Volume 1
Capítulo 1: O Dia da Mentira
— Desde que horas cê tá acordado? — perguntei.
O relógio na parede indicava meu atraso: meia-hora.
O evento já tinha começado. Eu era a principal atração daquele circo.
Antes, me arrumei no alojamento com tanta animação quanto um defunto esquecido no próprio funeral. Então eu vi a cara do Bérsio e fiquei com o astral um pouco mais elevado.
Ele era um dos únicos colegas que eu lembraria depois de ser cuspido ao passado. Era loiro, nunca penteava o cabelo e tinha um nariz fenomenal, com uma verruga que parecia querer dar bom-dia a cada aproximação. Por tudo isso, eu o considerei meu melhor amigo... e também pela extrema concorrência entre ele e meu falecido cachorro.
Naquele momento, Bérsio estava plantado na cadeira entre dois beliches, recostado na parede, segurando uma gaita que ninguém o viu tocar. Alguns dizem que ele só usava pra conquistar namoros, mas era mais fácil ele invocar uma entidade no espelho do que puxar conversa com alguma lenda urbana (garotas) daquele grande projeto.
— Bem, desde a hora que você começou a dormir — respondeu.
Era difícil acreditar que ele estava acordado desde aquela hora na companhia de cem mil mosquitos naquele inferno sem ventilador. Eu podia ouvir o zumbido deles todos os dias zoando o fato do programa não doar nenhum ventilador empoeirado pra nós.
— Deve tá acabado, hein?
— Não, estou muito bem, Síssio. Seu café da manhã é revigorante.
Não sabia que nossa amizade tinha chegado naquele ponto.
— Era eu que devia estar com ansiedade hoje — respondi. — E você roubou o meu lanche!
— Bom, o senhor geralmente dorme pra escapar da guerra de travesseiros durante a noite.
“Se o alvo não fosse somente EU, eu participaria”, pensei.
— “Senhor”? Que piada. — Cruzei os braços na frente dele. — O que aconteceu com o apelido de antes?
— Tá de sacanagem? Não quero ser executado. Vai que você me desintegra igual qualquer mago que você desintegrará. Te chamar de sardinha só iria me transformar em uma.
— Não precisa ter medo. Só matarei alguns magos utilizando isso.
— É sério? — Bérsio pestanejou.
— Sim. O resto vai ser na porrada.
Eu tinha que ser honesto quanto aos meus gostos.
— De qualquer jeito, não dá para confiar em mais ninguém aqui... se é que sobrou alguém.
— O quê?
Bérsio ficou calado.
Balancei a cabeça e olhei ao redor. Em seguida, abri a porta para ver o corredor que levava a outros alojamentos...
Nenhuma alma viva.
— Aliás — retrocedi meus passos até Bérsio —, onde está todo mundo-
O rapaz sumiu.
A cadeira estava vazia. Tinha apenas uma folha de papel em cima dela.
— F-fala sério, Bérsio. Sai debaixo daí.
Não houve nenhuma resposta.
Olhei debaixo das camas e só vi poeira. Procurei até no banheiro e sequer achei um fio de cabelo loiro.
Eu sei que eu desejava que todo mundo virasse pó dias atrás daquele momento... ou horas antes do amanhecer. Porém, logo no dia em que eu seria o centro das atenções de maneira positiva? Fala sério.
O que mais surpreendeu foi o papel amassado que restou. Peguei e estiquei para ler que peripécia tinha ali.
Acabei roubando o seu café da manhã a pedido dos meus colegas. Eles disseram que você não gostava mais de comer alimento.
"Não sabia que eu tinha virado uma planta”, pensei, virando a folha para conferir se não tinha algo a mais.
Não acredite neles como eu acreditei.
Pestanejei. Em seguida, amassei o papel e joguei no chão.
Legal.
Ele roubou meu lanche pra escrever uma frase de efeito.
➀
Era chegada a hora de enfrentar meu fracasso. Nossa, como eu odiava ter que usar aquela espécie de “tuniqueta” verde, feita para ser adaptável à Era Mágica. Parecia que eu iria até um evento nerd oferecer cartas de edição limitada vendidas no mercado negro. Mas eu não podia reclamar. Aquela era a hora de entrar na máquina do tempo e mudar a história mundial.
