Hyouka Japonesa

Tradução: slag


Volume 1

Capítulo 7: A Verdade Sobre o Histórico Clube de Clássicos.

Na tarde após um longo debate, eu pedalei vagarosamente pelos campos agrícolas banhados pelo laranja do pôr do sol e lutava para ouvir a voz suave de Satoshi.

— Para ser honesto, estou um pouco surpreso, Houtarou. Estou realmente surpreso pelo que você disse lá. Se você estiver certo, então nosso Festival Kanya continua existindo ao custo da vida escolar de uma pessoa. No entanto, estou mais surpreso que você tenha sido capaz de deduzir tudo isso.

— Você está duvidando da minha habilidade? — respondi brincando, mas Satoshi não sorriu quando respondeu:

— Você tem solucionado enigmas desde que entrou no Colégio Kami. Durante nosso primeiro encontro com a Chitanda-san, ou no caso do livro popular que ninguém leu, assim como na vez do Presidente do Clube Jornal do Mural.

— Foi apenas sorte.

— Não são os resultados que importam. O problema é: por que motivo alguém como você, que acha que resolver enigmas é algo irritante, acaba resolvendo-os? A resposta é simples quando se pensa a respeito. Você está fazendo isso pela Chitanda-san.

Virei minha cabeça e me perguntei se aquilo era verdade. A frase ‘fazendo aquilo pela Chitanda’ não estava exatamente correta. Eu acho que aceitaria se o motivo fosse ‘é tudo culpa da Chitanda’. Lembro-me de Satoshi me dizendo algo do tipo antes, que eu não tomaria uma iniciativa a menos que alguém me pedisse para fazê-la. Apesar de ela não ter me pedido diretamente, é verdade que acabei fazendo algo tão chato por ela, mas...

— Hoje é diferente.

É. Hoje é diferente.

— Você pode ser bom em chamar a atenção para si mesmo também, sabia? Hoje, o trabalho de solucionar o enigma era, supostamente, para ser dividido igualmente entre nós quatro. Você poderia ter escolhido fugir, dizendo que não tinha pensado em nada, e nenhum de nós diria nada. Mas, por que você, ainda assim, foi atrás da resposta sob o pretexto de ter ido ao banheiro?

O sol continuava a brilhar, e eu podia sentir a brisa do vento. Desviei meus olhos do olhar de Satoshi e olhei para frente.

— Não foi porque você estava fazendo isso pela Chitanda-san?

A pergunta de Satoshi estava correta. Normalmente, eu não me incomodaria em resolver tal desafio. Acho que estava extremamente ativo hoje.

Sim... Tem que ser isso.

Por que agi assim hoje? Acho que entendo mais ou menos a razão, e ela não tem quase nada a ver com a Chitanda. Entretanto, entender algo eu mesmo era diferente de fazer outro alguém entender também. Sem refinar minha lógica e meu vocabulário, não seria capaz de transmitir meus pensamentos aos outros, nem mesmo a um telepata como Satoshi.

Não, ao invés disso, acho que é porque já conheço o Satoshi há tanto tempo que fica difícil de explicar. Já que minhas ações e motivos hoje foram uma renúncia ao meu modus operandi normal.

Ainda assim, não tinha obrigação alguma de me explicar a ele. Poderia dizer que isso não tinha nada a ver com ele. Mas, tinha que responder ao Satoshi, assim como organizar meus pensamentos para o meu próprio bem. Então, após um longo silêncio, dei minha resposta, escolhendo minhas palavras.

— ...Talvez, eu só esteja cansado de ter uma vida cinzenta.

— ...?

— Desde que conheci a Chitanda, meus níveis de energia eficiente têm caído aos seus níveis mais baixos. Ela tem que fazer antologias como a Presidente do clube, fazer as provas como uma estudante e investigar seu passado como um ser humano. Isso é bem cansativo para mim. O mesmo para você e a Ibara, gastando seu tempo com todo tipo de esforço inútil.

— É... Acho que sim.

— Mas sabe, às vezes você acha que a grama do vizinho é mais verde.

Parei de falar nesse momento, quando percebi que poderia ter dito isso de um jeito melhor. Mas não conseguia pensar em nada melhor do que aquilo, então continuei:

— Sempre que olho para vocês, não consigo me acalmar. Quero ficar calmo, mas não acho nada de interessante em fazer isso.

— ...

— Então, no mínimo, quero, como você disse, solucionar o enigma. Quero ter um gostinho do seu jeito de viver.

Calei minha boca após isso. Em meio ao som dos pedais e da brisa, Satoshi não disse nada. Satoshi era normalmente uma pessoa comunicativa, mas havia momentos em que não conseguia dizer nada, e eu estava bem ciente disso. Mas queria que ele dissesse algo.

Apenas vou pensar em uma desculpa depois, mas, por agora, não podia aguentar esse silêncio.

— Bem, diga algo.

Pude sentir que Satoshi estava sorrindo, apesar de não conseguir vê-lo enquanto falava, ao menos.

— Eu acho...

— Hmm?

