Masmorra do Desejo Brasileira

Autor(a): Alonso Allen & Zunnichi


Volume Único

Capítulo 12: Purificada

Mesmo que as coisas não tenham saído como planejado, o chefe da masmorra foi derrotado e, apesar dos ferimentos, todos do grupo sobreviveram e estavam seguros por enquanto.

Contudo, ainda havia uma questão flutuando no ar, literalmente. Diante da mulher fantasmagórica de pele vermelha, o grupo aguardava em silêncio.

— Quem eu sou, você pergunta… — disse o espectro. — Meu nome é Cassandra 

Alexsander, cansado e ferido, olhou para ela e levantou a voz: — Você apareceu nos meus sonhos antes. E agora está bem aqui.

Alice ficou perplexa com a informação. — Os demônios que aparecem nos sonhos?! 

— Eu sou uma súcubo! — Rapidamente a criatura se manifestou, havia ansiedade em sua voz espectral. — Mas eu não farei mal a vocês. 

Lohan fez uma expressão de descrença. — Não posso confiar em uma entidade que sobrevive roubando a vitalidade dos outros.

A diminuta elfa cerrou o olhar e acrescentou: — Inclusive… neste mesmo instante nossos status estão reduzidos por causa da sua presença.

— O quê?! Quer dizer que ela está nos atacando!? — Foi Minerva quem falou, ainda influenciado pelo efeito negativo da habilidade. 

— Eu posso explicar…

Ela tentou falar, porém o ladino não permitiu que continuasse.

— Alice, use purificar nessa coisa! 

Os três estavam ansiosos e Paulo Horse parecia não querer interferir na decisão. Restava apenas uma pessoa para defender o espectro.

— Acalmem-se! — gritou Alexsander. O guerreiro ainda tinha a cabeça no lugar. — Ela me ajudou a fugir da banshee e encontrar vocês. Se quisesse fazer algo, já teria feito. Deixam-na se explicar antes de tomar alguma decisão.

O restante engoliu suas preocupações e se manteve em silêncio, pelo menos por enquanto.

— Me perdoem por atrapalhar vocês num momento tão crucial… — O corpo da sucubo tremulou, seu rosto pareceu se esconder numa fina névoa. — Esse é um dos resultados da maldição que jogaram em mim. Tudo começou dez primaveras atrás… 

A mulher de pele vermelha contou seu passado, desde quando era uma súcubo comum, que se alimentava invadindo os sonhos das pessoas e roubando sua vitalidade. Porém, um encontro com um sacerdote mudou sua vida de ponta cabeça.

Um membro da raça demoníaca, um demônio do sexo, criou uma amizade com um humano que servia a um deus bondoso. Nem mesmo as mais infames piadas partiriam de uma premissa como essa, mas, mesmo assim, essa foi a verdade.

A bondade do sacerdote mudou a forma como Cassandra enxergava o mundo. Isso levou a uma decisão radical: nunca mais roubaria a vitalidade de alguém, nunca mais se alimentaria da vida de outras pessoas.

Para os desentendidos, isso pareceria algo óbvio. Contudo, parar de aparecer nos sonhos dos mortais seria o mesmo que um humano decidir que nunca mais faria uma refeição. Era uma greve de fome com um resultado inevitável no fim: morte por inanição. 

— Eu achava que a única coisa que poderia lavar os pecados da vida que eu vivi seria a minha morte. O fim da vida não é o fim de tudo, é apenas uma parte do ciclo.

Algo nobre para muitos, uma idiotice para outros. Fato é: nem todos gostaram de saber que uma súcubo se aliou aos sacerdotes do templo em uma missão quase santa. 

— Mas um demônio abandonando a escuridão não agradou os cultistas da região. Eles fizeram um ritual de magia negra. Quando eu morri, minha alma ficou presa no limbo entre esse mundo e o outro. 

— Isso… Isso é horrível! Quem faria tamanha maldade? — Alice estava quase chorando ao ouvir o relato. Impedir alguém que não de seguir a jornada do pós-vida era uma das maiores maldades que alguém poderia fazer. 

Alexsander ouviu tudo atentamente. Agora ele entendia. — Charles Cooper.

