O Primeiro Serafim Brasileira

Autor(a): Anosk


Volume 1

Capítulo 25: Necromante (2)

Sariel e Aegreon permaneciam parados de frente a um exército de milhares de mortos vivos. Naquela escura noite, apenas o brilho roxo dos olhos deles podiam ser vistos, como um enxame de vagalumes, iluminando tanto o chão quanto os céus.

— Apenas alguns milhares... Não parece ser um necromante muito forte — comentou o viajante.

Aegreon apenas ignorou seu comentário e permaneceu em silêncio.

Centenas dessas criaturas avançaram na direção de ambos e, como se estivesse acostumado com aquele tipo de situação, o viajante apenas caminhou calmamente na direção deles, com uma espada de gelo na mão.

As criaturas se jogaram em cima dele e logo seu corpo não podia mais ser visto. Contudo, com apenas a força física, Sariel arremessou todos eles para longe. A força que tinha usado fora tão grande que, mesmo sendo apenas um empurrão, destruiu todos eles no ar, antes mesmo de tocar o chão.

— Ora, apenas os empurrei e já morreram? Esperava pelo menos um desafio... — disse desapontado.

— Isso não é brincadeira — disse Aegreon. — Vamos acabar logo com isso antes que morram muitos.

— Oh? Então você se preocupa com a vida dos inocentes?

— Cale-se. Vamos logo.

Com isso, Aegreon disparou na direção do exército seguido de Sariel. A força de ambos era tão grande, que eram capazes de derrotar as criaturas apenas correndo, como se fossem dois elefantes avançando e pisoteando qualquer humano frágil no caminho.

Não demorou muito para chegarem ao centro daquele exército, onde os mortos-vivos mais poderosos se concentravam.

— O quê?

Conforme se aproximavam, ouviram uma voz surpresa gritando no meio daquele exército. Como todos ali estavam mortos, aquela voz podia pertencer apenas àquele que causou todo este tumulto.

— Matem-nos!

Sob suas ordens, todos as criaturas se moveram na direção daqueles dois, falhando miseravelmente em pará-los.

Ambos já estavam a menos de 50 metros e conseguiam ver claramente o necromante: Um homem de altura média, pele pálida, cabelos brancos e curtos que eram escondidos por um grande manto com capuz escuro.

Vendo que simples mortos-vivos não seriam capazes de detê-los, o necromante aproximou ambas as mãos uma da outra e criou uma esfera roxa entre elas. Em seguida, essa esfera começou a crescer até ter o tamanho de um lobo adulto.

Depois, algo único aconteceu: a esfera mudou de forma aos poucos até ter a silhueta de um animal quadrupede. Depois. a cor roxa desta forma mudou para uma escuridão absoluta com a de uma noite sem estrelas, que logo se materializou em uma espécie de criatura feita de fogo, bem similar com aquela que atacou Luna na floresta.

— Vá! Consuma-os em nome de Elgor!

Sob seu comando, a criatura avançou na direção de Aegreon, que ignorou completamente o calor do corpo dela e a socou quando estava prestes a mordê-lo.

Seu punho atravessou a criatura por dentro e a fez explodir e jorrar fogo por todo lado. A lava tocou sua pele e ele apenas a ignorou como se fosse água.

— O quê? — surpreendeu-se o necromante.

Sariel continuou avançando na direção dele sem desacelerar.

— Maldito, MORRA! — O necromante estendeu ambas as mãos e, de suas palmas, intensas chamas roxas se espalharam como um jato na direção do viajante.

Contudo, as chamas tocaram o viajante e o atravessou, como se seu corpo fosse uma ilusão.

Ou melhor, era uma ilusão.

— Quê?!

O necromante intensificou mais ainda as chamas — que seriam capazes de queimar metade daquele vilarejo em um único ataque — na expectativa de acabar com Sariel, mas o resultado continuava o mesmo.

De repente, ele sentiu algo frio atravessar sua cintura pelas costas, e no momento seguinte, caiu.

Entretanto, ele não caiu por ter se desequilibrado, e sim porque metade de seu corpo havia sido cortado, e suas entranhas eram a única coisa que ainda conectavam suas duas metades.

ARGH! MALDITO!

Ele tentou usar suas chamas novamente, mas o viajante simplesmente cortou seus dois braços.

— Então... Foi você quem trouxe a Seita de Elgor a K’ak’... Esperava que fosse mais forte... — sussurrou o viajante.

