O Meu Caminho Brasileira

Autor(a): Rafael AS

Revisão: Rafael-AS


Volume 1

Capítulo 1: Sequestro

Hmm...

Espreguicei meus braços enquanto me sentava na cama.

Ah... Mais um dia...

Após esfregar os olhos, olhei para o quarto escuro em que estava, iluminado por uma fraca luz alaranjada de uma vela. Era madrugada.

“Que estranho”, pensei. “Normalmente acordo tão tarde, mas hoje me sinto com tanto vigor. Não, espera...”

Esfregando meus olhos ainda sonolentos, olhei de novo para a vela. Por que diabos eu deixei uma vela acesa no meu quarto?! E se ela cair durante a noite e colocar meu apartamento em chamas? Era muito mais fácil só deixar o monitor ligado se eu quisesse luz...

Só então percebi que esse não era o meu quarto. Um arrepio percorreu a minha espinha. Quanto mais observava o cômodo e via o quão diferente era do meu quarto, mais meu peito estremecia.

Não havia dúvidas. Essa cama, aquela mesa repleta de papéis e frascos vazios, esse quarto... Nunca havia visto nenhum lugar como esse. Só havia uma resposta plausível para como vim parar aqui:

Fui sequestrado.

Com os membros tremendo, me levantei da cama com muito cuidado, suor formando em minha face.

Não sei onde estava e nem o que deveria fazer. Fugir? Correr?

Se eu realmente tiver sido sequestrado...

Engoli em seco.

Se for esse o caso, ficar parado somente dará tempo para o sequestrador voltar.

Meus olhos ficaram molhados. A minha vida estava em risco pleno. Mesmo assim, tive que caminhar até a mesa para sobreviver. Talvez um daqueles papéis pudesse me dar uma pista...

Em cada passo tentei ser o mais silencioso possível, me atormentando pela possibilidade de alguém ouvir meus passos se eles fizerem barulho. Foi quando...

Crack.

Uma parte da madeira em que pisei fez um som considerável que cortou aquele silêncio agonizante.

Engolindo em seco e rezando para que ninguém estivesse me procurando, fiquei parado, tentando não fazer nenhum outro barulho para não perceberem nenhuma atividade no cômodo.

Tum. Tum. Tum.

Sentia meu coração querer sair pela garganta. Era quase impossível conseguir prender a minha respiração para não ofegar de forma audível.

...O tempo parecia se congelar, justo quando mais precisava que ele passasse.

Um, dois, dez minutos... Ninguém abriu a porta, nem fez qualquer som lá de fora. Aos poucos, isso começou a me tranquilizar, e meu coração foi se aquietando.

“Onde será que eu estou?...”

Olhando ao redor, não parecia ser uma cela: muito pelo contrário, era um quarto bem-arrumado, com grossas cortinas brancas que cobriam uma extensa janela. O piso era de madeira escura bem-polida. Em uma das paredes, havia uma mesa de madeira rústica com um grande número de livros e papéis bagunçados, além de inúmeros frascos vazios.

Pensando melhor, esse não é um lugar em que se prenderia alguém. É mais luxuoso que o meu próprio quarto.

A possibilidade de ser apenas um sonho existia. Para confirmar isso, me belisquei. Merda, a dor era real demais para ser um sonho... Além disso, a minha consciência estava ativa demais para não ser real. Mas não tem como ser...

Sem alternativa, criei coragem e caminhei até a mesa, para coletar qualquer informação. Com meus passos, ouvi mais um estalar da madeira do piso, e novamente o meu coração acelerou.

Mas, como antes, não aconteceu nada, não importava quantos minutos se passassem. Um pouco tranquilizado, comecei a ignorar os sons e apenas me sentei na cadeira.

Peguei os papéis e percebi que as letras eram muito diferentes. Não havia nenhuma do alfabeto romano, tudo escrito de forma extremamente cursiva e horizontalizada. Eu nem sabia onde começava uma letra e onde iniciava outra. O que seria essa língua?

