Magna Ordem Brasileira

Autor(a): Tomas Rohga


Volume 1

Capítulo 8: Batalha na floresta

A criatura parou de correr ao se revelar para Thales e Ellin, exalando uma aura aterradora ao deixar o meio das árvores. Era um ser alto e bípede, com uma cabeça de capivara repleta de cicatrizes, cuja pelagem amarronzada envolvia todo o corpo musculoso com exceção da tanga que cobria a cintura.

De seus olhos circulares, um brilho cor de sangue escapava ao confrontar os dois jovens; as narinas resfolegando de raiva.

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Status

Nome: Guardião Capivara       Elo: 50%

Raça: Darkinus       Classe: Corcel

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Usar o Malandro deixou Thales ainda mais nervoso, experimentando uma mescla estranha de sensações: por um lado, achou cômico dar de cara com uma capivara bombada; por outro, o detalhe de a criatura possuir 50 de Elo fazia seus nervos estremecerem.

Ele apertou o punho com força, obrigando o corpo a obedecer. Tinha apenas 7 de Cansaço, o que significa mais dois usos da promoção. Como no Xadrez, precisava traçar a melhor estratégia; a diferença era que, ali, estava apostando a vida dele e a da garota: não podia cometer qualquer erro crasso.

— A gente tenta fugir? — Não conseguia desviar os olhos do guardião.

— Acho… — Ellin engoliu em seco. — Acho que seria a melhor opção, não sei se…

Foi rápido demais. Num momento, a criatura estava imóvel, no outro, dois traços de luz escarlate cortaram a paisagem, terminando nas órbitas demoníacas materializadas como um clarão ao lado de Thales.

A visão do garoto foi traída. O punho da criatura surgiu sem mais nem menos, explodindo num choque poderosíssimo que o arrancou do chão e atingiu Ellin por tabela. A dupla voou em linha reta até se arrebentar contra a solidez de um pinheiro grosso, amortecido por uma substância aquosa.

 

«!»

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Vida: >>>200/360       Mana: 280/280

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O gemido de dor escapou em uníssono, ambos rolando do tronco até o chão com as roupas encharcadas.

A poeira flutuava ao redor quando Thales se voltou para cima, tentando assimilar o acontecido com a cabeça girando igual pião. Com esforço hercúleo, estreitou os olhos e notou que a destruição na árvore foi menor que a calculada, ao passo que o cristal no anel de Ellin ainda brilhava fracamente.

— Droga… — arfava ela, tentando se pôr de pé. — Consegui invocar uma gaiola d’água, mas esse ataque foi perigoso. Você tá bem, Thales?

Sentiu-se incapaz de responder, apenas fitando-a horrorizado; o coração tão disparado no peito que parecia prestes a romper as costelas.

Ferido, Thales começou a respirar depressa. Voltou os olhos trêmulos para o chão, encarando a mão direita que saiu de foco enquanto as lembranças do sangue, da dor e de Kalyna atravessavam-lhe a mente como um caldo venenoso.

Não conseguia forçar a própria fala garganta afora, refém de um delírio que distorcia a realidade a ponto de não saber se Ellin o chamava ou se imaginava a voz dela; o som ecoando de muito, muito distante.

THALES! — O berro da garota foi como um safanão. — Sei que tá com medo, eu também tô! Mas reage! Foge daqui! Eu vou distraí-lo e, assim que puder, eu já corro atrás de você.

— M-mas…

— Tá tudo bem… Se eu entrar pra Magna Ordem, vou lutar com coisa muito pior.

Thales engoliu em seco, sentindo-se tão patético que desejou se enfiar num buraco. Não sabia que era possível experimentar tanto medo, porém, antes que abrisse a boca para argumentar, o cristal no anel de Ellin brilhou novamente.

Incêndio! — Uma torrente volumosa de fogo rodopiou a partir das mãos dela, criando uma barreira flamejante ao redor do guardião. — Corre, Thales! Vai!

— Merda! Merda! — Humilhado pela própria covardia, ele obedeceu sem pensar, afastando-se enquanto acelerava até as árvores sem perder Ellin de vista, tropeçando numa raiz ao testemunhar o anel se estilhaçar em mil pedaços no dedo dela. A cortina de fogo se apagou praticamente no mesmo instante.

Thales rodopiou quatro vezes antes de atingir um pinheiro, ignorando a dor da colisão ao erguer a cabeça e procurar imediatamente pela garota.

