Volume 1 – Arco 2
Capítulo 27: Eu não sou o Melhor do Mundo.
A misteriosa mulher continuou subindo pelos degraus, caminhando em direção a nós. Passando pelo cavaleiro de ferro, deu-lhe um pequeno carinho e continuou.
Ela passou, abrindo caminho pela elfa negra e chegando próxima do elfo superior caído nas escadas.
— Deixe-me ajudá-lo.
Ela estendeu a mão para ele, mas o jovem apenas estalou a língua, recusando a ajuda e se levantando sozinho.
— Hm. Obstinado — comentou, deixando sua atenção ao sujeito de lado. — Bem-vindos, queridos. Esses que vocês viram é o Rocks. Peço outra vez que perdoem-no pelo susto. Ele é um bom garoto.
Achei engraçado a forma com que ela tratava o golem. Quase como se ele fosse seu próprio filho. Não ousei rir, claramente. Conseguia sentir que seu poder estava muito acima das minhas capacidades.
— Sou uma mestra — continuou ela — assim como vocês. Aqui é um evento para entretenimento e socialização, então não precisam ficar assustados. É claro, possuímos regras e logo explicaremos elas aos senhores. Primeiramente, gostaria de saber quem de vocês possuí o emblema golem.
Um segundo se passou e duas ou três pessoas levantaram a mão.
— Por favor, aqueles que levantaram a mão, me acompanhem; eu serei sua guia. Aos demais, esperem e logo também serão guiados. Caso vocês tenham mais de um emblema, é só seguir o mestre que preferirem. — Ela sorriu, mas era difícil dizer se era verdadeiro.
Logo ela levou os mestres que levantaram a mão com ela enquanto desciam as escadas. O cavaleiro de ferro seguiu atrás com passos lentos e pesados.
Aquele elfo pareceu ter entendido o recado e voltou a subir a escadaria. A elfa negra que o acompanhava desapareceu outra vez em sua sombra.
Uma habilidade bem útil, diga-se de passagem.
E, assim, aguardei. Um por um mestres iam surgindo para guiarem os novatos e eu pensava um pouco nervoso.
Meu emblema é vampiro, mas o que recebo da masmorra é Bestial. Com quem eu deveria ir? Ah! Seguirei o primeiro.
Os guias continuaram. Todos possuíam forças que eu não poderia sequer imaginar medir e havia até emblemas que eu nunca havia visto.
De repente, três mestres subiram as escadas ao mesmo tempo e eu senti um arrepio subir pelo meu pescoço. Aqueles três com toda certeza eram os mais fortes que apareceram até o momento.
Dois deles eu não reconheci a raça, mas o terceiro era mais do que óbvio.
Um Rei Elemental de Fogo.
O corpo inteiro dele era feito de fogo. Uma massa vermelha de calor surreal. Apenas sua aparição já fez com que todos sentissem seu poder.
No entanto o mais incrível de tudo era o fato do calor não machucar. Era mais como um abraço reconfortante. Obviamente, ele chamou os que possuíam o emblema de fogo.
Os outros dois eram estranhos. Um deles era alto, possuía longos chifres de carneiro que apontavam perigosamente para frente e usava uma máscara de caveira. O seu emblema era o da morte.
A outra parecia ser de uma raça élfica, mas ela tinha longas asas translúcidas e cintilantes, além de uma pele rosada e flutuava levemente um pouco acima do chão. O seu emblema era o das fadas.
Ambos chamaram por seus novatos, mas cada um levou apenas um consigo. Apesar da raridade, os novatos deles não pareciam muito notáveis. Um era um esqueleto com uma aura um pouco mais sombria e o outro uma fada, os seus companheiros também não eram grande coisa.
Logo atrás daqueles três, surgiu um ancião que era tão grande quanto o rei elemental de Fogo. Ele era um elfo e sua barba era longa e grisalha. Tinha um jovem elemental de fogo pousado em seu ombro.
