Mosmos Brasileira

Autor(a): Sharikov


Volume -5

Capítulo 9: O Primeiro Olho da Máscara se Abre

Ainda de noite, enquanto as coisas se desenrolavam em Miasma, as coisas na Cidadela se enrolavam. Os Cinco Grandes Anciãos: Alcebíades, Zacarias, Eustáquio, Antero e Euclide, estavam no último e mais alto andar do palácio, em uma enorme mesa retangular de madeira de carvalho que se estendia da porta até onde o salão permitia.

O interior da sala era repleta de quadros de pinturas daqueles que de acordo com o senso comum, eram os fundadores da Cidadela. 3 quadros na parede esquerda, 3 paredes no lado direito, e diferente do convencional, mais 1 quadro na parede, na parede acima de uma bela cadeira, que apesar de não ser um trono, era mais linda e reluzente que qualquer trono que se encontrasse nos reinos nas proximidades.

Diferente das outras 5 cadeiras da mesa, que eram de madeira de baixo valor e conforto, a sexta cadeira possuía uma madeira de ébano polida que refletia as luzes do sol que entravam pelas janelas, além de bordas de ouro, um acolchoado confortável e de cor roxa, uma cor altamente cobiçada pela sua dificuldade de obtenção, e por último, uma inclinação perfeita que fazia parecer que não era a cadeira que respeitava as leis da física, mas as leis da física que respeitavam a cadeira.

Na mesa, Alcebíades e Eustáquio no lado esquerdo, Antero e Euclide no lado direito, Zacarias na extremidade da mesa aonde ficava a porta logo atrás, e na cadeira reluzente apontada para o quadro, um homem virado de costas à todos, acariciando um pequeno dragão de estimação, enquanto aguardava que sua vontade de acariciar a criatura se cumprisse.

Zacarias logo iniciou o assunto.

— Vossa Excelência, o caçador de elite que enviamos para executar a exilada… ele não retornou. — ele disse em um fim capisbaixo e a cabeça levemente inclinada para baixo, temendo a reação do homem no trono, mas nenhuma preocupação ele demonstrou, e ao invés disso começou a falar de assuntos diversos, com uma voz calma, limpa e literalmente hipnotizante.

— Feiticeiros… de escória e aberrações mágicas à coitadinhos da Cidadela — disse ele antes de uma pausa para acariciar o queixo do pequeno dragão, e logo voltou a falar. — as vezes… eu me pego ponderando se eu fui elegido o líder da Cidadela por ser um “feiticeiro coitado” ou por eu ser realmente bom, o que você acha, Zacarias? — Questionou o homem, ainda de costas.

Zacarias não perdeu tempo para responder, e com os dentes tremendo, já disse.

— Porque Vossa Excelência é ótima! Não, espetacular! Mas… mas… podemos conversar sobre…

O homem na poltrona logo interrompeu Zacarias e voltou a falar.

— Se continuarmos assim… acabarão elegendo o que na próxima vez? Um gnomo? Um anão? Um halfling? Oh… eu realmente estou curioso para ver como essa sociedade irá agir. — disse o homem antes de suspirar profundamente, e se preparar para falar novamente.

— Enfim, Zacarias, vamos falar sobre o assunto na qual você havia vindo aqui tratar. — disse ele enquanto ainda acariciava o pequeno dragão.

Zacarias abaixou sua cabeça quase que à altura da mesa, e começou a dizer.

— Bem… como… como eu havia dito, o caçador de elite número 4 não retornou, além de que… um intenso incêndio se alastrou na floresta próxima aos domínios da Cidadela, acreditamos que tenha sido lá o confronto entre a exilada e o nosso caçador.

O homem apenas disse:

— Ok.

Zacarias se mostrou confuso, mas ainda mais assustado, e apenas questionou:

— Uh… o senhor… vai fazer algo? Devemos enviar o resto do esquadrão para assassinar a exilada?

O homem suspirou fundo novamente, e continuou a falar com sua voz calma e hipnotizante:

— Zacarias, você não parece muito interessado em capturar a ex-maga, por que mandar apenas um membro do esquadrão? Isso é estupidez ou uma forma de arrogância que lhe cega de ver o verdadeiro nível de perigo das coisas? — questionou o homem.

