Murphy Brasileira

Autor(a): Otavio Ramos


Volume 1 – Arco 1

Capítulo 8: Ceifadores

— Ceifadores… O que estão fazendo em Vigon? — sussurrou Kiyoko.

— Quem são eles?

— São uma facção de terroristas, os mais perigosos. Eles vêm lutando contra a UCC para dominar Rubra há algum tempo — respondeu Kiyoko, retirando um binóculo da sua mochila.

— Tem sete deles e um homem ajoelhado ali. Cabelo preto bagunçado, sem camisa, descalço e com uma calça preta… da onde surgiu esse mendigo? — brincou Kiyoko.

Ella achou essas características familiares e pediu para olhar pelo binóculo.

Assim como suspeitava, era quem imaginava. Samuel Oliveira, o homem da prisão.

— Merda, eu o conheço. É um amigo meu! — sussurrou Ella, aflita.

— Vamos descer um pouco mais para ouvir o que eles estão falando.

O homem da máscara dourada desferiu um soco no rosto do Samuel, puxando seus cabelos e aproximando seu rosto do dele, gritando:

— Seu ladrãozinho de merda. Acha que pode entrar na minha base e roubar o que é meu?

— Eu estava com fome… — sussurrou Samuel.

— Fome? Quer dizer que você come cristais de Neofásio e espadas? Que porcaria de dieta é essa? — zombou o homem da máscara dourada.

— Eu precisava disso para ir pra superfície… Qual é, você não precisa fazer isso, só me deixe ir e prometo não mexer com vocês novamente.

— Aquele da máscara dourada se chama Andrew Griffin, ele é o líder dos Ceifadores — disse Kiyoko para Ella, ambas no topo do teto de uma casa.

— Precisamos fazer alguma coisa. Se não, vão matar o Samuel!

— Qual parte dos terroristas mais perigosos de Rubra você não entendeu?

— Não importa. Samuel me poupou, ele foi generoso comigo quando podia ter me matado. Não posso deixar que o matem. — Ella, estava se preparando para agir.

— Explosive Flammae – exclamou Ella, segurando o encantamento em sua mão direita.

— Você tá louca? Você vai matar ele com esse ataque também — disse Kiyoko, segurando o braço de Ella.

— Se minhas teorias estiverem corretas, a regeneração dele será capaz de suportar esse ataque.

Quando elas menos esperavam, outro homem com uma máscara de caveira preta apareceu.

Ele saltou de um telhado freneticamente em direção à Andrew

— Nenhum desses cabeças de vento te avisou? Senti a presença de mais duas pessoas aqui, uma primordial solar e uma do Vazio — alertou o homem.

Kiyoko congelou ao ouvir que sua presença foi notada, mesmo tendo se ocultado, e sobretudo, por ele ter dito que era uma presença do Vazio.

Kiyoko rapidamente gritou para Ella.

— Ella, ataque!

Quando Kiyoko gritou, todos viram onde estavam e, também, o projétil de chamas vindo em sua direção.

Andrew Griffin desapareceu misteriosamente, sumindo do local num piscar de olhos.

O homem da máscara preta escalou cidade acima, numa velocidade imprescindível.

Os outros mercenários tentaram escapar do ataque, mas quando atingiu o solo, explodiu todos ali presente, incluindo Samuel, que se protegeu enquanto se encolhia.

Kiyoko rapidamente pegou na mão de Ella e imbuiu suas pernas com sua vontade, a do trovão. Ella relutou e disse:

— Espera, o Samuel, nós precisa… — gritou Ella, segurando no braço de Kiyoko, mas foi interrompida pela mesma.

— Não dá pra esperar, porra. Você matou seis deles, Andrew e o irmão dele vão nos caçar até nos matarem!

Como um raio, Kiyoko puxou Ella a força e correu na velocidade do som, atravessando todos os becos e vielas quase que instantaneamente, parando só quando percebeu que Ella desmaiou no meio da corrida.

Ela entrou com seu corpo desacordado em uma casa e a repousou sobre uma mesa.

Kiyoko pegou uma garrafa de água de sua bolsa e derramou um pouco sobre o rosto de Ella, fazendo-a acordar.

— O que aconteceu? — disse Ella, que acordou sobressaltada.

— Você não está acostumada com a velocidade do som, acabou desmaiando — respondeu Kiyoko, se sentando em uma cadeira disposta aleatoriamente pela casa.

— Estamos seguras aqui? — perguntou Ella, levantando-se da mesa.

— Eu acho que sim. Andrew consegue se teletransportar usando o Vazio como atalho, mas se ele não souber para onde fomos, não vai nos achar.

— E o que faremos agora? Estou morrendo de fome. — Ella pegou uma cadeira e colocou ao lado de Kiyoko.

— Vamos ficar aqui até a poeira abaixar. Toma, não é muito, mas dá pra forrar a barriga. — Kiyoko, entregou duas barrinhas de cereais para Ella.