— Acho que você, na verdade, está com ciúmes daqueles com uma vida cor-de-rosa.

— Talvez. — respondi, sem pensar.

 

***

 

Encarando o teto do meu quarto, ele continuava branco, como sempre. Eu ruminei o que Satoshi havia me dito antes. Apesar de gostar de ouvir coisas engraçadas, o que inclui piadas bobas e música popular, apesar de a Chitanda ter me deixado tonto, essa ainda era uma boa forma de matar o tempo. No entanto, com todo o devido respeito a todos os shows de comédia por aí, e se eu me tornar obcecado por essas coisas independentemente do tempo e do esforço... Isso seria muito mais interessante para mim? Isso valeria a pena, apesar de ser prejudicial à minha eficiência de energia?

Por exemplo, Chitanda perseguir seu passado. E, mais importante, como o ‘Herói’ Sekitani Jun acabou protegendo o Festival Kanya há 33 anos atrás, de acordo com a minha dedução.

Minha visão não conseguia focar em um único lugar. É, como eu imaginei, sempre que eu penso sobre isso, eu não consigo me acalmar. Eu mudei meu olhar do teto para o chão em que eu estava deitado e vi a carta que minha irmã havia me enviado. Meu olhar foi atraído por uma das frases escritas ali.

“Eu tenho certeza que se eu olhar para trás, daqui a dez anos, eu vou me lembrar desses dias sem nenhum arrependimento.”

Dez anos depois, para um mero humano como eu, esse é apenas um futuro vago. Eu deveria estar com uns 25 anos. Olhando a mim mesmo de dez anos antes, eu me pergunto se eu vou pensar sobre as coisas que eu fiz e que poderia ter feito. Talvez Sekitani Jun, com seus 25 anos, também possa ter olhado para seus 15 anos com algum arrependimento.

Eu... 

De repente, o telefone toca. Não, não é como se eu nunca tivesse ouvido um telefone tocar antes. É só que eu estava tão imerso em meus pensamentos que me surpreendi. Eu deixei a minha ansiedade para trás enquanto a minha mente retornava à realidade, me levantei e desci às escadas para atender o telefone.

— Alô, é o Oreki.

— Hã? Houtarou?

Eu senti um frio na espinha. Essa era uma voz familiar, uma que poderia bagunçar o meu estilo de vida e me envolver em todo tipo de problema. Era uma ligação de Oreki Tomoe, vagando por algum lugar da Ásia Ocidental e se escondendo no Consulado Japonês da perseguição de agentes do Mossad. Como essa era uma ligação internacional, era difícil de ouvir, mas não havia dúvidas de que era ela.

Sem hesitar, eu dei uma resposta honesta ao ouvir a voz que eu não havia ouvido por tanto tempo.

— Então você ainda está viva?

— Que rude! Você acha que eu seria morta por um ou dois bandidos?

Então ela realmente passou por isso? Bom, eu não posso dizer que estou surpreso. Provavelmente ciente do quão cara a ligação seria, minha irmã falou rapidamente.

— Eu cheguei a Prístina ontem. A propósito, isso é na Iugoslávia. Minhas finanças e saúde estão em boas condições e meus planos estão indo bem. Eu vou escrever para você assim que chegar em Sarajevo. Se eu viajar com calma, chego lá dentro de duas semanas. Isso encerra o meu reporte. Então, como estão as coisas aí?

Minha irmã parecia alegre, como sempre. Embora ela seja emocionalmente instável, ela pode ficar muito brava, chorar como se não houvesse amanhã ou ser extremamente divertida. Geralmente, ela é apenas feliz.

Eu enrolei o fio do telefone com o meu dedo e respondi:

— Nada de incomum no Extremo Oriente, Comandante.

— Entendo, então...

Minha irmã estava prestes a desligar. Apesar de eu não me importar se ela apenas desligasse, eu ainda disse:

— Nós estamos publicando uma antologia, ‘Hyouka’ ...

— ... Hã? O quê?

— Nós pesquisamos sobre o Sekitani Jun.

Minha irmã ainda falava de forma rápida:

— Sekitani Jun? Que nome nostálgico. Hmm, eu nunca pensei que aquela história ainda fosse ser passada adiante. O termo ‘Kanya Festival’ ainda é um tabu?

Eu não entendi o que ela queria dizer com aquilo.

— O que você quer dizer?

— Essa tragédia. Eu não gostei daquilo.

Tabu? Tragédia? Não gostou daquilo? Do que ela está falando? O que ela está querendo dizer?

— Espere um instante, nós estamos falando sobre o Sekitani Jun, certo?

— É claro. O ‘herói gentil’. Você entendeu, não?

Essa era uma conversa sem sentido. Apesar de estarmos falando do mesmo assunto, nós não conseguíamos conectá-los.

Eu instintivamente percebi que eu podia ter cometido um erro. Talvez a dedução que eu fiz na casa da Chitanda estava errada, ou faltando alguns detalhes. Mas, mesmo assim, eu não estava me sentindo impaciente, já que minha irmã parecia saber o que houve no Colégio Kamiyama há 33 anos atrás.

