Volume 1
Capítulo 15: Ajudando um Amigo
Floki ficou bastante animado, com um sorriso enorme no rosto, e não parava de se mexer, andando de um lado ao outro e gritando de alegria.
— Bem, devemos nos conhecer melhor, aprofundar a nossa nova relação de parceria. — falou Floki indo atrás do balcão.
Se abaixando, mexeu em alguns objetos ali embaixo e levantou uma garrafa preta e dois copos de vidro.
San só seguiu o ritmo e foi, pegou um banco jogado no meio da sala e levou à frente do balcão.
— Ta legal, eu primeiro. Sou Floki Matos, tenho 26 anos e sou o dono da incrível loja onde pisa. Mutante desde os meus dezoito anos e tô tentando ficar rico. — encheu os copos da bebida escura cheia de bolhas — Sua vez.
— Santiago Lunaris, já deve saber o resto.
— Só um pouquinho, cresceu numa casinha no bairro pobre, era cuidado pela sua mãe sozinha. Cresceu cometendo pequenos crimes, mas irritou o cara errado. Também havia uma irmã, que sumiu do nada. Ha! E a sua mãe tinha… espera, tô lembrando, tá na ponta da linguá.
Antes de Floki continuar, percebeu o olhar de San, o encarando seriamente sem nem piscar. Escolheu deixar pra lá.
— Quase me esqueci, beba, é ótimo.
Relutante, bebeu. Na hora, teve uma vontade enorme de cuspir. Forçando goela abaixo, disse:
— O que é isso?
— Boa pergunta, “isso” é a minha bebida especial. Tem gás e vários sabores diferentes, as pessoas bebiam muito há tempos atrás, tô trazendo de volta, ainda precisa de uns ajustes, adicionar açúcar, essas coisas.
— É, boa sorte, eu acho. Agora, já nos conhecemos super bem, me fala do objetivo.
— Tá legal, vamos em partes. Ao norte da floresta, em um lugar que te direi depois, tem umas plantas preciosas, são raras e úteis.
— Me diz a aparência.
— Pequenas e roxas.
— Sabe quantas dessas existem? Se quiser te compro um pouco.
— Ah, tem algo diferente, ela brilha, bem fácil de distinguir.
— Espera, flor roxa, brilha e é difícil de achar. Tá falando da Flor Estelar? Uma droga alucinógena fraca.
— Isso! Tá deixando mais fácil a situação. Como sabe da planta? Espera, não me diga, já experimentou? Meu garoto!
— Eu nunca usei, conheço porque pesquisei sobre qualquer coisa que dá dinheiro na floresta.
— Ah, pena.
— O que vai fazer? As alucinações são fracas e nem vale a pena o dinheiro gasto.
— Sim, eu sei, são fracas e nem cultivar dá, no entanto… Será que te conto? Sei lá, talvez tente roubar minha ideia.
— Roubar do cara me chantageando?
— É verdade, vou te contar, só porque somos amigos. — falou terminando a sua bebida. — Na verdade, quero sair dessa cidade, ser grande e poderoso, por isso vou criar um novo tipo de droga utilizando essa planta, forte e melhor. Já fiz experimentos e estou perto, infelizmente meus estoques acabaram.
“Só tá melhorando, vou ajudar um maluco a criar uma droga.” San tentava pensar em formas de se safar, contudo, que escolhas tinha? Soltando um suspiro, respondeu:
— Ótimo, onde fica?
— Bom, sobre isso, volta amanhã, escondi o mapa longe daqui.
Suprimindo a raiva, levantou-se e preparou para sair. Por um momento, deu outra olhada na loja, cheia de itens velhos e objetos quebradas. Considerava tacar fogo em tudo só de raiva. Nisso, seus olhos pararam em uma caixa específica.
Era pequena, feita de madeira com desenhos de lírios detalhados. Chegando perto, a abriu. Quando o fez, uma música começou a tocar e dentro e uma boneca de bailarina dançava.
A dançarina já havia perdido boa parte da tinta e ferrugem se espalhava; entretanto, não era isso que San prestava atenção. A música tocada era de um piano, lenta e triste.
San ouviu, ignorando o seu redor, focando somente no som. Foi só Floki chegar animado para estragar o clima.
— Gostou da música? É difícil achar isso. É da era antiga, antes de monstros andarem sobre a terra. E olha, os caras sabiam tocar; hoje em dia é difícil novas músicas bombarem, e pior ainda encontrar as antigas como essa.
Recompondo, saiu da loja, o som ecoando na sua cabeça. Seja sorte ou azar, ao tentar tirar da mente, sentiu um puxão de trás. Tão rápido que mal teve tempo de resistir, sendo levado a uma viela isolada.
A pessoa tampou sua boca com um pano; era forte, mesmo tentando resistir dando cotoveladas, o atacante as evitava perfeitamente. O levou até o fundo e jogou, o fazendo chocar contra a parede.
Levantando imediatamente, ficou preparado para a luta; a surpresa era a pessoa por trás disso ser ninguém menos que Íris, a agente caçadora de mutantes. Trocou o terninho por uma jaqueta com touca e calça rasgada.
