O Primeiro Serafim Brasileira

Autor(a): Anosk


Volume 1

Capítulo 15: Céu Estrelado

— Hey, Luna? Terminou de se vestir? — perguntou Quetzal.

Após o trio ter experimentado as comidas de rua de K’ak’, Quetzal convenceu os dois a provarem as roupas do reino.

O local onde estavam era uma pequena pirâmide, e as roupas se tornavam mais caras e luxuosas à medida que subiam os andares. Neste momento estavam no topo, onde havia alguns provadores separados por cortinas.

Entretanto, como já havia visto anteriormente, as roupas deste reino poderiam ser um pouco... reveladores demais para a princesa de Fordurn.

— Desculpe, mas essas roupas mostram demais... principalmente em ci-cima — disse Luna envergonhada colocando sua cabeça para fora e se cobrindo com a cortina do provador. — Não posso usar isso... — sussurrou.

— Relaxe, tenho certeza de que você ficou bem! Deixe-me ver! — Quetzal entrou no provador sem esperar que ela protestasse.

— Ora! Você tem um belo corpo!

— Espera!

— Uau... Suas medidas são tão proporcionais que até parece uma escultura... Tenho até um pouco de inveja...

— Nã-Não toque aí! Tenho cócegas!

Enquanto tudo isto acontecia, as pessoas responsáveis por ajudar e sugerir as roupas conversavam e focavam em seus trabalhos normalmente, completamente neutros sobre o que acontecia entre as duas princesas, como se fosse algo esperado que Quetzal fizesse.

— Não se preocupe, procurarei algo mais de seu agrado.

A princesa de K’ak’ deixou Luna em paz e foi à procura de outras roupas que cobrissem um pouco mais.

Ela encontrou algumas mais discretas, porém ainda não seriam o suficiente.

— Ah... parece que não vou achar nada aqui...

— Perdão, Vossa Alteza. Caso queira podemos fazer algo sob encomenda.

— Acho que não será necessário — disse Sariel. — Teremos que partir em breve, então mesmo que quiséssemos não poderíamos usá-las.

— Tem razão... — desapontou-se a princesa de K’ak’.

— Aliás, está escurecendo. É melhor voltarmos.

— Sim, vamos Luna!

— Ce-certo.

 

***

 

O trio retornou para o palácio após passarem o dia todo conhecendo K’ak’ com Pagui sempre no ombro de Luna. Estavam se dirigindo na direção do quarto de Quetzal, quando se depararam com Shiina deixando o aposento de Raymond.

— Raymond está aqui? — perguntou a princesa prateada, preocupada pelo que viu mais cedo. — Ele está bem?

— Ah, sim. Pode ter certeza de que eu o fiz se sentir muito bem... — disse a assassina sugestivamente.

— Ainda bem, obrigada por cuidar dele! — agradeceu Luna com um sorriso puro, sem perceber a malícia por trás da fala de Shiina.

Sariel, Quetzal e Shiina olharam para a princesa com descrença estampados em seus rostos.

— O que foi? — perguntou ela inocentemente sem entender o motivo daqueles olhares.

— Nada, vamos indo! — urgiu a princesa esmeralda ao mesmo tempo que ria um pouco.

— O quê? Qual a graça?

— Nada demais — disse o viajante, também sorrindo. — Vamos aproveitar que o céu está limpo e usar o telescópio.

— Certo...

Os três partiram e em pouco tempo chegaram ao quarto da princesa de K’ak’. Durante o caminho, Luna tentou entender o que havia acontecido de tão engraçado que ela não entendeu, no entanto não conseguiu pensar em nada.

Ao abrir a porta, Quetzal correu para a janela e olhou para o céu.

— Uau... Está ainda melhor do que o normal! Tiramos a sorte grande!

Pagui, que esteve o tempo todo com Luna, voou para a janela e pousou ao lado do instrumento.

— Venha ver! Em homenagem ao seu nome mostrarei a lua primeiro.

A princesa prateada se aproximou da janela e olhou com curiosidade para o telescópio.

— O que eu faço?

— Espere um pouco, tenho que deixar na posição certa... — Quetzal se concentrou conforme ajustava o instrumento. — Pronto, pode olhar aqui. — Apontou para a ponta menor do objeto que tinha um pequeno orifício.

— Só preciso olhar?

— Sim, fique à vontade.

A princesa prateada olhou pelo buraco com desconfiança e foi logo surpreendida com a visão da lua, grande e majestosa.

A superfície podia ser vista nitidamente. Era toda prateada e cheia de crateras nela. Além disso, ela estava tão próxima, que a princesa sentia que poderia tocá-la com suas mãos.

A imagem que vira fora tão impressionante, que ela se assustou e se afastou do telescópio.

