Volume 1
Capítulo 7: Improvável…
O espanto de Nimbus era evidente. Como um andarilho sem posses carregava uma arma tão valiosa? Antes que pudesse questionar, Lonios o interrompeu com um gesto.
— Acho que vem alguém. Você sabe o que fazer.
Nimbus rapidamente reuniu os pertences e conduziu os cavalos para um esconderijo atrás de arbustos. Observando por entre a folhagem, viu um grupo de cavaleiros chegar ao acampamento. À frente deles estava uma mulher ruiva de cabelos encaracolados, vestindo um colam de couro e carregando inúmeras armas.
— Ora, ora, se não é o famoso Sãr Lonios — disse ela com um sorriso malicioso. — Sou Violentina, e viemos cobrar o que você deve ao senhor Wynrid.
Os homens que a acompanhavam desembainharam suas armas, posicionando-se ao redor. Violentina desceu de sua montaria, repousando a mão sobre o cabo de um sabre. Seu olhar fixou-se em Lonios, que apenas retribuiu com um sorriso sereno.
⸸ ⸸ ⸸
Enquanto Nimbus se escondia entre os arbustos, observando os recém-chegados, Lonios mantinha sua postura relaxada e despreocupada. Os inimigos estavam de armas em punho, prontos para atacar, mas ele permanecia imóvel, com um sorriso provocador nos lábios. Rompeu o silêncio com uma pergunta, num tom de deboche:
— A senhorita não seria Violentina, a Retalhadora?
A mulher, com um sorriso cínico, respondeu:
— Parece que minha reputação chegou até os ouvidos de cavaleiros.
— Claro que sim. Cavaleiros devem saber quando valentões se destacam pelos seus atos abomináveis, como cobrar dívidas de camponeses bêbados e indefesos.
Violentina deu um passo à frente, segurando o sabre com firmeza.
— Não apenas camponeses, mas também cavaleiros. Pelo que me contaram, o senhor não é grande coisa. Dizem que apanhou várias vezes no cassino de Calamidade.
— Veja bem, como eu disse, vocês só lidam com bêbados, e eu estou sóbrio há um bom tempo.
Nimbus, ouvindo tudo, não pôde deixar de pensar, enquanto o coração batia acelerado: "Bêbado? Onde fui me meter? Eu deveria estar com minha mãe, e não com um cavaleiro decadente!"
Um assobio de Lonios quebrou o raciocínio do jovem. Era o sinal. Tempestade saltou por sobre os arbustos, enquanto Lonios montava, e Nimbus sobre Trovador partia em disparada. Violentina sacou seu sabre, atacando Lonios com um golpe veloz, que ele apenas conseguiu evitar rolando no chão. Sacando sua espada comum, ele bloqueou a próxima investida da mulher.
Quando Tempestade passou a galope, Lonios saltou sobre a égua e disparou, seguido por Nimbus. Violentina ficou para trás, observando o sabre ensanguentado. Calmamente, lambeu o sangue da ponta da lâmina e murmurou:
— Agora você não me escapa.
Ela montou seu cavalo, liderando a perseguição com os agiotas logo atrás. O som das patas ecoava pela trilha estreita, enquanto o grupo ganhava terreno. A floresta fechada dificultava o avanço, mas os perseguidores eram implacáveis.
— Logo eles vão nos alcançar. Nossos cavalos estão carregados, e os deles não — disse Lonios, levando a mão ao pescoço. Quando a retirou, estava ensanguentada.
Nimbus ficou pálido. Seus pensamentos eram um turbilhão: "Onde me meti? Lonios está ferido, estamos sendo caçados por agiotas, e agora sou cúmplice de um criminoso."
— Não se preocupe — disse Lonios com um sorriso desdenhoso. — Eu tenho um plano. Aposto que eles não vão nos seguir depois disso. — Lonios ignorou o sangue na mão e a levou até o cabo da Indolente.
Com a espada escarlate em mãos, Lonios passou rente a uma árvore gigantesca e desferiu um golpe. A lâmina cortou o tronco sem resistência. Segundos depois, a árvore caiu, bloqueando a estrada e obrigando os perseguidores a parar.
Violentina, no entanto, sorriu com frieza:
— Maldito. Isso não vai nos deter. Eu senti o gosto do seu sangue, e vou caçá-lo até o fim.
Depois de cavalgar por mais alguns quilômetros, Lonios parou em uma encruzilhada. Usando um galho, apagou as marcas deixadas pelos cavalos e tratou o ferimento no pescoço, que não passava de um corte superficial. Nimbus, embora aliviado, continuava preocupado com as ameaças da Retalhadora.
