Névoa Eterna Brasileira

Autor(a): Dimas Tocchio Neto

Revisão: KlayLuz


Volume 1

Capítulo 2: Dia de Pesquisa

Graças à família da Dora, conseguimos acesso total à biblioteca durante cinco dias da semana — de segunda a sexta-feira. Hoje iríamos concluir nossa jornada de estudos da semana.

— Pessoal, eu trouxe alguns mapas que indicam como era o mundo antes da Névoa — disse Fernanda.

— Maravilha, nos mostre eles — falou Eric.

Fernanda pegou alguns mapas enrolados; suas folhas amareladas — e empoeiradas — eram a prova da antiguidade.

Ela os abriu na mesa. Na lateral do mapa, mostrou sua data de criação: 552 no Calendário da Névoa Eterna.

— Como eles indicam como era o mundo antes… — comecei. — Foram feitos quinhentos e cinquenta e dois anos após o aparecimento desse nevoeiro?... 

— Eles são mapas copiados, os originais já não existem há muito tempo — respondeu Fernanda.

— Se for verdade, é uma verdade e tanto. — Dora adiantou-se. — Como você confirma a veracidade desses mapas e onde os encontrou? 

— Simples, veja o nome do desenhista. 

Enki Nagalkia, 552 do calendário da Névoa Eterna.

— Agora faz sentido… Seria impossível copiar a assinatura dele, sempre foi — comentei.

— Viu só? Podem me elogiar agora, hahaha!

— De fato, uma aquisição difícil, é necessário destacar seu mérito, mas ainda não respondeu: onde você os conseguiu? — disse Eric.

— Um mercador viajante passou pela ilha e fui olhar o que ele vendia de antiguidades. Me perdoem, não queria desanimá-los com uma aquisição sem Romance, mas achei esses mapas por apenas uma moeda de ouro. Que sorte.

Espera, uma moeda de ouro? Caralh… isso é o que eu ganho por vários dias de trabalho.

— Realmente, um bom valor — exclamei ocultando minha surpresa. — Fernanda, parabéns, conseguiu algo incrível.

Olhando melhor para o mapa, vi as ilustrações e, nelas, as ilhas eram iguais, ainda como sempre acima das nuvens, mas aquilo próximo embaixo era água?

— Então água? É tudo o que há? — disse Eric. — Isso nem faz sentido, porque existiria só isso embaixo das ilhas?! 

— Que interessante… — Helen continuou: — Claro, não explica porque todos que desceram não voltaram. Se realmente for apenas água, seria fácil voltar, a questão é que todos que desceram, junto dos seus barcos, retrocederam como uma tripulação transformada em esqueletos. Sempre mortos, não importa o quão fortes eram os guerreiros ou os magos. Cair, descer ou afundar… São uma sentença de morte absoluta.

O clima na biblioteca ficou tenso…

— G-gente!… Vejam pelo lado positivo! — falei. — Graças à Fernanda, finalmente estamos mais próximos de descobrir a verdade! Agora sabemos que existe água embaixo! .

— Isso! Uma descoberta é sempre um novo passo! — acrescentou Dora. — Vamos continuar analisando os mapas para buscar alguma outra informação crucial. 

Assim começamos, abastecidos por fresco vigor, a investigar. Apesar dos questionamentos, havia a confiança de que a nossa pesquisa iria finalmente ser levada à próxima etapa.

***

No final da tarde, decidimos fazer uma pausa para descansar um pouco. Estiquei-me na cadeira, suspirei e observei o teto alto da biblioteca.

— Por que a Névoa Eterna apareceu no nosso mundo? Pelos registros, faz tanto tempo e ninguém sabe explicar. — Franzi a testa.

— A resposta está no Final do Mundo. — Dora olhou para os mapas nas paredes. — Não é esse o motivo da nossa determinado para encontrá-lo?

— Estará lá, tenho certeza. — Troquei um olhar com ela, minhas íris estavam brilhando de empolgação. — Temos que encontrar a verdade. Somos a equipe certa para isso.

Essas paredes que nos encobrem, libertarei a humanidade dessa prisão. As extinguirei.

— Você ainda sonha com isso? — respondeu Eric, com frustração no rosto. — Vai sumir no final, como todos os outros.

— Ele está certo, David — disse Fernanda, focada em mim. — É um sonho infantil, um suicídio, e você sabe disso. 

— Não me importo. Todos sabem que a única maneira de acabar com a Névoa Eterna é chegando ao final do mundo, na última ilha. Irei comprovar os registros e nossos estudos, serei o primeiro a chegar lá, não importa o que aconteça!

Novamente, o clima na biblioteca tornou-se tenso.

Dora resolveu intervir:

— Pessoal, desistam, vamos deixar o David seguir seu próprio caminho. Sua convicção… A conhecem bem.

— Obrigado pelo apoio, Dora — respondi.

O ar abrandou.

Eric tirou seu jaleco branco e colocou na mesa. Disse:

— Já que estamos no final da tarde, que tal concluirmos nosso expediente e irmos a um novo restaurante que abriu no centro da cidade? 

— Conte comigo! — respondeu Helen, que também tirou o jaleco.

Todos concordaram.

Deixamos nossa vestimenta profissional cuidadosamente dobrada sobre a mesa e fechamos os livros.

Saímos da biblioteca para uma viagem aquecedora… 

O tempo voou.

