Hant! Os Piores Brasileira

Autor(a): Pedro Suzuki


Volume 1 – Arco 1

Capítulo 50: A decisão de Lucca


Apesar de ser noite, as ruas da cidade brilhavam. Pois entre os paralelepípedos, pequenos fragmentos mortos refletiam a luz da fenda espacial.

Para resistir ao frio incomum, os pais cobriam seus filhos com espessas camadas de blusas e cobertores, acendiam lareiras e fogueiras a céu aberto. Uma prevenção inútil, uma vez que todos mergulhavam nas fontes de água, modificadas para lançarem jatos com uma pressão três vezes mais forte que o comum.

Costume que surgiu há centenas de anos atrás, quando o mago das fadas purificou o rio; e que reapareceu quatro vezes ao longo da história dessa cidade, antes mesmo de ser batizada como cidade do Rio Cieno ou de pertencer a finada família Laika.

Do menor ao maior, do mais afortunado ao mais miserável, dos com a visão fraca aos ostentando a vitalidade da juventude.

Naquele momento, por mais que procurasse o dia inteiro, seria impossível descobrir um só habitante que desconhecesse o motivo dessa festa.

Onde quer que procurasse intriga, acharia, no lugar, irmandade.

Afinal, o cadáver, o próprio céu, as estranhas águas envenenadas e as incontáveis flores, eram testemunhas do que havia ocorrido.

Ou seja, por onde olhasse, descobriria o motivo, até mesmo se fosse um peregrino portando somente sua língua natal.

Se havia lugares mais movimentados que os outros, pela sagacidade dos comerciantes mais ágeis em se adaptarem, criando promoções e eventos adequados ao momento.

Era incomparável a quantidade de pessoas aglomeradas no centro da praça, no coração da cidade, onde a estrela da noite, que agitava a cidade com sua música e espantava o clima de luto, seria coroada com a maior das premiações: uma medalha de herói, intitulada com o nome daquele que recuperou o continente das garras demoníacas.

— Por essa descrição, de quem acham que estou falando?

Cidade do Rio Cieno, exatamente 150 anos depois.

— Do herói Lucca, é claro! — gritaram as crianças.

Ohoho, sua fama é mesmo incomparável! — Pedindo silêncio com as mãos, acalmando as crianças, o velho contador de histórias, convidado a compartilhar a origem do feriado que hoje era comemorado, descendente de um dos muitos historiadores que acompanharam a jornada de Lucca, prosseguiu: — Mas e se eu disser que um novo achado, um manuscrito escrito por um dos companheiros do herói, conta outra história?

— Então diria que é um dos negacionistas! — gritou uma das crianças, logo acompanhado de uma enxurrada de risadas.

— Ouça o que eu tenho a falar, antes de tirar suas próprias conclusões. — A professora se curvou, envergonhada com a atitude de seu aluno e receosa de que todo trabalho que teve para chamá-lo fosse em vão por uma besteira dessas, mas o contador de histórias riu e a tranquilizou: — Ignorar tudo o que os adultos dizem é tolice, mas também concordar com qualquer estranho, só por ter uma respeitosa barba como a minha, é igualmente ruim. Nisso, digo que fez bem, garoto. Porém, evite me interromper antes do tempo dedicado para perguntas.

Cedendo à pressão dos pais e professores, o garoto se levantou e se desculpou.

— Onde estava mesmo?... Ah, o discurso do Visconde. Diferente do que é compartilhado por todos os cantos, nesse manuscrito, onde o discurso é copiado palavra por palavra, os nomes mencionados, por enquanto sem ordem, são os seguintes:

Edwin, Mansão dos Laika

— Que suadeira é essa? Por que veio correndo ao invés de pedir uma carruagem dos motoristas do Visconde, como sempre?

— Roubaram o cristal!

— Pegue — disse Edwin, oferecendo um pano e um copo de água fresca, rapidamente esvaziado. — Explique isso direito, quem roubou?

— Eu não consegui identificar, estavam com os rostos cobertos — respondeu o cavaleiro, limpando a boca com seu braço.

— Nenhum palpite?

— Posso ter me enganado, mas acho que vi uma tatuagem na testa...

Ouvindo isso, mesmo estando encarregado de proteger o filho do Visconde Laika, ele pegou o cavalo mais próximo e disparou pelo portão principal.

