Murphy Brasileira

Autor(a): Otavio Ramos


Volume 1 – Arco 3

Capítulo 48: O Plano do Kross

“Como eu poderia imaginar? Como eu poderia imaginar que aquela vadia colocou um rastreador em cada um dos seus guardas? Agora estou com um cano colado na minha testa. Eu sou rápida o suficiente para matar esse cara, mas isso apenas adiaria o inevitável: minha morte. No fim, tudo é culpa dessa desgraçada. Ah, Mariah... se você soubesse como eu queria te rasgar agora.”

Ella afundou nos próprios pensamentos enquanto Tatiana andava de um lado para o outro na sala, passos cortantes no piso frio.

Os guardas estavam com seus rifles apontados para Ella e Mariah — não era essa a recepção que esperavam ao voltarem à comunidade.

— John! Finalmente — exclamou Tatiana, impaciente. — Que demora foi essa?

— Estava resolvendo umas pendências com meus homens — respondeu John, entrando e fechando a porta atrás de si.

— Recapitule para mim tudo que elas fizeram, agora.

“John Kross... ex Navy SEAL, espião do governo americano e virologista. O Vendedor não estava brincando, esse cara é perigoso pra caralho!”

— Foi aquilo que eu te falei. A Mariah abriu a fenda e as três atravessaram. Não pude entrar, se não eu seria descoberto, mas o que aconteceu é óbvio. Somente as duas voltaram e o chip da Susan foi destruído. Foi um sacrifício — explicou John, de forma fria.

— Vocês querem se explicar? — indagou Tatiana, apontando o dedo indicador alternando entre as duas.

As duas ficaram em silêncio, olhando pra baixo.

— Bom, se ninguém abrir o bico, a sessão de tortura do meu amigo John começa agora. Dado os seus anos e anos de experiência, é melhor não o subestimar.

— Porra... — murmurou Ella. — Foi a Mariah. Ela usou o corpo da Susan como oferenda. Eu não sabia de nada, nunca concordaria com uma brutalidade dessas!

Mariah olhou desacreditada para Ella. Como podia ela ser tão traíra?

— Oferenda para o quê? — Tatiana perguntou.

— Para trazer uma pessoa de volta.

— Quem?

“Agora acabou para nós duas”, concluiu Mariah, abaixando a cabeça e fechando os olhos.

Ella nesse momento, lembrou-se do que Marc havia dito. Yersin e Tatiana tinham uma relação de gato e rato.

— Scott... Scott Miller. Um amigo do meu pai. Ele vai me ajudar a encontrar meu pai. Foi por isso que eu pedi ajuda da Mariah.

Os olhos de Mariah se arregalaram, por um instante sua expressão mudou: ainda havia uma chance.

— Scott Miller... eu me lembro dele. Então ele estava morto? Isso explicaria seu desaparecimento.

— O que você vai fazer com a gente? — perguntou Ella, em tom cauteloso.

— Vou dar duas opções. Vocês tiraram um recurso meu, portanto, terão que se tornar um recurso temporário para mim. Caso não queiram fazer o que eu mandar, serão torturadas e morrerão dolorosamente. A escolha é de vocês. — Tatiana sorriu com cinismo.

— Me dê um serviço e eu o cumprirei! — respondeu Ella, já fazendo sua escolha.

— Não, não é isso que eu quero ouvir — retrucou Tatiana, agachando-se. — Vamos, diga a quem você pertence, a quem você obedece!

Ella virou a cabeça para o lado, contra sua própria vontade, murmurou:

— Eu pertenço a você... eu sigo as suas ordens...

Tatiana passou a mão no queixo de Ella, satisfeita.

— É isso que eu gosto de ouvir! — Levantou-se apontou para Mariah. — E você?

Mariah não gostava muito de servir as pessoas, sua feição nem um pouco amigável demonstrava isso. Mas não havia outra escolha.

— De agora em diante, serei seu recurso, ocupando o lugar da Susan. Deixe a Ella ir.

Tatiana estalou a língua, negando o pedido.

— A Susan estava grávida, ela valia por dois. Admiro sua atitude, mas a Ella vai ficar também.

— Você tá falando sério? — Mariah questionou, revoltada.

— Totalmente séria. Algum problema com a minha ordem?

— Não, nenhum...

— Vocês já podem ir — disse Tatiana aos guardas.

Ela caminhou até uma mesa e sentou-se sobre ela. John estava ao seu lado. As duas se levantaram.

— Tenho um trabalho de altíssima periculosidade para vocês duas. Preciso que ataquem um comboio militar e descubram onde estão alojados.

— Você quer que a gente ataque militares? A força militar de Rubra é a mais poderosa do mundo, tem noção do que está pedindo? É como cutucar um vespeiro — exclamou Mariah, incrédula.

— Exato! São vespas enormes com os maiores ferrões do mundo e com um veneno letal! É por isso que quero os ferrões.

— Eles estão em quantos? — perguntou Ella, direta.

— Sério que está cogitando atacar militares? Eles não são os sobreviventes sem treinamento que você encontrou por Rubra. Todos passaram por um treinamento intensivo. Sabem como agir em qualquer situação.

