Guerreiro das Almas Brasileira

Autor(a): Lucas Henrique


Volume 1

Capítulo 23: Lute como um mago

Os cadáveres avançavam e Marc vinha logo atrás, cobiçando usar sua magia em Oliver. Não havia uma abertura para um golpe direto no necromante. Para o jovem mago, a melhor chance era se reunir novamente com seus companheiros para atacarem juntos com toda a força.

No entanto, um deles já estava caído.

— Leanor, se concentra! Olha para mim.

Lucien tentava carregar a jovem vermelha para longe dos mortos. Ele a segurava todo desajeitado, com medo de tocar nos cabelos.

Ela cambaleava e parecia estar perdendo a consciência. Havia um corte fino no seu corpo que fazia uma diagonal da barriga até a clavícula. A respiração acelerada era familiar para Oliver. 

O mesmo veneno estava começando a entrar no corpo de Leanor.

Por um momento, ele se esqueceu de seu adversário. Só começou a correr na direção do curandeiro para ajudá-lo, até que foi parado por uma barreira de magia em meia lua.

— Tenho certeza que você me ouviu. Vai ter que me surpreender!

Oliver mal conseguia olhar para o necromante. Apenas a vida de seus companheiros importava. Leanor poderia morrer a qualquer momento e Lucien não seria capaz de se defender sozinho.

— Se você vencer, eu faço necromancia naqueles dois lá e deixo eles aqui para te fazer companhia. — O sorriso sádico de Marc era evidenciado pela luz do cajado em seu rosto. — Você consegue ver as almas dentro dos corpos apodrecidos, certo? Então vai poder aproveitar uma vida inteira com eles.

Um dos mortos aproximava-se pela esquerda do jovem mago com uma pequena faca na mão. A alma evidenciava o semblante de uma senhora. Ela pedia desculpas e mandava o garoto acabar com o sofrimento dela.

Quando ela chegou perto, seu corpo foi destruído por um murro raivoso de Oliver. A alma se desprendeu instantaneamente devido à carga enorme de energia espiritual no golpe, quebrando-se em pedaços.

Tudo o que restava no rosto do garoto era uma expressão selvagem. Seus olhos brilhavam como uma aurora. O necromante se deliciava com a raiva dele.

— Agora estamos conversando! Vamos, faça alguma coisa!

Oliver mal conseguia andar com tamanha energia espiritual acumulada a cada respiração. Queria dar o golpe definitivo, mas resolveu não sair do lugar até que Marc fizesse o primeiro movimento.

— Acabou seu tempo. — O necromante apontou seu cajado para a direção do jovem mago, comandando um ataque.

No entanto, nenhum dos mortos se mexeu.

Estavam completamente estáticos. Os poucos que conseguiam se esforçar para seguir em frente acabavam quebrando os próprios ossos em decomposição.

Marc encarava Oliver com preocupação. Seu braço continuava estendido em sinal de ataque, porém era tudo o que ele conseguia fazer.

— Nascer. Viver. Morrer. Progredir — sussurrou o jovem mago.

A energia espiritual saía de seu corpo para formar um gigantesco círculo de magia no chão. As palavras proferidas se destacavam entre as linhas que circundavam toda a extensão do campo de batalha.

— Essa é a lei! — Oliver correu na direção de Marc.

Ele levou os braços para trás e colocou o pé direito na frente. Antes que pudesse dar um golpe direto no corpo do necromante, acertou uma fina barreira que antes não tinha percebido que estava na sua frente. No entanto, isso não o impediu de arremessar o homem para trás com muita violência.

Depois do poderoso movimento, o garoto cambaleou para trás e sentiu falta de ar. Seu corpo havia sentido o impacto quase tanto quanto seu adversário. Os dedos tremiam e permaneciam contraídos.

Oliver correu em meio a tropeços antes que Marc pudesse levantar. Chegando perto de Lucien, o ajudou a colocar Leanor dentro da carroça. Nenhum dos dois precisou enfrentar os cadáveres ambulantes, que ainda estavam estáticos com o círculo de magia.

