Livro 1

Capítulo 4: O Grimório Guloso (4)

Theo engoliu inconscientemente.

Pois o som do Gula o chamando, um som que parecia vir direto das profundezas de um abismo, havia lhe deixado tenso. Então ele relaxou seu pescoço.

Theo precisava dizer alguma coisa, mas seus lábios não estavam se movendo. Felizmente, a voz estava lá para lembrá-lo.

< O grimório guloso, Gula, saciou sua fome. A inteligência do Gula foi restaurada temporariamente. E ele está disposto a pagar o portador que saciou sua fome. >

< O estado atual do Gula está incompleto. Por favor, no futuro, o forneça comida em abundância para restaurar seu desempenho. O Gula cairá em um sono profundo, exceto quando for pedir por comida. Ele lhe responderá uma questão imediatamente após saciar sua fome. A sabedoria do antigo grimório Gula, é verdadeiramente vasta.>

< Por favor, faça sua pergunta antes de o Gula cair no sono. >

A explicação foi detalhada, mas a conclusão era simples. Uma pergunta e uma resposta… Significava que ele receberia uma resposta para uma pergunta feita.

De acordo com a descrição da voz estranha, o Gula era um grimório muito antigo. Ele devia ter passado anos engolindo livros, então o conhecimento que ele possuía devia ser enorme. Mesmo se ele só comesse um livro por dia, seria por volta de 300 livros por ano. Se todos os livros fossem relacionados à magia, então o valor realmente não podia ser mensurado.

Para magos buscando sabedoria infinita, o valor dessa conversa podia ser maior do que o coração de um dragão.

Qual pergunta eu devo fazer?

Ele não tinha muito tempo para pensar sobre isso. Esse pequeno sujeito só abriu os olhos por um momento por que estava com fome, mas logo ele cairia em um sono profundo novamente. Theo não sabia quando ele faria isso, mas sabia que seria logo.

O que devia ser perguntado, e quais respostas deviam ser buscadas? Theo olhou dentro de si mesmo.

Eu tenho que perguntar algo que irá me beneficiar agora.

Para o Theo, que acabou de se tornar um mago do 2º Círculo, o conhecimento de magias antigas não teria sentido. Perguntas sobre tesouros escondidos e a habilidade para encontrá-los eram coisas separadas.

Havia um conto antigo que dizia que ser excessivamente ganancioso seria um convite para um desastre. Theo não tinha a intenção de ser um idiota como essas pessoas. Sendo assim, as questões que ele podia fazer agora estavam definidas.

— Eu farei uma pergunta.

Gula respondeu brevemente.

— O quê, me pergunto?

A voz continuava assustadora, mas ele pôde resistir melhor essa segunda vez se comparado à primeira. Mas o Theo ainda não podia parar o sentimento assustador que percorria sua espinha, porém ele conseguiu abrir sua boca de alguma forma.

— Gula, eu gostaria de saber informações sobre você. Deixe-me saber que tipo de grimório você é.

Houve silêncio por um momento. Seria essa uma pergunta inesperada?

Theo não sabia. Ele apenas sentiu que a voz se tornou mais clara.

— Certo.

Ele concordou em responder sua questão.

— Contudo, para me entender, sua visão… limitada, pobre. Por linguagem, transmitir, não pode.

Theo franziu as sobrancelhas pelas palavras. O grimório não podia transmitir na forma de linguagem? Era o mesmo que dizer que não poderia responder à pergunta, e a razão era porque a capacidade de compreensão do Theo era limitada e pobre. Theo nunca ficava para trás quando se tratava de seu cérebro, ainda assim ele não conseguia atingir os padrões do grimório antigo.

Contudo, as palavras do Gula não pararam por aí.

— Eu, visualizar, informação. Mostrar isso, humano, portador.

Visualizar?

— Isso, pelos sentidos.

Ele disse.

Logo que o diálogo terminou, caracteres estranhos fluíram da palma de sua mão esquerda para a cabeça do Theo. Havia números, letras, e conceitos de linguagem. Ele se sentiu tonto e entendeu porque o Gula não poderia transmitir isso na forma de linguagem. Era algo que desafiava o senso comum.

Esse… grimório…!

Grimório…

Não era um livro nem um feitiço mágico. Era um fragmento de uma existência que zombava do mundo. Os melhores magos vivendo atualmente não seriam capazes de criá-lo. Mesmo o Theo, que havia recebido informações sobre o Gula, mal podia explicar sobre ele.

Sim, o Theo só viu uma forma vaga.