— Esse não é o prefeito de Doveport?! — perguntou Lohan. 

A fantasma concordou com a cabeça. — Parece que o artefato que aquela maga usou fez com que eu conseguisse me manifestar nesse plano, mas, enquanto o ritual original não for desfeito, eu não poderei descansar.

— Vamos sair da masmorra e descansar — falou o líder. — Parece que retornaremos a Doveport antes do planejado.

Quando o chefe foi derrotado, os corredores da masmorra se modificaram, criando um caminho novo direto para os portões do labirinto. 

O grupo seguiu com atenção, mas com calma, nenhum monstro apareceu durante o percurso — a Masmorra das Planícies demonstrava respeito por aqueles que concluíam o desafio final. 

Assim que a grande passagem se abriu, revelando o exterior iluminado pelo Sol da manhã, o grupo levou um choque.

Todos os cavaleiros que faziam a guarda da Masmorra estavam mortos. Uma análise superficial mostrava diversos ferimentos causados pelas mesmas armas que eles carregavam, levando a crer que tinham lutado uns contra os outros.

— Aquela mulher deve ter criado uma ilusão para conseguir entrar na masmorra sem uma permissão oficial… — O guerreiro se aproximou de um dos corpos caídos e analisou as feridas, que mais se assemelhavam ao ataque de um animal descontrolado que um preciso golpe de uma arma. — Eles se atacaram até que não sobrasse ninguém.

— Camaradas forçados a lutar entre si até a morte… —  Paulo Horse tinha um olhar pesaroso, seu sorriso de sempre não estava mais ali. 

— Não toquem nos corpos, reportaremos na guilda quando chegarmos na cidade. — Lohan manteve sua atitude racional, mesmo que o ambiente não permitisse muito. — Eles devem enviar alguém para investigar, não podemos interferir. 

Alice deixou uma lágrima escorrer, mas se concentrou em rezar pelos mortos; era o máximo que podia fazer no momento. O grupo seguiu pela estrada e montou acampamento em uma clareira não muito distante da masmorra. 

Depois de lutarem por muitas horas seguidas, a fraqueza ficou estampada no caminhar deles.Montaram acampamento e caíram nos braços do deus do sono, por mais que a presença da súcubo tirasse parte da tranquilidade e o alívio que vinha de um bom descanso.

No dia seguinte, fizeram seu planejamento. A presença do espectro, que estava atrelada a Alexsander por obra do acaso, reduzia os atributos físicos de todos do grupo, então precisavam dar um jeito nisso.

Purificar a existência da pobre alma penada apenas mandaria ela de volta para o limbo. Não seria justo, não seria certo e Alice jamais faria isso. Só restava uma coisa a ser feita.

Os cinco aventureiros e o sexto companheiro espectral seguiram pela trilha nas planícies. Nenhum inimigo apareceu no caminho de volta, então a jornada foi rápida. No segundo dia, durante uma tarde ensolarada, o grupo alcançou a cidade de Doveport.

Antes de entrarem na cidade de fato, teriam que resolver algo importante: como disfarçar a presença de um fantasma diante dos olhos de todos? Para resolver esse problema, o espectro se condensou em um único ponto. Assumindo a forma temporária de um objeto, semelhante a um colar de sacerdotes. 

A primeira parada foi na guilda. Rapidamente reportaram a conclusão da masmorra e o incidente com os guardas. Algumas perguntas foram feitas, mas uma magia de detecção de mentiras comprovou a inocência do grupo. 

Resolvida a burocracia obrigatória, partiram para a prefeitura. Para surpresa dos cinco, o político não se encontrava ali. Os funcionários disseram que talvez ele estivesse na sua mansão, em uma parte mais afastada do centro da cidade. 

A cidade portuária tinha uma densa aglomeração de habitações, comércios e galpões de estocagem, porém a região onde o prefeito morava era diferente, não havendo outras construções próximas de sua casa.

Perfeito para conduzir rituais profanos e cometer crimes sem ser visto, pensaram os aventureiros.

Bateram na porta da propriedade e foram recebidos por um mordomo. O empregado levou o grupo até o escritório do chefe e foi embora.