— Respira, Oliver, calma. — O jovem curandeiro tentava ajudá-lo a voltar ao normal.

A respiração ofegante em meio ao ar seco atrapalhava ainda mais. A cada inspiração, a boca secava e dificultava o trabalho.

Além de tudo, o jovem mago sentia estar perdendo a visão. Tudo estava turvo, às vezes duplicado. Seu coração estava mais alto que o resto do mundo à sua volta, batendo rápido e inconstantemente.

"Limite-se. O recolhimento é necessário."

Mais uma vez, a voz dos espíritos familiares estava presente.

"Um jovem inexperiente como você precisa parar de fazer do corpo um receptáculo e transformá-lo em condutor da energia espiritual. Vai acabar se matando. Entenda de verdade o que está diante de você."

A voz calma, mesmo surgindo só para fazer mais um sermão, ajudou o garoto a relaxar. Sua visão ainda não tinha voltado ao normal, mas ele começou a entender.

O corpo começou a sentir o desgaste da luta. A alma trabalhava mais com ele do que com a mente. Quando olhou para os mortos, os cadáveres não estavam mais lá. Somente as almas eram vistas. Estavam tão nítidas quanto pessoas realmente vivas.

Ao levantar-se, olhou para as mãos. Percebeu pequenas linhas bem finas que fluíam sutilmente pela superfície da sua pele. Às vezes, quando piscava, tudo aquilo sumia, mas ele sabia que ainda estava lá.

— Dupla vista — sussurrou.

 

 

Caminhando de volta para perto dos guerreiros, Marc começou a destruir alguns corpos dos mortos que estavam ao seu lado. Oliver via a luz daquelas almas serem absorvidas pelo cajado.

Em instantes, o necromante tinha derrubado a maior parte do seu exército por conta própria. Até mesmo os mortos que estavam perto do trio, pereceram.

O jovem mago conseguia ver nele os mesmos sinais que percorriam seu corpo, mas com a densidade de uma malha reforçada.

Marc não havia usado nem um pingo de sua energia espiritual. Ele apenas havia abusado do que conseguia absorver dos outros. O cajado se alimentava das almas para dar forças a ele, não era uma simples arma.

Mesmo que um necromante não conseguisse fazer tudo o que magos eram realmente capazes, havia uma clara vantagem. O grupo estava exausto enquanto ele não havia sequer se esforçado.

— Precisamos pensar em alguma coisa para acabar com isso rápido — disse Lucien. — Não sei quanto tempo eu tenho para conseguir tratar da Leanor.

— As defesas dele são muito fortes — respondeu Oliver, ainda um pouco ofegante. — Precisamos de um golpe conjunto bem poderoso. Algo para derrubar ele de vez. Mas precisa ser bem pensado, só teríamos uma chance de fazer dar certo, eu estou exausto.

"É porque está se limitando ao plano físico", respondeu a voz. Ela vibrava em sua mente com intensidade.

"Eu não vou conseguir segurar ele sozinho. E que tal umas explicações mais claras?".

"Sabe como o círculo de magia funciona?", respondeu a voz em tom de desafio.

"Preciso tentar responder?".

Oliver podia jurar ter ouvido a voz bufando em desgosto.

"É uma habilidade que envolve ter a energia espiritual concentrada em um ponto. Nesse caso em que você ativou, foi o chão. Depois, você pode usá-la para travar o fluido espiritual que está naquela área. Faça isso direto no corpo dele".

— Como é? — perguntou em voz alta, sem se dar conta.

— O que foi? — Lucien arqueou a sobrancelha.

— Não é nada, eu só...

"Recolhimento, concentração. Foque em entrar em sincronia conosco. Quando a hora chegar, você poderá permitir a nossa participação. Agora, defenda-se".

Ao olhar para frente, Oliver viu uma luz enorme se aproximando como um raio. Foi necessário mais um círculo de magia como proteção para salvá-los, talvez um dos últimos que ele conseguiria ativar. O jovem mago estava se esgotando.