De repente senti um choque dentro do meu cérebro.

Argh! — A dor fez me corpo estremecer por um tempo. Fui incapaz de mover meus membros, obrigado a passar por toda aquela aflição com meu corpo paralisado.

Aos poucos, a dor foi se cessando. Ofegante, com meu coração novamente disparado e a testa repleta de suor, peguei o papel com minha mão trêmula.

— Caralho... O que foi isso? — sussurrei, ainda sem entender nada.

Quando li o papel de novo, porém, tive uma estranha surpresa: agora podia ler o que estava escrito.

“O quê?”

Chocou-me tanto essa nova capacidade quanto o conteúdo dos papéis.

“Magia... Apresentação amanhã, dia 09... de... ago... Agosto?”

Na pálida luz, não conseguia ler direito, então aproximei a vela dos papéis para ler melhor.

Runas mágicas de som - Apresentação amanhã, dia 09 de agosto.

Abaixo desse título, inúmeras informações foram colocadas em tópicos. Coisas como:

- Magia tipo ar, especializada em som;

- Runa composta por um heptágono com três triângulos inscritos;

...Por aí ia.

As anotações só me encheram com mais dúvidas. Runas de som? Magia? E... o que é esse desenho no papel? Era como se incontáveis figuras geométricas estivessem envolvidas em uma estrutura complexa e densa.

Li tudo de novo e de novo, mas, não obtive tantos resultados. Eram apenas frases curtas e que exigiam um conhecimento prévio que me faltava. A única coisa que entendi foi que, quem quer que tenha escrito isso tudo, essa pessoa acreditava em magia, com muitas teorias complexas e bem-estruturadas. Isso até me fez me perguntar...

“Apresentação de runa de som?”

Não havia nenhuma resposta logicamente plausível para isso. Não existe magia, e nenhum culto clandestino teria condições de manter seus prisioneiros em quartos luxuosos como esse...

Abri as gavetas da mesa e retirei dela alguns livros grossos.

Enciclopédia de feitiçaria de fogo iniciante;

Manual de magia de Éter: Introdução...

Esses foram os títulos dos livros.

Isso... é uma piada de mau gosto, certo?!

Ao mesmo tempo que tudo me chocava, também curiosidade fisgou meu peito.

Decidi ler. A cada página que lia sobre magia, mais meus olhos se arregalavam. Quando terminei o primeiro livro, de umas duzentas páginas, em uma velocidade surreal e com grande entendimento da obra, não pude deixar de rir.

— Hahaha... — Sentia-me como um louco.

Aquilo tudo era real demais, bem-estruturado demais, e eu adquiria aquele conhecimento com uma velocidade impensável para mim.

Minha mente não poderia processar tudo aquilo.

Como ainda era madrugada, li mais outro livro.

Quando o terminei, a luz do Sol já entrava pelas brechas das grossas cortinas. Meu sorriso cínico representava a ironia e confusão que sentia sobre tudo aquilo.

Entretanto, algo me chamou a atenção. Meus olhos se direcionavam até um calendário que estava na parede. Inspecionando-o, vi que o dia de hoje — antes dele todos estavam marcados com um “x” — estava com uma seta puxando para a palavra “apresentação”.

— Ah...

Não bastava eu acordar em um quarto estranho, com livros que discorriam sobre teoria da magia, mas ainda havia uma apresentação marcada justamente para hoje?!

Não sei o que está mais acontecendo, mas, no meio de toda a insanidade, não seria demais ser só um pouco mais insano e acreditar que devo fazer uma apresentação, né?

Meu Deus... Eu... eu realmente vou fazer isso. Ir além daquela porta...

Com uma pesada respiração difícil de controlar, investiguei o quarto uma última vez, antes de me preparar para explorar o desconhecido mundo que jazia além daquela porta no quarto...

 

 

Uma hora depois, vestia um uniforme chique em cores neutras de preto e branco — a única roupa que encontrei no armário —, enquanto tentava manter uma postura ereta ao caminhar pelo corredor frio, mas luxuoso, com um carpete marrom no chão e madeira bem trabalhada na parede e no teto.

