seol-Ah totalmente atônita.

Aaaahhh!! — O braço estava tentando levar a menina consigo puxando-a pelo mesmo buraco em que veio.

Com força, a cabeça da menina bateu contra o chão e o seu corpo começou a ser levado para a fossa de onde aquele membro apareceu.

— Manaaaa!!! — Yi Sungjin lançou-se em direção às pernas da menina que balançavam desesperadamente no ar. — Ajudaaaaaaa!!

Aquele grito de desespero acordou a todos. Então, a multidão correu para ajudar o jovem Yi Sungjin, que também quase estava sendo puxado para o buraco. Dez mãos apareceram e começaram a puxar e arrastar as pernas da menina e o corpo do seu irmão mais novo.

Foi como um cabo de guerra.

— Segurem!! Não soltem de jeito nenhum!

— Puxem!! Puxem os dois de volta!!

O local virou um caos. Era possível escutar apenas gritos e ordens desesperadas.

Mesmo com a força de dez homens, Yi Seol-Ah não conseguiu ser puxada de volta. Muitos eram arremessados para fora daquele cabo de guerra devido à enorme força que vinha da parte de baixo do chão, fazendo com que perdessem a pegada.

Euahahah!

— Ei! Não soltem!

Enfim aconteceu.

KYAAAAAAK!

Splash!

E então, de dentro do buraco, sangue jorrou. Aquele líquido vermelho misturado com carne se espalhou por toda parte.

— Mana!! Manaaaaa!!

Todos os seus dedos se curvaram, as coxas tremeram e os joelhos se dobraram.As pernas que antes estavam agitadas, ficaram calmas. 

A força que puxava o corpo da menina para baixo parou. Todos que continuaram o cabo de guerra contra aquele braço monstruoso foram jogados para trás.

Entre eles, havia um homem que tinha nas suas mãos um fino tornozelo, percebendo apenas quando olhou. Acima dele, havia algo que lembrava a forma de uma perna envolta em uma saia azul encharcada de sangue. 

Além daquilo não era possível ver mais nenhuma parte do corpo da menina, apenas um pedaço do intestino e tripas esmagadas.

Aaa

O homem ainda viu o formato de algo parecido com um humano saindo do buraco no chão. 

Aaah, ah

A cabeça daquilo era, no mínimo, quatro vezes maior que a de um homem adulto. A criatura também possuía um único olho que cobria a maior parte do rosto.

Ah, ah, ahhhaaaack!!

O homem gritou, levantou o mais rápido que pôde e fugiu. Não tinha muito para onde ir, mas ficar o mais longe possível daquele ser já era o suficiente.

A partir do susto causado por aquele grito, várias pessoas se viraram e conseguiram ver o monstro que saia do chão. Com isso, o caos se instalou.

“Meus, meus pensamentos estão…”

Quando recobrou a consciência, Seol se viu correndo em direção à porta bloqueada.

“Por que…” 

Deveria ser normal escutar todo aquela confusão se desdobrando a sua volta, porém o barulho diminuiu até quase se esvair. Tudo pareceu ficar em câmera lenta.

Tudo. Até mesmo o homem tirando as cadeiras da frente da porta ou a bizarra criatura que já havia saído totalmente do buraco mostrando os seus compridos membros parecidos com os de uma aranha.

Tudo estava em câmera lenta. 

“Por que...”

Seol estava com dificuldade para respirar e o suor que caía nos seus olhos atrapalhava a visão.

Quantos morreriam ali? O chão já estava escorregadio e pegajoso pelo sangue e tripas espalhadas por todo o auditório.

O seu corpo ficou pesado e sentia-se mais lento. Era um verdadeiro caos.

Por fim, decidiu parar de correr e ficou parado, mesmo que a saída estivesse a apenas alguns passos de distância.

Sabia o quão estúpido era ignorar os sinais de retirada imediata. Ainda não era tarde demais para fugir, mas mesmo assim…

“Por que eu tô tão calmo?”

Conseguia sentir o cheiro acre do ar. O seu corpo estava em chamas e ele sentia-se tonto. Por fim, começou a ficar com vertigem.

No entanto, naquele mesmo instante, a neblina que o deixava tonto se foi. Tudo ficou claro. Lentamente, Seol fechou os olhos.

O monstro estava ocupado se alimentando de outros corpos, mas parou e virou a cabeça em direção ao homem que estava imóvel próximo à saída do auditório. Partiu na sua direção utilizando os quatro membros para se mover.

Kheehick?

Percebendo que o homem não se mexia, moveu a sua cabeça em sinal de confusão e esticou o seu pescoço. Estava analisando Seol.

O Marca de Ouro pôde sentir um forte odor saindo daquele monstro. Apesar de tudo, era um cheiro familiar.

Sua percepção estava muito aguçada. Fechou os olhos. Quando os abriu novamente, o monstro continuava parado emanando uma intenção assassina…

Hmm.

Um sorriso formou-se no rosto de Seol.

Keeeick!

A besta retraiu novamente o pescoço.

Com o seu olho reduzido a uma fenda, o encarando, a criatura segurou e arremessou a perna de uma das cadeiras que formava a barricada na saída.

A intenção daquele ser era confrontá-lo ou fugir? Não importava. Ele já sabia. O seu eu do sonho já havia lhe contado tudo.

Ele disse que uma criatura assim não era nada para a força que possuía. Até perguntou se já havia vencido criaturas mais perigosas.

Até mesmo o seu eu de antes das apostas, de antes de perder a habilidade, já dissera a mesma coisa, agora era hora de apostar tudo.

Seol conseguiu agarrar o objeto arremessado no meio do ar. Por algum motivo, tudo pareceu muito fácil.

Mesmo que aquela simples perna de cadeira não fosse uma lança, ele ainda a segurou como se fosse e ficou em posição.

 Segundos depois disso, os seus olhos se abriram ainda mais.



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