Volume 2
Capítulo 12: Brinquedo novo.
Harkin e Pietro estavam no centro da oficina, terminando de organizar os materiais. No chão, ao redor do círculo que marcava o centro da sala, formaram outro círculo com tudo que seria usado na construção do novo braço.
— Cara, isso é coisa pra cacete pra fazer um braço só. Tem certeza que tá tudo certo? — perguntou Pietro, encarando as matérias-primas.
— Sim. Eu disse que aprimorei o processo. E é isso mesmo que vou precisar. Enfim... tá pronto?
— Tô. Deixa só verificar meu Magiphone antes.
Pietro desbloqueou o aparelho. Havia uma notificação de Okini:
"Eu e a Sera chegamos aí em vinte."
— A Sera e a Okini chegam aqui em vinte minutos.
— Vai ser no meio do processo. Fala pra Okini que a porta vai estar aberta, e pede pra ela vir direto pra cá. Vou precisar de você, mano. Isso vai ser do caralho. Não dá pra esperar você terminar seu chá com ela.
— Vai se foder, Harkin — resmungou Pietro, virando-se. — Vou abrir a porta lá em cima.
— Ainda vou ter que conversar com o Solomon... O filho da puta não deixou um funcionário sequer na casa.
Pietro só balançou a cabeça, deixando o tio dissimulado para trás.
Harkin, por sua vez, começou a se concentrar. Seus olhos brilharam, e a mana começou a preencher o ambiente. Com a mão que lhe restava, traçou uma fórmula no ar — um círculo mágico complexo. Sem perder tempo, começou a transpor os traços mágicos para o chão ao redor dos materiais.
Assim que o círculo se estabilizou, um laranja incandescente se espalhou pela oficina. Chamas surgiram no traçado, e uma bancada começou a emergir lentamente, moldando-se até tomar a forma de um meio-círculo aberto, com uma mesa repleta de apetrechos.
Pietro chegou no momento exato em que tudo se concretizava.
— Porra... isso nunca perde a graça.
— Bom saber que anos de estudo se resumem a algo "legal" — retrucou Harkin, com sarcasmo.
— Para de drama e me diz como posso te ajudar.
— Primeiro: me ajuda a tirar essa camisa.
— Não consegue sozinho, maneta?
— Você sabe que eu empurro o salame em qualquer com um braço só, quanto mais tirar uma camisa. Só me ajuda logo porra não é porque da pra fazer que é fácil.
— Tá, foda-se...
Pietro se aproximou e começou a ajudá-lo. À medida que a camisa subia, cicatrizes surgiam por todo o corpo de Harkin. Uma, em especial, impressionou: um corte vertical profundo no abdômen, grande o bastante para ter partido alguém ao meio.
"Como ele sobreviveu a isso...? É inumano. E ele ainda é mais novo que eu. Sei que a vida dele foi difícil... mas isso é outra coisa."
— Vai ficar olhando até quando? Tira logo essa porra.
— Foi mal... Eu só nunca vi tanta cicatriz em você.
— Geralmente eu disfarço com magia. Mas hoje não tô afim.
Havia também um pano cobrindo o ombro direito, envolto como uma atadura que ia até o peito.
— Me ajuda a tirar isso também. Foi difícil pra caralho de colocar.
Pietro começou a desenrolar as ataduras, revelando mais uma cicatriz — e agora, traços metálicos que indicavam o encaixe da prótese. A transição entre carne, osso e metal era impressionante. A clavícula misturava o orgânico e o sintético.
— Cara... que porra você fez com o seu corpo?
— Adaptei pra sobreviver. Você acha que essas cicatrizes são carinho de inimigo?
— Isso vai além do que eu esperava. Você basicamente transformou seu ombro em uma peça de máquina.
— Sim e não. Mas te explico depois. Agora vai começar a parte foda. Vou ter que remodelar tudo pro novo design. E vou precisar de você mais do que nunca.
— Como assim?
— Vai parecer loucura, mas eu já fiz antes...