Os dois seguiram viagem até avistarem a cidade de Calamidade ao longe, iluminada como uma joia no horizonte.
Depois desse episódio, Lonios se esquivava das perguntas sobre o ocorrido. E Indolente voltou a ser enfaixada e guardada na cintura do seu mestre, parecendo uma arma comum.
Em vez de lhe falar sobre a sua vida, Lonios o ensinava sobre moral, sobre o certo e o errado.
Segundo Lonios, um cavaleiro além de ser um excelente guerreiro, deveria ser um exemplo de retitude, um farol na escuridão para os desvirtuados no seu caminho, algo que parecia que ele não levava muito a sério, principalmente após o incidente dias atrás.
Mesmo assim Lonios ensinava a Nimbus sobre economia, filosofia, ciências e pensamento crítico e enquanto seu mestre recitava isso, Nimbus não conseguia deixar de pensar nos poucos meses que ainda restavam de remédios para sua mãe e no tempo que estava perdendo ali com Lonios, caso ele fosse o impostor que demonstrava ser, quem sabe mais o que ele havia omitido, será que ele era mesmo um cavaleiro? Aquela espada escarlate era mesmo dele?
— Nimbus, você está me ouvindo?
— Sim, senhor Lonios. Estava só perdido nos meus pensamentos.
— Continuando então, você sabe por que o povo de Cenferum paga tantos tributos e ainda vive na pobreza?
— Não — respondeu Nimbus.
— Como não, Nimbus? Eu já expliquei o contexto de Cenferum dias atrás.
— Desculpe, mestre. É que está difícil pensar, com tudo o que aconteceu. Minha mãe está lá sozinha, eu não sei como ajudá-la. Não sei se consigo aprender o que o senhor me ensina, parece que estou piorando nos treinamentos. E depois ainda teve aqueles agiotas atrás de nós... e o senhor não fala nada sobre isso.
— Calma, Nimbus. Uma coisa de cada vez. Primeiro, você não pode fazer nada em relação ao racionamento dos remédios. Estando lá, só arranjaria confusão. Segundo, você está aprendendo muito bem.
— Esse senso crítico que demonstrou agora é prova disso. Terceiro, eu nunca tive um aluno tão talentoso no treino de espadas. E por fim, assim como você evita falar por que abandonou a escola, não precisa saber por que estou sendo perseguido por agiotas. É algo pessoal meu. Entendido?
Nimbus baixou a cabeça, consentindo em silêncio, enquanto Lonios retomava o tom sério.
— Prosseguindo, há uma cultura em Cenferum onde todos tentam levar vantagem sobre os outros. Os tributos passam por várias mãos e, no caminho, cada um rouba um pouco. Seja superfaturando compras e dividindo o lucro, seja o próprio Grande Líder enchendo o tesouro pessoal.
Lonios fez uma pausa, observando Nimbus com atenção.
— O sistema é construído para enganar o povo. Festas públicas ou esmolas irrisórias fazem a miséria parecer menor, mas não resolvem o problema. Em vez disso, deveriam investir em educação.
— É mais fácil manipular quem não entende o que está acontecendo. Por isso, é seu dever como cavaleiro lutar contra isso. E a melhor arma não é a espada, é o estudo. Você precisa aprender para não ser enganado e para ajudar os outros a não serem subjugados.
Nimbus ouvia, mas sua mente divagava. As palavras de Lonios pareciam tão certas, mas ele não podia ignorar o contraste com as ações do cavaleiro.
— Entendeu, Nimbus? Você não deve ser apenas um homem de armas, mas um estudioso também. E lembre-se, em Cenferum, o governo controla a informação, a tecnologia e o uso da força. Esse sistema se alimenta de si mesmo, garantindo que nada mude.
Lonios o olhou de lado, percebendo a inquietação no rosto do aprendiz. Talvez estivesse realmente tentando ensiná-lo, mas Nimbus não sabia se podia confiar em um homem tão cheio de vícios e segredos.
— Então, o que aprendemos hoje? — A pergunta quebrou o silêncio.
— A estudar, mestre. Estudar para sermos melhores cavaleiros.
— Quase isso. Estudar não para ser melhor cavaleiro, mas para ser uma pessoa melhor. Quero que você evite os erros que cometi.
— E lembre-se, os melhores líderes nunca desejaram liderar. Mas, se um dia for necessário, você precisa ter conhecimento e um senso claro do certo e do errado.
Eles continuaram cavalgando pela estrada. Nimbus, perdido em seus pensamentos, tentava absorver as lições enquanto lutava com suas próprias dúvidas.
⸸ ⸸ ⸸