Vou ser direto: magia é inútil, por isso que era crime na Era Cyber. É retrocesso. Meu refrigerador sola qualquer mago polar que lê um textão e sopra um poder só para congelar o adversário na hora do vamos ver.
Minha intenção era meter a porrada em cada um dos magos da antiga era a fim de salvar a humanidade através de Heitaro, propulsor da filosofia que a rejeita. Assim sendo, não iria sobrar nenhum sujeito que tira coelho da cartola para contar história, não é ação que os leitores querem? Este será meu relato, pelo bem da humanidade que usa canudinho.
Pelo bem dos refrigeradores.
Porém, eu já andava por corredores sem avistar ninguém. Aquilo me preocupava.
Se todo mundo não estava nos estabelecimentos, então queria dizer que só havia três possibilidades da origem:
1: Configuraram a data errada nos avisos a semana inteira e todo mundo acreditou ao ponto dos meus colegas fazerem homenagens precipitadas, como um bolo ao lado de uma folha escrito: “dia primeiro: o momento em que Síssio sumirá para o bem dos nossos salários”;
2: Me informaram a hora errada porque me amam demais e querem dá uma homenagem digna como surpresa final, a fim de compensarem meu 13ª salário não pagos em vez de sopa de fermento “natalina” com doses de abraços;
3: Todo mundo já estava na sala — até porque cinco minutos são cinco minutos. A única coisa que faltava para mim é correr com um pão na boca e estar com roupa de colégio.
Enxerguei a grande cápsula temporal reluzente ao fundo, que brilhava igual cristal sob o banho de luz das lâmpadas. Parecia um monumento sem visitantes para contemplá-la sobre o tapete vermelho, entre mesas prontas.
Ambiente indecifrável.
De repente, saquei minha arma desintegradora da missão ao passado, pois algo cheirava mal naquela história — e não era eu. Dessa vez, os administradores sanitários do local tinham me dado sabão no banheiro em vez de queijo perfumado oval.
Aos poucos, senti que se aproximava, em passos, algum monstro horrendo prestes a estragar o momento histórico.
A ansiedade me fez apontar a pistola para várias regiões.
— Apareça!
Os passos eram mais fortes. A expectativa se expandia e engolia toda a minha segurança de maneira que correr até a máquina do tempo parecia uma alternativa tentadora.
Uma risada feminina ecoou pelas minhas costas.
— Você pegou essa roupa de onde? Assaltou um evento de RPG?
— Que desgraça... — sussurrei.
Me virei e vi uma mulher sentada em cima de uma das mesas, de pernas cruzadas. Tinha óculos redondos embaixo do cabelo espesso cinza — que pareciam ondas de tempestade — e trajava um jaleco preto.
Pensando bem, aquilo não era tão diferente a um monstro horrendo. Pelo menos as criaturas apenas te matam, e não ficam caluniando você até sua reputação estar no nível do seu salário.
Era Víria, a mulher viciada em macarrão. Minha professora das áreas regionais do passado e coordenadora da administração científica. Aliás, segurava um copo de plástico cheio desses e balançava como se fosse uma taça de vinho.
“Esquisita como sempre”.
Sou suspeito para comentar sobre mulheres, até porque a única que me abraçou foi a minha mãe no colo só para que eu não morresse de fome sem leite materno (não me lembro se isso ocorreu), mas não acho que seja uma atitude normal das garotas ostentarem macarrões crus por aí. O que ganharia isso, um cara cortês sacar uma panela para esquentá-los?
— Você ainda não achou um forno pra esses macarrões?
— Balançá-los no copo diminui minha ansiedade. Gosto do som.
Que ASMR horrível.
— E aí? Está preparado para embarcar na aventura que levará sua cabeça? — disse ela.
— Tá de sacanagem, né? Eu estaria se todo mundo do projeto não caísse fora bem no dia esperado!
— O que foi? Você não soube do que ocorreu? Você ia rir pra caramba... ou teria um infarto.
Ela falava aquilo com uma naturalidade assustadora.
Aquele papinho cheirava a macarrão queimado.
— Estou com receio de perguntar a pérola da vez — eu disse.
