Vol. 1 – Arco 2
Capítulo 27: Mudança de Planos
Ravender City - 4:50 da tarde, quinze de Julho.
Em um piscar de olhos, o tornado de energia que envolveu Leonard e seus parceiros desapareceu junto da base subterrânea. Tudo deu lugar às ruas movimentadas de uma cidade, com carros apressados por todos os lados.
Surgiram no meio da estrada. Era uma cidade grande e urbana, dominada por prédios e estabelecimentos. O completo oposto da cidadezinha de Woodnation.
— Vocês querem morrer?! — gritou o motorista do carro logo à frente, buzinando fervorosamente. — Malucos!
Eles saíram correndo até a calçada.
— Onde é que a gente tá? — O investigador virou-se para Einstein. — Por que nos teleportou pra cá? Para começo de conversa, que lugar é este?
— A quarta e última coordenada — respondeu, ofegante. — Desculpa, entrei em pânico e acabei usando a minha magia de teleporte.
— Fez bem. O Panthael iria nos matar — disse Elin, apreensiva.
— Panthael? Aquele maluco sem olhos? Cês conhecem ele? — perguntou Leonard.
Prestes a responder, a artista teve a sua atenção roubada quando o irmão dela caiu no chão. Quando foi checá-lo, notou que ele simplesmente desmaiou.
— Maldição… — resmungou, agarrando ele pelos braços com ajuda do detetive.
Leonard o colocou sobre seus ombros e começou a carregá-lo. Como algumas pessoas começaram a olhá-los com estranheza, decidiram caminhar para fora da área.
— Aquele cara… Panthael, foi como cês dois o chamaram. Ele parece ter controle sobre aquela árvore. As raízes da árvore em um momento entraram em meu pescoço e começaram a me enfraquecer, como se estivessem sugando a minha vitalidade ou coisa do tipo.
— É… droga. Também estou fraca. É impressionante que ele tenha conseguido nos teleportar mesmo após aquela coisa também sugar a energia dele. — Olhou para seu irmão. — Deve ter usado tudo o que tinha.
— Pensando por esse lado, tá óbvio o motivo dele ter desmaiado.
…
Depois dos dois terem parado em um estacionamento, onde Elin conjurou um carro para que Leonard escondesse suas armas no porta-malas, eles foram até um restaurante para acalmar os ânimos.
Um jornal desinteressante passava na televisão do restaurante.
— Ai, ô, consagrada. — Leonard levantou a voz para uma garçonete. — Passa dois pratos de panquecas pra cá, com mel em cima, em.
Depois ver a garçonete assentir com a cabeça, ele voltou-se para a artista e novamente indagou:
— Fala aê, o que lembra sobre esse Fanta-sei-lá-das-quantas?
— Panthael — corrigiu. — Ainda não me lembro perfeitamente, mas as imagens estão na minha cabeça…
Os olhos da jovem foram tomados por uma penumbra deprimente. Gaguejou por uns instantes antes de voltar a falar:
— As imagens dele matando o meu irmão, Galileu.
— Mas… o quê?
Lágrimas começaram a percorrer o rosto de Elin.
— Então, o Galileu tá morto… droga… — murmurou o investigador.
— É…
— Não se lembra de mais nada?
— Eu juro que queria, mas não. A única coisa que sei é que ele é um verdadeiro monstro.
— Com certeza.
— Desgraçado! Me lembro com perfeição daquela imagem, dele agarrando Galileu pelo pescoço e absorvendo cada pedaço de suas forças, como se fosse alguma espécie de alimento. Quando acabou, o meu irmão caiu, incapaz até mesmo de falar a mim suas últimas palavras…
— Matar alguém dessa forma, tão cruel… ele deve odiar vocês.
— Esse é o pior de tudo. Quando o meu irmão já estava sem vida, olhei para o rosto daquele homem e não encontrei nada. Nenhuma gota de ódio ou prazer, nada que justificasse o seu ato. — Suspirou, tremendo. — Mas também, nenhum sinal de arrependimento. Apenas aqueles buracos vazios e um rosto sem expressões. Era como se o meu irmão não fosse nada importante, apenas um empecilho.
O sentimento desesperador que a garota exalava pairou sobre o detetive, que foi pego por uma mistura irrefreável de tristeza, raiva e impotência.
— As panquecas — anunciou a garçonete, entregando os pratos. Percebendo o péssimo clima, se afastou rapidamente.
— Valeu… — falou Leonard.
“Passei todos esses dias arriscando a minha para encontrar o Galileu, e no final, ele estava morto esse tempo todo…”, pensou o detetive.
Deixou escapar algumas lágrimas, que caíram sobre a panqueca.
“Tudo isso foi em vão? Todos os meus ossos quebrados foram à toa?” Minutos de absoluto silêncio dominaram a mesa.
A garota mastigou o alimento, raciocinando com o passar dos segundos. Admitiu:
— Não tenho certeza do que é, mas também me lembrei de outra coisa.
— O quê?
— Tenho o pressentimento de que já estive lá antes. Principalmente, em um corredor por onde passei com Einstein depois que nos separamos de você. E… rostos.