— Quando alguma coisa que você faz não parece loucura?
— Você tem um ponto. Agora cala a boca e ouve, ok?
— Toma no cu, sabe-tudo...
— Tá, foda-se. Seguinte: imagina isso aqui como uma sala de cirurgia. Vou precisar dos seus conhecimentos em medicina e magia de cura.
— Porra, moleque... E quanto à esterilização? Anestesia? Equipamento? Equipe?
— Anestesia é desnecessária. Tá tudo quente pra caralho aqui dentro. Não vai ter agente abrasivo. E quanto ao resto... já fiz isso sozinho antes, sem apoio médico.
Pietro olhou para os olhos flamejantes do tio e entendeu: ou ajudava, ou atrapalhava.
— Tá... — disse, cansado, passando a mão no rosto. — Vou me arrepender. O que você precisa?
— Estabiliza meus sinais vitais. Não se preocupa com anestesia nem nada. Só garante que não role hemorragia se eu errar. Mas relaxa... Eu não vou errar.
Com o plano definido, Harkin posicionou-se no centro da forja. Pietro assumiu sua estação, usando magia para conectar o corpo do tio aos sensores e rituais de controle.
— Quando quiser, eu ativo a estase na região.
— Ok.
Harkin começou a desenhar fórmulas em sequência. As estruturas se tornavam mais complexas a cada camada. Os materiais ao redor começaram a levitar. Quando o total de sobreposições das fórmulas atingiu 1024, uma caixa flutuou até o centro do círculo
— Ativa a estase — disse Harkin.
A mana de Pietro envolveu o ombro do tio, assumindo o controle do fluxo sanguíneo da região. Era uma técnica tabu. Um único erro e o coração de Harkin poderia explodir.
A caixa flutuante se abriu, revelando um cristal fosco e escuro. Ao receber a mana de Harkin, o Cristal brilhou como o sol ao meio-dia, atingindo um tom de roxo igual aos olhos dele.
— Isso é a desgraça do Atherium? — perguntou Pietro.
— É. E antes que você pergunte: ele e todos os outros materiais vão ser a base do meu novo braço. Se nada der errado, o bagulho vai ficar federal. Hehehe.
A risada maliciosa assustou Pietro por um segundo, mas ele logo retomou o foco. Os materiais sintéticos no ombro de Harkin começaram a brilhar com o mesmo tom roxo do Atherium, perdendo sua forma.
Agora era possível ver tendões, parte da caixa torácica e os músculos do ombro. A dor que passava por seu sistema nervoso seria insuportável para qualquer outro. Mas Harkin não esboçava nenhuma reação.
— Hora do vamos ver — murmurou.
Carbono, silício, ferro e Zaralith — o metal mais raro do mundo só encontrado em Nierr’Dhalar — flutuavam ao redor do Atherium, virando um líquido de luz que o orbitava.
Harkin desenhou outra fórmula, que se multiplicou em 256 variações. Todas se fundiram em um círculo mágico preso à base do ferimento.
O círculo começou a avançar e, por onde passava, o líquido reconstruía a matéria, criando um tecido sintético, mas que parecia vivo.
Pietro notou o Atherium se desfazendo, enquanto linhas rúnicas se desenhavam nas fibras artificiais.
"Que porra é essa? Esse maldito tá usando energia suficiente pra abastecer uma cidade inteira!"
Durante cinco minutos, a articulação do ombro foi sendo formada. Quando concluída, mais Zaralith e Atherium se aproximaram.
— Agora vem a parte do braço. Se prepara. Aqui fica mais fácil, mas ainda é foda ligar esses nervos artificiais.
A loucura era tanta que Pietro nem respondeu. Apenas manteve o controle da estase.
O esqueleto metálico começou a tomar forma — e então, BOOM! A porta da oficina se abriu com tudo. Okini entrou gritando:
— Que distorção de mana maluca é essa?!
Ela travou ao ver a cena. Serafina, que vinha logo atrás, esbarrou nela.