Minutos depois, outro Grão-mestre chegou na mansão.

Prilio Celeste de Eplila

— Onde estão os outros? — perguntou para um jardineiro, assim que espiou a janela do quarto dos cavaleiros e não viu movimentação alguma.

— Eles...

Antes que pudesse responder, Voyro, pendurado de ponta cabeça na árvore podada, pulou e interrompeu:

— Foram para o circo!

— E por que você está aqui sozinho? — perguntou Prilio.

— Porque dormi demais!

— O líder da expedição deixou algum comando?

— Ele pediu para que você fosse para o circo, assim que possível.

Vendo a expressão estampada no rosto do Voyro, Prilio perguntou:

— Quer que eu te leve?

— Sim!

— Mas quem é ele? — perguntou, apontando para uma segunda figura, oculta por um manto, que apesar da aparência desgastada, era visivelmente especial; descansando em cima de duas árvores, que por pouco suportavam seu peso, como demonstrava os galhos curvados, estalando ocasionalmente.

— Meu mentor de esgrima, o mestre espadachim!

Monge Barinaja

— Está bem? Tome um pouco de chá... O que te traz aqui?

— Me ajude por favor! — gritou Edwin.

— Se estiver no meu alcance e não for contra os meus princípios...

— Sequestraram o filho do Visconde!

— Quem sequestrou?

— Não consegui ver direito, porém senti indiscutivelmente que é alguém com quem não devo arranjar problemas. Era perigoso demais até de me aproximar e arriscar ser visto.

— Sabe a direção para onde ele foi?

— Esse sem vergonha partiu para o circo! Talvez queira vender ele...

— Nessa terra governada por mercadores, tudo tem seu preço. — E o monge apontou para uma pequena caixa de madeira, com uma etiqueta porcamente colada, escrita: “doações”.

— Que seja, pagarei o que for necessário!

— Visto sua preocupação e urgência, o problema parece maior que o esperado. Nesse caso, vou mudar o que peço em troca. Hm, mas o que peço em troca? Essa situação me lembra de um dos meus primeiros aniversários... Depois que fui aceito no monastério. Naquele dia, apesar do meu mestre afirmar com firmeza que poderia pedir o que quiser, quando pedi o que queria, não recebi nada. Sim, era uma pegadinha. Ou talvez tenha pedido demais e ele tenha se envergonhado para recusar com palavras diretas. Sim, esse caso me parece mais provável.

— Por favor, vá direto ao ponto, me diga o que deseja!

Girando a cabeça, brincando com seu colar e olhando ao céu, o monge finalmente se decidiu e respondeu:

— Madeira de boa qualidade.

— Quantos quilos? Ou será toneladas? Diga e enviarei alguém, assim que tudo isso for resolvido.

— Preciso de madeira o suficiente para construir minha casa e minha escola, custava mais caro que eu previa.

— Comprarei uma floresta inteira para você, só venha comigo logo, por favor!

— Antes, assine esse contrato.

— Essa folha em branco?

— É mesmo, ainda não escrevi o contrato...

— Faça isso no caminho!

Robin Narak

— Tem certeza de que usar o filho do Visconde como isca é um bom plano?

— Dentre o que temos disponível, é a única opção atrativa o suficiente — respondeu Prilio. — Eles enviarão os lutadores mais fortes para cá, enquanto os aventureiros se infiltram na tenda, destroem o ritual e saem de fininho.

— E se outras pessoas más intencionadas ou até indesejadas, apesar das boas intenções, forem atraídas por essa isca?

— Que pessoas? Bandidos de rua? Bispos de folga? O mentor dele lida com isso.

Selena Lance

— Eu não sei, eu não sei, eu não faço a mínima ideia do que estou fazendo!

Pronto, era isso que queriam?

Me desculpa, eu me arrependo até hoje, eu ainda sinto culpa pelo que fiz!  

Segundas intenções, plano secreto? Eu só me arrependi! Voltei atrás, percebi que fiz algo imperdoável, me desculpe por ser tão indecisa!  

Eu não sei o que estou fazendo, eu não sei qual decisão difícil tomar e não sei como todos vocês sempre tem tanta certeza do que estão fazendo! 