Zacarias logo respondeu:

— Hm… mil desculpas… mas… mas… mas acreditamos que ela esteja na vila de Miasma, os exilados sempre param lá, sem falar que… ela não vai muito longe com o Culto de Lilith se alastrando pela região.

O homem suspirou novamente, e questionou:

— E quantos peões ainda temos?

— 6. — Respondeu Euclides, assertivamente.

O homem se mostrou surpreso, e disse:

— Oh Euclides? Então você sabe falar…? Oh… mas que silêncio entre esse seu grupinho de 3 pessoas, sobre o Alcebíades, eu relevo seu silêncio pela sua tamanha insignificância nessa mesa, um Ancião quase perto da demência, hohohohoho! — riu o homem, enquanto todos na mesa se mostravam bem desconfortáveis. O homem logo continuou.

— Enfim, uma dúvida às pessoas nessa mesa, o número de juízes ser 5 é para que possa haver um desempate na decisão, ou… é meramente simbólico para “ser bonitinho”…? — questionou o homem, exalando uma aura que amedrontou todos na mesa, algo iria acontecer.

Alcebíades, tentando limpar sua imagem de “inútil”, decidiu responder nessa vez, com uma voz bem velha e frágil.

— Sim, Vossa Excelência…

O homem ficou em silêncio, ponderando, quando finalmente chegou à uma escolha, e tirou sua mão direita das costas do pequeno dragão que estava acariciando, levantou esta mão, e com um estalar de dedos, incendiou Alcebíades na mesa, que começou a se debater e berrar de modo frágil e velho, caindo da cadeira, queimando ao lado de Eustáquio, que apesar do pavor que havia em seu coração, se mantéu completamente imóvel, pingando de suor.

O homem então disse.

— Pronto, agora vocês terão que ser mais úteis e… AMBIVALENTES em suas decisões para que evitem empates, ok?

Os 4 na mesa corresponderam, e o homem, após ponderar mais um pouco, disse:

— Na verdade… Alcebíades morreu à toa, porque sinceramente, todos vocês são uns inúteis.

Ao ouvir isso, todos na mesa entraram em um pavor que assolava, o medo era tanto que seus corpos suavam e tremiam como se houvesse um buraco negro os puxando para o centro de seus corpos, acreditando que seriam incendiados logo em seguida.

Mas o homem apenas disse.

— Euclides. Seu papel agora será cuidar da questão envolvendo a Pedra Filosofal.

— Eustáquio. Seu papel agora será administrar e ficar ciente dos interesses da Elite Burguesa da Cidadela.

— Antero. Seu papel agora será administrar as nossas forças militares e bélicas, incluindo os nossos caçadores de elite e a questão envolvendo a exilada, também cuide para que o Culto de Lilith não se aproxime demais dos domínios da Cidadela.

— E Zacarias… você será meu… Conselheiro. — disse o homem, em um tom que se diferencia de sua assertividade padrão, preocupando Zacarias em relação à o que ele realmente faria.

Antero logo questionou:

— Mas… mas quem vai cuidar dos julgamentos?

E assim o homem respondeu:

— Não é como se vocês estivessem fazendo algum tipo de justiça ou algo do tipo, então eu os dei trabalhos que realmente existem, eu simplesmente… abomino pessoas sem papel na sociedade. — disse o homem, se levantando da cadeira, deixando seu dragão de estimação sair voando pela janela, e ordenando que todos saíssem, menos Zacarias, que ficaria encarregado de limpar as cinzas de Alcebíades.

A aparência do homem, era a de um homem que, apesar de uma calvície que partia seu cabelo em dois, ainda possuía um elegante bigode que se estendia até para fora do rosto, além de exalar uma confiança e vigor físico jamais visto, sua calvície não era símbolo de vergonha, era símbolo de autoridade.

Este homem era ninguém mais, ninguém menos que Edmund Hölle.