— Todos os envolvidos na missão estão sendo interrogados pelo Chefe da Força Nacional de Segurança. Não voltarão tão cedo. Logo será você, só que na prisão, já que não partiu na hora em que os outros foram.
— O que foi isso? Foram convocados para as olimpíadas?
— Não, isso não seria tão divertido quanto ver você sumir do tempo presente.
Eu não cairia nessa.
Era o primeiro dia do quarto mês, seria leigo demais acreditar em uma situação tão cômica como aquela. Oficiais do governo convocando o alto escalão do governo de ver um avanço humanitário como aquele? Patético.
Alarguei um sorriso e cruzei os braços.
— Que pegadinha do dia da mentira sem graça, Víria. Eu esperava mais de você.
— Descobrindo antes da hora como sempre. — Ela retribuiu o sorriso com um banguela que fedia de intenção.
— Fala logo o que aconteceu. Deve ser ultrassecreto, né?
— Bem, sim. Eu passei um e-mail beeeem ultrassecreto alegando que havia uma mulher solteirona a um quilômetro do administrador técnico principal. O vírus foi bem letal e acabei vazando a informação do projeto pras organizações mundiais. — Ela pegou uma mecha e começou do cabelo e começou a enrolar no dedo. — Todos tiveram que se retirar e tal...
Aquilo era a coisa mais ridícula que eu já tinha ouvido dela. E olha que ela ousou em defender café sem açúcar e água com gás em plena segunda-feira da manhã.
De fato, cair no anúncio não deve ser tão difícil, mas gerar tudo isso em menos de um dia? Isso não é um vírus de computador, é uma pandemia mortal.
— Fala logo a verdade, Víria. Por qual razão só tem você e a máquina aqui?
Ela delineou um sorriso perverso.
— Eu vou destruí-la.
Hilário.
Depois de tanto esforço e puxar minha orelha, aquela maluca simplesmente fala isso.
— Não acredito... que você seja uma traidora. Parecia tão empenhada no cumprimento da missão!
E no excepcional cumprimento em me destruir.
— Pense, Síssio. — Víria se aproximou e tocou no meu ombro, olhando à máquina. — Não há razão para dar continuidade a esse absurdo. Esse esforço todo para algo tão inseguro... Não tem apreço pela sua vida? Isso é só uma besteira feito pra distrair os representantes do governo.
— Vamos ser sinceros? Se eu morresse engasgado com os sabonetes de queijo nas sextas, ninguém se importaria.
— Você já tentou comer... sabonete?
— A questão não é essa — ignorei —, mesmo que eu atenda sua sugestão de desistir disso, ninguém nunca se importou e não é agora que mudará. Não vai mudar.
— Você vai passar por coisa pior no passado.
Não há como. Eu sei quem eu era e de que eu era feito, por todos aqueles anos.
Parei por um instante, respirei fundo e falei:
— E-e é por isso que eu devo participar! Tudo isso foi uma preparação às situações extremas que vou passar no passado.
Minha argumentação foi como tirar a camisa só pra dar um mergulho em um caldo de cimento.
— Que vai passar no passado? Você é um tolo, mesmo. — Ela acabou gargalhando. Tive que arrancar minha tensão aparente e rir um pouco, só para aliviar o clima.
E não durou nada.
Ela sacou uma marreta de alguma dimensão misteriosa invisível (atrás da canela) e pousou o cabo na palma da mão disponível, desfazendo a empolgação. Virou baderna?
— Nós precisamos dar um fim nessa máquina agora. Para o bem da humanidade.
— Minhas mãos foram feitas para trabalhos honestos... e não servindo brutalidade com esse martelo aí.
— O quê? A marreta? É só pra dar mais impacto na minha fala, mesmo. Vou digitar o código de desligamento.
Tá, até que fez sentido.
— Eu pensava que tinham trancado as cervejas do teu congelador num local seguro — eu disse.
— Sempre foram as reservas. — Ela começou a andar diante de mim rumo a máquina. — Não bebo só aquilo.
Eu pousei minha mão no ombro dela, parando-a.
— Está falando sério?
— Já disse que sim.