Qual critério eu deveria usar para me guiar? Por acaso, só para mim todas essas escolhas são tão confusas? 

— É tarde demais para se arrepender. Deveria gastar essa confissão bonita para aqueles que ainda estão dispostos a perdoá-la. Se lembra mesmo de quem nós somos. — E o peão retirou a máscara e a arremessou ao chão. — Então você sabe que eu nunca, mesmo depois da sua morte, vou encontrar uma única justificativa sequer, mesmo que arquitetada pelo maior filósofo ou poeta do continente, que me convença de que você merece qualquer coisa além da cela mais profunda do inferno!

— Eram eles, os que você nos falou para não ligarmos? — perguntou o Visconde. — Já vi inimigos de guerra com menos sede de sangue e olha que lutei contra o povo das montanhas, antes do tratado.

— Cuidado! — disse Rafun, puxando o Visconde para perto, impedindo que fosse acertado por uma adaga voadora. — Melhor ficar quieto, pelo seu próprio bem.

E o Visconde respondeu silenciosamente, acenando a cabeça e equipando um elmo, entregue por um de seus cavaleiros pessoais.

— Sombra! — E uma mulher, coberta por uma capa branca, respondeu ao chamado da Selena. — Vou usar o colar, por enquanto.

Vindo de uma bolsa, um cilindro metálico oco, foi entregue.

— Por que ela usa uma capa branca, sendo que é chamada de sombra? — perguntou o Visconde.

— De noite elas usam — respondeu Rafun.

Então a Selena apertou uma trava e girou o cilindro, que se separou em dez argolas idênticas.

Vendo isso, os peões começaram a correr, mas logo foram alcançados pelas argolas, que se abriram, revelando pequenas garras e se fecharam no pescoço dos peões, rasgando as roupas, ultrapassando as armaduras e perfurando a pele.

 Aqueles que tentaram desviar, se abaixando ou se escondendo atrás de árvores ou barracas, foram surpreendidos pelos movimentos anormais das argolas, que os seguiram até capturar o último peão.

Olhando para baixo, um deles viu um colar decorado por dezenas de linhas vermelhas, finas e uniformes, se formar.

E ao redor, seus companheiros vestiam os mesmos adornos sangrentos.

Para alguns, que tentaram resistir, ainda mais sangue escorreu, para outros, que se mantiveram calmos, apenas algumas gotas caíram.

Mas uma argola sobrou nas mãos da Selena, que manuseava com luvas brancas, também entregues pela Sombra.

Ela jogou a argola para cima e fez um sinal com as mãos, aprofundando as lâminas, o que se replicou em todos os colares, criando uma enxurrada de gritos.

Analisando para encontrar o que deixou escapar a pior expressão, Selena caminhou até um dos peões e perguntou:

— Qual a verdadeira armadilha? 

Inesperadamente, ele sorriu.

Do meio da multidão curiosa, um dos funcionários do circo, que formava uma barreira humana para impedir que chegassem perto demais do conflito, largou a formação e correu em direção dela.

Rafun tentou impedir, se colocando na frente do palhaço, mas foi jogado para longe, surpreendido pela força dele.

— Atrás de você!

A Selena tentou desviar, mas não foi rápida o bastante.

Seus braços foram erguidos de repente e o susto fez sua mão soltar a argola que segurava, caindo e quicando no chão, retraindo as lâminas e dando descanso ao sofrimento dos peões, que recuperaram o folego.

— Me solte!

Se debatendo por alguns segundos e percebendo que sua resistência seria inútil, ela mordeu e quebrou seu canino de metal, deixando escapar uma nuvem venenosa de sua boca, que matou o palhaço, assim que inalou o gás.

Esfregando a testa dele, borrando a maquiagem branca, ela viu a mesma tatuagem dos cultistas.

— Como percebeu isso? — perguntou Rafun, cobrindo seu nariz com um pano e se afastando até uma distância segura.

— O Lucca e o Prilio me alertaram sobre eles — respondeu Selena. — Só quis verificar por segurança, mas parece que eles estavam mesmo envolvidos nisso.

— Ainda não acabou! — gritou o Visconde.

A Sombra surgiu, entregou um novo canino de prata, que foi prontamente recolocado no lugar, então desapareceu novamente.

— Ela bem que podia nos ajudar — reclamou Rafun.

