Luvas de Ifrit Brasileira

Autor(a): JK Glove


Volume 3

Capítulo 90: Representante

 

O sol começava a baixar no horizonte enquanto os membros da Crossed Bones caminhavam pela estrada em direção a Meryportos. A leve brisa balançava as árvores ao redor, criando um ritmo suave que contrastava com o clima de tensão que pairava entre o grupo. Após horas de caminhada, Rydia quebrou o silêncio.

— Baan, já que estamos quase chegando em Meyportos, seria bom explicar logo o teor da missão — disse, sem rodeios, olhando para o companheiro com seus olhos afiados. — Estou muito curiosa com o que quis dizer com “estudar numa universidade de magia”?

Baan, relaxado como de costume, deu uma risada abafada. Ele colocou o braço sobre o pescoço de Rydia, puxando-a para mais perto em um gesto descontraído.

— Ah, relaxa, Rydia! Confia no pai — falou, com aquele tom despreocupado de sempre.

Rydia suspirou pesadamente, coçando a cabeça como se tentasse afastar a irritação.

— Hmph... você sempre com esse jeito desleixado. Por isso a gente sempre passa por dificuldades durante as missões.

— Ah, Rydia, você que é muito séria. Só aproveita o percurso. O contratante vai explicar tudo quando chegarmos.

Caminhando ao lado, Joabe mantinha-se em silêncio até murmurar, mais para si mesmo do que para os outros:

— Será que o Otto e o Osken chegaram em segurança ao reino de Kaazordan?

Uji, atento aos murmúrios do amigo, colocou a mão no queixo, refletindo por um instante, antes de soltar uma risada baixa.

— E aí, Joabe, os assassinos do reino de Suna ficam assim tão moles quando se tratam de garotinhos? — provocou, com um sorriso travesso.

Joabe retrucou imediatamente, tentando manter sua seriedade habitual.

— Não estou mole... só estava pensando alto, seu idiota. — Seu tom firme contrastava com a tentativa de Uji de quebrar a postura do companheiro.

Mais à frente, Kreik, que vinha pensativo, acelerou o passo para se aproximar de Baan. Ele hesitava, sentindo um leve desconforto no peito, mas finalmente decidiu perguntar.

— H-Hey, Baan... posso... te perguntar uma coisa?

Baan deu um leve tapa nas costas de Kreik, forçando-o a tropeçar para frente.

— Claro, meu amigo! — disse, rindo alto. – Pergunta o que quiser, sem vergonha! Estamos juntos nessa.

Kreik sorriu, aliviado. Sentia-se à vontade com Baan, e isso o encorajou a continuar.

— Queria que você me contasse mais... sobre o encontro que teve com o meu pai. Como ele te ajudou quando você achava que ia morrer.

O sorriso de Baan diminuiu um pouco, e ele coçou a cabeça, tentando puxar pela memória.

— Ah, é verdade... — começou, com a voz mais pensativa. — Eu lembro que era jovem, estava preso em um laboratório, cheio de cabos que davam choques elétricos. Eu já tava perdendo a consciência quando um homem entrou e me libertou. Ele me disse que se chamava Vander Reich e me colocou nas costas. Ele começou a me carregar pelos corredores, procurando por alguém... uma mulher. Eu acho que o nome dela era... En...

De repente, Baan gritou, segurando a cabeça com ambas as mãos, a dor sendo visível em seu rosto. Ele caiu de joelhos, o corpo tremendo.

— Aaagh! Minha cabeça!

Todos pararam imediatamente e correram até ele, cercando-o com preocupação. Rydia e Uji foram os primeiros a se aproximar, mas Baan, ofegante, ergueu a mão, pedindo calma.

— Estou bem... é só o selo nas minhas costas. Ele embaralha minhas memórias antigas... sinto muito, Kreik, acho que não consigo lembrar de mais nada.

Kreik balançou a cabeça rapidamente, preocupado.

— Não, Baan, eu que peço desculpas. Já ajudou muito, só de me contar isso... já é o suficiente para acreditar que meu pai era uma boa pessoa. — O alívio na voz de Kreik era sincero, e ele sorriu. — Baan, mais uma coisa... Você é uma inspiração pra mim, sabia?

Baan, surpreso, sorriu com ternura e bagunçou o cabelo de Kreik com a mão.

— Agradeço, moleque. Mas tem muita gente melhor que eu por aí pra te inspirar. Não se engane.

— Deixa de ser babão — zombou Joabe, com os braços cruzados.

— Ei, eu não sou babão! Apenas sei me expressar, deferente de você, que nem isso sabe.

— Grande coisa. Demonstrar sentimentos assim é apenas coisa de frangote.

Parem com isso! — gritou Baan, com medo da discussão dois dois escalar.

