Volume 1 – Arco 4
Capítulo 53: Pensando (1)
Cale começou a pensar:
"Será que devo fugir?"
As pupilas do homem-baleia o encaravam com intensidade, seus dedos afundando no chão — dava para ver que ele estava usando muita força para se apoiar — ele tinha uma força impressionante, mesmo estando a beira da morte. No entanto, havia algo que estava deixando Cale intrigado.
"Um membro da tribo baleia sendo afetado pelo veneno das sereias?"
Foi então que percebeu.
"Mestiço."
Essa era a única resposta possível. Ele rapidamente tentou se recordar do conteúdo de "O Nascimento de um Herói". Não havia nenhum personagem mestiço na Tribo Baleia, que tinha uma população quase tão pequena quanto a dos dragões.
"Mas houve um que morreu."
Cale começou a franzir a testa preocupado.
— Ugh.
A baleia não conseguia mais se arrastar. Sem forças, o seu corpo começou a tremer. Nesse momento, Cale ouviu a voz do Dragão Negro em sua cabeça.
— Humano, você não vai ajuda-lo? — perguntou desconfiado.
Ele não respondeu à pergunta e se levantou. Odiava ter sentimentos inúteis e ficar estendendo a mão para ajudar alguém sem motivo. No entanto...
— Ei. — disse o ruivo ao se aproximar do mestiço e se agachar na frente dele.
O meio humano, que tremia no chão, ergueu a cabeça. O belo homem de cabelos longos realmente fazia jus aos rumores de que as baleias eram tão bonitas que faziam os elfos parecerem lulas. Alguém tão charmoso olhava para ele fixamente.
— M-Me salve...
— Sim, eu vou te salvar. — respondeu sem emoção.
"Um mestiço da tribo baleia."
Cale sabia que poderia ser mais doloroso para esse rapaz viver do que morrer daqui a pouco. Ele tinha certeza de que o homem-baleia também sabia disso. Então, lembrou-se da conversa que o Rei da Tribo Baleia teve com Lock na novel.
❖ ❖ ❖
— Você é um lobo de sangue puro.
— Isso mesmo mas, por que diz isso?
— É só que o meu filho não é como você.
— Hmm? Noona não é uma sangue puro?
— Não estou falando dela. Eu tive um filho, ele era mestiço. Foi por isso... que aquele garoto teve uma vida dificil. Ele era muito fraco para viver no oceano.
— Ele vive na superfície?
— Não. Aquela pobre criança deixou este mundo antes de mim.
❖ ❖ ❖
O rei da Tribo Baleia e mediador do oceano tinha cabelos e olhos azuis. Por estar escuro, Cale não tinha certeza mas, o rosto daquele rapaz lembrava um pouco a aparência do rei baleia descrita na novel.
Ele encarou aqueles olhos tão azuis quanto o oceano e disse:
— Durma um pouco. Tudo ficará bem quando você acordar.
Aqueles intensos olhos azuis piscaram antes de se fecharem lentamente. O ruivo ficou observando o meio-sangue por um tempo, antes de se aproximar e começar a examinar as suas pernas.
— Como ele está?
Já que o mestiço estava inconsciente, o Dragão Negro se revelou enquanto se aproximava da baleia. Então, ele criou uma pequena bola de luz com mágica para ter uma visão melhor da perna.
— Terrível. — respondeu.
A pele do povo baleia é muito grossa e resistente — Por mais que parecesse impecável e bonita, ela também era muito forte — Infelizmente, esse mestiço não tinha uma pele tão resistente. Por isso, foi ferido pelo ataque de uma sereia e acabou sendo envenenado. Enquanto Cale o examinava, o Dragão Negro o encarava com uma expressão indecifrável no rosto.
— Humano, você é muito estranho. Tão fraco e esquisito.
— Já chega.
Cale apontou para o rapaz inconsciente e ordenou:
— Jogue-o na água.
— ... Você mentiu para ele?
O Dragão Negro parecia chocado.
— Humano, você disse que iria salvá-lo! Você é fraco mas, sempre cumpriu as suas promessas! Então por que está me dizendo para joga-lo no mar?! Quer que ele morra afogado?!
Suspiro.
Cale suspirou frustrado. Em seguida, pegou aquela bola de luz que estava flutuando no ar (ela não estava quente). Então, acrecentou:
— Estou fazendo isso para salvá-lo. Se o colocarmos na água... se lembra dos cadáveres que vimos mais cedo?