— Bem-vindos de volta, aventureiros — recepcionou o prefeito, com seu sorriso soturno. — Voltaram cedo… Por acaso não conseguiram derrotar o chefe da masmorra?

O homem parecia suspeitar de algo. E definitivamente não queria os aventureiros por ali.

— Derrotamos — respondeu Alexsander, secamente e com as sobrancelhas franzidas. — Mas não estamos aqui para isso.

— Oh, e por que vieram, então? Deviam estar no próximo continente a caminho do próximo chefe.

— É por conta disso. — Ele colocou um colar com manchas vermelhas em cima da mesa.

Cooper ficou quieto de repente, analisando aquele colar em sua mesa. Cruzou as mãos, seu rosto ficou repentinamente sombrio e ele levantou da cadeira. 

Os aventureiros olharam-no caminhar de um lado para o outro, até que ficou de costas para eles, encarando a paisagem dos campos pela janela.

— Nós sabemos o que aconteceu. — Alexsander cerrou os punhos, segurando sua raiva. — Qual é a sua justificativa?!

O prefeito continuou olhando pela janela. — Antigamente o chefe da Masmorra das Planícies não era uma Banshee, sabiam? Fomos nós que a colocamos lá. Se existem pessoas que merecem alcançar o desejo supremo, somos nós. Apenas nós e mais ninguém.

— Você virá conosco do jeito fácil… — O grupo sacou suas armas. — Ou do jeito difícil? 

Cooper não respondeu. Sua mão deslizou por baixo da mesa do escritório, puxando uma pequena corda de lá de baixo. O piso abaixo dos aventureiros se abriu, fazendo com que todos caíssem para um abismo escuro.

Alexsander tentou se segurar nas paredes, olhando para seus companheiros despencando um a um em direção às sombras. Um grito de fúria ecoou pelo túnel, antes de se fechar acima dos aventureiros.

Eles caíram de costas contra um piso de pedra, numa profunda masmorra com goteira e um cheiro podre. Havia vários esqueletos pelo chão, prova que vítimas anteriores passaram por ali. O guerreiro se levantou e conferiu os arredores, estava parcialmente escuro e mal dava para ver mais que um palmo de distância, exceto um sorriso curto em meio as penumbras.

— Horse? Está aí? — Ele abanou a mão no ar, procurando alguma coisa.

— Estou sim! Alice e Lohan estão comigo, eu aliviei a queda deles! 

— Excelente, agora só precisamos saber de um jeito de sair daqui…

Uma pequena luz crepitou no meio de todos, iluminando por completo o lugar. Era uma pequena bola de fogo, que revelou um conjunto de corpos estirados nos cantos, junto de correntes que prendiam os esqueletos à parede. 

Contudo, isso não era o mais macabro naquele ambiente, tinha algo ainda pior. Próximo à uma pequena porta de madeira, havia o corpo de uma garotinha. Era magra, estava deitada no chão frio e as curvas de seu crânio se destacavam sob a pele.

Alice ficou sem palavras, ela queria vomitar perante àquela brutalidade. Seus olhos se voltaram para o chão e seu corpo começou a tremer. Minerva tentou confortá-la passando a mão em sua cabeça, mas não adiantou muito.

Alexsander podia meramente olhar e já sabia que ela havia morrido há algum tempo, seus olhos estavam vazios e insetos corriam pelas cavidades de seu corpo.

Ele suspirou, mesmo tendo visto algo assim diversas vezes ao longo de sua vida, era impossível se acostumar. Viu as costas de Lohan, que repentinamente ficou extremamente quieto, mas seus dedos apertavam o cajado ao ponto de estarem brancos.

Esticou a mão na direção do mago, só conseguindo ver seu rosto ao se aproximar o bastante. Era uma expressão furiosa, uma que nunca havia visto em dias de viagem com ele, parecia até mesmo a encarnação de um demônio.

— Estou farto disso…

Lohan bateu o cajado no chão, vinhas emergiram do chão e rapidamente tomaram conta das paredes, destruindo-as conforme cresciam descontroladamente para cima. A estrutura ao redor ruiu, os tijolos das paredes foram caindo em grandes pedaços, e assim toda a mansão se desmanchou como um castelo de areia.