— Mana, o que você sabe sobre Sekitani Jun?

Eu decidi perguntá-la seriamente.

Tudo o que eu recebi foi uma simples resposta.

— Eu não tenho tempo para isso! Tchau!

Click. Beep, beep.

Eu tirei o gancho do telefone do meu ouvido e olhei para ele, como um idiota.

— ...

— Por que isso...

— Irmã estúpida!

Eu bati o gancho no telefone, fazendo-o tremer com um alto barulho. Minha irritação agora estava dobrada, graças à minha irmã.

 

***

 

Eu não me lembrava exatamente do que minha irmã havia me dito, já que a conversa aconteceu tão rápido que eu não tive tempo de confirmá-la. Ainda assim, a parte onde ela respondia negativamente sobre o incidente estava fresca em minha mente.

Eu voltei para minha cama e peguei tudo que o Clube de Clássicos havia coletado sobre o incidente da minha mochila. ‘Hyouka’, ‘Saudações e União’, ‘Colégio Kami Mensal’ e ‘Colégio Kamiyama: Caminhando Juntos por 50 anos’... Eu também coloquei a carta que minha irmã me enviou de Istambul ao lado desses, enquanto lia mais uma vez a linha que havia chamado minha atenção.

“Eu tenho certeza de que, se eu olhar para trás daqui a dez anos, eu vou me lembrar desses dias sem nenhum arrependimento.”

Daqui a dez anos, né? Como Sekitani Jun era o presidente 33 anos atrás, se ele ainda estiver vivo, ele deve ter por volta de 50 anos agora. Será que ele olharia para sua vida no colégio sem nenhum arrependimento?

Eu não acho que ele iria. O ‘herói’ que se sacrificou pelo bem de seus companheiros e abandonou sua chance de continuar seus estudos não teria nenhum arrependimento de suas decisões. Desde a minha dedução na casa da Chitanda, isso era o que eu pensava.

Mas isso é realmente verdade?

Era apenas um Festival Cultural, mas mesmo assim, isso fez a escola ir atrás dele e mudar sua vida. Se a vida no colegial é realmente cor-de-rosa, então poderia uma vida tão cor-de-rosa que foi interrompida ainda ser chamada de cor-de-rosa?

A minha parte cinzenta me disse que não. Sacrificar a si mesmo para que seus companheiros sejam perdoados, poderia um herói suportar algo assim? Esse pensamento veio à tona em minha mente. Embora eu ainda resistisse a tal ideia, eu não conseguia ignorar o fato de minha irmã chamar o incidente de ‘tragédia’.

Eu precisava revisar isso novamente. Eu peguei todas as cópias que mencionavam aquele incidente.

E então, eu comecei a me perguntar se a vida de Sekitani Jun era realmente cor-de-rosa há 33 anos atrás.

 

***

 

No dia seguinte, fui até a escola, vestido com minhas roupas casuais. A fim de confirmar algo, chamei Chitanda, Ibara e Satoshi para virem também. Tudo que eu disse a eles foi simplesmente isso:

— Há algo que eu preciso acrescentar à minha dedução de ontem, antes que isso seja totalmente concluído. Eu vou esperar na Sala de Geologia.

E então os três vieram. Ibara me tratando com sarcasmo por ter trazido um problema que estava supostamente resolvido de volta, e enquanto Satoshi sorria, seu olhar de surpresa por eu ter desviado do meu comportamento normal ainda podia ser visto. Quanto a Chitanda, ela falou assim que me viu.

— Oreki-san, eu acho que ainda existe algo que eu preciso saber.

Eu me sentia da mesma forma. Enquanto concordava, coloquei minha mão em seu ombro.

— Tudo bem. Eu acho que nós devemos ser capazes de descobrir isso hoje. Apenas aguente mais um pouco.

— O que você quis dizer com ‘acrescentar algo à dedução de ontem’, Oreki?

— Acrescentar significa dar o passo final, a fim de completar algo que ainda está incompleto.

— Eu não entendo, você está dizendo que nós estivemos olhando para isso da forma errada ou indo em direção a uma conclusão equivocada?

— Apenas me escute.

Enquanto pegava minhas anotações, olhei para elas eu mesmo antes de mostrá-las para os outros.

— …’Hyouka’  foi escrito com a intenção de ser algo mais importante. Não apenas para narrar a vida de Sekitani Jun ou fazê-la um conto heroico, afinal, é isso que o prefácio diz. Essa foi a parte que o Satoshi cobriu ontem. Como esperado, ele disse:

— Essa não é a parte que discutimos ontem?

— É, mas talvez nós tenhamos nos enganado.

— O que você quer dizer?

— Essa passagem: “Como um sacrifício do conflito, mesmo o sorriso do Senpai acabaria ao longo do fluxo do tempo para a eternidade”. O ‘sacrifício’  aqui não significa desistir voluntariamente, mas sim ‘sacrifício’ como uma oferenda.

Ibara ergueu a sobrancelha.

— Mas então eles não usariam ‘vítima’  ao invés de ‘sacrifício’ ?

— ‘Vítima’, né…?