— … O que diabos você está me pedindo para fazer?
— Nada demais. Só quero que vá até lá e me traga um braço.
O Dragão Negro estava sem palavras. Cale não se importou com isso e entrou na caverna. Afinal de contas, aquele pequeno ser incrível e poderoso não havia dito não, por mais que estivesse chocado com toda aquela situação.
— …Vou fazer como você pediu, por enquanto.
O Dragão Negro foi surpreendentemente obediente e seguiu as suas ordens sem questionar. Cale continuou a seguir o seu caminho sem olhar para trás, determinado a resolver tudo e voltar para vila antes que as coisas ficassem muito agitadas.
Por não ser muito profunda, não demorou muito para ele chegar ao final da caverna.
"Encontrei."
O encontro fatídico que Toonka teve foi com uma "Pequena Poça". Ele tirou um dos itens que estava na sua bolsa. Era um dispositivo de alarme. Isso irá avisá-lo caso alguém se aproxime desse local.
"Só preciso levar isso comigo antes de partir."
Cale recolheu um pouco daquela água em um pequeno frasco de vidro.
"A água suprime-fogo."
A água sempre foi eficaz contra o fogo, mas essa aqui era um tanto especial. Se ele mergulhasse o item que Lock conseguiria para ele nessa água, um item muito poderoso seria criado. Um item que seria capaz de salvar a selva.
Ao retornar para a entrada da caverna, viu que o Dragão Negro já havia retornado com o braço e entregou a ele com uma expressão incerta. Cale também percebeu que o garoto Baleia estava encharcado.
— Vamos lá.
O Dragão Negro suspirou cansado. Antes de voltar para casa, ele levitou o corpo do mestiço, o braço da sereia e Cale.
Quando chegou, recebeu as boas-vindas bastante calorosa de On e Hong.
— Você chegou na hora certa!
— O mordomo estava batendo na porta agorinha mesmo!
Cale já havia percebido isso, muito antes dos gatinhos contarem. Dava para ouvir a voz de Hans do outro lado da porta. Ele parecia prestes a chorar.
— Jovem mestre, eu não me atrevo a entrar no seu quarto porque você disse que me mataria se te acordasse. Então fiquei batendo na porta ao invés de entrar. Jovem mestre, você pode abrir a porta, por favor?!
Cale tirou a roupa de mergulho e a jogou em um canto antes de pegar um dispositivo na bolsa mágica e joga-lo para o Dragão Negro. Logo depois, ele vestiu um roupão de banho e abriu a porta.
— Jovem mestre, a jovem dama Amiru me pediu para ver se você estava bem. Então, por favor, acorde e abra...
— O que você quer?
— Oh! Jovem mestre!... Você estava tomando banho?
Cale jogou seu cabelo molhado para trás e respondeu:
— Eu não consegui dormir, então resolvi ficar relaxando na banheira e tomar um banho com água do mar.
— Ah, você estava no banheiro. Então eu não deveria me preocupar com a minha vida, já que você não estava dormindo.
— Tem certeza...?
— Me perdoe, jovem mestre.
— ...
— Ahem, hem.
Hans soltou algumas tosses falsas antes de começar a inspeciona-lo.
— Você está ferido em algum lugar? Lá fora está uma bagunça. Houve algumas explosões mais cedo. Acho que alguma coisa aconteceu no oceano.
O ruivo olhou para a janela e contemplou a visão do lado de fora. O vilarejo estava totalmente iluminada agora, mesmo estando no meio da noite, também dava para ver que as luzes se estendendo até o mar.
Amiru parecia ter tomado uma decisão corajosa ao mandar pessoas checar o mar, mesmo com os perigosos redemoinhos. Pelo visto, as coisas estavam prestes a mudar.
— Eu ouvi um barulho alto. Eles descobriram a causa?
— A senhorita Amiru disse que enviaria seus subordinados para o mar. Acredito que irão descobrir isso em breve.
Na opinião de Cale, a jovem senhorita ficaria bastante feliz porque o redemoinho próximo à ilha central havia desaparecido. Isso, por si só, aumentaria exponencialmente o valor deste lugar.
— É mesmo?
— Sim senhor.
— Então, pode ir.
Hans fez uma reverência respeitosa antes de sair do quarto.