— Que foi, NiNi?! Por que... — parou no meio da frase, chocada com a visão.
Harkin continuava focado, ignorando tudo. Construía tendões, ligamentos e articulações com precisão cirúrgica. A concentração era tão grande que nada mais existia para ele.
Pietro chamou as duas com um gesto. Elas desceram, ainda em choque.
— Que porra é essa? — perguntou Okini.
— Acredite, eu queria saber — respondeu Pietro, afastando-se alguns passos.
— Pi, ele tá sentindo dor? — perguntou Sera, com olhos aflitos.
— Acho que sim... mas pra ele é como se fosse qualquer outro dia. Sei que tá refazendo a prótese, e que é algo novo... Mas é tudo o que eu sei.
— Isso é loucura. Parece que ele tá fazendo um braço artificial do zero!
— E pelo que tô vendo, tá replicando a anatomia humana perfeitamente — comentou Pietro.
— É exatamente isso — disse Harkin, sem tirar os olhos do processo.
Virou-se brevemente e explicou:
— Descobri há um tempo que o Atherium podia se conectar com matéria orgânica. Então pensei: e se eu conseguisse criar canais de mana entre orgânico e inorgânico?
— Você é louco — respondeu Pietro, pasmo.
— Louco até provar que tô certo. Aí viro gênio. Minha teoria é que, se conectar tudo, posso criar uma arma mágica fundida ao corpo. E voilà: um braço funcional que não se desfaz como os anteriores.
— Isso dói? — perguntou Sera.
— Dói pra caralho. Mas já me acostumei. Esse é o menos doloroso até agora.
— Porra, cara... isso tá além do que eu esperava — disse Okini.
— Calma, NiNi. Ele tem os motivos dele. Mas tem certeza que não tá te machucando? — reforçou Sera.
— Humanos são como baratas. Sobrevivem a quase tudo... e evoluem com aquilo que não os mata.
— É... você é irritante igual a uma barata — disse Okini.
Harkin fez uma careta e a imitou com uma vozinha irritante, mas nunca parou o processo.
— Tô entrando numa parte delicada. Preciso me concentrar.
Os materiais continuaram sendo absorvidos. O braço tomava forma, cada vez mais parecido com um real. Runas se gravavam nas camadas artificiais desde o esqueleto. Quando os músculos se firmaram, um novo círculo começou a criar camadas de pele sintética.
Ao final, duas fórmulas — com 2048 variações cada — se posicionaram acima e abaixo do braço. Quando se tocaram, ativaram o constructo.
Uma luz pulsou. O braço brilhou e foi suavemente reposicionado. Harkin esticou o novo braço e testou alguns movimentos.
— Novo em folha. E pronto pra arrasar.
— Vejo que você tá aproveitando bem o tempo... — disse uma voz feminina, vinda da porta.
Harkin se virou e viu sua irmã com os demais, todos observando o braço com tons metálicos reluzentes. Sputnik aproximou-se.
— Jovem mestre... isso é magnífico. Posso reportar ao meu senhor Solomon que a arma estará pronta em breve?
— Amanhã eu entrego. E diga a ele que preciso de funcionários. Essa casa não vai se cuidar sozinha.
— Entendido. Passarei suas palavras.
Sputnik sumiu nas sombras.
Harkin avaliou a situação: oficina bagunçada, amigos assustados, namorada preocupada... e irmã, chegando no pior momento.
"Não é como se eu tivesse muitas opções."
— Vamos — disse, pegando na mão de Sera. — Aqui não é o melhor lugar pra conversar.
Eles caminharam em direção à saída. Gabriela se colocou à frente dele, o encarando de baixo pra cima. Travou por um momento... e olhou para a mão dele entrelaçada à de Serafina.
— Quer dizer que agora você tá romântico? Uma grande mudança... pra poucos meses.
Harkin passou por ela, parou na porta, olhou para os outros e disse com um sorriso torto:
— Aqui não... deixa eu preparar um chá.
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