— Co-Como? Estava tão perto!

Haha! Legal né? Fiquei do mesmo jeito na primeira vez que vi. Veja de novo!

A princesa prateada se aproximou novamente e olhou mais uma vez para a lua, no entanto o que viu foi algo completamente diferente.

Um objeto circular e amarelo, do mesmo tamanho da lua, havia substituído a o objeto que observara anteriormente. Estranhamente, este objeto era escuro no centro, igual ao anel de luz de seus olhos.

Ela observou por um bom tempo aquele objeto, se perguntando se estava vendo coisas, até que este objeto escureceu completamente por um segundo e logo se tornou visível novamente.

— Mas o quê? — Luna afastou-se do telescópio, confusa com o que havia visto.

Foi então que ela percebeu Sariel e Quetzal sorrindo e segurando a risada deles.

— O que foi? — perguntou ela completamente confusa.

O viajante apenas apontou para a outra extremidade do objeto.

Ao olhar para o telescópio, ela viu Pagui com a cabeça encostada à lente do instrumento. A ave se alongava, ficava na ponta das patas e, apesar da difícil tarefa, era capaz de manter-se completamente parada.

Ao perceber que Luna não observava mais o telescópio, Pagui se afastou e piscou para ela ao mesmo tempo que balançava suas asas, emitindo um som similar de uma risada.

CROAC!

— HAHAHA! — Ambos Quetzal e Sariel falharam em conter suas risadas e gargalharam ao mesmo tempo.

A princesa prateada olhou novamente para Pagui. Após finalmente entender o que havia acontecido, sorriu e fez algo que há muito tempo não fazia.

Pff... Hahaha!

Ela riu.

Luna nem se lembrava de como era este sentimento ou até mesmo do som de sua própria risada, porém graças a Pagui ela se lembrou de como era.

Sua risada era quase como o de uma criança. Pura, doce e suave, exatamente como sua personalidade.

Sariel e Quetzal calaram-se no momento que ouviram aquilo. Ambos sabiam sobre as coisas terríveis que ela teve de ouvir sobre si mesma, portanto ouvi-la rindo era uma grande surpresa.

Enquanto ambos a olhavam com sorrisos nos rostos, Luna continuava rindo e até mesmo lacrimejou um pouco. Ela nem sabia por que ria tanto ou se aquilo realmente era tão engraçado quanto achava, apenas ria continuamente.

— Haha... ah... — Após algum tempo, suas risadas finalmente cessaram, fazendo-a se sentir cansada por rir por tanto tempo.

— Então era você que eu estava vendo — a princesa se aproximou da janela e acariciou Pagui. — Pensei que tinha feito algo errado.

— Ele sempre faz isso quando uso o telescópio, e até mesmo brinca de esconde-esconde.

— Agora que paro para pensar, como vocês se conheceram?

— Ah, um dia eu estava caminhando pela floresta e ouvi um choro de uma ave. Quando cheguei perto, vi Pagui, ainda filhote, e se movendo como se procurasse algo. Creio que se perdeu da mãe, por isso eu o adotei e cuidei dele deste então. Estamos juntos há quase 10 anos.

— Ele teve bastante sorte que você o encontrou — comentou o viajante. — Ele teria morrido na floresta sem sua ajuda.

— Sim, por isso somos inseparáveis! — Quetzal também se aproximou e acariciou Pagui.

— Bem, já que você já viu a lua, deixe-me mostrá-la outra coisa interessante — disse Sariel ao mesmo tempo que se aproximava e ajustava o telescópio.

O viajante demorou vários minutos enquanto procurava.

— Onde você está...?

Ele estava tendo bastante dificuldade para encontrar o que queria, até que finalmente avistou o lugar correto.

— Aqui está! Veja.

— Certo.

A princesa se aproximou e olhou pelo instrumento. Dessa vez, o que viu não foi a lua e nem Pagui, e sim um planeta verde e azul. Havia também duas luas circulando ao redor deste objeto, sendo uma delas visivelmente maior que a outra.

— O que é isso?

— Maon, o mundo dos anjos.

— Sério!? Posso ver? — perguntou Quetzal.

— Ah, claro, o telescópio é seu afinal — disse Luna ao mesmo tempo que se afastava do objeto.

A princesa de K’ak’ se aproximou e olhou pelo telescópio, soltando um audível “uau” ao ver Maon.

— É parecido com nosso mundo...

— Como sabe? — perguntou a princesa prateada.

— Ah, os anjos observaram o nosso mundo através do mundo deles, pintaram o que viram e nos mostraram, olhe ali.

Quetzal apontou para um quadro ao lado da janela que possuía uma pintura de Vilon — o mundo humano — que era bem parecida com Maon.