Marc não falava mais nada. Seu rosto mostrava um riso de nervosismo. O olhar estático e focado em Oliver, misturando raiva e felicidade de uma maneira medonha.

— Lucien, precisamos achar um jeito de chegar nele. Eu tenho que tentar encostar naquele cara para aplicar minha magia. Não dá para fazer isso de longe. Consegue criar uma distração?

— Acho que sei o que podemos fazer — respondeu enquanto olhava Marc concentrar mais almas em seu cajado para outro disparo. — Vamos correr juntos e você ataca logo depois de mim.

— Certo.

A dupla correu alinhada na direção do necromante.

Marc olhava para os dois e parecia que estava escolhendo em quem atirar primeiro. Esticou o cajado na direção do curandeiro e outra vez uma torrente de energia espiritual foi lançada.

Oliver juntou as mãos e concentrou-se em fazer uma proteção para seu companheiro. O movimento já cansado do jovem mago fez ele perder o ritmo da corrida e cair pela exaustão.

— Continua, Lucien!

E Lucien não parou. Oliver vinha logo atrás, mas tinha medo do que viria a seguir.

Quando o jovem curandeiro se aproximou de Marc, fechou o punho para atacar. Deixou as chamas de seu corpo arderem em todo o seu braço e, em um movimento direcionado ao chão, criou uma explosão que o jogou por cima do necromante.

Um círculo de fogo acendeu em volta dos dois, mas com uso da dupla vista, Oliver sabia onde acertar. Mesmo não vendo o corpo de Marc, podia ver seu fluido espiritual.

Correndo através das chamas, ele se viu olhando direto nos olhos de seu adversário. Então, esticou o braço para tocar a testa do necromante.

Ele havia conseguido.

No entanto, logo após esse movimento, tanto Oliver quanto Lucien ficaram suspensos no ar. O jovem mago tentou se mexer e conseguiu segurar no braço de Marc. Ele trouxe o garoto para mais perto, encostando o cajado em seu estômago.

— Animação factícia — disse Marc, baixinho. — Não sei o quanto isso é novidade para você, mas aposto que isso aqui você nunca viu.

Ao apertar o punho esquerdo na direção de Lucien e girando-o, Marc fez com que o ombro do garoto se deslocasse. Depois de um urro de dor, o curandeiro foi arremessado para longe.

— Obrigado pela luta, moleque, mas acabou — Marc disparou um último ataque com o cajado, jogando Oliver para longe.

A sensação do jovem mago era de ter sido pisoteado por uma manada. Seu estômago doía tanto que ele quase vomitou. Depois daquilo, nem tentou se esforçar para levantar. Juntou as últimas forças que tinha para falar em voz alta:

— Por favor, façam a sua parte.

Logo após terminar sua fala, todas as suas sensações se perderam.

Não havia dor, mas também não havia som. O cheiro da podridão dos mortos, o gosto de sangue na boca...

Nada.

Aos poucos, voltou a perceber seu corpo, mas não conseguia comandá-lo. Sentia-se como um sonâmbulo. Quando a audição voltou, percebeu uma voz gritando:

— Como você ainda está de pé?!

Era Marc. Parecia estar logo atrás do garoto, mas ele não conseguia se virar para olhar.

Os braços de Oliver faziam um movimento estranho. Estavam ao lado do corpo, com os dedos bem separados e apontados para Marc, como um marionetista segurando fios.

"Sua derrota foi determinada... no momento que o garoto aprendeu a lutar... como a classe dele".

Era a voz dos espíritos. Pareciam estar ditando aquelas coisas para o corpo falar. A voz que saía de Oliver era fraca e rouca.

— Q-quem são vocês? — Marc estava cada vez mais assustado. — Parem, se não eu mat...

Tudo ficou quieto outra vez. Oliver podia perceber que seu corpo estava dizendo mais algumas coisas que eram ditadas pelos espíritos, mas não compreendia.

Em poucos momentos, voltou a si. Tudo estava acabado.

 

***

 

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