— É contra as regras — respondeu um dos peões.

— Dane-se as regras! Olhe com quem vocês se aliaram — disse Selena, recuperando a argola e reabrindo as garras, trazendo uma sequência de xingamentos. — Ela só está ocupada com outra coisa.

De monociclos e pinos, até cadeiras e partes das barracas, dezenas de objetos foram arremessados contra a Selena.

— Todos os trabalhadores desse circo estão com eles!? — resmungou o Visconde, protegido por três cavaleiros com grandes escudos.

Lucca Massaro Monti

Olhando os colares que se prenderam aos assassinos, instintivamente levei meus dedos ao meu pescoço.

— Que audácia desviar seu olhar de mim. Por acaso está tão confiante que já está analisando seu próximo oponente?

— Independente do que faça ou de como me prepare, o resultado já está definido.

Oho, gosto dessa confiança!

— Confiança? Eu definitivamente vou perder aqui.

Em nossa breve interação, gastei todos meus truques sem ele nem perceber.

De que adianta descrever sua aparência vilanesca, seus artefatos incríveis ou suas técnicas dezenas de níveis acima?

Fato é que essa luta irá acabar logo, está claro para todos aqui.

Em um milésimo de segundo ele estava a dez metros de distância, no outro estava colado em mim.

Se foram suas pernas que esticaram por alguma mutação, maldição, habilidade ou magia, ou o artefato que usou para congelar a água tem múltiplas funções, que diferença essa nova informação faria?

Eu possuo um arsenal limitado e mais fraco, enquanto ele parece dispor de uma infinidade de opções de primeira categoria.

Se descubro uma de suas fraquezas, ele logo aparece com mais cinco problemas.

“Meu objetivo agora não é ganhar, só comprar tempo até os verdadeiros oponentes a altura chegarem. Para isso, meus truques atuais devem servir”, a situação, porém, parecia bastante familiar, de quando enfrentei o grão-mestre da prisão.

No mau sentido.

Voltar as mesmas saídas, repetir os mesmos erros, me trouxe um sentimento ruim.

Além de estar praticamente estagnado, até agora, tenho pensado e agido de maneira patética. Por mais quanto tempo isso irá funcionar? Até quando eu vou poder me escorar nos outros?

Com um novo plano em mente, levantei minhas mãos e me rendi.

Contador de histórias

— Ué? Se a lista menciona o nome do herói, qual o motivo de todo esse suspense? — perguntou o garoto.

— Por isso te pedi para ter paciência. Não nego que o herói teve um papel importante naquele incidente, mas a grande diferença é a ordem! Em todas as outras listas usadas como referência, o nome do herói vem em primeiro, pois supostamente teve a maior contribuição. Mas nessa, no lugar do nome Lucca, está escrito em destaque o nome:

Tristan Ebenhardt

— Que vista.

Todas as barracas ardiam em chamas, palhaços sequestravam as pessoas comuns, que fugiam da forma que conseguiam; cavaleiros de brasões diferentes se esbarravam e interrogavam uns aos outros, e cultistas corriam praticando atos de terrorismo pela cidade.

— Algo está errado com a barraca central — avisou Aika, segurando um artefato em formato de termômetro.

— É sério!? Não me diga — disse Kappa em um tom irônico, desaparecendo e reaparecendo segundos depois, para desviar do artefato lançado em sua direção.

— O ritual falhou? — perguntou Tristan. — Por isso foram obrigados a começarem o plano B de tacar o terror nessa cidade?

— Chuto que os escravos do circo aproveitaram essa chance para iniciarem uma revolta — disse Konstantin, apontando para uma horda de homens com correntes e grilhões, atacando os supervisores e libertando os animais enjaulados.

— O que não parou, nem atrasou o progresso do ritual! Precisamos nos apressar... Esquece, eles conseguiram. É isso, bom trabalho enrolando meia hora naquela parada!

— Que pecado é colher umas frutas quando está com fome — disse Kappa. — Nenhum de vocês me avisou que era venenosa!

— Nada nesse continente inteiro é comestível, quantas vezes vou ter que repetir isso?!

— Chega. — Com o comando de Tristan, todos se endireitaram e se calaram. — Por enquanto, vocês três vão resolver aquela bagunça e eu lido com aquela coisa.