No corredor, todos os três antigos Anciões, agora caminhavam rapidamente até seus devidos objetivos. Antero se dirigiu às pressas até a parte militar da Cidadela. Eustáquio se dirigiu até a região dos bairros ricos da Cidadela e Euclides se dirigiu até o Laboratório Real.

Caminhando rápido nas ruas de terra da região militar da Cidadela, ao entrar na Sala de Guerra em meio à noite, acendeu a lamparina acima de todos, e bateu palmas, declarando:

— SE LEVANTEM, VOCÊS NÃO SÃO PAGOS PRA FICAR DE BOBEIRA, REFORCEM O PERÍMETRO E ME DIGAM ONDE ESTÃO OS 6 CAÇADORES DE ELITE

Os cavaleiros não entenderam nada, acordaram completamente desorientados, e sem entenderem nada, apenas acataram a ordem sem maiores questionamentos, saindo da estrutura aos montes e indo reforçar a vigilância acima dos muros da Cidadela.

Antero saiu da estrutura em meio às ruas de terra e novamente chamou a atenção dos soldados, questionando novamente onde estavam os 6 caçadores de elite, e a resposta que obteve foi a aparição de 3 deles logo atrás dele, em meio à noite escura.

— mas onde DIABOS estão os outros 3?! — questionou Antero, completamente nervoso e quase sem ar.

O caçador com máscara de lobo disse à Antero:

— 2 foram realocados para caçar membros perigosos do Culto de Lilith à leste, já o outro, nós realmente não sabemos onde está.

— ahhh….aaaaAAAARRGHH! Que merda! Vocês 3! Eu preciso que se dirijam à Oeste! Procurem o corpo do caçador morto! Não! Ignorem isso e vão direto para Miasma! Matem a ex-maga boca-grande! — berrou Antero enquanto batia o pé no chão, com uma absurda raiva que era mais um reflexo de seu desespero.

Os 3 caçadores mascarados, ao ouvirem isso, não perderam um segundo de tempo sequer, se agacharam no chão, e após alguns segundos, logo saltaram por cima dos muros, indo em direção à Oeste.

Um possuía uma máscara de lobo e um gibão vermelho adornado com ouro. Outro, o mais alto, possuía uma máscara de tigre e um gibão marrom, adornado com ouro, e por último, uma figura mais feminina e baixa, possuía um gibão azul claro e uma máscara de coruja, todas as máscaras completamente prateadas e os três completamente dispostos ao trabalho.

— Mas… mas onde diabos está o último caçador de elite?

Do alto da torre do relógio, Auster estava sentado, observando à movimentação intensa da cidade à noite, dezenas de soldados deixando seus aposentos e partindo para as ruas com suas armas, lamparinas que iluminavam tudo ao redor e armaduras repletas de runas que eram de uma magia para garantir maior defesa mágica e física à cada um deles.

Ao ver aquele rio de soldados, Auster apenas disse à se mesmo em pensamento.

Eu realmente espero que você tenha tomado aquele caldo de ossos que eu te dei, Abby.

No Laboratório Real, logo ao lado do Palácio Real, Euclides chegava batendo na porta desesperadamente.

— Abram essa espelunca!

Assim que a porta foi aberta, Euclides se deparou com uma cena desumana. Dezenas de pessoas em estado deplorável dentro de uma cela. Todas com um aspecto doente, músculos atrofiados, ossos saltando por cima da pele podre, bochechas sugadas para dentro dos ossos da bochecha, todas amontoadas em cima uma das outras, como se fosse realmente uma pilha de cadáveres qualquer, só que viva.

Os homens no local sequer deixavam a cela fechada pelas pessoas serem fisicamente incapazes de pelo menos se locomoverem.

Ao ver tamanha cena grotesca e mórbida, Euclides, que nunca havia visto a realidade por trás do Laboratório Real, sentiu na sua pele como se aqueles ossos estivessem tocando em sua própria carne. O frio da sala, o fedor, tudo aquilo o doía no corpo e fazia recuar para trás até alcançar a parede, com a mão na boca para não vomitar, e gaguejando, apenas disse:

— Vo-vo-vocês precisam apressar o pro-pro-pro-processo de enriquecimento da Pedra Filosofal! — ele disse com a voz abafada por estar tampando a boca com a mão.

