O Mestre da Masmorra Brasileira

Autor(a): Eduardo Goétia


Volume 1 – Arco 1

Capítulo 6: Coelho Chifrudo

Andamos calmamente em direção à saída. Os goblins não tinham uma marcha continua, distraiam-se com facilidade e acabavam sempre arrumando confusão uns com outros. Isto acabou resultando em um atraso na saída.

Entretanto o primeiro goblin invocado parecia ter assumido uma posição de líder. Sempre que um dos verdinhos tentava fazer alguma confusão, ele usava o taco, aquele que dei a ele, para acertar uma porrada na cabeça do baderneiro.

Após uma curta caminhada, alcançamos os portões da masmorra. Empurrei eles e todo o grupo saiu — comigo na liderança, é claro.

Ainda era dia do lado de fora, mas o sol já se aproximava do horizonte, por isso me adiantei.

— Andem em grupos de dois e não se afastem muito desse ponto — disse para eles e sinalizei para que se afastassem. — Lobo, você vem comigo.

O lobo soltou um uivo alto e me seguiu. Os únicos restantes eram o esqueleto e o primeiro goblin invocado que acabaram formando uma dupla.

Queria deixar bem claro a importância de se ter segurança. Caso vissem qualquer coisa incomum, precisavam reportar para mim o mais rápido possível.

Contudo confiar em goblins não era a melhor das opções.

— Vamos por aqui. Se ver qualquer coisa, avise-me de imediato. — Segui em uma direção com cuidado.

A floresta era bem densa. Após apenas alguns metros, eu já não conseguia enxergar a masmorra. A única coisa que dizia que ela estava por ali, era a conexão que me ligava ao Núcleo dela.

Tomei cuidado onde pisava, pois poderia haver armadilhas. Também me concentrei nos arredores. Eu não possuía nenhuma habilidade de localização ou defesa, portanto, caso eu sofresse um ataque surpresa, apenas morreria.

Morrer aqui não me parece uma boa ideia.

De repente, o lobo começou a agir de maneira estranha. Ele começou a sentir um cheiro e rosnou para que eu o seguisse. Abaixei meu corpo e prestei atenção nos movimentos do lobo, seguindo-o com calma.

Após alguns metros, ele abaixou o corpo e se escondeu por detrás de uma moita. Seguindo o seus passos, também me escondi.

Logo, uma pequena criatura brotou de uma das moitas. Ela possuía um pequeno chifre afiado na ponta da cabeça. Também tinha um corpo pequeno todo branco e olhos vermelhos.

— Um Coelho Chifrudo... — Reconheci a criatura como um dos monstros mais fracos que havia em Vangloria.

Rapidamente levantei a mão e tentei ler as suas estatísticas. Contudo nada ocorreu.

Que estranho. Em Vangloria era possível ver as estatísticas de monstros e itens, por que aqui não é?

Tornou-se ainda mais perigoso rondar as redondezas. Por alguma razão, eu não conseguia ver estatísticas de monstros que não fossem da masmorra. Até testei isso, olhando para as estatísticas do lobo branco, mas estava tudo normal.

O coelho chifrudo continuou a pastar, parecendo não notar que estávamos por perto. Apesar de não conseguir ver as suas estatísticas, tenho lembranças de que a maior parte deles não possuía nem 5 pontos, portanto preocupar-se não era algo relevante.

— Lobo... Ataque! — ordenei com firmeza e, seguindo o que disse, pulou de dentro da moita em perseguição ao animal.

Previ que o ataque seria perfeito. O coelho estava distraído e o lobo era extremamente ágil. Contudo, para a minha surpresa, a criaturinha desviou do ataque com precisão. Ele então realizou alguns movimentos no ar que achei que fossem impossíveis e recuou para uma distância segura.

— O que foi isso? — Ainda de dentro da moita, contive meu grito e encarei aquele animal com outros olhos.

O lobo branco rosnou e bateu com as garras no chão, criando uma atmosfera de tensão no ar. O coelho não recuou ou temeu por um instante, colocando-se em posição de ataque.

— Tem realmente algo de errado aqui...

Atacando diretamente, o lobo correu para o abate. Ao chegar no alvo, porém, recebeu em mãos apenas o ar, pois o coelho outra vez executou movimentos em pleno o ar, como se pudesse saltar nele.

De repente, percebi o que era e coloquei uma flecha no meu novo arco. Aquela luta não seria tão fácil assim.

O animal cortou pela ar e, em um salto preciso, acertou um golpe em uma das patas do lobo. O sangue vazou e um rosnado de dor ressoou. O chifre era curto, então o ferimento não foi profundo, mas ainda doía.

Caso o lobo sofresse mais um dúzia de ataques, a morte era certa.

Minha flecha já estava no arco e eu apontava diretamente para a cabeça do pequeno. Entretanto os rápidos movimentos dele impediam-me de ter uma precisão adequada do alvo. Precisava que ele se distraísse por um instante.

Cheio de fúria, o lobo branco atacou outra vez. Esta era minha chance de matar a criatura. E, outra vez, o Lobo errou o seu alvo, fazendo com o que o coelho fizesse outra vez os movimentos no ar.