Acima de minha cabeça, fogo queimava em lustres de vidro bem espalhados pelo corredor. Era realmente magia...

Embora tentasse caminhar normalmente e com certa confiança, por dentro estava perdido, sem entender nada que estava acontecendo.

A única conclusão plausível a que consigo chegar é que estou vivendo a história de alguém que é matriculado em uma espécie de academia de magia, ou academia militar, ou algo do tipo. 

Não tenho nem ideia de como isso aconteceu. Na minha vida normal, apenas fui dormir depois de um dia puxado na faculdade. Parece que o sujeito deste corpo atual – cuja aparência nem sei como é – também foi dormir depois de estudar bastante, a julgar pelo tanto de papéis em sua mesa.

Isso tem que ser um sonho...

Sobre os papéis... eles eram notas sintetizadas de uma apresentação que teria hoje. Pelo que entendi deles — o que só foi possível depois de ler os dois livros —, runas são sistemas mágicos que produzem um feitiço específico ao serem ativadas. Podem ser feitas no ar ou gravadas em uma superfície para serem ativadas posteriormente.

No caso da runa de som, havia diversas aplicações, desde criar um mecanismo ativado pela presença de alguém – como uma runa no chão, que, ao ser pisada, criaria um som —, ou criar um sistema que pode ser ativado à distância quando fosse necessário, como para confundir inimigos e fazê-los olhar na direção errada antes de executá-los rapidamente.

Estudar tudo isso me deixou com um gosto amargo, porém. Eu teria que executar pessoas e aplicar essas runas em combates, se continuasse a viver aqui?!

Em um capítulo de um livro, também dava exemplo dessa runa quando lidando com monstros que ouvem melhor que enxergam. Essas runas serviriam como armadilhas. Mas...

Não, muito obrigado. Não quero arriscar a minha vida assim.

Afinal, mesmo se fosse um sonho, não era igual um jogo em que quem sofreria pelas minhas imbecilidades seria o personagem. Não quero me colocar em dor e sofrimento. Só de pensar nisso me deixava receoso... que merda de lugar em que vim parar? Com monstros e coisas aterrorizantes que li naqueles livros?

Enquanto eu andava em um ritmo acelerado por não saber até em que horário eu poderia entrar na suposta sala de aula – se ela existir, e também correndo o risco de me perder pelos corredores desconhecidos –, algo na minha visão fez meus pensamentos pararem.

Foi uma garota de longos cabelos loiros, que se tornavam ainda mais dourados sob a luz do sol que adentrava pela janela. Suas costas e ombros estavam escondidos por um uniforme branco e, embora grosso, aparentemente macio. Da cintura para baixo, uma calça preta, também de tecido firme, exibia o contorno de suas curvas um pouco acentuadas.

Comecei a me sentir um pouco nervoso. E se ela me conhecer? Não tenho nenhuma memória, e acho que não sou algo como um fantasma, certo? Será que seria melhor evitá-la? Ou... poderia a seguir até a sala, se estivermos juntos?

Decidindo não a ignorar para não parecer tão suspeito, apresso os meus passos até chegar ao seu lado. Encarando-a com um sorriso — o melhor que consegui expressar naquela ansiedade —, disse em um tom amigável e sereno:

— Bom dia.

Ela me olhou de volta. Por um segundo, seus olhos azuis me fitaram com uma expressão surpresa, mas logo seus lábios se abriram em um sorriso.

— Bom dia, Flamel — disse ela com uma voz delicada que suavizou um pouco a ansiedade do meu coração. Ela parecia gentil. Deve ter uma certa amizade comigo... ou com quem quer que estivesse nesse corpo.

Espera... E se, na verdade, tudo que conheço da Terra, dos telefones e de tudo, for na verdade um sonho, e eu na verdade sou esse tal de Flamel?