Click.
Ao mesmo tempo, enquanto a porta era fechada, o Dragão Negro desligou o dispositivo de invisibilidade, revelando a si mesmo e o rapaz inconsciente, juntamente com o braço da sereia em cima dele.
On e Hong não sairam do canto da sala após ver o braço decepado. Esses gatinhos tinham medo de coisas muito estúpidas.
Ele foi até o banheiro e coletou um pouco de água do mar que tinha na banheira. O Dragão Negro observava com curiosidade enquanto Cale mergulhava uma parte do braço da sereia na água.
Tssssss.
O ruído de algo queimando podia ser ouvido, contudo, por alguma razão, o braço antes seco estava rapidamente voltando ao normal.
Tal mudança fez com que On e Hong correressem e se escondessem debaixo da cama.
O braço do cadáver voltou ao seu estado original em um piscar de olhos. Cale olhou para a perna do garoto baleia. Ao contrário de antes, o fluido verde se misturou com a água do mar.
Cale pegou uma faca.
Nesse momento, as pálpebras do homem inconsciente começaram a se mexer e seu corpo começou a tremer.
— Parece que ele vai acordar a qualquer momento. — comentou distraído. — Humano, afaste essa faca!
O Dragão Negro gritou e o mestiço abriu os olhos. A primeira coisa que viu ao acordar foi um homem levantando uma faca sobre a sua cabeça. Ao fazerem contato visual, aquele sujeito sorriu para ele, tentando tranquiliza-lo. Seus olhos começaram a tremer conforme via aquele objeto afiado se mover.
Tch.
A faca perfurou o braço, cortando a pele e fazendo um líquido escorrer, sangue. Para surpresa de todos, assim que o braço voltou ao normal, o sangue foi restaurado também, como se nada tivesse acontecido.
Cale dirigiu-se ao homem que ainda estava tremendo, com um tom de satisfação em sua voz.
— Ótimo.
O líquido vermelho continuou a jorrar da ferida e acabou caindo sobre a perna do meio-humano.
Ssss.
A substância verde na perna do garoto baleia começou a chiar assim que entrou em contato com o sangue da sereia. Cale o entregou o braço decepado.
— Beba logo antes que seque. Esse é o antídoto.
No volume cinco, após Lock ser ferido durante a luta contra uma sereia, Rosalyn descobriu uma forma de curá-lo. Era um método que ainda não havia sido descoberto nesse mundo.
Os olhos do mestiço, que parecia ter por volta dos 20 anos, começaram a tremer novamente. O mesmo aconteceu com os três filhotes que assistiam a tudo em um canto da sala.
Após ver que sua perna não incomoda vá mais, o homem-baleia resolveu beber o sangue.
Cale voltou a falar enquanto olhava para a expressão confusa no rosto do mestiço.
— Qual é o problema? Não foi você que matou essas sereias?
Ao ouvir isso, o homem-baleia ficou tenso. Cale não pode deixar de zombar ao ver a sua reação após ouvir uma simples pergunta.
Ele derramou o resto do sangue na perna do mestiço e depois colocou o braço de volta na água, onde começou a se dissipar.
— Você é uma baleia. Não devia voltar para o oceano até amanhã para poder se recuperar? — disse enquanto observava o braço evaporar. — Se quiser, pode descansar e dormir um pouco antes de ir.
O rosto do homem se tornou frio, emanando uma crueldade diferente da que Choi Han as vezes mostrava. Essa era a expressão de alguém que sempre foi menosprezado, constantemente lembrado de que não era tão bom quanto os outros membros de sua tribo. Uma frieza que só podia ser emitida por alguém que era constantemente desvalorizado.
— Como você soube que eu era uma baleia?
— Havia três sereias mortas. Quem mais poderia ter feito isso?
— Preciso voltar para casa...
Cale sentiu que estava prestes a ouvir algo inútil, por isso acenou rapidamente com a mão.
— Não tenho nenhum desejo de ouvir sua história.
Por essa razão, não perguntou o seu nome, nem deixou Hans vê-lo.
— Só te salvei porque você me pediu ajuda.
O ruivo deitou-se na cama. Ele precisava tomar um banho, mas estava muito cansado para isso agora.
— Vou dormir. Vê se não faz barulho quando sair.
Cale fechou seus olhos. Não havia nada para se preocupar enquanto tivesse um dragão ao seu lado.