Mas eu não precisei dar muitas explicações, já que a Chitanda respondeu por mim.

— Não, ‘sacrifício’  também pode ser involuntário. Costumava haver apenas esse significado no passado.

Como esperado de uma estudante de honra, isso foi rápido. E eu estava prestes a pegar um dicionário.

Satoshi comentou, com um suspiro:

— Eu entendi o que você está tentando dizer com um significado diferente para essa palavra, mas isso não é óbvio? Aliás, não tem como nós sabermos qual significado é o verdadeiro sem perguntar ao autor antes.

É claro, a diferença dos significados não era puramente um problema linguístico. Como a linguagem nunca foi tão precisa quanto a matemática, era natural que palavras pudessem ter mais de um significado. Então, não é possível concluir que uma palavra significa algo a mais completamente.

Mas ainda havia um jeito de solucionar isso. Eu concordei com a cabeça para Satoshi e disse:

— Bem, então nós apenas temos que perguntar ao autor.

— ...E quem é?

— Aquele que escreveu este prefácio, é claro. Kooriyama Youko-san era uma estudante do primeiro ano há 33 anos. Ela deve estar por volta dos 48 ou 49 anos agora.

Os olhos da Chitanda se expandiram.

— Então você a encontrou?

Eu balancei minha cabeça bruscamente.

— Eu não precisei. Já que ela estava bem próxima.

Ibara ergueu a cabeça. Como esperado, ela foi a primeira a perceber.

— Oh! Entendo.

— Isso mesmo.

— O que você quer dizer?

— O que você descobriu?

Ibara olhou para mim, e eu acenei levemente pedindo que ela explicasse.

— ...É a Itoikawa-sensei, a Bibliotecária Chefe, não é? Itoikawa Youko-sensei, seu nome de solteira era Kooriyama. Estou certa?

Como a Ibara era uma bibliotecária, ela naturalmente sabia o nome completo da Itoikawa, por isso ela percebeu tão rápido.

— Exatamente. Se vocês meramente lessem o nome ‘Ibara Satoshi’,  sem verem como ele é lido, vocês não conseguiriam adivinhar que o Satoshi havia adotado o nome da Ibara. Mas, já que nós sabemos que o nome da Itoikawa é lido ‘Youko’, e também o fato de sua idade bater, descobrir seu nome de solteira se torna algo elementar.

Cruzando seus braços, Ibara começou a soltar seu sarcasmo cínico.

— Você é realmente estranho. Mesmo eu não pude perceber tal coisa, apesar de estar em contato com a Sensei o tempo todo, e mesmo assim você foi capaz disso. Talvez você devesse deixar a Chi-chan dar uma olhada dentro da sua cabeça.

Como eu disse antes, eu tive sorte com um flash de inspiração. Eu também não quero ser lobotomizado pela Chitanda.

Enquanto isso, o rosto da Chitanda estava lentamente ficando vermelho.

— E-Então, se nós ouvirmos da Itoikawa-sensei...

— Então, vamos saber o que aconteceu 33 anos atrás: por que isso não é um conto heroico, por que a capa foi desenhada daquele jeito, por que a antologia foi intitulada como ‘Hyouka’... Nós vamos conseguir todas as respostas a respeito do seu tio.

— Mas você tem alguma prova de que é realmente a Itoikawa-sensei? Não seria chato se acabasse sendo outra pessoa?

Nós não estávamos enganados. Eu dei uma olhada no meu relógio de pulso e percebi que já estava quase na hora.

— Na verdade, tenho certeza disso. Descobri que ela era presidente do clube em seu segundo ano. Marquei um compromisso com ela para conversarmos sobre isso. Deve estar quase na hora agora, vamos até a biblioteca.

Enquanto me virava para sair, pude ouvir Ibara murmurar:

— Você está bem entusiasmado.

É, acho que estou.

 

***

 

Durante as férias de verão, a biblioteca ficava com suas persianas abaixadas para proteger os livros da intensa exposição à luz do sol. No ambiente com ar condicionado moderado, a biblioteca ainda estava lotada de estudantes se preparando para o Festival Kanya ou terceiranistas se preparando para os exames de entrada das universidades. Itoikawa podia ser vista escrevendo algo enquanto estava sentada atrás do balcão, usando um par de óculos que não tínhamos visto da última vez. Ela era bem pequena, e rugas eram visíveis em seu rosto, mostrando que já fazia cerca de 31 anos desde a sua graduação no Ensino Médio.

— Itoikawa-sensei.

Ela se virou e nos notou quando a chamamos. Erguendo o rosto, ela sorriu.

— Ah, o Clube de Clássicos.

Ela olhou ao redor e disse:

— Está um pouco cheio aqui, devemos ir até o meu escritório?

E nos conduziu até o escritório atrás do balcão.

O escritório da biblioteca era um lugar acolhedor, grande o suficiente para uma pessoa trabalhar, embora o ar condicionado fosse consideravelmente mais fraco ali. Como as persianas não estavam abaixadas, Itoikawa as fechou enquanto nos pedia para sentarmos no sofá de visitas. Uma leve fragrância podia ser sentida, vinda de uma jarra de flores em cima da única mesa da sala. Era fácil e comum esquecer daquela flor, e provavelmente ela não estava ali para os convidados, mas sim para que ela mesma a admirasse.

