Volume 1 – Arco 2
Capítulo 12: O primeiro dia
O navio balançava bastante, todos exceto pelos que já estavam acordados despertaram em um susto. Esquerda. Direita. O movimento causava uma náusea intensa para Cálix. Talyra teve que fazer uma magia rápida para não ser afetada pela tontura, mal conseguia ler o livro de seu pai, entretanto, Vaia caiu da cama de cara no chão, também um pouco enjoada — mas não verde como Cálix.
— O que está acontecendo?! — exclamou Talyra.
Lá fora, estava claro demais para ser uma tempestade, era mais como se o próprio barco estivesse sendo sacudido.
— Cadê o Lâmina?! — indagou Cálix.
— Não sei! Acho que ele acordou antes de nós… — Vaia se agarrou à parede para estabilizar. — Espera… onde está a bebê?!
Do lado de fora, o sino do barco ecoava junto das colisões das ondas com o casco de madeira rígido.
Um tiro de canhão foi ouvido na distância.
Os três jovens saíram cambaleando e tropeçando por qualquer objeto que estivesse no chão. Cálix ainda vestia seu pijaminha rosa e as roupas de Vaia ainda estavam em trapos.
Mas todos eles compartilhavam o mesmo rosto cansado, que se tornou confusão pura no momento em que presenciaram a cena no convés.
Heinrich estava sentado no chão com um sorriso radiante enquanto testemunhava a luta de suas filhas, tripulação e Lâmina contra uma lula gigante que emergiu das profundezas do Abismo Revolto.
A criatura usava seus enormes tentáculos para puxar e balançar o navio, parecia ter um foco especial em atacar o jovem espadachim. Mirele usava as cordas do mastro para se balançar, desferindo tiros periódicos com uma pistola antiga nos pontos vitais da lula.
Milene manipulava seus fios azuis, enquanto emanava a Aura de mesma cor, ela amarrava alguns dos golpes da criatura em teias enquanto mantinha o corpo amarrado e imobilizado.
Do outro lado do mar, estava o outro navio de Heinrich que sobreviveu aos eventos de Fajilla, cheia da tripulação de Heinrich, que parece ter acompanhado a nau-capitânia até este ponto do oceano. Eles atiravam balas de canhão no monstro, sem nenhuma preocupação em atingir o barco de Heinrich no processo.
Enquanto isso, Lâmina tentava desviar os tentáculos com uma espada de madeira, enquanto a sua estava derrubada no chão.
Os jovens olharam em desespero, procurando por qualquer sinal da bebê naquele caos inacabável.
Encontraram-na em cima de um barril próximo, mesmo com o balanço do barco, ela parecia equilibrada, levantou os bracinhos ao alto, soltando gritos e risadas alegres.
— Alguém pega ela, rápido. — gritou Cálix antes de colocar a mão na boca com ânsia de vômito
Vaia lançou-se na direção da criança, visando agarrá-la para que ela não caísse no chão ou rolasse para fora do navio.
Mas antes que conseguisse sequer tocar na menina, um dos tentáculos chega como um relâmpago e se enrola em volta da bebê, puxando-a e desaparecendo tão rápido quanto apareceu.
— Ah… Ah!! Lâmina, o bicho pegou a bebê!! — Vaia gaguejava ao tentar pronunciar as palavras, tudo que conseguiu fazer foi alertar o colega
— Oh, isso é problemático… — disse Heinrich. — Ok, acabou a brincadeira. Meninas!
— Pode deixar com Milene!
A bebê estava agora suspensa por uma de suas pernas enquanto o monstro levantava sua boca para fora d’água. Preparado para a refeição.
Lâmina arregalou os olhos ao ver o estado da bebê, e imediatamente correu para o outro lado do convés. A criatura virou o barco para sua direção oposta. Os barris e canhões do convés começaram a virar, prestes a caírem no mar.
Os jovens se seguraram no que estava por perto, e começaram a gritar.
— Vai virar, é isso… ACABOU!! SOCORRO!! — berrou Cálix.