Os arcanistas apenas olharam uns para os outros e olharam de volta para Euclides, e disseram:

— Olha… eu não sei o que um membro do Conselho dos Anciãos está fazendo aqui, mas… para que o processo ande, precisaremos de mais que apenas alguns arcanistas! Acho que vamos precisar do apoio de alguns alquimistas renomados direto da capital tebaliana!

Ainda com a mão na boca, Euclides ordenou que o mostrassem o estado atual da Pedra Filosofal, afirmando ser para que pudesse definir o atual estado da jóia.

Os arcanistas por um momento, hesitaram em mostrar um objeto tão valioso, raro e cobiçado pelas potências do mundo afora, à um homem que de acordo com eles, “não conseguia tolerar ver uns cadaverezinhos”, mas por ser um dos grandes Anciões, eles não tinham nenhuma escolha a não ser o dar a jóia para análise.

— Pronto. — disse o arcanista chefe dos experimentos, mostrando à ele uma caixa preta, que quando aberta, revelou uma brilhante pedra branca e brilhante, bem diferente daquilo que era do imaginário comum sobre uma pedra filosofal, que se acreditavam ser da cor vermelha, mas na realidade, ela é normalmente branca, e quanto mais arroxeada for, mais pura e energizada ela está.

Euclides, desesperado e mentalmente quebrado por causa da situação do laboratório, não hesitou. Ele sabia que o portador da Pedra Filosofal ganharia enormes poderes, mas não sabia como, mas sua psique simplesmente não aguentava a tamanha desumanidade daquele laboratório.

 Completamente fora de si, Euclides agarrou a pedra da caixa, a sentindo queimar a carne de sua mão, mas com a psique quebrada, aquilo não doía nada comparado ao que seus olhos viam, e virando para trás de modo apático, vendo a luz da lua iluminando os céus e a cidade agitada, sentiu como se aquilo fosse um sinal divino de que ele… talvez poderia escapar?

Sem olhar para trás e com a mão sendo cada vez mais tostada pela energia da Pedra Filosofal, ele correu, mas correu o mais rápido que pôde, gritando por ajuda e gritando negações sobre o que havia acabado de presenciar.

Os arcanistas tentaram parar Euclides, mas o mesmo corria tão rápido entre becos e ruas de terra, que durante o estado de descrença e surrealidade que os arcanistas viam o ato, eles acabaram rapidamente o perdendo de vista.

— NÃO! NÃO! NÃO! NÃO! DESCULPA! NÃO! — ele gritava enquanto corria em direção aos portões da Cidadela.

— ISSO! ISSO! ISSO! ISSO! — ele gritava conforme chegava mais perto dos portões que o levariam para a liberdade.

Os guardas tentaram o parar, mas a velocidade é desespero de Euclides era tanta, que mesmo sendo magro e esguio, apenas atropelava todos em seu caminho.

Quando a última fileira de guardas havia sido derrubada, Euclides se via à centímetros de sua liberdade, que sairia do portão e entraria na floresta, fazendo todos o perderem de vista. Ele havia simplesmente conseguido a sua liberda—

SHRRRRRRK

Euclides se encontrava completamente imóvel, pálido, esbranquiçado, com a expressão maníaca fixa no rosto, ele havia sido completamente congelado de dentro pra fora, o reduzindo à uma estátua de gelo em milésimos.

Neste momento, um homem com um gibão branco e máscara prateada de raposa surgiu atrás dele, tirando lentamente sua mão de seu corpo completamente congelado, logo em seguida dando um chute firme na estátua, estilhaçando Euclides em dezenas de pedacinhos congelados e sangrentos, fazendo basicamente um espetáculo para todos os guardas que ali estavam.

No fim,  a Pedra Filosofal caiu do alto direto em sua mão, sem a menor dificuldade, esfriando o membro para evitar que fosse carbonizado até a carne.

— Uh, parece que eu vou ter que levar isso de volta pro Laboratório… que saco, guardas! Desculpa pelo transtorno! — disse o homem por trás da máscara, caminhando calmamente até o Laboratório para devolver a Pedra.

 

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