Apesar de ser um sofá grande, ainda não era grande o suficiente para nós quatro. Itoikawa teve que pegar uma cadeira dobrável e colocá-la ao lado do sofá. Mas por que fui eu quem acabou sentando na cadeira enquanto os outros três ficaram no sofá? Itoikawa se sentou em sua própria cadeira. Colocando seus cotovelos sobre a mesa, ela nos encarou e disse:

— Bem, do que vocês gostariam de falar comigo?

Ela perguntou gentilmente. Como ela estava falando com todos do Clube de Clássicos, era natural que eu falasse pelo clube. Tentei me livrar da vontade de cruzar os braços em uma situação em que não estava acostumado e, respeitosamente, respondi:

— Sim, há algo que gostaríamos de lhe perguntar. Mas primeiro, nos confirme algo. Seu nome de solteira é Kooriyama?

Ela concordou.

— Então isso significa que foi você quem escreveu isso, certo?

Peguei uma cópia do meu bolso e entreguei a ela. Itoikawa passou seus olhos pelo pedaço de papel e sorriu gentilmente:

— Sim, sou eu. Mas fico surpresa que isso ainda esteja preservado.

Em seguida, pareceu que ela baixou o olhar para mim.

— Acho que sei do que vocês querem conversar comigo. Se estudantes do Clube de Clássicos estão perguntando sobre meu nome de solteira, tenho uma ideia do que está acontecendo... Vocês querem saber sobre o movimento de 33 anos atrás, certo?

Bingo, então ela sabe.

No entanto, em contraste com nossas expressões de expectativa, Itoikawa meramente suspirou.

— Mas por que vocês iriam querer perguntar sobre um evento tão antigo? Seria melhor esquecer isso.

— Bem, isso é principalmente graças à Chitanda, que vê todo tipo de evento curioso como uma fera, ou para começar eu nem teria notado esse evento.

— Uma fera?

— Desculpe, quis dizer uma festa.

Itoikawa e Satoshi sorriram, enquanto Ibara me deu um olhar exasperado. Chitanda protestou levemente, mas eu a ignorei. Itoikawa sorriu para Chitanda e perguntou:

— E por que você se interessa por esse movimento?

Notei a Chitanda apertando os joelhos. Provavelmente estava nervosa enquanto respondia brevemente:

— Sekitani Jun era meu tio.

Itoikawa deixou escapar um suspiro.

— Oh, entendo, Sekitani Jun... Um nome tão nostálgico. Como ele está?

— Não faço ideia, já que ele foi dado como desaparecido na Índia.

Ela suspirou novamente:

— Oh.

Apesar de não ter ficado abalada. Talvez, viver por 50 anos signifique que já tenha visto algo assim?

— Entendo. E eu sempre quis encontrá-lo novamente.

Sekitani Jun era alguém que valeria a pena encontrar outra vez? Não pude deixar de querer conhecê-lo também.

Embora cheia de emoções, Chitanda falou lentamente.

— Itoikawa-sensei, por favor, conte-me o que exatamente aconteceu há 33 anos. Por que o incidente em que meu tio estava envolvido não pode ser considerado um conto heroico? Por que a antologia do Clube de Clássicos é chamada ‘Hyouka’ ... As deduções do Oreki-san estão corretas?

— Deduções?

Itoikawa me perguntou:

— O que você quer dizer com isso?

Satoshi respondeu:

— Sensei, Oreki criou uma dedução do que poderia ter acontecido há 33 anos usando as informações limitadas que reunimos. Talvez você devesse ouvi-la por ele.

Parece que vou ter que repetir o que eu havia dito ontem. Na verdade, embora já tivesse a intenção de fazer isso, ainda não havia percebido que eu poderia estar apenas especulando para alguém que havia realmente passado pelo incidente. Mas estava confiante em minhas deduções, embora houvesse uma pequena parte que talvez eu tenha entendido errado. Lambi os lábios e comecei a explicar usando o mesmo método de 5W1H, como ontem.

— Primeiro, o personagem principal desse incidente…

 

***

 

— …E então, nós concluímos que a expulsão ocorreu em outubro. 

Após ter dito tudo isso, eu fiquei surpreso com o quão bem eu consegui organizar meus pensamentos. Enquanto eu falava sem nenhuma anotação como referência, o tempo pareceu passar bem mais rápido.

Durante todo o tempo em que eu falava, Itoikawa permaneceu em silêncio. Ela falou com Ibara assim que eu terminei.

— Ibara-san, você tem as anotações da qual você falou?

— Não, eu...

— Eu tenho.

Satoshi abriu sua mochila e então retirou um bloco de anotações que estava dobrado ao meio e o entregou a Itoikawa. Ela deu uma olhada nelas e então voltou a olhar para cima.

— Você deduziu tudo isso apenas com isso?

Chitanda assentiu com a cabeça.