— Então eles também podem no ver...

— Bem, é claro! Se nós podemos vê-los então o contrário também. Quem sabe não tem alguém lá olhando para nós neste exato momento...

O trio permaneceu em silêncio enquanto observava o vasto céu estrelado diante deles. A ideia de poderem ver o mundo da raça que quase os exterminou era, de alguma forma, relaxante.

— Ah, você havia dito que eles nos ensinaram astronomia certo? — perguntou Luna. — Pode dizer mais sobre isso?

— Ah sim, veja bem... — começou Sariel.

No início, quando os anjos vieram pelo Astrum Lux, eles ensinaram e ajudaram os humanos. Eles nos ensinaram agricultura, metalurgia, medicina, alquimia e muito mais, o que impulsionou a humanidade a evoluir séculos de pesquisa em apenas alguns anos, e graças a isso cresceram exponencialmente e ocuparam quase todos os lugares do mundo.

Por isso, anjos e humanos tornaram-se amigos inseparáveis. Casamentos entre ambas as raças era extremamente comum, e nenhum casal sentia-se triste se tinham filhos humanos ou anjos.

Entretanto, décadas depois de sua vinda, os anjos lançaram um súbito ataque surpresa e destruíram centenas de reinos humanos nas primeiras horas de sua ofensiva.

Apesar do desespero que enfrentaram nas primeiras horas, os humanos resistiram e sobreviveram ao impacto inicial. Foi neste momento que Ardos, um anjo, se revoltou contra a própria raça e se uniu aos humanos, ajudando-os a coordenar as batalhas e a lutar contra os anjos.

Graças a Ardos, os humanos foram capazes de começar a ganhar territórios em certos lugares, e depois de um século de duras batalhas foram capazes de expulsar os anjos pelo Astrum Lux. O portal se fechou e permanece assim até hoje.

Depois disso, Ardos fundou o Conselho, um grupo de que continha as 10 pessoas mais poderosas no mundo de cada elemento, além da Vigília, um exército treinado para lidar com anjos.

— Então eles nos ensinaram quase tudo que sabemos?

— Basicamente.

— Então por que tentaram nos exterminar? — perguntou Luna.

— Ninguém sabe. Muitos acreditam que fizeram isso para ganhar nossa confiança, enquanto outros acreditam que eles foram enviados por Kura para nos exterminar, porém acho que ambas as teorias estão erradas — explicou Sariel.

— Por quê?

— Bem, o segundo caso é totalmente improvável pelo fato de Kura ter guiado a humanidade antes mesmo da vinda dos anjos. Quanto ao primeiro, se a intenção realmente fosse ganhar confiança então eles não precisavam nos ensinar, pois isso nos faria mais fortes e tornaria mais difícil a tarefa de nos exterminar.

— Sem contar que se tivessem a intenção de nos exterminar desde o início eles não teriam tido filhos com humanos — disse Quetzal. — Mas eles realmente nos consideravam amigos, tanto que até mesmo durante a guerra ainda havia humanos e anjos tendo filhos, como é o caso de Sariel.

— Entendo... — A princesa prateada permaneceu em silêncio enquanto digeria tudo que ouvira. — Espera, Sariel nunca disse que era descendente de anjos e nem mesmo mostrou seu broche, como sabe que ele tem descendência de anjos?

— Pelo nome dele, é claro! Todo nome terminado em “el” tem origens angelicais, e era bem comum que humanos dessem nomes de anjos aos seus filhos, mesmo que nascessem humanos.

— Isso mesmo, mas acho difícil que algum de meus pais tenha sido anjo, já que eu nasci muito próximo do fim da guerra. É mais provável que eu tenha alguma descendência distante, igual Quetzal.

— Ah, entendo. Mas você não tem nenhuma ideia de quem poderia ser seus pais?

— Bem, creio que...

Bam! Bam! Bam!

— Com licença, Vossa Alteza. — Uma batida na porta e a voz de um serviçal interrompeu Sariel. — Sua Majestade deseja saber se já jantou.

— Ah, na verdade não.

— Gostaria que trouxéssemos vossa refeição?

— Não é necessário, eu irei buscar.

— Certo, Vossa Alteza.

Sons de passos puderam ser ouvidos conforme o serviçal se afastava.

— Bem, está ficando tarde — disse o viajante. — Retornarei ao meu quarto agora, até amanhã!

— Certo, até mais!

Sariel deixou o quarto da princesa de K’ak’ e se dirigiu ao seu aposento.

— Sabe de uma coisa, você ainda não se banhou, certou? — perguntou Quetzal para Luna, que respondeu balançando a cabeça negativamente.

Hmm, então você pode se banhar no meu banheiro enquanto vou atrás de nossa janta. — Ela apontou para uma outra porta em seu quarto.