Moara, que até então tinha ficado em silêncio, aproximou-se por trás do Baan, com um sorriso brincalhão.

— Ei, chefinho, pelo visto você já se recuperou dessa dor que sentiu? — perguntou, maliciosamente.

Baan, des costas para ela, girou a cabeça para o lado e assentiu. Moara sorriu e, antes que ele pudesse reagir, ela se jogou em suas costas, segurando-o pelo pescoço.

— Ótimo! Então me carrega! Meus pezinhos estão tão cansados — disse, rindo.

— Me solta, não vou carregar ninguém, você tem pernas. Sai daí, sua chata! — Baan retrucou, tentando tirá-la de suas costas.

A cena rapidamente se tornou uma discussão cômica, até que Bardo, o pássaro de Moara, voou sobre Baan e soltou um cocô bem no topo da cabeça dele.

— Ahhh! Seu pássaro cagão, vou te fazer virar sopa! — gritou Baan, irado, enquanto lançava pequenas estacas de ossos contra Bardo, sem conseguir acertá-lo.

Joabe, Uji, Rydia e Kreik observavam a confusão à distância. Rydia cruzou os braços, seu olhar analítico revelando o cansaço.

— Como conseguimos ter um chefe tão idiota? — murmurou ela.

Joabe concordou com um aceno, uma expressão de resignação no rosto.

— Difícil não sentir vergonha perto desses dois.

Kreik sorriu, olhando para o grupo.

— Moara me falou que foi criada por monges depois de ser encontrada em uma cesta no rio? E Baan... bem, ele passou por uma infância difícil como cobaia em um laboratório. Eu conheço um pouco do passado deles, mas... não sei nada sobre o de vocês. Vocês já sabem muito sobre mim, então, queria ouvir como vocês entraram na Crossed Bones. E quais são seus objetivos.

Uji e Rydia se entreolharam brevemente antes de responderem ao mesmo tempo:

— Não é da sua conta. — E seguiram adiante, com as expressões fechadas.

Kreik ficou parado por um segundo, desconcertado, até que Uji gargalhou e deu um soquinho leve no ombro dele.

— Não liga pra eles, Kreik. São ignorantes mesmo. — O sorriso do samurai contrastava com o tom de brincadeira.

— E você, Uji? Qual é o seu passado?

Uji desviou o olhar, adotando um tom mais despreocupado.

— Ah, você não devia se preocupar com o que já aconteceu. O que está por vir é bem mais interessante. Vamos logo, acedito que não queira ficar para trás. Hehehe!

Kreik suspirou, percebendo que Uji também não queria falar. Ele abaixou a cabeça, resignado, mas aceitou a resposta.

A brisa marítima de Meryportos soprou suave no porto, trazendo o cheiro salgado da água e o som de ondas quebrando preguiçosamente contra os pilares de madeira. O pôr-do-sol refletia em cada gota de água, fazendo com que a luz dançasse no horizonte. Em meio a isso, a Tenente Mayumi, com seu uniforme impecável, permanecia em pé com os braços cruzados atrás das costas, observando a movimentação dos navios. Ao seu lado, seu irmão, Ryujiro, estava deitado em um amontoado de caixotes, completamente despreocupado.

— Ryujiro, o Coronel Malik já tá a caminho. Você sabe que ele não vai gostar de te ver nessa posição — disse Mayumi, sem desviar o olhar dos barcos.

Ryujiro, com uma maçã na boca, mordeu mais um pedaço, respondendo de boca cheia:

— Não se preocupa, maninha. Assim que eu ver qualquer sinal dele, vou me levantar e ficar igual uma estátua... igualzinha a você — completou com um sorriso provocador.

Mayumi suspirou, apertando os olhos e pensando: “Aff, que tortura ter que trabalhar com ele, que cara mala! É sério.. Deus, o que te fiz para me castigar dessa forma?”

Aos olhos da irmã, Ryujiro parecia cada vez mais impossível. Contudo, algo chamou sua atenção, e ela franziu o cenho ao focar a atenção na maçã nas mãos dele.

— Onde você conseguiu essa maçã, Ryujiro? — perguntou, a voz subitamente mais severa.

Ele deu de ombros, dando outra mordida sem se incomodar.

— Peguei de um desses caixotes aqui — apontou com o polegar para o monte de mercadorias ao lado deles.

Mayumi arregalou os olhos, a indignação crescendo rapidamente.

— Você fez o que? Não sabe que isso essas maçãs são mercadorias privadas? Isso é roubo, Ryujiro! Você não pode simplesmente pegar coisas assim!