Então, ele se lembrou das últimas palavras que o rei baleia disse a Lock na novel.
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— Por isso, eu não quero perder mais nenhum membro da minha família.
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Essa foi a razão pelo qual Kim Rok Soo decidiu agir dessa vez. Ele já havia vivenciado a perda de todos os seus entes queridos.
Claro, não havia a menor chance dele sofrer alguma perda por conta disso.
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— Se aquela criança ainda estivesse viva, eu teria passado o trono para minha filha e teria ido viver no mundo humano com meu filho. Acho que ele teria ficado muito feliz se eu fizesse isso.
— Sabe, acredito que noona seria uma ótima rainha. Mas, como ela também é uma pessoa bastante carinhosa, não acha que sua filha também iria querer viver com vocês, senhor?
— Tem razão. Quando meu filho desapareceu, aquela criança procurou por ele em cada canto desse oceano.
— Se a noona fez isso, tenho certeza que ela virou o oceano de para baixo enquanto tentava acha-lo... Ei, senhor, qual era o nome do seu filho?
— ...Seu nome era Paseton.
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O salvador do filho do rei… Cale não seria capaz de usar isso a seu favor? No entanto, para isso acontecer, a Tribo Baleia tinha que vencer a guerra contra as sereias.
Cale adormeceu com a mente tranquila. Quando ele acordou na manhã seguinte, Paseton já tinha ido embora.
— Ele disse que vai voltar hoje a noite. — disse Hong, o gatinho vermelho.
— Ele não precisa fazer...
Kim apenas encolheu os ombros sem terminar a frase.
Mais tarde, naquele mesmo dia, ele foi invadido por um estranho sentido de "Isso era mesmo necessário?"
— Jovem mestre Cale! Sinto muito por vir tão cedo mas, eu precisava compartilhar com você essa notícia maravilhosa!
A senhorita Amiru tinha um sorriso brilhante no rosto, Era raro ver a sempre seria Amiru agir desse geito. Ela parecia ter acabado de sair do mar, pois ainda estava com uma capa de chuva e outras pessoas acompanhavam-na.
— Você sabe o que aconteceu?
— Não faço ideia.
Diferente da senhorita Amiru, Cale estava bem calmo. Na verdade, ele quase não expressava qualquer emoção.
— O redemoinho! o redemoinho em frente à ilha central desapareceu! Sumiu da noite para o dia, sem deixar rastros.
"Eu fiz isso acontecer."
O ruivo não podia dizer a ela que ele tinha feito aquilo, então resolveu apenas olhar em volta.
Ao lado de Amiru estava o pescador veterano e alguns cavaleiros, assim comoToonka.
Conforme foi descrito na novel, Toonka tinha longos cabelos castanhos como a juba de um leão. Esse homem de aparência perigosa, que parecia ser capaz de enviar um orc voando com um único tapa, estalou a língua e resmungou:
— Que decepcionante. Eu queria pular naquele redemoinho. Devo pular em outro, então?
"Sabia que esse cara era maluco."
— Jovem mestre Cale! Em troca prlo investimento da família Henituse, eu quero lhe mostrar a vista de um pacífico mar Ubarr. — disse animada. — Você irá a ilha central comigo?
Logo, precisando mostrar alguma confiança em sua parceria até que alguém do Território Henituse chegasse, Cale sorriu gentilmente para Amiru e perguntou:
— Todos aqui nos acompanharão?
— Sim.
O ruivo havia esboçado uma expressão estranha. Já Toonka pôs um sorriso no seu rosto de aspecto assustador… Era mais terrível do que um sorriso de ogro.
Os cantos dos seus lábios tremeram ao ouvir essa resposta. Amiru, que não havia percebido nada e apenas reparou no sorriso gentil, apontou para Toonka e continuou a falar.
— Ah, essa é a primeira vez que vocês se vêem, certo? Essa foi a pessoa que quase foi pega por um redemoinho. Senhor Bob, esse é o jovem mestre Cale Henituse.
“Bob?”
O ruivo havia esboçado uma expressão estranha. Enquanto Toonka pôs um sorriso aterrorizante em seu rosto… Era mais assustador do que ver um ogro sorrir.
— Prazer em conhecê-lo. Meu nome é Bob.
Bob, um nome bastante adequado, era quase tão estúpido quanto seu dono.