A poeira subiu e Alexsander tentou se guiar no meio do caos, mas apenas se viu separado dos demais. Ao ver uma pequena abertura pelas paredes, fugiu para o lado de fora. 

Livre novamente, viu a mansão do homem, agora feita em pedaços pela magia do mago.

No meio desse caos havia Lohan, cujos olhos emanavam uma mana intensa. Ele se colocou de frente para o prefeito, que usava vários anéis brilhantes e uma armadura de placas completa — no tempo que ficaram presos, o homem se preparou para a luta.

A energia ciana se concentrou ao redor do mago, enquanto a própria natureza abasteceu suas reservas e fez pequenos raios estalarem em seu longo cabelo dourado.

— Você é corrupto, não merece o poder que tem! — disse, a ponta de seu cajado acumulou partículas azuladas que eclipsaram a gema vermelha. — Pessoas como você são um tumor neste mundo. Aquelas pessoas morreram por sua culpa, minha amiga morreu por sua culpa, e eu não permitirei que isso continue assim! 


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A habilidade Foco Arcano evoluiu

Sua compreensão da mana aumentou, suas magias serão mais fortes ao usar a habilidade.

Aumenta em 20% 30% o poder da próxima magia.

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A aura de repente se tornou escarlate, as labaredas dançaram ao seu redor e aos poucos se reuniram num único ponto cintilante. Uma gigantesca esfera pairou acima da cabeça do mago, girando e queimando o ar ao redor.

— Queime no inferno!

Ele apontou o cajado para frente, lançando sua magia e destruindo tudo pelo caminho. O prefeito ergueu seu escudo mágico, porém de nada adiantou e todas as suas proteções se desintegraram diante daquela magia. 

O corpo do homem foi lançado pelos ares com chamas intensas p queimando. Parecia uma estrela cadente feita de carne. Seu corpo logo despencou contra o chão, era irreconhecível, sua pele queimada e o cabelo chamuscado o deram uma identidade completamente diferente.

Lohan respirou fundo, aquela forma de criança mais uma vez parecia fraco pelo tanto de energia consumida. Seus olhos se encheram de água, transbordando pelos cantos e permitindo que pela primeira vez pudesse retirar um pouco do peso que habitava seu peito.

Alexsander observou tudo aquilo de longe. Ele estava ressentido em falar o que quer que fosse. Eu não posso culpá-lo por ter feito isso… mas agora o que será de nós?

Quando a confusão acabou, uma voz ecoou na mente de todos.

 

Obrigada, aventureiros. O que vocês fizeram por mim, ninguém mais faria.

 

Diante deles, a súcubo se manifestou novamente, mas não como antes. Não era mais um espectro parcialmente definido, não era mais uma alma penada.

Cassandra não tinha mais o olhar triste no rosto e o choro de dor já não ecoava mais na mente de Alexsander, a mulher tinha um sorriso puro no rosto.

A magia de Lohan que consumiu toda a mansão destruiu também aquilo que causou a maldição, quebrando o vínculo que mantinha a súcubo no limbo entre os planos. 

 

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Boa sorte em vossa jornada. Estarei torcendo por vocês, meus amigos. 

 

Com a aparição digna de uma santa, a entidade finalmente poderia seguir o ciclo e descansar. Os aventureiros assistiram tudo com certa admiração.

O guerreiro repleto de cicatrizes também sentia algo a mais. A dor que ele sentia, o arrependimento em seu coração, foi o que conectou os dois seres. Agora que ela se viu livre da maldição, poderia seguir em frente.

Alexsander, porém, ainda não conseguia se livrar dos grilhões. 

 

☆ ☆ ★ ☆ ☆


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O caos habitou Doverport por dias depois que o prefeito foi atacado. Os corpos escondidos ficaram à céu aberto para todos os residentes olharem, e isso fez muitos acreditarem no envolvimento de Charles Cooper com necromancia e bruxaria. Até mesmo os paladinos e clérigos das igrejas mais próximas foram chamados para investigar o caso peculiar do prefeito e sua gama de assassinatos.