Ao chegarmos, a fachada do restaurante brilhou intensamente para meus olhos, decorada com luzes amarelas e vermelhas. Era um estabelecimento especializado em carnes, com uma estética rústica: mesas de madeira preenchiam o ambiente, chapéus de vaqueiros pendiam nas paredes e cartazes mostravam a origem de cada recorte de carne de cada animal.

Ao nos acomodarmos, uma atendente, trajada em roupas típicas e segurando uma caderneta, se aproximou para nos atender:

— Boa noite, senhores, o que desejam hoje? — perguntou ela, sorrindo.

Pedimos todos o mesmo prato: carne de gado cozida em ervas e com batatas, acompanhada de vinhos finos. Ótimo, o gosta já veio à boca.

Assim que terminado, uma grande bandeja foi colocada no centro da mesa. Todos começaram, se serviram e conversaram animadamente.

— Amanhã irei arrumar minha expedição rumo ao fim do mundo — falei, com um semblante de felicidade. — Após muito tempo, estou pronto para ir.

— Você vai partir logo tão cedo? — pergunta Dora.

— Sim. — Sorri. — Afinal, estou planejando desde os 12 anos, quando li sobre isso no livro “As Crônicas da Névoa Eterna”, entende?

— Alguém tão racional sendo levado a acreditar numa fábula por conta de um livro de fantasia escrito há 500 anos! Hah! — respondeu Eric, já embriagado. Encheu-se de deboche.

— Não é uma fantasia — Fernanda ficou séria.

— Ele foi escrito por um renomado alquimista da era do ferro — garantiu Helen. — Se for realmente uma fábula, tem propriedade acima de qualquer outra.

Eric se levantou da mesa. Cambaleava.

— Não sejam idiotas, é um mito, assim como os deuses! Cadê o pensamento crítico de vocês?!

Logo após falar isso, caiu no chão. Bêbado e desmaiado.

— Talvez seja um mito… mas irei com David — afirmou Dora. 

Ajudavam Eric a erguer Eric, respeitosos.

— Somos uma equipe, não é mesmo? Eu também vou! — respondeu Helen.

— Eu também vou — disse Fernanda.

Eric, levantado, caiu em cima de mim, falando:

— Nem sonhem em me deixar fora dessa aventura, mesmo que seja loucura.

Todos começam a rir e não pude deixar de expor minha felicidade por estarmos juntos nesse sonho.

Eram anos de confiança.

— Conto com todos nessa aventura.

Vamos descobrir o mistério por trás da Névoa Eterna de uma vez por todas.

Após terminar de comer e beber, nós nos levantamos, pagamos a conta e seguimos até nossas casas.

As ruas estavam bem iluminadas, com postes em formato único de triângulos na iluminação, cada um com uma pequena luz mágica dentro, acendida por pó um mineral muito comum na região.

No caminho, Fernanda e Helen seguraram Eric, que estava totalmente embriagado. Numa encruzilhada, nos despedimos e nos dividimos.

Fernanda e Helen, segurando Eric, continuaram reto na rua enquanto eu e Dora viramos à direita, rumo ao final da cidade.

Chegamos à porta da mansão da Dora, uma gigantesca residência…

— Até amanhã — disse, admito que um tanto tímido… — Muito obrigado pelo seu apoio naquela hora.

— É o mínimo que posso fazer pela pessoa que gosto — respondeu Dora. Deu um beijo repentino no meu rosto e correu para dentro de casa enquanto acenava para mim.

Foi um baque.

Fiquei ali parado, tentando entender o que aconteceu. Comecei a me indagar: “Espera, será que a Dora quis dizer gostar… gostar ‘amor’?” Não era novidade ser denso, mas fiquei minutos pensando.

Cheguei à conclusão de que era melhor ir para casa e pensar melhor sobre isso depois.

Passei pelo portão de entrada da cidade e o senhor Aelar já havia ido para casa, contudo Gerald estava lá.

Eai, pequeno cientista, estava se divertindo brincando com seus amiguinhos ricos? Hahaha! — pronunciou alto.

— Você realmente me odeia esse tanto, hein? O que foi que eu te fiz? Não me diga que ainda guarda mágoa só porque te amassei no torneio de esgrima?

— Fale com respeito, David, eu posso te prender aqui.

— Acha que consegue? Estamos sozinhos aqui e eu também estou armado. No máximo, você levaria outra surra. Que engraçado, “a notícia de um guarda real apanhar para um pequeno cientista”! “Hahaha!”

— Some daqui, seu moleque, passa logo. — Gerald abriu o portão.

Passei correndo. Naturalmente, mostrei meu dedo do meio. Ele realmente não gostava de mim, por que será? Eu muito menos… 

Chegando em casa, abri a porta e pronunciei:

— Estou em casa.

Sabendo que ninguém iria responder de volta, entrei.

Era feita de madeira, sem quintal ou varanda. Muitos ficariam surpresos. Mesmo sendo filho de aristocratas, perdi todos os meus direitos políticos quando meus pais morreram e, agora, vivo estudando nos dias da semana. Nos finais de semana, trabalho numa mineradora para me sustentar.

Poucos sabem disso, alguns se assustariam se soubessem.

Mesmo assim, me sinto feliz nessa vida. Especialmente agora que estou prestes a partir em direção ao meu sonho. 

Chegarei ao final do mundo e eu sei que a partir desse momento…

Tudo o que conheço acabará.



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