— Eu também estou. — Saquei o desintegrador e encostei a ponta no pescoço dela. — Peço que se afaste, ajoelhe-se e bote as mãos na cabeça em nome da Ordem.
Ela arqueou as sobrancelhas e deu passos tímidos para trás.
— E se eu revidar neste exato momento, Síssio?
— Tudo o que sobrará serão seus óculos no chão com um monte de poeira que eu terei que varrer. E eu já estou acostumado nesse ofício... ou quase.
“Minha coluna dói até hoje”, pensei.
Ela permaneceu de pé, com as mãos soltas.
— Víria, é a sua vida que está em jogo.
Ela começou a rir, aumentando de forma rápida, o que me fez me dar um passo para trás.
— Sabe de uma coisa? — Ela disse. — Você está apto a buscar.
— O quê-?
Talvez seja estranho o que eu vou dizer aqui, no entanto, num relato em que existe máquina do tempo, projeto oculto, um desintegrador na minha mão, macacos no título e magos, só faltaria altas taxas de morfina para completar a viagem. Porém, ocorreu.
Eu fiquei tonto e caí em menos de um segundo.
Sim, de forma repentina. Caí que nem um boneco ventríloquo. Nem ao menos pude raciocinar como os músculos das minhas pernas viraram macarronada. O mais estranho foi a ausência de dor no baque, enquanto meu corpo ficava frio e dormente.
Incapaz de mexer qualquer dedo, comtemplei Víria agachada, com os óculos redondos dela iluminados por uma vitória desconhecida. Era como olhar para o que eu nunca seria. Vi duas pessoas em pé, afastadas dela, usando ternos.
— Se renda ao poder na sobrevivência e me encontre — disse Víria, com um sorriso de orelha a orelha.
Minha visão escurecia. O número de pessoas fardadas aumentava, junto da extensão do sorriso malévolo. Nos últimos segundos, senti mãos enrijecidas me carregando para algum lugar dali.
➁
Abri os olhos, sentido um barulho de água.
A dormência parou. Eu estava em êxtase.
A matéria fora extinguida junto à lógica. Não era um lugar que eu pudesse compreender totalmente, mas... ao menos eu sentia uma superfície.
Ah! Eu só poderia usar a mana dentro de mim conforme minha vontade e aquilo não estava nos meus planos nem de cara com a morte. Me recusaria até a morte.
O horizonte era um completo vazio. Me levantei, pisei forte na superfície, porém nenhum eco. Era um completo vazio translúcido.
— Ei — uma voz grave sinalizava. — Vaza daqui!
Olhei para baixo.
Um hamster.
Uma criatura de bochechas gordas, peluda, de tonalidade escura envolta do olho esquerdo. Tinha uma expressão mais humana que você possa imaginar.
— Um hamster falante?! — Acabei dizendo enquanto eu me agachava. A maioria das pessoas sãs iria se afastar de um negócio bizarro como aquele, mas eu já nem ligava mais.
— Você não é bem-vindo aqui!
— Eu nem sei que lugar é esse, pitoco.
— Tenha mais respeito! — O roedor tentou dar um soco na minha cara. Falhou feio. — Droga!
Levantei de novo.
Não estava gostando daquele papo. A mana dentro de mim ardia de novo. Há quantos anos eu não sentia aquela punição escorrendo pelo meu corpo?
— Do que você tá falando? Que lugar é esse? — Me afastei dele, a fim de deixá-lo mais confortável.
O roedor suspirou.
— Isso aqui é a penumbra do tempo-espaço. Você está uma zona proibida por mim. Aquela sua amiga te jogou nesse lugar sagrado através de métodos proibidos.
— “Métodos proibidos”... está falando da máquina?
— Máquina? O que é isso, uma entidade?
— Do tempo, ué.
— O quê? Isso...
Ele arregalou os olhos e esfregou a pata no queixo, impressionado com alguma coisa na minha belíssima face. Mais cedo ou mais tarde, ninguém deixaria se impressionar com o herói do tempo.
— O que foi? — perguntei. — Fizemos algo de errado? É uma missão vital ao futuro. Talvez você tenha uma limitação em ver os meandros futurísticos, mas eu não possuo.
Ele deu as costas e se afastou lentamente. Algum tempo depois, virou-se.