— Sim, foi isso que Oreki-san fez.

Isso não está exatamente certo.

— Eu meramente juntei as teorias deles, isso é tudo.

— Mesmo assim...

Suspiro. Itoikawa soltou um suspiro e colocou as anotações sob a mesa, enquanto cruzava as pernas.

— Eu estou surpresa.

— Não está errado?

Ibara perguntou, e Itoikawa balançou a cabeça.

— Não, foi assim como Oreki-kun disse. Tudo isso é verdade. É tão estranho, é como se você estivesse lá comigo, assistindo a tudo isso.

Eu deixei escapar um suspiro. Eu estava realmente aliviado por ter entendido tudo certo.

— Bem, o que mais você quer saber de mim? Eu posso te dar a minha aprovação, se as minhas respostas coincidirem com a sua especulação.

— Bem, eu não tenho certeza, mas Houtarou acha que tem algo faltando.

Sim, algo estava faltando.

Havia algo que eu gostaria de perguntar: Sekitani Jun abandonou sua vida colegial cor-de-rosa por vontade própria? Eu formulei a minha pergunta da seguinte forma.

— Eu tenho apenas uma pergunta. Sekitani Jun desejou se tornar um escudo para todo o corpo estudantil?

A expressão gentil no rosto de Itoikawa congelou de repente ao ouvir a minha pergunta. Ela simplesmente olhou para mim.

— ...

E me encarou silenciosamente.

Eu esperei por sua resposta, assim como Chitanda, Ibara e Satoshi. Eles provavelmente estavam se perguntando do que se tratava aquela pergunta enquanto esperavam.

...O silêncio não durou muito. Itoikawa moveu seus lábios enquanto murmurava algo e disse de forma apreensiva:

— Você realmente viu através de mim... Então eu devo lhe contar sobre isso. Acho que é melhor se eu começar a contar desde o começo, até o fim. Embora tenha sido há muito tempo, eu ainda me lembro claramente.

E então, a antiga Kooriyama Youko começou a falar sobre a ‘Luta de Junho’  de 33 anos atrás.

 

***

 

— Embora o Festival Cultural seja tão ativo quanto antes, ele parece ser mais quieto do que costumava ser. Antigamente, todos viam o Festival Cultural do Colégio Kami como seu maior objetivo de vida. Era um tempo em que as pessoas poderiam facilmente descartar o antigo e dar as boas-vindas a algo novo, e alguns diziam que era graças a essa overdose de energia que o Festival Cultural passou a existir.

— Antes de eu me inscrever nessa escola, havia uma sensação de que uma manifestação estava prestes a explodir. Nada de bom viria de uma comoção saindo do controle, certo? Mesmo assim, em comparação com os incidentes escolares mais recentes, os movimentos daquela época eram até que organizados. Mas para os professores daquela época, isso ainda era inaceitável.

A lembrança que eu estava ouvindo parecia ser a respeito de alguma História Moderna Japonesa. Eu acho que essas pessoas transbordando de energia daquele tempo ou mesmo as pessoas nascidas no mesmo período que eu, poderiam sequer imaginar a existência de outro grupo.

— Em abril daquele ano, o Diretor, de repente, teve uma explosão, durante uma reunião de funcionários. Eu acho que isso está marcado em uma de suas anotações: “Nós não devemos nos permitir a ser complacentes e nos tornarmos uma escola atrasada”. Hoje em dia, as pessoas devem ver as palavras do Diretor Eida apenas como alguém com expectativas em seus estudantes. Mas antigamente, isso foi encarado como uma mensagem encoberta para derrubar o Festival Cultural.

— Quando o horário do Festival Cultural foi anunciado, houve uma grande comoção. Os cinco dias costumeiros foram drasticamente reduzidos para apenas dois dias, e eles foram movidos para o final de semana, para apenas dois dias no final de semana, como se estivessem sendo descartados do calendário escolar completamente. Todos sentiram como se tivessem jogado um balde de água fria sobre eles e acharam a decisão muito dura para se engolir.

— Desde esse anúncio, eu pude sentir a atmosfera da escola se tornando mais tensa, como se algo estivesse prestes a começar.

— Primeiro, todo tipo de linguajar sujo foi postado no mural da escola. E então, começaram os discursos públicos, onde todos podiam subir ao palco e dizer o que quisessem, onde todos estavam ficando cada vez mais impulsivos e recebendo aplausos. E aí, o movimento começou a sério quando foi proposto que se reunisse os recursos dos clubes relacionados à arte.

— No entanto, embora estivessem esperando resistência, ninguém parecia estar preparado para a dura resposta da escola de forçadamente cancelar o Festival Cultural. Para defender o movimento, um de nós deveria estar preparado para aceitar as consequências. Embora todos fossem bons em falar por falar, pateticamente, ninguém se voluntariou a vir e se tornar o líder da aliança dos clubes.

Itoikawa se moveu em seu assento, o que fez um chiado sair de sua cadeira, enquanto ela continuava:

— Então, foi decidido que faríamos um sorteio para escolher quem seria o líder, e o seu tio, Sekitani Jun, acabou sendo o escolhido. A operação atual do movimento era controlada por outras pessoas, mesmo que seus nomes nunca tenham vindo a público.