— E você realmente acha que a gente tem outra opção, porra? — explodiu Ella, estressada. — Se recursamos, estamos mortas.

— Escuta ela, Mariah. Ella é uma garota esperta. — Tatiana disse, com um tom quase elogioso.

Ella aproximou-se de Mariah e sussurrou em seu ouvido.

— Meu pai já me contou histórias sobre os militares: quanto maior a patente, mais perigosos. Alguns até atingiam os níveis dos Águias. Eu sei que estamos praticamente nos matando, mas temos uma chance! Eu não passei por tudo que passei para morrer nas mãos de uma psicopata puracionista.

Mariah virou o rosto e encarou Tatiana.

— Você já tem um plano em mente? Pelo menos alguma estratégia?

— John. — Tatiana chamou.

John tirou um mapa enrolado do bolso de trás e estendeu sobre a mesa, ao lado de Tatiana.

— Quando Rithan invadiu a Terra, os militares bloquearam todas as ruas do sul — explicou John, apontando para determinada parte do mapa. — O resultado disso são ruas limpas, sem carros abandonados. Vamos usar isso a nosso favor, chegaremos neles com um jipe. Pelo que estudei do padrão deles, o comboio sempre vem com três caminhões blindados: o da frente provavelmente deve carregar armas de defesa; os dois de trás servem de escolta. Destruam os dois de trás, matem quem estiver neles. Quanto o da frente, estourem as rodas e deixem apenas dois vivos para interrogatório.

— Ok... mas como entraremos? Você não disse que eles tinham bloqueado as ruas? — Ella perguntou.

— Bloquearam, há 18 anos atrás. Os sobreviventes já destruíram essa barreira há muito tempo.

— Mas nós iremos chegar atirando nos comboios? Isso vai denunciar que estão sendo atacados — contestou Mariah. — Por que você mesmo não vai de forma furtiva até eles? Não foi você que nos espionou por todo esse tempo?

— Eu já fiz isso. Segui o comboio por cinco quilômetros, mas um atirador me avistou. Não sei como, mas por pouco não tomei uma bala na cabeça. Eles estão com um franco-atirador barra pesada, precisamos apagar o cara primeiro.

— “Precisamos?” — Ella arqueou as sobrancelhas.

— Sim. Eu vou junto. Sou eu quem conhece as rotas do comboio. Vocês vão cuidar da parte do ataque, eu dirijo. Além do mais, quero ver com meus próprios olhos quem é o atirador.

— E quando descobrirmos a base, o que vamos fazer? Vamos arrombar tudo atirando para todos os lados? — perguntou Mariah, um pouco cética quanto a funcionalidade do plano.

— Sim, é isso mesmo — respondeu John, direto. — Quando chegarmos à base deles, vocês duas irão ganhar tempo para eu me infiltrar e localizar as armas.

— Então nós seremos basicamente seus escudos humanos? Cutucaremos o vespeiro para que você possa coletar o mel? — disse Ella, sarcástica.

— Essa foi uma boa analogia, mas vespas não produzem mel. E sim, vocês vão ter que segurar as pontas pra mim. Tentarei ser o mais rápido possível.

— Não estou entendendo as indagações de vocês duas. — Tatiana interrompeu, de pernas cruzadas. — Desde o início eu disse que era um trabalho de altíssimo risco. Por isso escolhi vocês. Se morrerem, não terei nenhum prejuízo.

Ella reprimiu seu ódio. “Eu ainda vou te matar, Tatiana”, pensou, com o ressentimento visível em seu rosto.

Tatiana conduziu-os ao arsenal da comunidade — duas vezes maior que o da UCC. Repleto de armas futuristas que Ella jamais imaginaria existir.

— É realmente um arsenal de respeito... — admitiu Ella.

— Talvez — respondeu Tatiana, indiferente. — Mas não é metade do que eu preciso. As armas daqueles militares são o que preciso pra acabar com o império do Logan.

— Os Goldwings? Pensei que fosse aliada deles. Quer dizer, o Kurt foi contratado pelo Logan para me caçar.

— Por enquanto. Logan tem mais homens, mais armamento, e ele por si só é muito mais forte. Mas uma vez que eu botar a mão naquelas armas... — Um sorriso sádico surgiu no rosto de Tatiana. —  Eu vou esmagá-lo como uma mera formiga.

— De que tipo de armamentos estamos falando? — Mariah perguntou, preocupada.

— O tipo de armamento capaz de perfurar barreiras de Vontade Sagrada. Armas que reduzem um Primordial a um mero humano!

Mariah e Ella se entreolharam, apreensivas.

— M-271 Kraven. Não esperava que você tinha armas de tamanha potência — disse John, passando a mão na metralhadora rotativa.

— É a sua primeira vez no meu arsenal, né? Normalmente você costuma fazer os trabalhos que eu peço com suas próprias armas.

— Sim, mas se eu soubesse que você tinha tanto poder aqui, teria pegado algumas antes. — John riu, contido.

— Então, John, já escolheu quais armas você vai utilizar nessa missão?