— ACABEM COM ELE! — gritou para os mortos-vivos para que tentasse se livrar de Sariel.

— Uma pena que não poderei checar suas memórias — disse conforme arrancava a cabeça do necromante.

No momento seguinte todas as criaturas se desfizeram instantaneamente em cinzas, desaparecendo como se nunca tivessem existido.

— E pensar que alguém como você causou tanto problema — disse Sariel.

— Suas ilusões são interessantes — comentou Aegreon.

— Obrigado, deve ser por isso que você pediu uma Gema de Ilusão e Alteração, certo?

O viajante desfez sua espada de gelo e começo a vasculhar os pertences do necromante.

— Maldito... Não faz nem questão de esconder mais...

— Esconder o quê — perguntou o viajante com um sorriso jocoso.

Sariel...

Uma voz distante e desesperada soou ao longe, chegando aos ouvidos atentos do viajante.

Ao perceber que aquela voz era de Raymond, ele não se demorou e flexionou suas pernas, dando um salto e voltando para o vilarejo como um cometa.

— SARIEL! — continuava a gritar Raymond.

Tum!

O som de algo seco atingindo o som pesadamente soou atrás do guarda-costas.

Ao se virar, viu o viajante com uma pequena cratera ao seu redor.

— Qual o problema?

— Ela foi ferida com Conjuração!

Ao ouvir isso, o viajante imediatamente se ajoelhou ao lado de Luna com uma expressão preocupada.

Sem dizer nada, aproximou as duas mãos — que brilhavam em dourado — e um líquido áureo e translucido derramou de suas mãos na direção do ferimento.

O ferimento dava sinais de tentar se fechar, mas uma energia roxa lutava contra o poder de cura e tentava corroer qualquer tecido, musculo ou osso ao redor.

Alguns segundos depois, Aegreon também chegou e, ao perceber o ferimento, tentou se aproximar.

— Afaste-se! — ordenou Sariel.

— Preciso vê-la!

— E vai fazer o quê? Roubar a alma dela.

— COMO OUSA... — irritou-se terrivelmente.

— Aegreon, espere! — disse Shiina. — Não é hora pra isso.

Tsc! — bufou o Pilar, se afastando alguns metros de Luna.

Com isso, ele se afastou cerca de alguns metros e observou de longe.

— Por que não está funcionando? — perguntou Raymond ansioso.

— Meu poder de cura não é o suficiente, preciso que me ajude, use magia de Proteção também.

— Mas eu não tenho este elemento — disse Raymond.

— Como não!? — perguntou Sariel. — Pelo menos uns 25% do seu poder mágico é do elemento Proteção.

— Isso deve ser um engano! Nunca usei esse elemento antes.

— Por acaso já foi curado com magia antes?

— Sim...

— Então tente recriar este sentimento e despeje sua magia em Luna.

Seguindo as ordens dele, Raymond tentou usar magia de Proteção, tentando invocar um sentimento quente e confortável, mas o máximo que conseguiu foi criar um duro escudo mágico, frio e resistente.

Ele tentou de alguma forma mudar a consistência dessa magia, mas apenas deixou ainda mais resistente.

— Droga! Não consigo! — praguejou. — Sou um inútil aqui.

Raymond desistiu com medo que fizesse algo errado e piorasse a situação. Sentia-se extremamente frustrado por ser o guarda-costas oficial da princesa e não poder fazer nada para ajudá-la desde o início dessa jornada. Desde que Luna deixara o castelo, ele nunca esteve no controle da situação em meio aqueles dois monstros chamados Aegreon e Sariel.

Ele sempre se achou mais que qualificado para proteger uma simples garota, mas recentemente ele tem percebido cada vez mais como era imponente e pequeno. Não era capaz nem mesmo de protegê-la de um simples grupo de mortos-vivos, imagine então se aqueles dois tentassem algo.

— Frio... — sussurrou Luna. — Muito... frio...

Neste momento, o rosto de Raymond empalideceu. Luna nunca havia sentido frio em sua vida, portanto ouvi-la sussurrando aquelas palavras era terrivelmente preocupante.

— Deixe de se lamuriar e continue tentando! — disse Sariel. — Se não ajudar ela definitivamente irá morrer!

Pressionado por aquelas palavras, o guarda-costas tentou mais uma vez curar a princesa, criando outro escudo mágico novamente.

— Relaxe, tem que se manter calmo, caso contrário só criará um escudo resistente.