Ela não estava mais no local, então procurou mais um pouco, encontrando-a encurralada no pé de uma árvore à boa distância. Pelo jeito, havia corrido na direção contrária, ao passo que a criatura se aproximava devagar, abrindo e fechando os punhos com a lentidão de alguém que se deleitava com o desespero: a expressão escancarada nas feições da garota. Pelo jeito, o guardião estava prestes a aplicar o golpe final.

Naquele breve infinito, como se o tempo tivesse diminuído o próprio ritmo, Thales enxergou a cena de outro modo: Ellin colada à árvore, aterrorizada diante do guardião, era ele mesmo apavorado no banheiro do ginásio, encurralado pelo bandido da escopeta. Seu espírito estremeceu.

— Cacete… — Thales calculou que tinha menos de dez segundos. Fosse agir, precisava ser veloz, muito veloz. — Por que eu me arrisco desse jeito?

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Força: 170       Destreza: 130 (+1164)

Resistência: 145       Magia: 135

Cansaço: 4       Promo (Corcel)

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O garoto deu o primeiro passo e sumiu do lugar, deixando um ligeiro rastro de poeira se elevando do solo.

Vários metros dali, Thales terminou de usar a penúltima promoção quando freou ao lado de um arbusto elevado, rapidamente se escondendo com a garota no colo. Acomodou Ellin no chão e esticou o pescoço acima da folhagem; daquele modo, confirmou a boa distância que haviam aberto da criatura.

— Pelos seis divinos… — O choque soou na voz dela. — Como fez isso agora?

Ele se virou para olhá-la, mas desconversou: — Mais importante que isso, tá tudo bem?

— A-acho que sim, mas por que voltou?

— Eu ia ficar só assistindo?

— Não era pra voltar, idiota — Ellin forçou uma voz zangada, virando o rosto para disfarçar o sorriso. — Não sei o que a gente faz agora. Usei magia demais e meu cristal se quebrou.

Uma engrenagem se encaixou na cabeça de Thales.

— Cristal? Um cristal darkinus?!

— Que mais seria? — Frustrada, ela arrancou o anel do dedo e o atirou de canto. — Economizei tanto pra comprar esse anelzinho…

— E que acha desse daqui? — Invocando a janela do sistema, Thales materializou um item do Tabuleiro: em sua mão, surgiu o cristal darkinus esverdeado.

— Pelos filhos de Roia… — Ellin levou as mãos à boca, perplexa. — Onde achou um desse tamanho?

— Caiu de uma aranha gigante. Consegue usá-lo?

— Claro que sim, mas não só isso. Ele deve ampliar minha Magia!

— Ótimo. Então vou precisar da sua ajuda.

— D-da minha? Você tem um plano?

Um ruído de aproximação chegou até eles, criando urgência na fala de Thales:

— Pensei numa tática. Qual é o seu ataque mais poderoso?

Ellin se mostrou nervosa enquanto refletia. — Tem um, mas deve estar incompleto… Foi só uma vez num treinamento. Acabei desmaiando por consumir toda a minha Mana.

— Então não use ela toda. Consegue limitar a… 99% da coisa?

Meio incerta, ela concordou.

— Preciso primeiro de um canalizador. — Puxando um galho grosso do arbusto, Ellin utilizou algumas gavinhas para amarrar o cristal no objeto, improvisando uma espécie de cetro. — Mas Thales… Vai uns trinta segundos pra invocá-la, o que vai fazer o cristal brilhar. Com certeza o guardião vai nos descobrir aqui e nem sei se posso derrotá-lo com isso. O Elo dele pode estar muito acima do meu.

De fato, ela não tinha acesso àquela informação. Thales se lembrou que o Malandro só mostrava os atributos em sua janela.

— Tá tudo bem… — tranquilizou o garoto, as próprias palavras servindo para convencer a si mesmo. — Nossa tática vai dar certo. Tem que dar.

— Você pode ser insuportável às vezes, mas sempre foi inteligente. Eu confio em vo... N-no seu plano! — Ellin fechou os olhos verdes e o cristal começou a brilhar; uma cintilação bastante intensa.

Como ela previu, a luz era suficientemente forte para revelar a posição da dupla, por isso Thales tratou de sair logo dali, usando a janela do sistema para abrir o Tabuleiro e apanhar a Seda da Aranha Carnívora. Engoliu em seco e bradou:

— Ei, Capivara!

Não muito longe dali, o olhar bestial da criatura se voltou até ele.

Trinta segundos. Só preciso de trinta segundos! Com o novelo na mão, Thales acelerou numa guinada para cima do darkinus, berrando como se tivesse enlouquecido de vez, mas sua mente contava: oito, nove, dez, onze…

O guardião, em contrapartida, comportava-se como uma gárgula bombada, divertindo-se com o desespero retorcendo o semblante de sua próxima vítima.