— An? Mas e você, você não vai comer?

— Pode comer, eu só preciso dormir. Correr nessa velocidade usa muito do meu corpo — disse Kiyoko, cambaleando de sono.

— Está bem, bom sono então. Pode dormir tranquila, eu protejo as coisas por aqui. — Ella sorriu, logo em seguida mordeu uma das barrinhas.

— Obrigada, Ella. Qualquer coisa, é só me chamar. – Kiyoko retribuiu o sorriso e logo em seguida caiu no sono.

Ella cruzou suas pernas na cadeira e começou a meditar.

Uma prática ensinada pelo Andarilho, era uma técnica excelente para recuperar sua vontade e fazer com que ela fluísse melhor pelo seu corpo, caminhando por todos seus vasos sanguíneos e aumentando sua força vital.

Durante a meditação, uma memória de Ella surgiu, um diálogo com o Andarilho sobre a vontade.

— Ei… mestre. O que é a vontade em si? — perguntou Ella, sentada em posição de lótus, enquanto uma brisa suave balançava seus longos cabelos loiros.

— Concentre-se na meditação, Ella — respondeu o Andarilho, rispidamente.

— Essa é uma pergunta genuína, ninguém nunca me explicou o que de fato é a vontade.

Os dois estavam ao ar livre, próximos à varanda de sua casa, que ficava em um ponto elevado e afastado de Vigon.

No teto rochoso da cidade, havia uma fenda decorrente da erosão que permitia a entrada de luz solar e vento, criando um lugar excepcionalmente tranquilo para a meditação.

— A vontade, Ella, é uma forma de energia espiritual presente na alma de determinados humanos, nos concedendo uma singularidade etérea exclusiva da nossa raça. A adquirimos no momento em que somos gerados, seja por herança genética ou pura sorte. Existem dois tipos, primordial e mística, sendo a última, uma ramificação das primordiais. Como você já deve saber, as vontades primordiais surgiram com o nascimento de Peter Murphy, seu antepassado e primeiro portador da vontade sagrada, com Lilia Synder, a primeira portadora da vontade solar, com Liam Bresset, o primeiro portador da vontade atemporal e Kael Feyrer, o primeiro portador da iluminação da natureza. Esta última, sendo a vontade mais rara de todas. A vontade é gerada espiritualmente em nossa alma e materializada fisicamente em nosso coração, onde é bombeada e distribuída por todo nosso corpo através dos vasos sanguíneos. Fortalecendo cada músculo, osso, tendão e ligamento, nos proporcionando capacidades sobre-humanas. Espero que tenha respondido todas suas perguntas. Agora, se concentre.

— É, eu acho que respondeu todas. Obrigada — disse Ella, retomando sua meditação em silêncio.

Ao encerrar a meditação, Ella sentiu seu corpo se revigorar.

Utilizou sua mochila como travesseiro, se deitou no chão e acabou adormecendo em instantes. Estava verdadeiramente cansada.

Kiyoko acordou logo pela manhã, antes de sua amiga e, notou uma particularidade na forma em que Ella dormia.

Uma mão estava sobre sua rapieira, com parte da lâmina fora da bainha. Enquanto a outra segurava seu revólver, com o dedo no gatilho, próximo a sair do coldre.

Mesmo dormindo, Ella se mantinha em posição de ataque.

Aquela não era sua maneira habitual de dormir, o sequestro deixou marcas profundas em seu psicológico. Era agora um reflexo instintivo de sua natureza cautelosa.

— Tá na hora de acordar — disse Kiyoko, em um tom de voz alto, acordando Ella. — Se nos apressarmos, conseguiremos chegar no coliseu ainda hoje.

— Que horas são? — perguntou Ella, se espreguiçando.

— Oito horas. Come e vamos. — Kiyoko jogou um enlatado de carne em direção a Ella.

— Uau! Onde você achou isso?

— Eu encontrei um fundo falso na casa, está lotado de enlatados. Eu peguei metade, pega a outra metade também.

Ella encheu a mochila alegremente com todos os tipos de enlatados. Naquele cenário, era como se tivessem encontrado um tesouro enterrado.

Juntas, saíram de casa e partiram em direção ao coliseu. Havia uma longa caminhada pela frente.

Kiyoko tinha se distanciado muito quando fugiu de Andrew Griffin.

Já na parte mais profunda de Vigon, não havia mais nenhuma vegetação e a pouca iluminação existente, vinha dos postes que ainda eram abastecidos por uma fonte de energia reserva da cidade.

Caminharam incessantemente por dez horas, até que finalmente puderam ouvir sons de batalhas.

O coliseu estava mais perto do que nunca.

No fim do horizonte, lá estava ele, metade do coliseu estava para fora e o restante dentro das paredes rochosas de Vigon.

Gigante e imponente, belo e ameaçador, aquele era o tão temido Coliseu dos Mortos.



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