O Nefilim Primordial Brasileira

Autor(a): Ghoustter


Volume 2 – Arco 1

Capítulo 60: O Outro Mundo

Sem qualquer rastro de poder espiritual ou a chance de um aterrorizante vórtice de energia surgir no céu, anunciando o iminente fim da vida, Raizel e Petra caminhavam tranquilamente por uma rua.

Diferente da aparência habitual, os cabelos e olhos da garota estavam castanhos, assim como os de Raizel, que mudaram para preto.

Isso graças ao rapaz que estava usando sua Habilidade Inata para envolver seus cabelos e olhos com uma fina camada de energia dessas cores, a fim de camuflar as originais.

Dada a aparência peculiar deles, os dois chamariam muita atenção naquele mundo, o que não estavam muito empolgados em fazer.

— Olha, Rai! — disse, chamando a atenção do seu parceiro para uma construção antiga. — Parece com os do nosso mundo.

— É um dos prédios históricos daqui. — O rapaz, que carregava algumas sacolas em suas mãos, observou a construção como se tentasse se lembrar do passado. — Se não me engano, esse foi construído por volta do século XX.

O CCBB (Centro Cultural Banco do Brasil) ao qual o duo observava, possuía uma arquitetura de origem francesa baseada na ornamentação eclética.

A fachada do edifício era composta por sólidas pilastras, as quais separavam os caixilhos idênticos e simétricos das janelas.

Tal estilo arquitetônico se destacava em meio às construções mais modernas pelas quais os dois passaram durante sua caminhada.

— Sério? Você lembra até da época em que ele foi feito? — Petra o encarava com os olhos carregados de um brilho tão intenso que era capaz de ofuscar as estrelas.

— Eu costumava vir aqui uma vez ou outra.

Além disso, a sua memória não era das piores. Isso sim era o que se poderia chamar de memória de elefante.

— Talvez eu te leve para ver as pirâmides do Egito na próxima vez.

Olhando para o céu claro e acolhedor, lembrou-se de uma certa teoria da conspiração, então resolveu brincar com a garota.

— Você tinha que ter visto quando os aliens construíram aquelas pirâmides.

Aliens? Sério? — Se ela brilhasse mais do que aquilo, Raizel sentia que acabaria ficando cego.

Só era um pouco impressionante que sua parceira tivesse se empolgado tanto com a ideia. De certa forma, ela também era uma alien.

Fazendo menção de entrar no prédio, o rapaz estendeu uma das mãos cheias de sacolas para a garota.

— Quer ver como é por dentro?

Uhum! — respondeu com um aceno de cabeça, enquanto segurava sua mão.

No interior, um majestoso e requintado salão dava acesso ao átrio principal, que conservava o belo piso de mosaico.

Os elegantes balcões de madeira entalhada e o delicado vitral davam uma atmosfera aristocrática ao ambiente. Era como se tivessem se teletransportado para outro lugar.

Esse certamente era um local adequado para descansarem um pouco após andarem para cima e para baixo enquanto procuravam alguns presentes para os seus amigos de Hervrom.

As sacolas nas mãos de Raizel eram a prova inanimada dos esforços de ambos. Todavia, já estava na hora de mandar todas elas para dentro do anel de ressonância.

Assim que se acomodaram em uma mesa, quando as sacolas ficaram fora do alcance da visão de qualquer pessoa, todos os objetos foram tragados pelo anel do nefilim.

— As pessoas deste mundo precisam de tantas sacolas? — perguntou Petra, ignorando o capuccino à sua frente e se inclinando na direção de Raizel.

Com um despretensioso sorriso, o rapaz respondeu: — Depois de um tempo você se acostuma… eu acho.

No seu primeiro dia na Terra, Petra já foi capaz de perceber o quão cômodo é usar qualquer objeto como catalisador para guardar coisas em um Compartimento Dimensional.

Embora ela tenha achado que carros parecessem bem mais confortáveis e eficientes do que carruagens — mesmo que aquelas tais de buzinas fossem bem irritantes.

"O café desse mundo é tão bom quanto me lembro", pensou Raizel, ao provar um pouco do capuccino. "Mas ainda prefiro o vinho".

— Será que eles vão gostar dos presentes? — indagou Petra enquanto segurava, com as duas mãos, a xícara contendo o líquido fumegante.

Estava confiante quanto à escolha das lembrancinhas para Andrew e Valentina, afinal, ela os conhecia bem.

Contudo, o mesmo não se podia dizer dos presentes selecionados para os amigos de Raizel.

A garota realmente queria ter conhecido eles melhor, mas pouco tempo após fazer o Pacto de Ressonância, teve que partir para aquele treinamento insano em Erebus.

— Acredite, não é tão difícil agradar aqueles quatro.

Hmm… Será mesmo?

— Cada um deles tem um gosto bem definido. — Então reparou que o café na xícara da garota ainda estava intocado. — É bom tomar antes que esfrie.

A-Ah! É mesmo.

"Ela ainda está com a mente um pouco distante?"

Não era à toa. Aqueles olhos dourados e voz estranha que a garota contemplou antes de perder a consciência na luta contra Inveja ainda lhe incomodavam.

Ela queria conversar mais sobre isso com Raizel, mas seu parceiro disse que era melhor esperar até retornarem para Hervrom.

No momento, ele só queria que sua parceira se divertisse como uma pessoa comum, sem uma preocupação tão insana quanto uma Chave de Goétia.

— Sabe — disse, buscando distrair a mente da garota — seguindo essa linha de pensamento, eu sou a melhor pessoa para te dar um presente, senhorita.

Huh?

— Afinal, eu sou quem melhor te conhece.

Hm! Hm! — negou balançando a cabeça para os lados. — Esse posto pertence a Valentina.