Não me parecia ser muito especial, sendo até mais fraco que os três que vieram antes. Pensei que o elfo superior arrogante o seguiria, mas ele fingiu nem o ver.
O ancião apenas o encarou por um instante e deu de ombros, levando outros do emblema élfico. Notei que a maioria dos vampiros havia partido com seres de outros emblemas.
Assim que o elfo velhote saiu, finalmente chegou a minha vez. Uma presença poderosa começou a subir as escadas.
Cabelo vermelho longo, como fios de sangue, escorria pelas suas costas e um par de tranças caiam por um dos lados da cabeça.
Havia um par de orelhas também vermelhas que subiam acima da cabeça, como orelhas de um lobo; sensíveis e trêmulas, escutando todos os sons distantes.
Possuía ombros largos que desciam em braços musculosos de pele morena. Eles eram cheio de cicatrizes e havia um espécie de tatuagem de lâminas duplas no esquerdo.
Usava um longo vestido vermelho agarrado ao corpo que deixava um decote no peito, onde estava um colar que terminava em um dente afiado. Acima do colar, havia uma raposa toda branca enrolada no pescoço como se fosse um cachecol.
Seus passos eram pesados. Quando se aproximou mais, consegui escutar suspiros e corações acelerados. O dia mal começou e já havia visto duas das mais belas mulheres de toda minha vida.
Quando estava próxima, abaixou-se levemente para endireitar os sapatos, mostrando-me suas costas largas e extremamente musculosas. A aura ao redor dela era de proteção.
Todo o seu corpo exalava o máximo de dois mundos completamente distantes e diferentes. Meus olhos desceram pela sua fina cintura e, a cada passo, conseguia ver de relance o par de pernas surreais dela.
Precisei me segurar para não ficar boquiaberto. O quão perfeito poderia ser um corpo como aquele? Além disso, eu não poderia nem mesmo calcular seu poder ou saber sua raça. Uma coisa tinha certa; ela era mais forte que o elemental de fogo.
— Aqueles com emblema bestial, por favor, me sigam. — Diferente dos demais que levavam entre cinco e dez com eles, mais de quarenta novatos levantaram a mão e foram com ela. Como não surgiu ninguém com emblema de vampiro, decidi seguir ela.
Me enfiei no meio do enorme grupo para passar despercebido e descemos as escadas, afinal. Nesse momento, eu senti uma presença avassaladora.
Todos que desciam as escadas paralisaram, inclusive a mestra bestial que olhou friamente para baixo.
Vagarosamente ele subiu pelas escadas. Era pálido como uma folha branca, os olhos vermelhos eram da cor de um coração ainda pulsante, mas eram tão cegos e frios quanto um deserto à noite.
O corpo era forte, com um tronco poderoso e um rosto delicado, moldado quase a perfeição. Passos suaves como se sua existência não afetasse as dos demais.
A mestra bestial instantemente olhou em seus olhos quando ele passou. Sem temer, mas ainda com respeito.
Entre os mais arrogantes, aquele homem era um rei.
Eu odeio Reis.
Instantaneamente soube qual era a sua raça. Uma das mais poderosas que existiam no mundo. Uma criatura que surgiu junto dos primeiros monstros.
Um ser original e puro.
Um vampiro primordial.
Dentro da hierarquia, não havia algo acima. Ele era um monstro que poderia destruir impérios sozinho, mas o pior era que ele nunca estava sozinho. Sempre era acompanhado de milhares de familiares.
Assim que subiu ao salão, me virei para ver quem iria acompanhá-lo. Para a minha surpresa, ele não era o guia daqueles com emblema dos vampiros.
A sombra dele também se moveu, idêntica a sombra daquele elfo arrogante e uma vampira mascarada, com apenas os lábios vermelhos do lado de fora, surgiu usando um vestido de casamento todo preto.
— Aqueles que possuem o emblema das sombras, por favor, sigam-nos.