— Vou precisar da M-271, dois fuzis de assalto Thumbgrip, não importa o modelo. Duas granadas de fumaça e duas granadas de fragmentação Thumbgrip.

“Armas modelos Thumbgrip... ele quer fazer uma chacina do pior tipo.”

As armas de modelo Thumbgrip foram um dos avanços mais devastadores para as forças militares.

Através de uma superfície de Rubrannium na empunhadura da arma, toda a Vontade do portador era distribuída por um sistema que imbuia cada projétil, tornando armas pequenas tão poderosas quanto bazucas.

— Vocês duas sugerem alguma coisa? — indagou John.

— Eu não sei usar armas — confessou Mariah.

— O quê?! — John e Tatiana exclamaram ao mesmo tempo.

— Qual é o motivo do espanto? Nunca fui uma caçadora, tampouco recebi treinamento militar. Minha especialidade é a Vontade e o Vazio.

— É estranho não saber atirar nos dias de hoje — disse Tatiana, incrédula. — Até meu filho de sete anos sabe.

— E você, Ella? Tem algo a revelar para nós? — John encarou-a através dos óculos escuros.

— Meu pai me ensinou a usar todos os tipos de armas. Sou melhor com revólveres e fuzis, mas consigo manejar todo o resto.

— Perfeito. Então façamos assim — disse John, tirando a M-271 Kraven do suporte de armas. — A Ella vai usar a M-271 pra destruir os dois caminhões da escolta e a Mariah te protege com a Vontade. Foque primeiro nas rodas e depois quem estiver dentro dele. Quanto ao caminhão da frente, destrua apenas as rodas — precisamos de dois vivos. Ficou claro?

— Sim. Ficou claro — assentiu Ella.

Mariah concordou com a cabeça.

John aproximou-se de Ella lentamente, pegou na sua nuca com firmeza e sussurrou em seu ouvido:

— Eu sei quem você é garota, quase consigo ler seus pensamentos. Você não me engana. Essa submissão falsa, mentiras contadas em horas de desespero... esse seu olhar de cobra. Te aviso já: se tentar algo, te mando direto pro inferno.

Ella manteve o olhar baixo durante a ameaça, mas, ao fim, ergueu os olhos e encarou os de John, coberto pelos seus óculos escuros.

O olhar verde esmeralda de Ella tornava-se cada vez mais penetrante.

— Nós estamos do mesmo lado, John. Posso até mesmo de chamar de capitão. Não vou tentar nada, tenho uma reputação a zelar com a Tatiana, não se preocupe.

Ella respondeu de forma provocativa. Sabia que John não poderia fazer nada naquele momento — mas ela queria ir além.

— Mas eu quero que saiba que, se me ameaçar de novo, eu juro que te mato. Não subestime o que sou capaz de fazer.

John sorriu — um sorriso convencido, de quem sabia que Ella não estava a sua altura.

— Você pode tentar.

Após a pequena troca de ameaças, todos eles começaram a carregar o armamento até o jipe que iriam usar.

Mariah e Ella ficaram a sós por um momento.

— Por que pediu para a Tatiana me liberar? Ocupar meu lugar enquanto eu me safasse... não faz muito sentido pra mim — perguntou Ella.

— Porque eu não suporto trabalhar com pessoas teimosas como você — respondeu Mariah, encostando no jipe e acendendo um cigarro. — Raiva, tristeza... você deixa suas emoções te dominarem facilmente. E eu odeio gente emotiva. Então, eu pensei, se for pra ser punida, que seja sem ter uma criança mimada me azucrinando.

— Ah, desculpa por ser uma humana e não um monstro frio e insensível que mata uma mulher grávida sem hesitar — retrucou. — Emoções... são elas que me diferenciam de você. Nós não somos iguais.

— Definitivamente não somos. — Mariah soltou a fumaça, com um olhar amargo. — Mas estamos juntas nessa, precisamos colaborar. Eu irei te proteger, você irá matar. Ponto final.

John e Tatiana chegaram, interrompendo a discussão delas.

— Partiremos amanhã de manhã. O comboio sempre segue a mesma rota às oito. Chegaremos lá às sete e esconderemos o veículo. Quando iniciarem a rota, daremos início ao plano. Portanto, não durmam tarde, cinco e meia da manhã quero vocês de pé.

— Vamos, Ella, te arranjo um quartinho na minha casa — disse Mariah, desencostando do jipe.

— Descansem bem. Amanhã nós vamos botar pra foder! — bradou John, com um sorriso confiante.

Ella virou as costas e caminhou ao lado de Mariah. O sol estava se pondo, era quase noite.

“Botar pra foder. Então é assim que ele chama o massacre. Ele está certo, eu ia tentar matar ele com a arma que roubaríamos, mas eu deixei óbvio demais. Ele me leu que nem um livro, eu deixei com que isso acontecesse... mas não mais. Nunca mais.” Seu lábio se contraiu em um sorriso de lado.

Seus planos mudaram, mas os objetivos continuaram o mesmo. Ainda que demore, Ella não o deixaria escapar.

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