Superando a surpresa, levantou a guarda; no menor sinal de perigo, iria resistir.
— Sinceramente, esperava Ramon.
Ela se manteve quieta, os olhos nervosos, olhando sempre para trás com medo de alguém aparecer.
— Tenho pouco tempo, então vou ser rápida.
— Pode vir. — falou animado para testar o novo poder.
— Acha que to aqui pra brigar? Escuta, seu amigo está sofrendo, e tá no limite.
Perdendo o ânimo de experimentar as habilidades de uma agente, disse:
— Tá aqui pra?
— Isso é errado, nosso trabalho é ir atrás de gente ruim.
— Os impeça.
— Se eu pudesse, já teria feito. Ramon tá obcecado, quer de qualquer jeito, uma confissão. Leonardo não tem família e ninguém o apoiando, assim fica fácil.
— Veio só dizer estar arrependida? Isso me ajuda em?
— Se sabe de algo do culpado verdadeiro, é a hora de falar.
San andava de um lado ao outro no beco, roendo as unhas. “Talvez seja uma armadilha, uma forma de me atrair.” Parou e analisou Íris, tudo nela dizia estar falando a verdade, o nervosismo, respiração acelerada.
Considerando, parou. “Se for verdade, meu amigo tá sofrendo nesse exato momento, devo isso a ele, dessa vez vou me arriscar.”
— Posso te dar um novo suspeito.
Tentando esconder a alegria, falou em dúvida:
— Forjar provas é inútil.
— E quem disse forjar?
San saiu do beco, sinalizando para o seguir; hesitante, fez. Se significasse dar um fim naquilo, confiaria em um criminoso.
Seguiram indo ao bairro pobre, caminhando discretamente e abaixando os rostos. Chegando, entraram nos inúmeros becos.
Virando nos inúmeros caminhos e esquinas, alcançaram uma porta velha feita de metal enferrujado.
San bateu repetidamente; e apesar do estado velho, era resistente e nem se moveu.
Depois de cinco minutos sem parar, ouviram uma voz irritada do outro lado:
— Quem é? — A voz era de uma mulher, rouca e raivosa.
— Somos da agência de caçadores de mutantes, viemos conversar com a senhora. — falou San.
Íris o olhou com uma cara brava por usar o nome da sua agência.
— Não tem mutantes aqui. Vão embora.
— Senhora, só viemos conversar.
— Vão embora! — gritou irritada.
— Tudo bem, só pra avisar, iremos voltar, e quando isso acontecer, será com policiais. Porque a senhora instalou câmeras sem a permissão da cidade.
San deu alguns passos para trás; Íris a todo instante tinha uma cara de dúvida e confusão.
Demorando dez segundos, a porta abriu rapidamente, revelando uma velha de cabelo branco curto. San desviou o olhar na hora, já que ela só usava uma camisola transparente.
— Tá legal, entrem. — Voltando para dentro, parou e encarou San. — Te conheço?
— Duvido muito, senhora.
Deixando a porta, voltou a escuridão da casa. Íris não conseguiu desviar os olhos e seu rosto se tornou uma mistura de medo e nojo.
— As damas primeiro.
— E o cavalheirismo?
— Morreu depois de descobrir que o amigo tá sofrendo.
Emburrada, entrou cautelosamente. A casa era pequena e apertada, a senhora os levou até a sala, com gatos andando aleatoriamente. As paredes eram feitas de madeira velha e, ao invés de lâmpadas, havia velas iluminando.
Sentada em uma poltrona de couro falso e rodeada de móveis com roupas de tricô, ela — Usando um casaco — Os olhava com irritação. Para o garoto, adicionou um pouco de curiosidade, como se tentasse se lembrar.
— Sejam rápidos, atrapalharam a melhor parte da minha novela.
Íris já entendia o plano e deixou San assumir.
— Precisamos das imagens da madrugada do dia 12.
— Humm, e o que eu ganho nisso?
— Pra começar, vai ajudar a libertar uma pessoa inocente. — O rosto da velha continuou o mesmo. — E segundo, não vamos retirar suas câmeras.
Pega de surpresa, tentou agir confiante.
— Duvido que saibam onde estão.
— Seguindo o corredor e virando à direita, coberta de musgo e sujeira. Atrás de uma lixeira. No vaso de flor na janela da vizinha. Posso continuar.
Pela primeira vez, além de irritação, a velha mostrou surpresa.
— Como?
— Descobri há uns anos caminhando por aí.
A velha, aborrecida por ser descoberta, suspirou derrotada, levantou e seguiu até uma porta. Em um sorriso, San ia a seguir. Antes, percebeu algo: todas as velas apagaram sozinhas. “Interessante”, pensou indo atrás.
Entrando em uma sala grande, maior que a anterior, vários computadores espalhados, inúmeros monitores mostrando imagens de todos os lugares dos bairros pobres.
Ainda sabendo que se depararia numa cena dessas, o queixo de San caiu; Íris, ao seu lado, ficou até assustada no número de imagens.