— Heinrich, nos ajude! — clamou Vaia, olhando para o capitão.
Heinrich estava de pé no mastro, que agora, estava praticamente em posição horizontal. Ainda estava sorrindo, divertido com o caos causado pela criatura marinha. Ele olhou fixamente para Vaia.
— Esse é o maior que já apareceu enquanto vocês estavam no barco! Nenhum bicho na ida para a ilha tinha esse tamanho!
Antes que qualquer outra pessoa pudesse comentar, Heinrich pulou para a borda do convés, onde se encontrava a criatura. A mesma soltou a bebê dentro de sua boca, mas o capitão apanhou-a antes de cair para a digestão.
Heinrich fez força na queda, estabilizando o barco e fazendo um efeito alavanca para Lâmina, que estava no outro lado do convés.
O jovem espadachim usou do impulso de Heinrich e canalizou mais de sua Aura na espada de madeira, deixando-a colorida em um azul-escuro.
O vento cortou o ar quando Lâmina atravessou a lula gigante e cortou ela no meio, dando um fim ao ataque do monstro.
A água se espalhou para todos os lados, o sangue da criatura pegou em boa parte do navio de Heinrich e começou a ser levado pelo mar. Ao fundo, as comemorações da tripulação de Heinrich podiam ser ouvidas.
A espada que Lâmina segurava foi esmigalhada, como previsto.
— Milene! Pegue ele!
A filha de Heinrich respondeu rapidamente, usando seus fios como um laço para puxar Lâmina de volta para o convés.
— Mirele, amarre os pedaços da criatura, teremos rações para alguns dias!
A menina obedeceu de prontidão, pegou as cordas do navio e começou a enganchar os tentáculos na borda do navio, deixando-a pronta para cozinhar.
Lâmina caiu no navio de forma brusca, levantou-se com um pouco de esforço e acompanhou Heinrich em direção aos outros jovens.
— Bom dia, flores do dia! Como dormiram? — perguntou Heinrich.
— Muito bem… até toda essa baderna acontecer! — respondeu Cálix, tomando respiros fundos para passar a náusea.
— De ONDE saiu esse bicho?! Nenhum parecido apareceu na viagem de ida! — indagou Vaia, ainda com a voz meio rouca de tanto gritar.
Heinrich explicou que havia descoberto a verdade por trás das aparições mais frequentes de monstros:
— Hoje cedo, eu vi o amigo de vocês treinando aqui junto da bebê, decidi fazer um duelo amistoso contra ele, apenas uma espada de madeira e meu sabre embainhado. Ele começou com um ataque lento, depois fomos aquecendo, ou, no caso dele esfriando…
— Corte os detalhes…
— Eu já estava chegando lá. Acontece que pela quantidade de Aura que ele tem, quando ele a exala em combate, acaba atraindo e atiçando monstros em uma área bem grande.
— Aura também exala quando um corpo está cicatrizando ferimentos, será que não foi por isso também? — questionou Talyra
— Não, eu já acordei todo recuperado — respondeu o jovem.
Realmente Vaia e Talyra estavam surpresas, talvez realmente ele tivesse o índice de quinhentos, resultando no baixo tempo de recuperação completa.
Mas Vaia foi um pouco além, começou a imaginar que essa foi a razão pela qual ela se transformou em monstro em Fajilla. Os ferimentos do combate entre Lâmina e Mirele, além da própria exaustão de combate.
A jovem pensou em estender a mão, como um pedido de desculpas para o colega, para todos eles, na verdade. Atacou a filha de Heinrich, também.
— Mas, como uma recompensa a mais pelo nosso duelo, eu prometi informar vocês sobre as missões do Círculo com tudo o que sei — Heinrich entregou a bebê nos braços de Cálix, que começou a niná-la.
A bebê não parecia nada assustada, o cabelo estava despenteado pelo vento e pela água salgada e o coração batia acelerado. Mas Cálix tinha a certeza de que ela estava bem-humorada, pelo menos era uma boa notícia.