< Grimório “Gula” / Ranque F >

< Efeitos: Afinidades elementais aumentada em 1p; Sensibilidade mágica +10; Calibração e criação de círculos mágicos; Magia “Relâmpago” adquirida; Proficiência com a magia “Escudo” aumentada.

* Estado incompleto. A maioria das funções estão seladas.

* Uma vez por dia ele irá acordar para saciar sua fome.

* Imediatamente após saciar sua fome, ele irá responder uma pergunta.

* As habilidades que ele consumir serão dadas ao seu portador.

* Ele extrai a essência de livros ou itens consumidos. Quanto maior a compreensão do portador, maior a eficiência. >


De fato, era uma descrição fácil de entender. Talvez ele tenha sido frequentemente usado por humanos antes de entrar na mão do Theo. De outra forma, seria difícil resumir as informações em palavras tão claras.

Enquanto o Theo revia as informações em sua cabeça várias vezes, o Gula bocejou.

— Hahh… então, eu respondi…

A voz do Gula foi se abafando até não poder mais ser ouvida. A língua e o buraco desapareceram.

Theo olhou em sua mão esquerda com uma expressão vazia. Não havia traços restantes dos cinco livros que foram engolidos. O conhecimento permanecia em sua cabeça, e o poder mágico desconhecido provou que isso era real.

Ha… hahaha…

Uma risada seca emergiu de algum lugar. Ele não se deu conta de onde vinha até seus lábios secos se tocarem. Theodore Miller… O som vinha de sua própria boca.

Essa era a mesma biblioteca, um lugar para onde ele fugia de sua realidade desamparada que o desprezava. Como ele poderia saber que encontraria algo incrível nesse lugar?

Eu posso me graduar. Não, agora a graduação não é mais um problema. Haverá ainda mais chances!

Theo tinha uma cabeça boa, mas não podia fazer nada se tratando de magia. Ele absorvia conhecimento como se estivesse colocando água em um poço sem fundo. Theo entendia que isso não significava nada, mas ele não desistiu. Ninguém mais havia notado seu talento exceto o Professor Vince. Mesmo os esforços do Professor Vince eram como uma pilha de folhas. Ainda assim, um broto já havia brotado dessas folhas mortas…

< Quanto maior a compreensão do portador, maior a eficiência. >

O significado dessa sentença curta era algo que o Theo atual não podia nem imaginar. Não era apenas memorizar livros e fórmulas. Cada vez que as notas se enchiam com sua caligrafia, sabedoria começaria a aumentar em seu cérebro.

O próprio Grimório havia selecionado seu portador. Não era uma coincidência que o Theodore, que buscava mais conhecimento do que qualquer outra pessoa foi aquele que o encontrou.

*Ding*

Um som forte de sino quebrou o silêncio. Theo olhou reflexivamente para o relógio em um canto da biblioteca. Os ponteiros do relógio estavam apontados para cima. Já era hora de os dormitórios serem fechados. Ele descobriu o Gula por volta das 22h, então algum tempo já havia se passado.

Eu não poderei dormir na minha cama, mas… eu estou me sentindo muito bem.

Seu poder mágico estava cheio de excitação. Nesse momento, Theo estava confiante de que ele poderia ter sucesso em qualquer magia do 2º Círculo. Sua sensibilidade só aumentou ligeiramente, mas esse sentimento de satisfação era assustador.

Theo olhou mais uma vez para as informações do Gula. Havia uma breve menção da mudança em sua sensibilidade.

Sensibilidade mágica +10.

Não era um número grande, pois ela só foi aumentada ligeiramente. Ainda assim, e se esses 10 aumentassem para 20, 30 ou 100? Podia levar algum tempo, talvez algumas décadas… mas ele podia conseguir.

…Certo, eu irei ler mais alguns livros.

Theo queria usar magia, mas a biblioteca não era lugar para isso. Se ele colocasse fogo em algo acidentalmente, ele não sabia qual punição receberia dos professores. Era necessário escolher os livros para o Gula com antecedência, e isso seria mais útil do que dormir na cadeira.

Theo se moveu com empolgação em seus passos. Os livros que eram como “tortas no céu”, agora eram mais como baús de tesouros colocados bem à sua frente.

A existência da carta de reprovação em seu bolso já havia sido esquecida há muito tempo. Agora que seu sonho de longa data estava bem à sua frente, Theo não tinha tempo de pensar em desistir da academia.

O grimório guloso, Gula…

Este foi seu primeiro encontro com o Theodore Miller.



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