— Tem tantas. — A Agente balbuciou.
— É bom saber o que está acontecendo. Quando descubro, conto as minhas amigas. Por exemplo, o Mário descobriu que o filho é de outro, a Paola será mãe e…
— Legal, pode ir logo? — San falou impaciente.
Resmungando, mexeu no teclado. A mulher digitou várias vezes; as telas mudando até aonde queriam, sempre dando uma olhada de canto no jovem ao seu lado.
Acelerando as gravações, viram pessoas passar nos becos, bêbados e drogados, entretanto, o que chamou atenção foi a de um homem em particular.
Vestindo um manto escuro, o cobrindo completamente e andava lento. Parou no meio do beco e olhou diretamente na câmera. Usava uma máscara preta com pequenos chifres e dentes afiados, exibindo um sorriso.
Após isso, continuou seu caminho. Acelerando o vídeo de novo, viram-no correndo pelos becos, sangue na roupa e mancando. Um tempo depois, guardas apareceram
— Quem é? — perguntou Íris animada.
— Seu culpado, agente. — falou San em uma voz desanimada.
— Preciso dessas imagens agora!
A velha nada falou e deu um pendrive a Íris. Saindo da sala de computadores, animados, as velas acenderam ao passarem. Os dois, indo direto na saída, foram parados.
— Garoto!
Os dois pararam na porta, Íris só de curiosidade.
— Eu te conheço, sabia que reconhecia esses olhos.
— Está imaginando, velha.
— Achei estranho a forma de conhecer a localização das minhas câmeras, então me lembrei. Anos atrás, uma mulher e um garoto passeavam nos becos; os dois estavam desanimados, por isso, a mãe propôs uma brincadeira, achar as câmeras escondidas.
— Estamos com um pouco de pressa, dá pra deixar a história… — San tentou interromper, em vão.
— O garoto, demorando a entender, entrou na brincadeira. No início não encontrou nem uma, porém, a mãe, em questão de segundos, avistou todas. Depois procuraram em outro lugar, aí sim, o garoto melhorou e encontrou sozinho.
— Deve adorar contar isso aos seus netos, vamos. — falou empurrando Íris pela porta.
— Ela era uma mulher gentil, me visitava e conversávamos — sua expressão mudando em tristeza — Você me lembra ela. Já te vi inúmeras vezes, no entanto, por algum motivo, te olhando agora, está diferente, parecido com o seu…
Fechando a porta com força, as mãos de San tremiam. Se forçando a voltar ao normal, falou:
— É o suficiente?
Fingindo estar normal, respondeu:
— Deve ser. Vou levar para analisarem melhor. Pode demorar uns dias.
— Quantos?
Desviando o olhar e ficando envergonhada, disse:
— Uma semana ou duas, demora para comprovarmos e investigarmos.
Agindo contra o esperado, San permaneceu calmo e concordou com a cabeça; estendeu a mão e apertaram. Na hora, sentiu a energia entrar pelo corpo. “No começo, achei precisar ver o poder em ação, mas só umas velas acendendo já funcionou.”
Sem perder tempo, foi direto na delegacia. Saindo de vista, San, ainda na frente da porta, bateu de novo.
***
Preparando um sanduíche na cozinha da polícia, Ramon olhava um vídeo na internet sobre piranhas, pensando se podia usá-las. Seu lanche foi interrompido quando sua parceira chegou.
— Aconteceu alguma coisa para estar animada, novata?
— Sim, tenho um vídeo interessante.
— Do que seria?
— A prova de Leonardo ser inocente.
Comendo tudo, Ramon decidiu a seguir, curioso. Andando juntos, iam direto à sala dos computadores. Porém, antes de conseguirem, viram inúmeros policiais se juntando.
— Espera um pouquinho. — falou para a animada Íris.
Chegando na sala, viram o que assistiam na TV: uma reportagem sobre os caçadores de mutantes.
Jessica Mayers apresentava um vídeo. Ramon permaneceu quieto, prestando atenção ao máximo. Íris ficou pálida, com os olhos incrédulos; havia visto o vídeo naquela tarde.
Terminando, Jessica falou:
— Recebemos esse vídeo de um contato anônimo esta manhã. Disse que a agência de caçadores de mutantes está mantendo sob custódia uma pessoa inocente, conhecido como Leonardo Avalon, um mutante com um álibi na hora do assassinato de Simon Cardoso.
A reportagem continuou, e Ramon foi embora, as veias pulsando no seu corpo.
***
Do outro lado da cidade, San estava sentado olhando a reportagem, as garotas já dormindo.
— A pergunta que não quer calar, quem é o mascarado? — comentou Jessica. — O devorador de almas usa métodos diferentes, e considerando o corpo e o modo, é uma pessoa diferente. O mais estranho é que também recebemos imagens e vídeos de Simon agredindo mendigos. Os caçadores de mutantes estão protegendo esse tipo de gente?
San desligou a TV, já imaginava o que iria falar; sabia das imagens e vídeos, ele mesmo passou o dia arrumando. No momento, era só esperar e torcer para Leo ser solto.