— Acha que sou idiota? — Ryujiro revirou os olhos e respondeu, ainda mastigando. — O que fiz não pode ser considerado roubo, já que eu deixei alguns rilds dentro do caixota. Paguei pela maçã, veja bem antes de tirar conclusões precipitadas.

— Não é assim que as coisas funcionam! — esbravejou ela. — Você precisa seguir os procedimentos! É importante respeitar as regras, Ryujiro!

Ele, no entanto, parecia imperturbável com a bronca da irmã, jogando mais algumas moedas no caixote.

— Relaxa, Mayumi. Você fica estressada por nada. — E, com um sorriso malicioso, jogou mais alguns Rilds no caixote e pegou mais duas maçãs, jogando uma para ela.

Mayumi pegou a maçã no ar, mas em vez de comer, jogou de volta no caixote. Quando tentou pegar a outra que estava nas mãos de Ryujiro, os dois começaram uma pequena briga, puxando a fruta de um lado para o outro, até que se desequilibraram e caíram sobre os caixotes. Uma avalanche de maçãs se espalhou ao redor deles, cobrindo-os parcialmente.

Ao levantarem as cabeças, encharcados de vergonha e com maçãs rolando por todos os lados, viram o Coronel Malik, de braços cruzados, olhando para eles com uma expressão severa.

— Vocês dois vão passar a noite descascando maçãs como punição — disse o Coronel, sem levantar a voz, mas com uma firmeza que fazia suas palavras ecoarem como ordens incontestáveis.

Ryujiro abriu a boca para retrucar, mas Mayumi deu-lhe uma cotovelada rápida no estômago.

— Quieto, idiota! — sussurrou ela.

Ryujiro, com uma careta de dor, pisou discretamente no pé da irmã.

— Desculpa maninha, não vi a sua... patinha — debochou o Tenente.

 Os dois começaram a trocar olhares furiosos, prestes a iniciar outra discussão, quando um som de navio atracando chamou sua atenção. Ambos viraram a cabeça, e ao avistarem o grande navio, gritaram em uníssono:

— VOVÔ!

— Não façam tanto alarde. O navio do General Gintaro está a caminho, mas mantenham-se a postos. Ele deve tá chegando. interveio Malik, ainda com os braços cruzados.

Eles se dirigiram ao cais, mas quando o navio finalmente desembarcou, em vez de Gintaro, um soldado raso surgiu, marchando rigidamente até os três e batendo continência.

— Tenentes, Coronel! — disse ele, estendendo uma carta. — O General Gintaro teve que atrasar sua saída alguns dias por ordem do Marechal.

Malik franziu o cenho ao abrir e ler a carta.

— E qual foi o motivo do atraso? — perguntou, sem desviar os olhos do papel.

— O Marechal enviou um representante para se encontrar pessoalmente com o General. Inclusive, o representante vai ajuda-los na recepção do General — respondeu o soldado, a postura ainda impecável.

— E quem é esse representante? — indagou Mayumi, curiosa, após dar um passo à frente.

Malik levantou o olhar da carta e, com uma expressão de surpresa, respondeu:

— O Coronel da 1ª Divisão.

A cena mudava para uma caravana militar avançando pela estrada. Dentro de uma carruagem, um homem uniformizado estava deitado, com um livro sobre o rosto, claramente adormecido. O veículo parou bruscamente, fazendo o homem cair de cara no chão.

— Mas que droga é essa? — resmungou o militar, esfregando o rosto enquanto se levantava.

Um soldado, montado em um cavalo ao lado da carruagem, se apressou em se desculpar.

— Coronel, estamos sendo atacados pela guilda Silver Fang!

O Coronel, ainda esfregando o rosto dolorido, suspirou.

— Não reclamei da freada... — disse ele calmamente. — Mas sim porque sempre que tento ler um livro, acabo dormindo.

O soldado, surpreso, ficou em silêncio por alguns segundos, sem saber como responder. Antes que pudesse dizer mais alguma coisa, uma onda de gelo atingiu a carruagem e os soldados ao redor, congelando tudo que tocava.

De repente, uma explosão rompeu o gelo, liberando uma densa cortina de poeira no ar. De dentro dessa cortina, o Coronel se levantou, erguendo um braço. Uma rajada de lava disparou em direção aos magos da Silver Fang, derretendo o gelo e atingindo-os com força, deixando-os gravemente queimados e derrotados.

 

 

O Coronel se sentou novamente no chão, enquanto a poeira ainda pairava ao seu redor, suspirando.

— A próxima ordem — disse ele, com um toque de cansaço na voz — é arranjar novos cavalos. Não posso me atrasar para o encontro com o General Gintaro e colocar a 1ª Divisão em descrédito.

O soldado, com olhos arregalados, mal conseguiu responder.

— S-sim, senhor, Coronel Vorkam Zack...



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