Não só isso, como também foram achados documentos adulterados que reforçavam uma antiga teoria de corrupção e tráfico humano. Tamanha barbaridade acarretou na investigação da polícia real, que levou o caso adiante com inúmeros julgamentos e intensa perseguição aos envolvidos.

O que antes acreditava ser uma cidade porteira próspera e rica se transformou no epicentro de um dos maiores dramas ocorridos no continente, tornando-se a conversa diária das pessoas à fora. Mais tarde, parte das identidades dos cadáveres foram descobertos, e se descobriu que muitos eram de outros residentes próximos que tentaram descobrir alguma verdade, mas que foram longe demais e assim tiveram que ser cortados para o segredo se manter.

No entanto, o grupo de aventureiros responsável por desmascará-lo não apareceu para pegar qualquer recompensa. Eles desapareceram dos olhos do público tão rápido quanto surgiram, como se fossem fantasmas em busca de justiça.

Quando alguns dias se passaram, todos na cidade começaram a falar de heróis que desviaram de seu caminho apenas para desmanchar o governo tirano de Cooper… Porém a realidade era um pouco diferente do que a maioria imaginava ser.

Eles estavam num barco rumo ao próximo continente, e o motivo era simples: ninguém queria suportar todos os problemas que viriam com um evento tão trágico, por isso Alexsander levou todos embora assim que viu a chance. O líder se encontrava no convés, observando as ondas balançarem e o vento soprar.

Fazia muito tempo que ele não possuía aquela sensação, aquele vazio depois de uma tragédia. Sua cabeça gritava para tentar amenizar a situação, mas ele não fazia a mínima ideia do que fazer, então seu silêncio era a resposta para os problemas que rondavam ao redor. 

Eu não sou um líder tão bom assim… Se eu tivesse percebido alguma coisa fora do lugar, ou talvez me controlado… ou talvez esperado um pouco… Uma dor aguda atingiu seu braço. Pôs a mão na região e puxou a gola da blusa, veias roxas pulsavam por baixo da roupa, criando caminhos por entre seus músculos e subindo até o ombro. Não, devo esquecer essas coisas por enquanto, preciso me focar… Verei Alice, talvez ela consiga tratar isso.

Saiu do convés rumo às cabines. O silêncio caminhava lado a lado com seus passos, misturando-se com as batidas das ondas. Chegou na cabine da clériga e bateu na porta, rapidamente a tranca foi aberta e ele entrou no quarto. 

Alice estava de pijama, com o rosto e os olhos vermelhos, sem conseguir olhar para o rosto de seu amigo. 

— Está tudo bem? — perguntou o guerreiro, pondo uma mão no ombro dela. — Eu não queria vir a essa hora, se quiser, posso…

— Não, continue aqui. — Segurou o braço dele, logo as lágrimas voltaram a correr pelos seus olhos. — Por… por favor, continue aqui…

Alice não resistiu e caiu em prantos, apoiando sua cabeça no peito de seu amigo e segurando-se nele. Alexsander afagou sua cabeça e a sentou na cama; novamente estava sem o que dizer. Ficaram minutos ali, com ele tentando confortá-la e limpando suas lágrimas. Quando a clériga enfim parou de chorar, ela se separou dele.

— Desculpa por isso, eu só não consigo acreditar no que vi. Como as pessoas podem ser tão más assim?

— Eles existem há muito tempo, então eu esperava cedo ou tarde encontrar pessoas daquele tipo… só não tão cedo. — Suspirou, olhando agora para o chão de madeira e relaxando os ombros. — E também, eu ainda acho que não devia ter vindo, já que você está assim.

— Nã-não pense nisso, Alexsander! Eu a-acho que foi me-melhor ter vindo… Não gosto de ficar tão só.

— Entendo. — O homem puxou a manga de sua camisa, mostrando uma ferida que parecia necrosada em seu braço, o mesmo braço que Ashley atravessou com sua rapieira mágica. — Vim aqui pedir para você usar sua cura nessa ferida.

Alice assentiu com a cabeça, ela olhou no rosto do guerreiro e pensou em como ele era austero, sua expressão não exibia desconforto, mas certamente aquele machucado estava doendo. Ele sempre guarda tudo para si…

A garota meio-elfo equipou seus equipamentos e invocou o milagre de Cura, porém a ferida permaneceu igual, sem sinais de mudança. 