Tentando seguir o conselho, Raymond relaxou sua mente e seu corpo, se lembrando do sorriso gentil e calmo de Luna, assim como os poucos momentos descontraídos que tiveram juntos, e aos poucos aquele escudo amoleceu até adquirir um aspecto líquido e transparente, que começou a curar o ferimento.

Ambos permaneceram daquele mesmo jeito por quase meia hora enquanto curavam constantemente o ferimento. Naquele ponto, gotas de suor enxarcavam o rosto de Raymond, que se sentia cada vez mais cansado conforme esgotava sua magia.

“Não posso parar, Luna ainda está em perigo!”

Sariel, apesar de estar fazendo a mesma atividade que ele, não parecia cansado.

Neste momento, inúmeras pessoas já haviam rodeado os dois e tentavam oferecer ajuda, e o viajante sempre recusou, dizendo que não havia nada além do que aquilo para ser feito.

Finalmente, depois de uma hora, o ferimento finalmente fechou, porém Luna continuou desmaiada.

— Ufa, ela está fora de perigo por enquanto — disse Sariel.

— Ela ainda está desacordada e com febre!

— Ela precisa descansar — disse o viajante conforme carregava gentilmente Luna em seus braços. — Vou deixá-la na cama em que estava antes.

O viajante a levou de volta à casa em que estava e a deitou na cama.

Segundos depois ele surgiu na porta e disse: — ficarei ao lado dela para ter certeza de que ela estará bem, vocês deveriam tentar dormir agora, estão a salvo.

Em seguida, entrou novamente na casa.

Com isso, todas as pessoas trabalharam em enterrar os mortos, que não eram muitos apesar do ataque imenso. Depois, entraram em suas casas e tentaram dormir, sendo que uma minoria foi capaz disso.

Raymond, preocupado com Luna, entrou no quarto que ela estava com Sariel sentado logo ao lado.

Aegreon estava prestes a entrar na casa, quando percebeu Raymond entrando e decidiu ajudar as pessoas do vilarejo a enterrar os mortos e reparar as casas danificadas.

— Como ela está? — perguntou Raymond com o rosto preocupado.

— Estabilizada por enquanto, vá dormir.

— Ficarei aqui.

— Então terá de dormir no chão.

— Não me importo — disse conforme se sentava em uma cadeira ao pé da cama.

— Tudo bem...

As horas se passaram e Raymond permaneceu no chão a noite toda. Luna não mostrou nenhum sinal de piora, e permaneceu dormindo a noite toda.

O dia amanheceu e ela não dava sinais de acordar, e Raymond continuava no mesmo lugar, sem ter se movido nem um centímetro.

— Ela vai ficar bem? — perguntou após horas de silêncio.

— Acho que sim...

Raymond ficou em silêncio por alguns segundos antes de dizer hesitante: — O-Obrigado...

— Pelo quê?

— Por ter salvado ela, se dependesse de mim ela estaria...

— Talvez assim você possa confiar em mim...

— Um pouco.

Ambos permaneceram em silêncio por um tempo quando o guarda-costas falou novamente: — Como sabia que tenho um pouco de Proteção?

— Percebi em Fordurn ao vasculhar seu poder mágico, mas você realmente não sabia?

— Não...

— Então Fordurn realmente está bem deficiente nas artes mágicas...

Depois disso, as horas se passaram novamente sem que falassem. O Dia passou e deu lugar à noite, com Luna ainda desacordada.

Raymond, sentindo-se faminto por permanecer um dia inteiro sem comer, saiu para jantar rapidamente.

Sariel brincava com sua magia criando ilusões de animais variados brincando entre si, quando ouviu Luna sussurrando.

— Di...

Isso atraiu a atenção dele, que virou o rosto e se deparou com ela ainda dormindo.

“Deve estar sonhando”, pensou sem dar muita importância àquilo.

— Di... Dies... irae — sussurrou a princesa.

Ao ouvir aquelas palavras, ele imediatamente se virou para a princesa e se aproximou para escutar melhor.

Luna permaneceu em silêncio por alguns segundos, o que quase fez o viajante achar que ela não sussurraria mais.

— Quantus tremor est futurus... — sussurrou ela.

— Quando iudex est venturus...

— Cuncta stricte discussurus... — sussurram ambos em uníssono, já que Sariel conhecia aquelas palavras.

Depois disso, Luna continuou dormindo sem dizer nada mais.

A noite passou novamente, e o viajante ficou o tempo todo pensando sobre aquelas palavras proferidas pela princesa que não deveria conhecê-las.


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