— Quer roubar a parte legal só para você? Vamos todos juntos.

— Já não basta... — Mas vendo que os outros dois compartilhavam esse sentimento, Tristan suspirou e cedeu. — Evitem ataques explosivos, de alto alcance, técnicas experimentais e cuidado com as pessoas.

— Todas as pessoas?

— Os terroristas também são pessoas.

— Sim, incluindo terroristas. Precisamos de alguns para interrogar.

Robin Narak

— Eu sei como se sentem, mas vocês devem parar com isso agora!

— Olha Robin, sei que é seu trabalho, mas nem você vai conseguir conter os outros depois daquele discurso e tanto do herói — respondeu um dos participantes da revolta.

— Herói? Por que o herói colaboraria com essa algazarra?

— Não entenda errado. O Lucca pode ter tido uma ideia oposta da nossa, mas pela mesma solução — disse Prilio. — Enquanto você pensa que o caos pode acelerar o que seja que os cultistas estão fazendo, parece que ele canalizou toda revolta para destruir os círculos. Como ele não tem como saber dos detalhes que descobrimos, é uma ação completamente razoável.

— Mesmo que ele pense assim, ainda é uma solução violenta demais! Como herói, como pôde esquecer das pessoas que deveria proteger, que com um plano desses, inevitavelmente vão sair com prejuízos enormes ou até pior...

— Prilio! — gritou Edwin. — Você viu o filho do Visconde?

— O Voyro? O que houve com ele?

— Eu que te pergunto, como está andando tranquilamente depois de perder quem deveria estar protegendo!? Todos os outros disseram que você o trouxe para cá, não deveria estar cuidando dele? Para começo de conversa... De onde surgiu a ideia de trazer ele?

— Só pensei que a mansão, nesse momento, seria mais perigosa. Ele mesmo que pediu para que fosse junto comigo. Olha, não esquenta a cabeça, que o tal do mestre espadachim parece forte o bastante para garantir a segurança daquele garoto.

— Espera, aquele homem de semblante criminoso não era um sequestrador?

— Como é que chegou nessa conclusão?

Edwin se virou e começou a correr, mas Prilio agarrou seu braço.

— Me solte! Preciso ir avisar o Barinaja imediatamente!

— Chamou aquele monge para essa bagunça?

— Já entendi que eu e você cometemos muitos erros hoje, podemos conversar e esclarecer tudo depois. Mas agora não é a hora para isso.

Monge Barinaja

— Seja o que for, posso te oferecer agora mesmo. Pelo seu próprio bem, é melhor que resolvamos isso de forma pacífica. Por favor, seja razoável e deixarei você ir sem nem prestar contas a guarda do Visconde, com um bom pagamento pelo resgate ainda. Vamos, deixe o garoto ir.

— Do que está falando?

Hm, vai tentar fingir que é o pai dele ou coisa do tipo? Tenho provas concretas de quem ele é, e sei muito bem quem ele é. Solte o garoto, esse é meu último aviso.

— Os disfarces dos cultistas estão começando a ficar bem criativos. Não vou cair na sua ladainha, venha, faça o que tiver que fazer logo!

— Esperem! — gritou Voyro. — Parece que houve algum tipo de confusão aqui... Deixe-me apresentar vocês dois. Barinaja, esse é o meu mestre espadachim de origem misteriosa e mestre espadachim, esse é o meu segundo professor de artes marciais.

— Segundo? Que besteira é essa, por que buscou um segundo professor?

— Sabe, tem grandes períodos de tempo que você simplesmente some, sem aviso nenhum. Para que eu não me enferruje de tanto dormir, achei uma boa ideia encontrar outro grão-mestre competente.

— Então ele não é seu sequestrador? — perguntou Barinaja.

— Claro que não!

— Então o que será de minhas madeiras de primeira qualidade!? Terei que começar a coletar eu mesmo?

— O que?

— A compensação de um dos cavaleiros do Barão. Ele prometeu que patrocinaria os materiais necessários para minha escola caso o resgatasse, mas se nunca foi sequestrado, o que posso fazer?

— Quer ajuda para mentir para ele? — perguntou o mestre espadachim.

— Faria isso por mim?

— Ei, você é um monge! — interrompeu Voyro.

— E o que tem?

— Não deveria ser virtuoso e nunca mentir?

