Volume 1
Capítulo 6 : Um teste.
Os animais lutam e caçam por instinto, para se alimentar e proteger. Isso é a natureza. Os humanos são seres que tiram a vida dos seus semelhantes movido por vingança, ódio ou até por prazer. Mesmo que Roy não tivesse a intenção de matar e sim proteger, entendeu que que tinha um preço a pagar pelo seu objetivo.
“Não tenha piedade, pois nenhum inimigo terá de você. Eles não ligam se tem um sonho ou família. Vão pensar apenas em te matar.”
O garoto recordou do que a figura tinha dito.
— Não ter piedade... ele pode ter razão.
Olhou para o céu. Como a noite já tinha caído, viu muitas estrelas. A fogueira já estava acesa e assando alguns peixes que Roy tinha buscado no rio. Decidiu sentar-se à frente das chamas e descansar.
— Os papéis. — Lembrou-se, pegando novamente os bilhetes.— Liberte a floresta...
Juntou o papel com a frase. Havia mais três folhas. Elas continham alguns desenhos e nomes para eles. No primeiro tinha um desenho de uma criatura estranha, com chifres parecidos com os de um alce. A coloração de sua pele era negra, seu corpo magro e humanoide demonstrou que era grande. Nesse papel estava escrito:
Wendigo, monstro que pode se camuflar na escuridão e em meio às árvores. Para achá-lo, permaneça na escuridão e ele se revelará. Mesmo sendo perigoso é o mais fraco dos três.
Na segunda folha estava desenhado um urso negro. Logo ele se lembrou do animal que matou a serpente. Seu corpo gelou e engoliu em seco. O nome da criatura é Beareebal.
Beareebal, se encontra na parte mais fria da floresta, que fica na fronteira de Giden.
O garoto passou para última folha. O desenho estranho chamou sua atenção. Era uma figura que aparentava ser uma espécie de primata, um gorila, porém o que mais chamou a atenção sobre a criatura eram seus quatro braços enormes.
Kenoo, se encontra no pico mais alto da floresta, saberá que é o lugar pelos rastros que ele deixa.
— Hã? Eu vou ter que lutar com esses bichos? — Questionou irritado.
Nunca tinha visto animais desse tipo, sequer saberia lidar com eles.
— Tem nem uma dica?
Olhou mais os papéis e não achou nada que pudesse ajudar. Apenas uma mensagem escondida no verso da página de Kenoo.
Esses seres não são mais animais qualquer. Não eram maus por natureza, mas se perderam com tanto poder. Ao eliminá-los, o ciclo da floresta voltará ao normal.
Boa sorte, Roy.
O garoto bufou, contrariado.
— Não acha que tá botando muita expectativa em mim? — disse com ironia— Eu vou é morrer!
Roy se perguntou se foi aquela figura que o salvou que tinha deixado aquilo. E se foi com um propósito? Ele confiou essa missão de libertar a floresta desses seres malignos. O garoto olhou para suas mãos. Mesmo agora que podia usar a primeira abertura e mesclar com suas habilidades de luta, sentiu medo. Mas, apesar do medo, queria vencer novamente.
— Frou-do? — O amigo aterrissou em sua cabeça.
Ele pensou um pouco antes de responder. Cerrou os punhos e se sentiu confiante.
— Vamos para uma aventura, Frodo. Mas antes, preciso fazer uma coisa.
A resposta veio com um sorriso.
**
— ZUM! BAM!!
Roy simulou uma batalha imaginária, com um dragão. Acertou vários golpes no ar e conjurou magias em sua mente.
—Você morrerá seu verme!
Gritou triunfante, matando o monstro e salvando a terra mágica. Mas a batalha foi interrompida por uma esfera de água que acertara suas costas em cheio.
— Boa tarde, Roy. — Cumprimentou o garoto que tinha lançado a esfera de água. — O que está fazendo?
— Lucius...
Olhou para o garoto mais velho e maior que ele. O valentão estava acompanhado de garotos da mesma idade de Roy. Antes que pudesse se afastar, uma rodinha se formou em torno dele.
— Achei que estava tentando fazer magia. Um inútil como você tentando fazer magia! Eu fiquei curioso para ver isso.
A frase do garoto ecoou pela mente de Roy. Os outros acompanhavam as piadas do mais velho com risadas mais altas.