Oh! E por quê?

— Porque ela é a minha melhor amiga — disse, enfaticamente. — Nós nos conhecemos desde a infância.

— Mas nós dois somos um duo. — Com um dedo, apontou para o próprio peito. — Possuímos um pacto de alma.

Foi então que duas garotas, as quais passavam por perto da mesa, ouviram a última parte da fala do rapaz e se encararam estranhamente.

— Você ouviu o que aquele cara estranho falou? — cochichou uma.

— "Pacto de alma?" — indagou a outra. — Será que é um daqueles namorados possessivos?

Humph! Vai saber. Essas garotas boazinhas adoram um cafajeste.

Mal sabiam elas que, daquela distância, os dois podiam ouvir claramente cada um dos seus comentários.

— "Garota boazinha", heim? — refletiu o rapaz. — É impressionante como até em outro mundo as pessoas te veem assim.

— É mesmo, "cafajeste"? — Só após proferir aquelas palavras, Petra se deu conta do quanto sua fala poderia soar indecente, principalmente durante um certo momento entre quatro paredes. — É, bem... Quero dizer...

Balançando as mãos em frente ao corpo, tentava corrigir o mal-entendido, mas tudo o que conseguiu foi despertar ainda mais o interesse do seu parceiro.

Com os cotovelos apoiados sobre a mesa, Raizel se inclinou um pouco mais em sua direção — como se quisesse estar o mais próximo possível dela — o que a fez desviar um olhar envergonhado para o lado.

— É, eu diria que não soou tão ruim.

A imagem daquela garota pura cedendo aos seus desejos mais profundos nos braços dele era algo simplesmente... tentador.

Pela noite, os dois se encontravam em uma grande fila, esperando por aquilo que marcaria o encerramento da sua jornada pela Terra.

Ao seu redor, adultos, crianças e adolescentes passavam pelas barraquinhas e brinquedos resplandecentes do parque de diversões.

Empolgação e alegria eram estampadas no rosto da maioria. Casais andavam de mãos dadas ou se abraçavam pelos cantos.

Alguns dos pais, por sua vez, se esforçavam para não perderem as crianças levadas em meio a multidão. Mas, no fim, todos se divertiam.

Após esperarem por tanto tempo, Raizel e Petra finalmente embarcaram em um dos assentos da roda gigante.

Nooossa… — suspirava a garota, ao passo que o brinquedo girava, levando os dois para o alto.

Aos poucos, as luzes das casas e prédios surgiam e se destacavam em meio ao breu da noite, como se fossem vagalumes.

Enquanto Petra tinha seus olhos fisgados pelo panorama noturno de São Paulo, os de Raizel estavam voltados para ela, admirando uma visão mais cativante do que aquelas luzinhas.

Foi quando reparou que os olhos da moça se voltaram para um ponto mais abaixo, o assento em que estavam duas pessoas.

Abraçando-se e trocando carícias, sorriam e davam comida uma para a outra. Petra se lembrava daquela maçã coberta com calda de caramelo, uma maçã do amor.

Antes que percebesse, Petra sentiu um gentil toque em seu ombro, que a puxou devagar em direção a Raizel, até que seu rosto encostasse no peito dele.

— Rai…? — Praticamente sussurrou com sua voz meiga.

— Tá um pouco frio aqui em cima, não é?

Uhum! — Sem esboçar resistência, continuou ali, no calor de seus braços.

O restante do passeio nas alturas foi calmo e silencioso, não havia necessidade de falar nada, eles só queriam aproveitar o momento.

E, ao passo que o brinquedo parava para todos descerem, os dois sentiam que aquele instante estava para acabar.

Um flash iluminou seus rostos de repente, pegando Petra — que estava de olhos fechados e com o rosto ainda encostado no peito de Raizel — de surpresa.

— Uma lembrança para o jovem casal — disse o fotógrafo, enquanto tirava a foto da máquina para oferecer aos dois.

— Nós… — Antes que pudesse negar o comentário do homem, seu parceiro tomou a frente e pegou a foto.

— Obrigado, senhor.

Ao passo que se afastavam do fotógrafo, Petra deu uma olhadinha para trás e depois para Raizel. Mais do que envergonhada, estava curiosa.

— Por que você não disse a verdade?

— Por que eu negaria? — disse enquanto observava a foto em suas mãos. — Além disso, você ficou bem fofinha.

A garota sentiu suas bochechas aquecerem e a vergonha preencher ainda mais o seu peito.

Todavia, essas emoções logo sumiram quando levantou seu rosto e percebeu que eles já não estavam mais no mesmo lugar.

Ainda pareceria que os dois estavam no parque de diversões, se não fosse pelos brinquedos e construções beirando a ruína.

O local que, antes brilhava, estava carregado de trevas e um odor insuportável de enxofre.

— Esse lugar… — Raizel observava, reflexivo, os arredores. Sem pensar duas vezes, criou algumas espadas em volta dele e de Petra.

Como se respondesse à ação do garoto, uma criatura humanoide de pele cinza e profundos olhos pretos saiu das sombras em direção a eles.

Enquanto encarava-os rangendo os longos dentes afiados e espassados, mais dos seres medonhos começaram a se juntar de todas as direções.

— Saiam daqui! — gritou a primeira aberração, ao passo que pulava com selvageria contra os recém-chegados, e um leve brilho esmaecido surgia no lugar de suas pupilas. — Saiam de Setealém!


Saudações, primordiais!

Passando para avisar que, durante o período de hiato, algumas imagens de personagens foram adicionadas em capítulos anteriores, entre eles: 1, 2, 3, 4, 13, 17, 23.5, 37...

Elas também estão disponíveis e organizadas no canal #artes-da-obra no servidor do Discord.

Até a próxima.



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