— Ah, realmente! Agradeço pela ajuda, mas procurarei outra forma de conseguir os materiais necessários.

— Nesse caso, posso te ajudar nisso! — Um bastão de madeira se esgueirou pela roupa do Voyro, o levantou e se retraiu até encontrar os braços de um dos palhaços, que o cobriu com um saco de couro e correu para longe.

— Voyro! — gritaram os dois juntos.

Selena

— Isso é tudo?

— Você subestima a origem e o escopo desses cultistas. O objeto de adoração deles pode parecer tolo, mas aquele que eles cultuam não é. O império já enviou um de seus governantes, e o palco perfeito que preparamos é só o começo!

— Tem alguma corda ou pano por aí? — E a Selena amarrou a boca do peão, transformando o discurso ameaçador em grunhidos incompreensíveis.

— Pode nos silenciar agora, mas no fim! — Um por um, todos que ousaram abrir a boca, foram nocauteados ou calados a força.

— Nesse ritmo não vai ter para todo mundo... — Então Selena decidiu aplicar um método que aprendeu com Khajilamiv: — Se cada caminho da magia é representado por um inseto. E se eu puder controlar todos? Então serei mais forte que os quatro imperadores?  

Assim foi descrita a criação da técnica da família, pelo próprio velhote. 

Não só controlamos insetos, mas nos inspiramos neles, para ajudar a criar alguns truques úteis.

Inspirado após observar uma caixa cheia de centopeias por três dias inteiros, o velhote criou uma técnica que permite os humanos fingirem que possuem cem membros perfeitamente funcionais. 

Só contando os dedos, possuímos mais de vinte articulações intuitivas de se usar.

Mas esses pequenos movimentos são delicados demais para oferecerem qualquer perigo, não passava de um simples conceito fantasioso, até com auxílio de artefatos.

Porém, graças a Fortuna e suas grandes invenções, roubadas dos heróis de outros mundos, uma tecnologia independente da magia se revelou a peça que faltava.

Encontrando um vidro rachado, Vibogo teve um momento de eureca...

— O que foi com essa explicação toda? — cochichou o Visconde.

— Não sei, mas parece estar funcionando — respondeu Rafun.

Se aproveitando de que todos os peões foram treinados para nunca interromperem um monólogo do líder da família, principalmente quando se tratava das explicações de técnicas e filosofias, Selena conseguiu terminar de prender todos, sem mais nenhuma interrupção.

Prilio

— Para onde estão indo?

— O Voyro foi pego! — gritou o mestre espadachim.

— Siga aquele palhaço! — apontou Barinaja.

Então Prilio assoviou e montado em sua Serpe, invadiu a tenda principal, atropelando os guardas e cultistas no caminho.

Nikolina

— É tudo culpa dele... Esse bêbado me enganou e tramou o assassinato de meu irmão! Vejam todas as provas!

— Eu sou inocente!

— Já vi e ouvi o suficiente — disse o Visconde. — Permito.

Ouvindo sua sentença de morte, o homem se livrou dos guardas e fugiu por um caminho que conhecia bem, entrando em um terreno em construção e descendo até o ponto de encontro, que visitou tantas vezes.

— Aquela pirralha nos traiu! — gritou o homem, se rastejando e agarrando os pés de uma figura completamente coberta, alta e armada com uma espada de ferro. — Eu prometo que ainda consigo ser útil, mas por enquanto, por favor me acolha na propriedade dos Zanatos e me esconda por um tempo!

— Nos traiu?

— Sim, ela nos acusou de termos planejado tudo sozinho! Como é nobre, foi livre de toda culpa e ninguém sequer suspeitará dela. Agora entendo o motivo de sua família odiar tanto essa família traiçoeira!

— Você ou ela, me mencionou de alguma maneira?

— Claro que não! Nunca faria isso.

— Então só você foi traído.

? Você também vai perder tudo com isso! Todo tempo que passou trabalhando na infiltração, fora que essa falha custará sua cabeça!

— Obrigado por cumprir seu papel perfeitamente até aqui. Seus familiares receberão a compensação prometida. — Então chutou o rosto do homem e o amarrou. — Como planejar e matar um nobre é um crime que se estende a todos os laços de família, talvez a recompensa acabe sobrando para alguns primos de terceiro grau, isso é, se não for confiscado pelos Fortuna.