Antes que eu me perdesse mais nos pensamentos, cortei meu raciocínio para não ignorar a garota.

Com mais tranquilidade por causa da gentileza dela, decido tentar puxar uma pequena conversa para adquirir mais informações. Como ela parece ser também uma estudante...

— Esses trabalhos têm ficado cada dia mais difíceis, não é? — pergunto com uma risadinha.

Em contraste com o que imaginava, ela me encarou com uma expressão duvidosa.

— Para já estar assim na segunda semana de aula, parece que você acumulou bastante cansaço no último período?

Ops. Fiz besteira. Meu coração disparou novamente.

Sem saber o que dizer, ri um pouco.

— Pois é — assenti e deixei o assunto morrer. Pelo menos adquiri três informações:

- Meu nome é Flamel;

- É o início de um novo período na academia;

- Ela provavelmente é da minha sala.

Caminhando em silêncio ao seu lado, não pude extinguir o sentimento de que eu deveria lhe dizer algo, puxar algum assunto. Mas, de verdade, não sabia como fazer isso.

De vez em quando, olhando em sua direção, via pela janela imensos pátios, alguns com arenas de batalha, outros com campos de treinamento repletos bonecos-alvo, outros como uma sala de aula aberta à natureza...?

De qualquer forma, evitei contemplar a janela, pois a garota poderia entender que estava a observar ao invés da paisagem.

No meio do percurso, ela me olhou. Seus olhos eram curiosos.

— Está preparado para a apresentação de hoje?

Então realmente há uma apresentação...

Hahaha... Isso não faz sentido nenhum.

Felizmente, desde que acordei de madrugada, li todos os materiais em busca de alguma explicação do que acontecia. Isso me fez entender parcialmente as anotações feitas por Flamel.

— Um pouco. — Coço a minha cabeça em um leve embaraço. — Você vai apresentar hoje também?

Com seus cabelos voando um pouco ao vento, ela virou a um corredor à esquerda. Antes de prosseguir seu caminho, virou para mim com um sorriso.

— Sou do seu grupo, avoado.

Ela riu e se virou, seguindo alegremente pelo corredor. O que a deixou tão animada? E para onde ela está-

— Vou no banheiro, pode ir na frente! — disse ela, interrompendo meus pensamentos, enquanto continuava adiante com uma risadinha.

Não entendi nada que aconteceu, então dei de ombros e continuei o caminho reto, rumo a... a algum lugar.

Espera... sobre minha conversa mais cedo, ela foi em que idioma?

Com essa dúvida, após mais alguns minutos caminhando pelo extenso corredor que às vezes se ramificava em entradas laterais, finalmente cheguei em uma escada que descia à frente. Segui por ela, até que a saída se abriu em uma praça de pedra com um jardim exuberante a circundando.

Alguns estudantes estavam caminhando por lá, a maioria em dupla ou em grupo, mas o número ainda era baixo. Todos vestiam sempre uniformes parecidos das tonalidades de branco e preto, como se fosse um padrão. Como essa era a única roupa mais formal que eu tinha no armário, então eu estava em sorte por não poder escolher algo diferente, se não passaria vergonha e...

Pior ainda que vergonha: atenção. Naquele mundo, todos poderiam me conhecer, mas não tenho memórias de ninguém.

Esse pensamento me fez engolir em seco e começar a suar. Ali, no meio de todos, eu já poderia ser alvo de alguém. Sozinho, desamparado, sem aliados, cercado por desconhecidos que possuem uma história talvez não amigável comigo...

Felizmente, ninguém parecia me olhar em específico, o que me relaxou.

Observando melhor, pela folga com que todos andavam, eles estavam bem relaxados, o horário da aula deve estar tranquilo... Vim mais cedo do que deveria.

Tendo esse tempo de folga e querendo fugir de todos ali, decidi andar pelos arredores e conhecer um pouco mais aqueles pátios que vi pelas janelas anteriormente.

“Deve estar tudo bem em andar por aqui, certo?”

Discord da Obra



Comentários