— É, de fato, a máquina do Bento é muito poderosa...
— Do tempo.
— Sim, sim, do tempo. A punição será horrível.
Fala sério.
Será que ele aceitava algum tipo de propina? Tipo, uma pílula de dor de barriga do velhote? Vai que ele sofra de caganeira na confidência... daí a chance seria bem pequena.
— E ago-
— Mas você pode evitar! — O roedor estampou um sorriso maquiavélico, caminhando rápido até mim. — Sinto seu heroísmo daqui...
— Eu não passei nenhum perfume dessa marca.
— Sua mãe deve ter vergonha de ver o que você se tor... — O hamster, logo em seguida, balançou a cabeça. — Q-quer dizer... Olha, presta a atenção: se em 13 dias você sobreviver aos meus ataques, eu permitirei que você seja livre nesse... passado.
Soltei uma gargalhada.
— E você vai fazer o quê contra mim? Roer minha calça?
— Não, deixo essa tarefa às onças.
Franzi o cenho.
— Que papo é esse?
— Ou talvez às cobras... Macacos? Não os subestime, hein. Eles sabem chutar bundas.
O roedor respirou fundo e soltou um sopro tão devastador que me arrastou para trás.
Meus membros tremiam junto das minhas cordas vocais.
Foi quase pior do que levar ponta pés — com a diferença que o vento me levava até o chão e me ralava. Em determinado momento, consegui obter equilíbrio e cobri meu tórax usando os meus ante braços.
— Ei!
Aquilo só poderia ser um blefe. Ele era apenas um delírio meu. E se eu já estivesse em coma e tudo aquilo não passasse de uma ilusão? E então esse relato viraria uma teoria tosca na internet envolvendo coma se fosse adaptado em desenho.
É, seria pior se fosse uma ilusão.
— Tá, tá! — Respirei fundo. — Agora eu só quero saber quem é você.
Ele parou, sério.
— Sou a própria natureza.
— O quê-
O roedor respirou fundo e soltou um sopro tão devastador que me arrastou para trás.
Foi quase pior do que levar ponta pés — com a diferença que o vento me levava até o chão e ralava meus membros. Em determinado momento, consegui equilíbrio enquanto eu protegia meu rosto.
— Por enquanto — o hamster elevou a voz. — Considere-se uma anomalia temporal. Se em treze dias você sobreviver, então terá o direito de andar um pouco mais tranquilo.
Enquanto eu era empurrado pelo sopro atômico depois das minhas forças acabarem, a proposta de Víria ecoava pela minha mente. Porém, o que ecoou mais forte foi a frase de Bérsio.
“Não acredite neles como eu acreditei.”
Céus.
Eu fui pro passado de barriga vazia.
➂
Cuspi areia, sentindo minhas costas arderem.
Um vento brando passou pelo meu rosto enquanto minhas memórias voltavam no lugar em que deveriam estar.
Tudo foi um sonho?
Eu estava acima de um manto de areia, próximo da mata densa. A localidade não fazia sentido nenhum. E era difícil aceitar o meu rosto sujo e o Sol que quase queimou meus olhos, levando minha reputação de agente competente depois que eu soltei um grito estranho.
Não apenas minha bunda estava doendo, como também minha cabeça. Só piorou quando olhei para trás e vi um grande lago esverdeado com algumas gaivotas passando por cima. Mais árvores no horizonte fazendo sombras com suas copas.
Era o passado.
Eu tinha certeza.
Sem máquina do tempo ou aplausos. Fui cuspido por lá sem explicação.
A bolsa com remédios tinha desaparecido junto de minha arma na cintura. O que sobrou foi duas cápsulas contra dor de barriga no meu bolso — que valiam mais do que minha vida no governo —, meu cinto e minha roupa.
Isso nada se comparou quando me virei de volta em direção a mata sobre a areia: era um ser baixinho e peludo limpando o nariz...
Enquanto apontava a pistola na minha direção.
O macaco guinchava. Eu não entendia direito. Estava tudo tão... destoante. O grito do animal aumentava enquanto ele batia os punhos no peito e no solo.
Tudo mudou quando eu vi o meu desintegrador em uma das mãos.
Aquilo só poderia ser uma grande mentira.