O menino se voltou para seu oponente, encarando-o nos olhos e cerrando os punhos, tentou falar algo:
— Você... — A voz dele tinha perdido a força ao perceber o que estava fazendo.
— Eu? Eu o que? — questionou lançando seu corpo em direção a Roy para intimidá-lo.
O menino desistiu de sua investida. Se golpeasse Lucius, todos ali iriam revidar com suas magias, destruindo-o completamente.
— Nada...
— Não fique falando besteira, seu inútil!
Colocou a mão sobre a cabeça do menino e ativou sua magia de água para molhar completamente Roy.
— Olha, trouxa, tá chovendo!
Lucius se afastou rindo com seus companheiros.
O garoto apenas olhou o grupo ir embora, impotente. Sentindo-se vazio novamente. Sentou-se sobre uma pedra e chorou sem parar. Imaginou que se soubesse usar magia, tudo seria diferente.
Roy se lembrou disso enquanto treinou socos em um tronco. Sentindo raiva de si mesmo naquele momento, acertou uma sequência de golpes sobre a árvore, usando a primeira abertura. A madeira se partiu e isso fez com que a árvore caísse.
— Se eles me vissem agora...
O garoto olhou para trás e por alguns metros, havia dezenas de troncos derrubados pela força de seus golpes.
— Realmente a abertura ajuda muito. — sorriu triunfante— Agora... UM! DOIS! TRÊS...
Jogou seu corpo no chão para fazer flexões.
Depois dos exercícios matinais, voltou para a beira do rio. Tinha que pensar em algum plano para lutar com os monstros. Um pequeno erro poderia custar sua vida.
— Preciso me testar mais.
Decidiu adentrar na floresta para procurar um animal para ser seu oponente. Ao descer um barranco ficou de frente com uma enorme rocha partida ao meio. Era como se isso tivesse sido feito por alguém e pelo estrago feito da enorme rocha, não era obra de um animal qualquer.
“Com certeza foi um desses monstros que estão na carta.”
Roy analisou de perto. E teve a certeza de que não queria encontrar nenhum deles naquele momento. O garoto ouviu sons de galhos se quebrando atrás dele. Observou vários seres se aproximando.
Raposas com mais de um metro de altura o cercaram. A pelugem, outrora alaranjada, ganhara um tom rubro por causa do sangue de outros animais. Elas rosnavam, mostrando suas presas. Seus olhos negros fitavam sua presa em potencial.
— Um, dois, três, quatro — Roy contou quantas haviam — Oito! Muito bem!
O garoto saltou no mesmo lugar, puxou o máximo de ar que conseguiu. Sentiu seu corpo aquecer e o coração acelerar. O vapor foi substituído pela aura esverdeada. Vendo que o humano tinha mudado, as raposas atacaram, antes que pudesse se movimentar.
Uma delas atacou por cima e outra pela frente. No entanto, Roy tinha sumido dos olhares dos caçadores. E vindo pela direita, golpeou o corpo de uma raposa com um chute. O animal foi para longe.
As outras foram para cima. Devido à agilidade aumentada, conseguiu se esquivar facilmente.
— Vocês parecem mais lentas.
Roy estava surpreso com a sensação que sentiu com aquela luta. Porém, se desconcentrou e uma delas tentou abocanhá-lo. O som estridente foi ouvido, a lâmina da adaga e as presas da raposa se chocaram.
"Esses dentes..."
O menino percebeu que as presas do animal eram como metais. Mas não teve tempo para fazer mais nada, pois foi mordido na panturrilha e na costela. Movido pela dor e raiva, agarrou a que estava na costela e jogou para longe. Virando-se para a que tinha ferido sua perna, cravou a adaga entre os olhos do animal.
A raposa ganiu de dor e caiu no chão sem vida. As outras recuaram, viram o brilho verde que emanou das pupilas do garoto e sentiram sua sede de matar.
— Ei! Venham aqui!
Sem ter o que fazer, os animais rosnaram e se lançaram em direção ao garoto.
Apenas o feixe de luz do movimento de Roy ficou visível a partir dali. Sem piedade, acertou um soco no focinho de uma delas. A pressão do golpe fez o animal sumir dentro da mata. Outra raposa agarrou o pulso esquerdo do menino, fazendo com que ele perdesse o equilíbrio. Mesmo com a abertura, ainda estava em desvantagem.
Quase caindo para trás, seu peito foi ferido pelas garras de um dos animais que o cercavam. Soltando o ar que prendeu, usou toda a força para ir contra o puxão da criatura.