— Estranho… meu milagre não funciona. Isso é mal, muito mal. — Mordeu o dedo, tentando pensar numa alternativa. — Eu vou man-mandar uma mensagem para meu patrocinador e pedirei um antídoto, está bem? 

— Está sim. — Ele puxou a blusa de volta e cobriu o braço. — Obrigado, de qualquer jeito.

Alice acenou com a cabeça, vendo-o sair lentamente do quarto. Alexsander fechou a porta e retornou à sua cabine, onde arrumaria suas coisas e dormiria por um tempo. Em breve eles chegariam ao novo continente, então tudo precisava estar no seu devido lugar.

Algumas horas depois e o cais da nova região ficou visível no horizonte. Os tripulantes foram avisados de que logo atracariam, e por isso todo o grupo se levantou. Quando o barco parou, o monge moreno acenou para seus companheiros no convés e abriu um largo sorriso.

— Desculpe, companheiros, eu trouxe meus problemas para vocês… Pensei que conseguiria enfrentar isso, mas agora ficou claro que ainda não é o momento, contudo, vocês me encorajaram a continuar em meu caminho e me deram uma nova esperança, obrigado por tudo.

Paulo Horse deu as costas e andou sobre a prancha, então seguiu rumo às ruas da cidade. O tempo todo o grupo encarou as costas e a pele morena daquele gigante que se destacava na multidão, até que não pudesse ser mais visto. Ninguém ousou jogar alguma palavra, como se soubessem que dessa vez não adiantaria mais trazê-lo de volta. Minerva se despediu silenciosamente do monge, até mesmo sentindo culpa de ter “roubado” seu dinheiro.

Assim, todos pegaram suas bolsas e a bagagem restante e fizeram uma parada na taverna local; infelizmente não havia nenhum traço mágico naquele lugar, apenas o cheiro de cerveja e fumo pelo ar. 

Mesmo que o lugar fosse incomparável com a Estalagem do Gato Morto e Erwin não estivesse por ali, o grupo se organizou para descansar.

Alice ficou em seu quarto meditando e rezando pelo futuro, como uma forma de trazer sorte. Minerva saiu pelas ruas para, quem sabe, tirar um dinheiro de um desavisado, já que uma grana a mais trazia um pouco de felicidade.

Alexsander encheu a cara até o sol raiar, sozinho com seus pensamentos, espantando qualquer bebum que procurasse confusão e ocasionando numa briga que virou o bar mais tarde.

O único que realmente não possuía uma válvula de escape para o conflito dentro de si era Lohan. O álcool era um antigo conforto e ele evitava voltar para ele nessas ocasiões. Sem outra opção, permaneceu deitado na cama de olhos abertos e encarando o teto. Era a segunda vez que acontecia, era do mesmo jeito que ocorreu com sua mestra, o mesmo fatídico destino que ele não conseguia mudar.

Ashley fez coisas ruins, ele sabia. Matou aqueles cavaleiros, tentou assassinar Minerva e quase matou Alexsander. Mas, mesmo assim, ele se sentia culpado. Se eu tivesse notado o estado mental dela antes, se eu tivesse conseguido ajudar ela anos atrás… 

O elfo viu uma pequena corda amarrada na janela. Um desejo o invadiu, e ele se sentiu tentado a estender a mão na direção do objeto, porém, não o fez. Se matar por não suportar a própria imortalidade é covardia e uma das coisas mais rídiculas que um elfo poderia fazer… mas, por que só eu tenho que ser amaldiçoado com isso?

Deitou mais uma vez. Faltava algo que não tinha, algo que impedisse que errasse, algo que pudesse desfazer qualquer infortúnio. Ele abriu uma janela do artefato de encadeamento, seus olhos passaram entre seus atributos e inventário. A escolha era óbvia, precisava chamá-lo.

Uma janela flutuante apareceu diante de seus olhos, com uma simples mensagem escrita.

 

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 Eu estou disposto a enfrentar qualquer aventura que me der, independente do que seja. 

Me dê mais poder.

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