Outro emblema a qual eu nunca havia escutado. Em Vanglória, eu tinha uma suposição. Havia cerca de 100 emblemas. Por que eu acreditava? Eu tinha uma certa lógica baseada na quantidade monstros que eu conhecia os emblemas e pelo próprio sistema do jogo.
Monstros normalmente não poderiam ter mais do que cinco emblemas. A razão para isso era óbvia. Tantos poderes juntos poderiam causar um desiquilíbrio.
O monstro com mais emblemas que já vi foi um Slime Elemental. Ele, além do emblema bestial padrão, também tinha outros quatro elementos naturais: Fogo, Água, Terra e Ar.
Com isso em mente e, graças as informações dadas a mim pelo sistema, criei uma lista com todos os emblemas que eu conheci nesse mundo:
1° Humano |2° Bestial |3° Gigante
4° Vampiro | 5° Nobre | 6° Élfico
7° Sombras | 8° Demoníaco |9° Angelical
10° Fogo | 11° Água | 12° Terra
13° Ar | 14° Luz | 15° Morto-Vivo
16° Vida | 17° Gelo | 18° Dragão
19° Fada | 20° Golem | 21° Morte
Era um lista curta em comparação aos que faltavam, mas logo ela aumentaria de tamanho significantemente.
Para minha surpresa, quem levantou a mão foi o jovem elfo. Ele seguiu atrás do vampiro primordial e sua serva junto de mais outros dois mestres.
Ninguém ainda havia se movido. A mestre bestial continuava o encarando, porém ele não deu atenção à ela. Senti sua expressão se afetar por um momento. Um pouco de fúria.
Assim que passaram pelo grande grupo paralisado nas escadas, vi o desgraçado do elfo superior abrindo um sorriso irritante em nossa direção.
Ah, eu daria tudo para quebrar a cara desse maluco.
Não sei se foi raiva, ou apenas idiotice minha, contudo acabei liberando um pouco do meu mana acidentalmente. Foi tão rápido que achei que ninguém havia notado.
Suspirei um pouco aliviado...
Deixe-me! Deixe-me assumir!!!
De repente aquela voz, surgiu na minha cabeça querendo o controle. Foi quando isso aconteceu, que notei o par de olhos pesados me observando.
Engoli seco quando virei meu olhar e eles se encontraram com aquela massa de poder vermelha. O enorme vampiro me olhava diretamente; olhos nos olhos.
Suas sobrancelhas estava enrugadas e o seu olhar era afiado. Um calafrio instantaneamente desceu pela minha espinha. Aquele cara, ele era simplesmente estúpido de forte. Muito mais forte do que eu poderia sequer imaginar.
Eu era uma formiguinha inofensiva ao lado de uma montanha gigantesca. Só por ficar perto da brisa que descia por ela, eu poderia sair voando e ser destruído pelo ar.
Ele era mais forte do que qualquer monstro que criei nesta e na minha outra vida.
Ele é melhor do que eu.
Logo ele desviou o olhar e sussurrou algo no ouvido da sua serva.
Brevemente voltou a descer, a pressão aterrorizante passou e pude ouvir o que os outros diziam.
— Nossa que medo!
— Medo?! Quando ele olhou para cá eu pensei que iria morrer! Juro que vi minha vida passando pelos meus olhos.
— Sua vida? Não me deu nem tempo de pensar. Eu entrei em choque.
Pela primeira vez em toda a minha vida, eu me senti exatamente como aquela multidão. Eu não era diferente deles; eu não era especial.
— Ufa! — suspirou a mestra bestial, escondendo seus verdadeiros sentimentos. — Vamos, pessoal, temos muito o que ver ainda hoje.
Voltamos a descer as escadas em conjunto. Senti levemente um toque suave da Cristal que parecia compreender que havia algo errado comigo.
— Está tudo bem, Cristal. — Sorri falsamente.
Conseguia sentir, bem lá no fundo, mesmo que inconsciente disso, havia algo que se quebrou dentro de mim.
Eu não sou o melhor do mundo...