Embora ela descrevesse isso plenamente sem emoção alguma, eu ainda podia sentir a atmosfera de 33 anos atrás, seja essa a paixão pelo movimento ou a covardia de seus representantes, eles estavam todos no passado agora. E então, Itoikawa continuou:

— Mas nós passamos do limite. Eu participei do boicote às aulas. Todos estavam no pátio, gritando slogans. A construção de um acampamento fez o clima chegar ao seu clímax, e então, em uma noite, isso aconteceu.

— As chamas do acampamento saíram do controle. Nós não sabíamos se alguém tinha feito isso de propósito, mas o Dojo de Artes Marciais pegou fogo. Embora o fogo eventualmente tenha sido apagado, o consideravelmente velho dojo foi gravemente danificado pela água jorrada pelos hidrantes.

As expressões de Ibara e Chitanda ficaram rígidas, assim como a minha, eu suponho. Até mesmo nós podíamos dizer que isso era ruim, já que indiretamente, isso significava que esse dano à propriedade da escola não poderia ser ignorado.

— Tal ato criminal passou longe de ser normal, e não poderia ser encoberto. Por sorte, a escola não queria piorar as coisas e decidiu não envolver a polícia. Já que ninguém tinha argumentos, a escola encontrou alguém para ser responsabilizado assim que o Festival Cultural acabasse... Já que todos diriam que não sabiam de nada assim que o Festival terminasse.

— E então, enquanto a causa do fogo ficou desconhecida, aquele que acabou levando a culpa foi ninguém menos que Sekitani-san, o líder oficial do movimento.

— Antigamente, era muito mais fácil expulsar um estudante. Sekitani-san permaneceu calmo até o fim. Você me perguntou se ele queria se tornar um escudo para todos, certo?

Itoikawa simplesmente sorriu e olhou para mim.

— Eu acho que você tem a sua resposta.

 

***

 

Após terminar sua longa história, Itoikawa se levantou para pôr um pouco de água quente em sua xícara de café, antes de bebê-la.

Nós não dissemos nada. Aliás, nós não tínhamos nada para dizer. Eu só consegui ver os lábios de Chitanda se movendo um pouquinho, enquanto murmurava ‘que horror’ ou ‘que cruel’, embora eu não faça ideia de qual desses era.

— Bem, isso é tudo que eu tenho para dizer. Você tem mais alguma coisa para me perguntar?

Enquanto voltava à sua cadeira, Itoikawa falou em seu tom comum, o que mostrava que essa era apenas uma história do passado para ela.

Ibara finalmente quebrou o silêncio e disse:

— Então, eu gostaria de saber sobre a ilustração da capa que foi desenhada naquela época...

Itoikawa assentiu silenciosamente.

Eu me lembrei da capa de ‘Hyouka’, aquela com o cachorro e a lebre perseguindo um ao outro, enquanto várias lebres formavam um círculo e assistiam a eles. O cachorro provavelmente representa os funcionários da escola, enquanto as lebres são os estudantes. E a lebre perseguindo o cachorro no círculo era, provavelmente, Sekitani Jun.

Depois, Itoikawa respondeu ao que eu havia acabado de imaginar, e eu perguntei a ela:

— De todos os prédios no Colégio Kami, o Dojo de Artes Marciais é o mais distante, então isso significa que ele foi reconstruído?

Eu percebi o quão antigo o dojo era quando Chitanda o mostrou para mim em abril, embora não tenha dado atenção a isso naquele momento.

— Sim, isso mesmo. Já que monumentos públicos escolares são raramente renovados, a menos que alcancem seu prazo de validade. Enquanto todos os outros prédios foram renovados há 10 anos atrás, apenas o dojo foi deixado intocado desde sua última renovação.

Satoshi então disse, de mansinho:

— Hmm, Sensei, eu percebi que você nunca se refere ao festival como Festival Kanya.

Como o tópico mudou bruscamente, Itoikawa acabou com um leve sorriso.

— Por que você me pergunta? Claramente você pode descobrir isso agora.

— Hã?

Festival Kanya?

Entendo. Eu me lembrei de minha irmã mencionando em sua ligação que o termo era considerado um tabu dentro do Clube de Clássicos. Embora tenha sido um pouco tarde, eu finalmente entendi porque isso era um tabu.

— É porque Sekitani Jun não queria se tornar um herói, certo? É por isso que você não o chama de Festival Kanya.

— Fuku-chan, o que ele quer dizer com isso?

Apesar de sorrir enquanto respondia, o sorriso de Satoshi era um pouco diferente do comum. Dessa vez, ele não estava sorrindo de diversão.

— ‘Kanya’ não é uma abreviação de ‘Kamiyama’, mas sim uma forma diferente de se pronunciar o kanji de ‘Sekitani’. Eu pude perceber isso agora a pouco. É provavelmente um nome alternativo para ‘Festival Sekitani’, para poder enganar os funcionários enquanto honram seu herói.