— VAI...SE...
Ele abaixou o corpo para desviar do predador que tinha saltado para agarrar sua cabeça. Jogando sua arma no chão, agarrou a raposa pela orelha. Por ter perdido a concentração, a abertura foi desativada. Puxou a pura força bruta de seu corpo.
— FERRAR!
A resistência do corpo do animal era grande, não daria para rasgar facilmente. Porém, isso ajudou o garoto levantar o corpo de seu oponente. O peso da raposa era grande, mas preferiu ignorar e jogar ela contra a pedra que tinha visto mais cedo.
Ele se recuperou, olhou ao redor, cercado por três raposas. A adaga estava debaixo de uma delas.
“Droga!”
Ficou desarmado, mas não foi motivo para recuar. Roy começou a gingar com as pernas e dar socos no ar, como se fosse um lutador de boxe. Apesar de gostar de lutas com espadas, treinou pesado o estilo de lutar de Johan.
Sua aura voltou e armou os braços a frente do corpo para lutar. Como se tivesse se tele transportado, ficou à frente de uma das criaturas. Soltou o ar enquanto se movimentava. A cor de sua abertura ficou mais forte e acertou uma sequência de socos diretos no animal.
Enquanto seu oponente voou para longe, quase no mesmo instante atacou as outras. Saltou, pisando e afundando a cabeça da raposa na terra. Sentiu os ossos do crânio do animal racharem e viu seus olhos saltarem para fora.
Mesmo rápido, conseguiu ser mordido no ombro. Jogou a criatura no chão que cambaleou e ficou de pé voltando a atacar. Roy golpeou o queixo da raposa, e começou uma sequência frenética de socos e chutes no animal.
A raposa desabou no chão. O garoto olhou para suas mãos e roupas sujas de sangue. Sentiu-se extasiado e deu uma gargalhada.
— Isso é muito bom!
Ouviu barulhos vindo de trás. Ao se virar, observou que as raposas que lançou para longe tinham chamado reforços.
— Merda!
**
O garoto caminhou mancando pela floresta. Em sua mão direita estava sua adaga completamente manchada de vermelho e em sua mão esquerda trazia um cadáver de raposa. Ofegava enquanto andou, sua pele e roupas sujas. Seu cabelo desgrenhado balançou com o vento. Seu olhar permaneceu morto olhando para o chão.
“Eu venci. Mas porque me sinto assim?”
Se questionou por sentir diferente de quando venceu o crocodilo. Um aperto dominou seu peito. Algo do passado o incomodou.
Um vulto passou à sua frente, tirando-o da imersão de seus pensamentos. Ao lembrar-se do que tinha se passado, viu-se cercado por sombras. Elas aparentavam não serem hostis, porém mesmo assim, causaram assombro em Roy. Sussurravam nos ouvidos do menino.
— Inútil...
— Seu lixo. Não fez nada para nos ajudar...
— Verme, sem magia...
As frases se repetiram em sua mente sem parar. Ouvindo aquilo, não conseguiu conter as lágrimas.
“Eu queria ter feito alguma coisa.”
Uma das sombras parou a sua frente. Roy a reconheceu, pelo tamanho do corpo. Era seu avô.
— Velho...
— Estou decepcionado com você, Roy.
O garoto desabou no chão, largou a raposa e sua arma. Seu coração acelerou e ficou com falta de ar. A ansiedade atacou seu corpo.
— Me perdoa.Eu fui fraco...
— Não me venha com desculpas.
A agonia subiu à mente de Roy. A sensação de ser forte agora não apagou o que aconteceu antes, de não poder fazer nada naquele momento.
“Não consigo...”
— Frou-do!
Um coaxo ecoou. A língua de Frodo molhou a orelha de seu amigo. Fez isso para tentar trazê-lo ao normal.
A visão do garoto se ajustou e observou se amigo amarelo e pequeno. O ar começou a circular novamente em seu pulmão.
— Frodo.
— Frou-do? — pelo tom do coacho, ficou preocupado com seu amigo.
— Estou bem, preciso só comer. Acho que a carne desse bicho deve ser boa — Tentou ser positivo —Tenho que melhorar mais antes de lutar.
Seu amigo sapo saltou em seu ombro esquerdo.
— Vamos partir numa aventura!
O garoto sorriu olhando para o pôr do sol.