Quando finalmente atingiu a distância desejada, o garoto trouxe a mão do novelo para trás, pegou impulso e o atirou na criatura, lembrando-se perfeitamente da descrição do item: “teia da mais alta qualidade fabricada pela Grande Aranha Carnívora, podendo ser usada para amarrar.”

Subestimando a investida de Thales, o guardião abriu os braços e se deixou golpear pelo pequeno objeto, seguido por um movimento circular que girou em torno dele como um abraço de serpente. Sem reação, testemunhou os membros fortes colarem junto ao corpo num redemoinho cintilante de cordas que surgiram e o prenderam com firmeza.

Aturdida pela armadilha surpresa, a criatura guinchou e se agitou, fazendo muita força contra o cárcere enquanto Thales continuava a contar, cada vez mais ansioso: vinte, vinte e um, vinte e dois… Mas os braços descomunais do guardião mostraram sua potência, começando a arrebentar os primeiros feixes.

Só mais um pouco! A pressa se transformava em agonia, até ele finalmente ouvir o som. A vários metros de distância, um grito confiante partiu de uma garota ao lado de um arbusto elevado:

Colapsaflama!

O ataque de Ellin partiu tão poderoso que ela despencou para trás, explodindo o cristal do cetro numa rajada condensada de fogo. A magia cortou a clareira numa violência absurda, exalando o calor num rastro que queimou toda a grama do percurso.

Ouvindo um zunido, Thales rolou para o lado pouco antes de a incandescência atingir em cheio o guardião, engolindo-o numa fornalha furiosa de fogo.

Com os cabelos chicoteando em meio à massa de ar quente da clareira, o garoto protegeu os olhos, experimentando alívio, mas, ao mesmo tempo, uma inquietação no espírito.

Após vários segundos de ardência impiedosa, as labaredas diminuíram de intensidade, revelando a sensação que o afligia: o ataque devia ter arrancado parta da Vida do guardião, pois saiu vacilante e chamuscado do interior das chamas, embora livre das cordas e com uma vontade hedionda por trás dos olhos escarlates.

Não havia mais tempo. O garoto soube, naquele segundo, que a paciência da criatura se esgotara: ela iria assassiná-los.

Indo para o tudo ou nada, correu primeiro que o inimigo, tremendo o punho sob a força descomunal que usava para apertá-lo.

Estava a pouco de golpeá-lo, mas imagens começaram a correr na mente de Thales, vendo-se em meio ao turbilhão de memórias que o arrastaram até ali: o bandido, a aranha, a rainha, o abraço de um pai, uma nova amiga…

O medo que oprimia seu coração desde que acordou naquele mundo havia preservado a si mesmo, mas compreendeu ali, naquele lugar, diante daquele oponente, que só a coragem ultrapassava o óbvio: em suas mãos estavam não somente a própria vida, mas a de Ellin também, como na véspera esteve a de Arell e, muito antes, a de seu pai na Terra, pedindo que não viesse até o ginásio.

Em todas as vezes, Thales havia deixado a razão de lado e dado tudo de si. Só precisava repetir a loucura mais uma vez. Uma última vez.

Ele rugiu: — Forçaaaaaa!!!



«!!»

A Intenção do Jogador está acima de 100%. Os pontos de «Cansaço» serão esgotados em troca de uma «Benção».

Promoção: +33%

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Força: 170 (+1152!!)       Destreza: 130

Resistência: 145       Magia: 135

Cansaço: 0       Promo (Rainha)

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Thales sentiu um poder brutal emanar de si mesmo, como se os músculos fossem atravessados por eletricidade. O Cansaço chegou a zero, mas a sensação arrepiou todos os pelos de seu corpo, desviando-se da investida final do guardião por milímetros antes de um pequeno corte lhe abrir na bochecha.

Veio o silêncio, e então o soco esmagador. Toda a raiva que sentia desde o momento em que aportou naquele mundo foi expurgada através do punho, repercutindo na altura do estômago da criatura.

O ar estremeceu com o impacto e as forças que o mantinham de pé deixaram de existir. Ele perdeu os sentidos junto à explosão da metade superior do inimigo, que desapareceu numa chuva escarlate e grotesca.

Os olhos de Thales, enfim, se fecharam, sentindo-se colidir contra a grama sob o som distante da voz de Ellin e do brilho de aviso de Mitty:

 

O Jogador evoluiu!

O Jogador evoluiu!

O Jogador evoluiu!

O Jogador evoluiu!

O Jogador evoluiu!

 



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