Quando ele deu um terceiro pulo no ar, minhas dúvidas se dissiparam. Aquela era uma habilidade conhecida como manobra tridimensional. Não era algo que um simples coelho pudesse ter, então realmente as coisas não estavam bem.

Todavia, ao acertar o ataque, uma brecha de alguns segundos era criada até ele poder reutilizá-la e essa era a minha chance de contra atacar.

Como previ, ele outra vez acertou um golpe no lobo; desta vez foi em uma das patas do animal. Neste meio tempo, ele soltou do canino e pisou no chão. Sem perceber, uma flecha já voava com rapidez em sua direção.

Um som suave ressoou, seguido de um impacto repentino. O corpo sangrento do coelho bateu em uma árvore e ficou ali, pendurado e contorcendo-se dor. Após mais alguns segundos de sofrimento ininterruptos, o animal deu o seu último suspiro.

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[Coelho Chifrudo Morto]

[Conquista]

Nome: Primeira Morte

Grau: Comum

Prêmio: 100 Pontos

Descrição: Você acabou com a vida de outra criatura viva. A morte é uma força avassaladora. Cuidado ao brincar com ela.

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Vendo o coelho morto, soltei um suspiro de alívio e sai da moita. Acabei notando que o Lobo Branco ainda observava e rosnava para o cadáver. Isto nunca havia ocorrido antes em Vangloria, por isso estranhei.

— Pode se acalmar. Ele está morto... — Tentei me aproximar e colocar a mão no lobo, mas fui recebido com um ataque das suas garras. Dei um passo para trás e o encarei com fúria.

Notando o seu erro, o lobo abaixou a cabeça e deitou no chão, parecendo arrependido. Decidi deixar, desta única vez, isso para lá. Ele estava extremamente aguado.

— Então você é realmente um ser vivo, não é? Venha aqui. — Lembrei-me que agora eu não estava em um jogo e esse animal acabara de vir ao mundo, nunca antes tendo experimentado dor. Apesar de estar no auge da sua vida, ele não era nada mais que uma criança.

O lobo aproximou-se devagar, como um cachorro de rua abandonado.

— Está tudo bem. Você foi corajoso. Não tentou fugir em nenhum momento durante a batalha, por isso tenho orgulho de você. Agora venha aqui — disse algumas palavras de consolação e notei que o lobo mexia o rabo um pouco animado.

Aproximando-se, olhei para as feridas que ele recebeu. Ainda sangrava um pouco e havia um vermelho pintado no seu belo pelo cor de neve, sujando a antiga magnificência que apresentou antes. Naquele momento, o lobo branco era apenas um animalzinho indefeso.

— Quando retornarmos farei questão de curá-lo, então não se preocupe.

Como um gesto de lealdade, o animal deu algumas lambidas na minha mão. Eu abri um pequeno sorriso.

— Consegue ficar de pé? — Ele soltou um uivo suave e, com um pouco de dificuldade, se levantou.

Aparentemente, ele era uma besta forte e tinha uma grande determinação. Não deveria ver aquele ato de ataque como algo ruim, mas uma certeza de que ele não recuaria em batalha.

— Ótimo então. Já iremos nos reunir com os outros, deixe-me ver isso antes.

Apontei para o cadáver pendurado na árvore e andei na direção dele. Arranquei a flecha da árvore e o corpo caiu no chão. Achava que Vangloria era realista, mas aquele corpo arrebentado de dentro para fora me causou enjoo e um sentimento de medo latente.

Engoli a vontade de colocar tudo para fora, apesar de não ter comido nada desde que cheguei aqui, e segurei o coelho com firmeza em uma das mãos. Em outro momento, buscaria pela Pedra de Mana que ele poderia possuir.

 Chamei o lobo e desaparecemos por entre à mata.

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“Ao Sul da Capital Imperial dos Nobres Vampiros, há uma Reino de porte médio, que entrava constantemente em conflito com o seu vizinho mais ao Sudoeste. As suas fronteiras se encontravam em maioria em Campos abertos de grama, portanto os conflitos e guerras se desenrolavam entre grandes exércitos armadurados.

Todavia havia um único ponto de fronteira entre esse dois reinos que era de um terreno diferente dos demais.  E, também, havia três territórios que faziam divisa por essas terras: Um pequeno Baronato e dois Condados.

O Famigerado terreno era conhecido como “A Floresta de Sort”, um lugar ainda inexplorado; rico em mana, minérios e tesouros, mas também recheado de perigos.

Ele não era explorado por várias razões. O tamanho do território, por si só, já aproximava-se de um dos reinos que faziam fronteira com ele. Outro ponto crucial era o fato de que aquela floresta era cercada pela fronteira entre 5 reinos de igual poder bélico.

Aquela terra não tinha dono legítimo... Mas, na verdade!, ela possuía sim donos...

Os perigos que rondavam por aquela mata eram famigerados e multiplicados de tal forma que tornou-se até parte da cultura dos reinos ao seu redor.

Poucos são aqueles que se atrevem a entrar em Sort, menores são aqueles que saem vivos para lhes contar essa história” — Conde Edyard — O Belo Reino ao Sul.

Livro Escrito 2 meses antes da morte do Conde que o narrou; nunca chegou a ser publicado. Rascunho recuperado por um Soldado de Ossos chamado Ian durante o saque ao Condado.

1 ano e 6 meses após a Invocação de Kayn.

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