...E então, Chitanda perguntou:

— Sensei, você sabe o motivo pelo qual meu tio deu o título ‘Hyouka’ para a antologia?

No entanto, Itoikawa gentilmente balançou sua cabeça.

— Esse nome foi provavelmente um capricho de Sekitani-san, enquanto ele sentia que estava para ser expulso. Ele disse que isso significava algo que ele não podia fazer em seu estado atual naquela época. Mas mesmo assim, eu não sei o que isso significa.

...Ela não sabe?

Ela realmente não sabe? Ou Chitanda, Ibara e Satoshi ainda não perceberam?

Embora eu raramente fique com raiva, agora eu estava ficando um pouco irritado. Nesse momento, tudo o que eu estava sentindo era irritação, já que ninguém parecia ter entendido a mensagem que Sekitani Jun deixou para trás. Eu estava bravo por ninguém ter captado uma mensagem tão simples.

Sem perceber, eu comecei a falar:

— Vocês não entenderam? O que diabos vocês estavam ouvindo até agora? Eu vou explicar, não é nada além de um simples trocadilho.

— Houtarou?

— Sekitani Jun queria deixar uma mensagem para nós, os descendentes do Clube de Clássicos, e ele a colocou dentro do título de uma antologia. Chitanda, você é boa em inglês, certo?

Chitanda se assustou um pouco ao ser chamada de repente.

— Hã? I-Inglês?

— É. Isso é na verdade uma mensagem secreta. Não, mais algo como um jogo de palavras…

Itoikawa não reagia, apenas olhava para nós. Eu me pergunto se ela tinha percebido. Não, ela conseguiu entender. Ainda que, por algum motivo, ela não esteja nos dizendo nada. Embora eu não tenha entendido tudo, eu tentei me colocar em seu lugar e percebi que talvez isso possa ser algo que não deve ser dito alto. Talvez isso seja uma das tradições do Clube de Clássicos?

— Você descobriu algo, Oreki-san?

— Oreki, pare de tentar fazer a gente adivinhar. Você realmente entendeu?

— Nos conte logo, Houtarou.

Quantas vezes eu já fui pressionado por respostas por essas pessoas? Eu suspirei, enquanto me preparava para dar a minha explicação. Embora dessa vez eu sentisse que não tivesse nada a ver com sorte ou ter outro insight. Eu só senti como transmitir o arrependimento de Sekitani dentro de seu trocadilho para alguém.

E então eu respondi:

— O que você acha que ‘Hyouka’  significa?

Chitanda respondeu:

— Esse é o título da antologia do Clube de Clássicos.

— Eu estou perguntando o significado da palavra em si.

Satoshi continuou:

— É a palavra japonesa para ‘gelo’, certo? Então ‘doce gelado’ ?

— Tente ‘Ice cream’.

Ibara respondeu:

— Ice cream? O que isso deveria significar?

— Tente rearranjar as sílabas.

Ah, droga. Por que sempre tenho que me alongar tanto nas explicações? Entendam logo o que estou tentando explicar!

— ‘Ice cream’, por si só, não significa nada. Foi por isso que disse que era um jogo de palavras.

A expressão no rosto de Satoshi primeiro demonstrou ‘Ah, entendi’, antes de mudar para uma expressão pálida, como se todo seu sangue tivesse sido drenado dele. Em seguida, foi a vez de Ibara, que sussurrou ‘Ah, agora entendi!’  com uma expressão irritada.

Finalmente, Chitanda parecia ainda não ter entendido. Sendo uma estudante de honra, ouvi dizer que ela era boa em inglês. No entanto, parecia que ela não entendia completamente as nuances linguísticas. Não estava com vontade de provocá-la ainda mais.

Peguei uma cópia do prefácio de ‘Hyouka: Volume Dois’  e escrevi nele, com uma caneta que havia trazido.

— Essa é a mensagem que seu tio deixou para trás.

Chitanda assentiu, parecendo perplexa.

Quando finalmente compreendeu, seus olhos se arregalaram instantaneamente.

— Ah! — ela exclamou, e ficou em silêncio.

Os olhares de todos se fixaram nela.

Os olhos de Chitanda estavam lacrimejantes. Foi então que percebi que os meses de ajuda finalmente deram frutos.

— ...Eu me lembrei — ela sussurrou. — Agora eu me lembro. Perguntei ao meu tio por que a antologia se chamava ‘Hyouka’. Ele simplesmente disse… sim, ele me disse para ser forte.

— Essa é uma mensagem para eu continuar vivendo, mesmo quando me sentir fraca, ou quando encontrar momentos em que não possa expressar minha voz...

Ela voltou seu olhar para mim.

— Oreki-san, eu me lembrei. Estava chorando porque tinha medo de viver enquanto estava morta por dentro... Graças a Deus, agora posso me despedir adequadamente do meu tio...

Um sorriso surgiu em seu rosto. Percebendo que seus olhos estavam molhados, ela moveu as mãos para limpá-los. Em seguida, voltou a olhar para a nota que segurava. Nela estava o verdadeiro significado da palavra que eu havia escrito.



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