Na mesma noite, o cadáver desse homem foi jogado em frente a propriedade dos Laika.

Biblioteca branca

Ver o herói agonizar tanto, me fez abrir a primeira exceção.

Em outros universos isso seria impossível, mas sem um administrador fixo, nesse universo quebrado, o preço é suportável.

Colocando uma página em branco de um lado e um livro pronto no outro, abri o teclado e digitei a proposta.

Lucca

[Deseja ir a dimensão ### e realizar uma missão emergencial para salvar os sacrificados?

Aceitar/Recusar]

Essa é uma decisão óbvia, por que sequer oferecer a opção?

Levantei meu dedo, mas uma leve dúvida trouxe uma hesitação e essa hesitação trouxe uma pergunta.

— Eu devo fazer, é o certo. Um leve risco para salvar muitos, sim, eu devo.

Vamos, aperte!

— Ele está hesitando?

Pare, por enquanto.

— Escolha logo, é uma decisão fácil! Nunca houve consequência alguma para aqueles que escolheram isso, é o dever de um herói!

O que?

Qual a razão desse medo?

— É uma escolha fácil, vamos...

Estou com medo da morte?

— Impossível, eu já estava pronto para morrer muito antes de pisar nesse mundo

Vamos, aperte!

— Que esquisito, meu subconsciente está encontrando alguma suspeita nessa opção conveniente demais? — Perguntar não custa nada, — Sistema. Qual o preço?

[Nenhum.]

Pronto, as dúvidas foram sanadas, agora posso apertar

...

— Eu sou mesmo um completo covarde.

[Aceitar/Recusar]

Horas depois

— Você tinha que ver como eles foram incríveis! — Explodindo de empolgação, uma criança explicava tudo que aconteceu para Lucca. — O Tristan pegou a lança, voou e fez pow no tentáculo do monstro! Depois a maga fez um vuush em volta dela e com a invocação fez um boom! Derrubando tudo que voava na hora! O monstro respondeu fazendo um Bleergh pshhh grawl! Mas o assassino surgiu na cabeça dele jogando uma bomba maneira! Então o monstro fez um cabrum prii Pluft! E se dividiu em diversas cópias menores, infinitos clones! Então o ladino arremessou um artefato que brilhou e o Tristan finalizou com um golpe insano que fez uma cratera enorme! Apesar que se você quiser ver, não vai conseguir, porque a maga restaurou tudinho com a magia dela.

— Obrigado pelo entusiasmo... Acho que entendi.

— Mas em que caverna o senhor estava para não conseguir ver tudo isso acontecendo?

— Uma caverna bem escura e com um ótimo isolamento acústico. — Lucca lançou uma moeda para o garoto e seguiu andando. — Pelas minhas contas, isso deve ser o suficiente para comprar algum brinquedo por aí.

Heh, valeu!

Selena

“Queria muito voltar com vocês, mas houve um pequeno incidente na reserva venenosa. Até a próxima, baixinha!”

Alternando entre encarar a curta mensagem da Ampom e a nervosa expressão do Barão, ela disse:

— Vocês brigaram, não foi?

Robin

— E-eu só aceitarei porque é meu sonho seguir para onde você provavelmente irá, não porque concordo com coisa alguma que você fez ou fará! — Envergonhado, os dois apertaram as mãos, firmando o recrutamento não oficial. — Mas por enquanto, pode contar comigo para o que precisar, herói.

— Sinto muito pela confusão de antes — disse Lucca. — Espero que me impeça de fazer essas idiotices no futuro.

— Agora isso é problema seu, para você se resolver sozinho! Não conte comigo nessas coisas!

— O cristal está pronto? — o murmúrio de um cavaleiro do Barão, que carregava o artefato de comunicação, fez os dois prestarem atenção e se aquietarem por um instante. — Espera, o cristal não está pronto?... Mas temos um cristal?!

Encerrando a ligação, Lucca correu para perguntar:

— Qual o veredito?

— Vamos junto do grupo de bardos.

...

Com a despedida do grupo de aventureiros Lunares e a ingressão do grupo dos bardos viajantes Sordom, a viagem seguiu... Com duas famílias de grupos mercantes renomados, rodeando uma humilde carrocinha caindo aos pedaços, puxada por um burrinho velho.