— Tem certeza? Não será um incomodo?

— Claro que não! Se quiser usar uma roupa minha tudo bem — Quetzal sorriu e colocou uma mão no ombro dela. — Já volto!

Com isso, a princesa de K’ak’ deixou o próprio quarto. Pagui, ao perceber que ela estava saindo, voou para ela e pousou no ombro dela.

Luna caminhou na direção da porta e a abriu, deparando-se com uma sala com uma banheira do tamanho de uma piscina no piso do aposento. Água quente fluía constantemente de uma fonte piramidal.

Ela se aproximou da água e tocou com sua mão para testar a temperatura. Estava acolhedoramente quente.

Sem se demorar, ela despiu suas roupas e entrou na grande banheira.

O calor da água envolveu seu corpo e a fez sentir-se relaxada. Frio não era um problema para ela, portanto banhar-se em águas frias era totalmente viável, contudo, é claro que água quente seria sempre melhor.

Luna mergulhou por alguns segundos e molhou completamente sua cabeça. Quando emergiu, se recostou contra as paredes da banheira e fechou seus olhos.

Sua mente divagou conforme se lembrava do “sonho” que tivera mais cedo. Aquele era definitivamente seu pai, no entanto que lugar era aquele?

Ela continuou a pensar no ocorrido quando se lembrou de um certo nome: Elise, um nome que nunca ouvira antes.

— Elise... Espera! Raymond pode saber algo sobre isso!

É claro que ele saberia. Raymond era a pessoa mais próxima do rei nestes últimos anos.

“Como não pensei nisso antes?”

Toc! Toc!

Duas batidas baixas soaram pela porta, assustando a princesa.

— Quetzal? Você já voltou?

Houve um silêncio por alguns segundos, até que uma voz grossa disse: — Sou eu, Aegreon.

— Ah, não entre, por favor. Estou me...

— Eu sei, apenas vim dizer algo.

— O que é?

O Pilar permaneceu em calado por alguns segundos.

— Vim me... desculpar...

— Como é?

— Eu... — Aegreon disse com dificuldade. — Menti para Yaxun sobre o motivo de querer ir ao Astrum Lux. Se eu dissesse a verdade, yaxun não iria nos ajudar. Eu tentei falar com você antes, mas aquele maldito esteve contigo o tempo todo.

Um grande alívio tomou conta dela ao ouvir aquilo.

— Ah, tudo bem — disse conforme sorria. — Achei que você realmente queria apenas me usar... Peço perdão por duvidar de ti. Acho que Sariel se enganou...

— Sariel não é confiável. Não acredite nas mentiras dele.

— Mas ele me salvou duas vezes já!

Nenhuma resposta.

— Aegreon?

Mais uma vez, nenhuma resposta. O Pilar já havia deixado o aposento.

— Aah... Vocês são tão complicados... — suspirou.

 

***

 

Sariel retornou ao seu quarto, banhou-se rapidamente e trocou suas roupas.

Ao terminar, notou que seus pertences haviam sido colocados em uma pequena mesa. Estava tudo lá, ou melhor, quase tudo.

O viajante abriu a porta de seu quarto e procurou por um serviçal. Não havia ninguém, portanto ele se aproximou de um criado mudo que estava ao lado de sua cama, pegou um sino que estava ali e o soou suavemente.

Um “tling” ecoou pelo seu quarto. Alguns segundos depois, sons de passos puderam ser ouvidos e, após pararem na porta de seu quarto, uma batida soou.

— Com licença, senhor Sariel. Precisa de algo?

O viajante abriu a porta para conversar com o serviçal.

— Sim, vi que trouxeram meus pertences, mas esqueceram algo.

Hm, permite-me me aproximar para conferir?

— Sim, fique à vontade.

O serviçal entrou no quarto e observou com cuidado os pertences do viajante.

Hmm, está tudo aqui, senhor Sariel. Todos os itens que me foram entregues estão aqui.

Sariel olhou com atenção o serviçal, se aproximou da mesa e olhou novamente seus pertences.

— Ah, tem razão. Peço perdão, acabei deixando passar, haha!

— Certo, fico feliz que esteja tudo nos conformes. Se precisar de ajuda novamente pode me chamar.

— Certo.

O serviçal deixou o quarto e fechou a porta.

O viajante, encarou novamente seus itens com um olhar misterioso. Em seguida, ele se aproximou da janela de seu aposento e observou a bela capital de K’ak’, iluminada apenas por algumas tochas e pela lua.

— Bem que achei que havia algo de suspeito sobre você...

Seu olhar continuou a esquadrinhar as ruas da capital, procurando por algo — ou melhor, alguém — atentamente.


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