Volume 1

Capítulo 1: Um Presente dos Céus

Não importa quantos dias passem, existe uma tradição que nunca deixo de cumprir.

Todas as segundas depois da escola, compro um karaage e venho até o parque para comê-lo embaixo de uma cerejeira no parque municipal.

Como esse é o meu primeiro dia de aula, é possível ver as flores da árvore, já que estamos na primavera. Essa sim é uma visão bonita.

O motivo para seguir essa tradição tão à risca? Já faz um tempo que ele se perdeu… Mas, mesmo assim, continuo vindo sem faltar um dia.

Hmmmm… A Dona Himekawa realmente capricha… Não importa o quanto tente, eu não consigo reproduzir esse sabor. — Me permiti soltar uma voz de prazer.

Enquanto me deliciava com a maciez da galinha e a crocância da massa, peguei algo da minha mochila.

Hehe… Ficar naquela fila valeu a pena… Consegui a versão exclusiva do último volume de Samurai de Prata. Não tem nada melhor para acompanhar esse karaage.

Óbvio, ficar apenas embaixo dessa cerejeira comendo não é necessariamente algo aproveitável para nada além de respirar um ar puro. Por essa razão, sempre trazia alguma coisa comigo para ler.

Hoje, havia trazido um volume do meu mangá favorito que fiquei horas esperando na banca para conseguir. Era a finalização da série!

Depois de um bom tempo me divertindo sozinho, decidi que era hora de parar por hoje e voltar para casa. À noite eu teria muito trabalho para fazer.

— Bom, mais uma segunda se passou… E eu não me esqueci de vir. Então… — comentei, em um tom melancólico. — Até a próxima semana, eu acho…

Me virei e comecei a sair do local, quando, de repente, ouvi um estrondo enorme atrás de mim e meu corpo foi impulsionado para longe.

Aaaaaaaah! — Deixei sair um enorme grito enquanto voava pelo ar com o vento atingindo meu rosto.

Ploft!

Não demorou muito para que algo impedisse meu corpo de continuar a viagem. Infelizmente, eu bati com a cara em outra árvore mais à frente.

Ai, ai, ai…

Que porra foi essa? Era o que queria saber. Ignorando meus machucados, me levantei e comecei a voltar para onde estava antes da explosão.

Havia muita fumaça e, conforme ela foi desaparecendo, foi revelando uma enorme cratera no chão. Olhei para dentro, e o que havia lá me surpreendeu bastante.

— U-uma pessoa?

O que estava lá dentro era uma mulher. Cabelos loiros, feições delicadas, vestido elegante rasgado, sangue… Sangue!

— Tem sangue escorrendo da cabeça dela! Eu tenho que… Eu tenho que chamar um médico!

Sem pensar duas vezes, puxei meu celular do bolso e disquei o número da emergência, sendo atendido prontamente.

— Boa tarde, o que podemos fazer hoje? — Uma voz totalmente despreocupada saiu do outro lado da linha.

Am, boa tarde. Eu preciso de… de uma ambulância agora mesmo!

Hmmm… Ambulâncias, ambulâncias. — Com essa resposta, a mulher que estava no telefone estava falando baixinho, como se estivesse conversando com alguém. — Ah, sim! Desculpe, senhor, mas… Não podemos mandar uma ambulância.

Dei um pulo de surpresa com essa resposta. Como assim não podiam mandar uma? Tem alguém morrendo aqui! Pelo amor de Deus!

— Por que não podem mandar!?

— É que nós… mandamos todas as ambulâncias da cidade para atender uma ocorrência…

— O quê? Que tipo de ocorrência poderia exigir todas as ambulâncias de Shinjuku?

— Ah, foi só uma guerra de gangues. Falando nisso, se eu fosse você, não iria para o Distrito Kabuki hoje…

Totalmente irado, desliguei o celular e voltei minha atenção para a pessoa quase morta no chão.

— Bom, se a ambulância não vem até ela… Eu mesmo vou levar ela pro hospital! — Levantei a garota do chão e coloquei nas minhas costas, começando a correr rápido pelo parque.

Ela balançava muito, e todos do parque estavam olhando para mim com olhares suspeitos, mas isso era apenas detalhe!

Eu sou um homem da família Jundou! Nunca vou deixar alguém na merda continuar na merda. A não ser que ele mereça estar na merda!

Depois de sair do parque correndo que nem um maluco, enfrentei meu pior inimigo! A sinaleira dos pedestres havia fechado e eu precisava atravessar a rua.

— Merda… Merda… — resmunguei, tremendo meu corpo em irritação com esse obstáculo.

Enquanto falava baixinho comigo mesmo, percebi que uma mulher carregando um carrinho de bebê também estava afim de cruzar a rua.

Ela parecia bastante assustada… Talvez porque estou carregando uma mulher ensanguentada com suas roupas rasgadas?

Bom, tenho que mostrar para ela que não apresento perigo, então vamos começar uma conversa amigável até o sinal abrir.

— Boa tarde, senhora. — Me virei diretamente para ela e então a cumprimentei da maneira mais formal possível.

No momento em que eu disse isso, ela arregalou os olhos, mostrando a maior cara de medo, no nível se mijar nas calças.