— Não é uma ocorrência comum, mas como devem saber, O Círculo divide os tipos de missão pela cor das cartas; Uma vez que você conclui uma missão, a carta perde a propriedade de reaparecer no seu bolso, mas ela não some, apenas deixa de brilhar…
Os quatro jovens ouviam atentamente, quietos e concentrados nas palavras de Heinrich.
— Jas… me falou que existem outros tipos de missões separadas por cor: quando O Círculo te julga digno, você recebe uma missão especial, geralmente associada a um grau de dificuldade e de área. Ela… não entrou em muitos detalhes, disse que queria falar disso com vocês… pessoalmente. — Heinrich fechou um pouco a cara
Não é como se eles tivessem algum tipo de escolha, estavam presos com Jasmyne no barco tanto quanto ela estava presa com eles. Ela não se demonstrou como agressiva ontem, só ameaçadora — e isso não era muito difícil.
— Eu só não quero brigas aqui, certo? Depois da viagem que fizemos juntos, passei a me importar muito com você, Cálix, e por consequência com seus amigos também. Mas, ao mesmo tempo, sou pai de duas meninas e amigo da Jas, então, por favor, entendam a minha posição.
“Eu larguei meu posto justamente para evitar esses conflitos…” pensou o capitão
— Tá, mas não será por boa vontade — disse Cálix — Heinrich, ela ainda é uma assassina…
— Ela abandonou o próprio dever. O Círculo quer a cabeça dela, e vocês não precisam se envolver. Só aguentem mais essas duas semanas…
Vaia deu um passo à frente.
— E-Eu estou disposta a conversar. Eu posso ser uma assassina tão horrível quanto ela, vou precisar de toda a informação sobre as missões que a Xamã tiver… — ela fechou o punho perto do peito e olhou para baixo em tristeza — se minhas memórias retornarem, essa angústia pode sair finalmente do meu corpo.
— Talvez a recompensa possa tirar essa maldição de brinde… — Lâmina deu outro tapa na nuca de Cálix pela sua insensibilidade na fala — Ai!!
A bebê reagiu rindo de Cálix.
— Não se preocupe, Heinrich. Se ela manter a sua parte nessa “trégua” e não demonstrar agressividade durante a viagem, eu vou garantir que todos… erm… — Lâmina pigarreou enquanto olhava para o clérigo — se portem devidamente.
— Ótimo! — Heinrich abriu o sorriso novamente, virando o clima de cabeça para baixo, mesmo que forçadamente — Vou preparar a mesa para vocês, devem estar famintos! Só se vistam de forma mais apropriada
Heinrich fitou Vaia.
— Me desculpe!
— Não esquenta! Pedi para Milene consertar as roupas de vocês mais cedo.
O capitão deu meia-volta e começou a andar alegremente para sua cabine. Os jovens se entreolharam por um momento:
— Nunca tive a oportunidade de ver a vice Milene usar tanto seus poderes assim: laços, fios de costura para conserto de roupas… é impressionante — disse Lâmina.
— Feitiçaria… bruxaria… sei lá o que ela tem. De qualquer jeito, é totalmente superestimada. Mas enfim, vamos voltar. Não acredito que deixei o Heinrich me ver de pijama… Eu sempre tinha o cuidado de me vestir antes de encontrá-lo.
Os quatro jovens então se viraram para as escadas aos aposentos da nau-capitânia.
— Talyra, venha — disse Vaia, segurando no ombro da menina. — Talyra?
Os olhos da maga estavam vazios, com uma mistura anormal de terror e estranheza. Era a primeira vez que testemunhava um monstro. Afinal, ela nem viu o Wendigo no vilarejo.
— Vixe, a maga pifou… — Cálix acenou com a mão diante do rosto de Talyra, tentando chamar sua atenção, estalou os dedos até ela responder:
— E-Eu só estou a tentar processar o que vi há pouco. Tem a certeza de que serão mais duas semanas de viagem?
— Vai se acostumando, quando eu cheguei no “Velho Mundo”, também fiquei surpreso com o perigo… — alertou Lâmina enquanto retornava ás escadas, como se toda aquela situação louca nunca tivesse ocorrido.
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