Não por falta de propostas do Barão e do Visconde de transferirem o cristal para cavalos de primeira qualidade, mas pela insistência dos músicos.

Então, em uma cena cômica, uma expedição enorme rodeou e marchou aos passos de um burrinho e sua pequena carroça  

Contador de histórias

Os poderosos têm o privilégio de marcar os céus para sempre, com os nomes que desejam. 

Até hoje, a fissura gerada pela abominação de outro mundo, é um lembrete da glória de um homem que já partiu desse mundo, mas que ainda vive. Mesmo que esse homem nem seja o autor do feito relembrado até os dias de hoje.

Já aos miseráveis, até o que pensam que possuem. Tudo, tudo lhes será tirado.  

O semideus Lucca, o mesmo que possibilitou nossa ascensão, com razão, retirou até as glórias da história, daqueles que não merecem o que têm. 

Por isso hoje comemoramos a festa em homenagem ao panteão dos heróis. 

Para o detentor de todos os méritos, anualmente sacrificamos um dos marcados para a fenda. 

A única coisa que resta a eles, suas próprias vidas, são entregues pela mera possibilidade de agradar um semideus. A vontade de alguém morto prevalece sobre a morte de alguém vivo!

Agora entendem a gravidade da minha descoberta?

— Por acaso está advocando pelos marcados? — perguntou a professora, em um tom incrédulo com a heresia que acabou de ouvir.

— Para pensar que isso me ofenderia, vocês só podem desconhecer o legado que herdei! Meu mestre, se traçado até as antiguidades, possuía um título semelhante. Poucos sabem que ele também registrou todos os eventos que viu, em um caderno pessoal, secreto. Mas o peso de sua testemunha é igual, senão superior, a maioria dos filhos dos historiadores comuns. Impedir mortes vãs de sentido, isso é algo tão ruim?  

— T-tire esse homem daqui! Está louco!

Labra, também chamado de Jonas

— Ouçam com atenção, pois trago notícias de uma grande tragédia que há de vir, caso persistam no erro! Como puderam presenciar, tudo ocorreu como lhes contei que ocorreria, portanto, tudo que irei dizer também há de ocorrer! Larguem esses planos tolos de invadir a superfície, contentem-se com o grande espaço que já ocupam! Se fizerem isso, garanto pela minha própria vida que sobreviverão. Mas caso desobedeçam e ignorem meus avisos, a morte virá tomar tudo o que vocês têm, e virá logo!

— Saia daqui maldito humano! Já não conseguiu o que queria? Olhe só quantas vidas foram arruinadas por sua previsão imprudente!

— Se continuarem me ignorando, essa será a menor de suas preocupações!

— Como ousa...

Apedrejado, chutado e arremessado para fora da cidade, está escrito que ele foi resgatado e cuidado por seu único seguidor e discípulo que teve a coragem de partir para o submundo com ele.

— Fracassou? — perguntou um daqueles que abandonaram a ordem da Santa para o seguir em suas viagens à Terra dos marcados. — Por que segue insistindo em pregar aos que não ouvem? Diferente dos humanos, eles não têm razão para entenderem... 

— Um dia, haverá os que ouvirão. Como não sei quando, devo seguir falando, enquanto minhas cordas vocais permitirem. 

— Veja a hostilidade desse povo, um dia sobrará até para mim! Quem dera uma aposentadoria tranquila, por simples velhice. Da forma que as coisas vão se complicando, da maneira que você se enfia em lugares cada vez mais perigosos, com gente cada vez mais perigosa, você será comido vivo por um desses lunáticos!  

— Apropriado. Talvez até desejado por aquele que me renomeou, haha...

Rasmanov Galante

— Agora que ouviram meu testemunho, há quem duvide? O falso herói deve morrer!

— Eu me ofereço para ajudar na sua causa! Tenho o sangue dos Fortuna, tenho o direito de participar do banquete, mesmo não usufruindo dos privilégios nobres.

— Sua ajuda será bem-vinda, amigo!

— A jornada será longa, então partirei imediatamente. Me perdoe, mas não conseguirei ficar até o fim da reunião.

— Não se preocupe. É um pequeno detalhe perto de sua grande contribuição.

— Glória ao partido da paz!

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