— Políciaaaaaaaaaa! — Ela saiu gritando, empurrando o carrinho para o meu lado oposto. Depois dessa, ela até desistiu de atravessar.

— Ok, isso é um problema… — Fiquei com os meus próprios pensamentos e logo percebi que o sinal havia aberto. — Certo! Eu posso pensar em como me livrar dessa depois! — Atravessei a rua da maneira mais rápida que alguém carregando outra pessoa conseguiria.

Com muito esforço e perseverança, fui capaz de chegar no hospital e já logo cheguei entrando com tudo na sala de espera.

— Médicoooo! Eu preciso de um médico! — gritei, desesperado por atendimento.

Todos os pacientes sentados lá me fitaram como se estivessem julgando toda minha linhagem e culpando-os por alguém como eu ter nascido.

— Senhor, por favor pegue sua senha e aguarde! — A mulher no balcão se pronunciou, vendo minha situação.

— M-mas… Isso é uma emergência. — Tentei refutar a falta de consideração da atendente, mas não tive sucesso.

— E daí que ela tá com uma feridinha na cabeça? Eu tô sem uma perna e tô esperando aqui! — Um velho sentado na sala aumentou seu tom para que eu ouvisse. — Na minha época eles resolviam isso só passando um Dorflex.

Tch. Esses velhos saudosistas são a pior merda de todas! Ainda bem que o meu velho não é assim…

Bom, já que eles não vão me ajudar… Não tenho escolha a não ser pegar a merda da senha!

Deixei a minha Bela Adormecida assentada cuidadosamente em uma cadeira do meu lado e então…

Hmmm… Dizem que massagear o lugar onde tá machucando depois de uma porrada grande ajuda a aliviar. — Já que não tinha mais nada pra fazer enquanto esperava, fiquei massageando cuidadosamente o lugar onde a garota tinha se machucado.

Espera! É verdade! Ela sofreu um grande acidente. A primeira coisa que eu deveria ter feito era buscar informações dela pra avisar a família, né? Nossa, como sou burro!

Checando os bolsos dos vestidos, não fui capaz de encontrar nenhum celular, nem uma carteira e muito menos algum documento de identificação.

A única coisa que tinha era um broche de ouro muito bonito. Tenho certeza que essa garota é muuuuuito rica!

— Número 136, pode vir! O doutor vai te atender.

Opa, finalmente chegou minha vez! Já estava cansado de esperar. Sem pensar duas vezes, peguei minha princesa no colo e a levei direto para o médico.

No momento em que ele tocou na ferida, concluiu que era algo que ele nunca tinha visto antes.

— Meu senhor… Onde diabos ela fez uma concussão dessas!? É surpreendente que ainda esteja respirando!

— E-eu não sei… Eu tava lendo lá no parque e do nada ela caiu no chão. Fez até uma cratera de tão forte.

— Uma cratera!? — O médico colocou as duas mãos na cabeça, puxando os cabelos de tão exacerbado.

— De qualquer forma, tem como ajudar ela? — Fiz a pergunta mais importante no momento.

O homem de mais idade ponderou um momento, enquanto puxava sua barbicha, até que finalmente chegou a uma conclusão:

— Eu vou precisar internar ela… Talvez por alguns dias. — Enquanto dizia isso, foi para seu computador e começou a digitar algo. — Aqui está… — Ele imprimiu algo e me entregou. — Entregue isso para a atendente e passe seu número. Entraremos em contato para avisar caso tenhamos mais notícias.

Meu número? É… Não achei nenhuma forma de contatar a família dela, então é melhor eu cuidar disso até poder perguntar pessoalmente.

Com isso em mente, realizei todos os procedimentos necessários e abandonei o hospital, tendo uma sensação de dever cumprido.

Enquanto fazia o caminho de volta para a casa, fui parado por um policial que estava andando pela rua.

— Com licença, senhor.

— Ah, olá, senhor policial. Posso ser útil em algo? — perguntei, curioso pelo motivo de um cidadão modelo como eu ser parado assim do nada.

— Recebemos uma denúncia de que tinha um estudante maníaco andando por aí com uma vítima ensanguentada e com as roupas rasgadas. Acreditamos que possa se tratar de abuso sexual. Por acaso você sabe de alguma coisa?

Caralho… Aquela dona realmente exagerou na história, né? Ela me odeia tanto assim?

— Lamento não poder ser de grande ajuda, mas… Eu realmente não vi nada do gênero. Como pode ver, não posso fazer nada.

Ele ponderou por um momento, mas acabou achando que eu era uma pessoa bem convincente, então simplesmente disse:

— Está certo. Se ficar sabendo de algo, chame a polícia.

— Com certeza… — Me despedi do policial e continuei meu caminho.

Depois de andar um pouco, peguei meu celular para ver que horas eram e então pulei para trás com a revelação.

— Já são quatro e meia! Era pra eu estar no restaurante cinco horas pra começar a preparar o caldo! Meu pai vai me matar! — Entrei em desespero ao perceber que estava quase atrasado para o trabalho.

Calma, Akazawa. Seu pai é compreensivo… Ele vai entender que você só fez uma boa ação e por isso se atrasou.

Pelo menos é isso que espero…



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