— Rostos?
— Aquele monstro, um homem loiro e nú, um homem de traje militar, outro com roupas antigas. Lembro de cada um deles envolta da figura de Panthael, como se…
— Fossem seus seguidores?
— Exato.
Os olhos dele palpitaram, refletindo sobre as citações dela. Era fácil de ver que tentava a todo custo conectar aquilo com os acontecimentos passados, e com algum esforço, conseguiu:
— “Homem loiro e nú”, “outro com roupas antigas”... esses foram os dois caras que estavam atrás do Einstein. Laertes e Hamlet. Tenho total certeza disso.
— Lembro de vocês os descrevendo de forma semelhante.
— Então, Panthael é o chefe que aquele hippie vagabundo tanto citava? Ele absorveu a energia do Galileu até a morte, e então, começou a perseguir vocês dois. Quando os encontrou, a primeira coisa que fez foi tentar fazer o mesmo com Einstein. Agora as peças parecem estar se encaixando!
— É. Pelo o que parece, ele quer arrancar as nossas forças. Como se fosse um vampiro. Por quê? Ficar mais forte?
— Sei lá, provavelmente, mas… Isso tem relação com aquela árvore gigante. Na real, acho que ele não quer exatamente a nossa vitalidade.
— O que ele quer?
— Ele quer… ele quer a energia que roubamos da árvore.
Elin paralisou por um instante, com um olhar fixado mirado para o detetive.
— Como assim?
— Aquela coisa que encontrei no laboratório do Amadeus, uma pequena árvore, ela era muito parecida com a árvore gigante que encontramos naquele lugar. Os aliados de Panthael começaram a me perseguir logo depois que a pequena árvore “cuspiu” em mim. Além disso, comecei a alucinar com plantas vermelhas muito parecidas com as plantas daquela árvore gigante. Ou seja: as duas árvores estão conectadas.
— Mas nunca entramos em contato com essa árvore, e também somos perseguidos.
— Amnésia, não tá lembrada? Cês podem ter entrado em contato com uma das duas árvores e agora não se lembram mais. Acho que é isso.
— Faz sentido. Quando você se esforça, até que consegue, em?
O detetive gargalhou, e então começou a focar em comer sua panqueca. Com a boca cheia, falou:
— Bem, o que temos certeza é que esse maluco não parece conseguir se descolar daquela árvore esquisita de jeito nenhum. Tá preso, por isso mandou os lacaios para virem atrás do Einstein.
— A minha teoria é que Panthael até pode sair daquela árvore, mas sabe que não deve.
— Por quê?
— Os poderes dele parecem estar todos relacionados àquela árvore e a floresta que a envolve — comentou, terminando de comer. — Talvez ele perca as habilidades ao se desprender dela, ou então, precise ficar nela para manter-se vivo. Talvez o que as raízes da árvore rouba da gente sejam os nossos nutrientes e ele esteja absorvendo para se tornar mais vigoroso. Foi o que parecia que estava acontecendo quando as raízes entraram no corpo do Einstein.
— É uma possibilidade. Afinal, aquele corpinho magrelo estava só o pó da rabiola. Ainda assim, a mão dele conseguiu agarrar o meu pescoço e me asfixiar sem muitas dificuldades.
— É, enfim… Está dispensado, detetive. — Ela começou a enxugar suas lágrimas.
Leonard quase levou a mesa consigo, esbravejando:
— O quê? Por quê?!
— Seu trabalho era encontrar o nosso irmão, e agora já sabemos muito bem qual foi o destino dele. É melhor se afastar de nós dois agora, antes que acabe sendo morto pelo governo ou pelo Panthael.
— O quê? Tá louca? Isso nem chega a ser uma opção. Já tô envolvido nisso até o talo. Mesmo se vazar agora, os homens de preto continuarão indo atrás de mim pelo resto da vida.
— Sim. Esse é o problema. Por nossa causa, eles estão atrás de você. Nem estamos te pagando e, mesmo assim, você terá que fugir do país para não ser preso ou morrer.
— Então não muda em nada.
— Claro que muda. Se fugir agora, talvez consiga ter uma vida tranquila daqui para frente. Mas se continuar com a gente, estará correndo o risco de morrer a qualquer instante.
A mesa rachou com o soco do investigador.
— Depois de tudo o que fiz, realmente acha que ligo? Realmente acha que busco uma vida tranquila?
— Quem não busca?
— Não tô afim de tranquilidade, Elin. Quero lutar e desvendar todos os mistérios que surgiram em minha vida desde que conheci o Einstein. Quero ajudá-los a vingar a morte do Galileu, porque sei que vão. E acima de tudo, quero viver uma vida de aventuras. Uma vida sem arrependimentos!
— Por acaso, acha isso tudo divertido?
Leonard levantou e encarou os olhos dela com uma tenacidade admirável. Com toda a honestidade do mundo, apenas respondeu:
— Sim.
“Como pode ser tão cara de pau?”, pensou Elin.
— Você é uma piada mesmo, em? Se é assim, ok. Só não vem chorar depois. Eu em.
— Ah, esqueci. — Estendeu a mão até a garota. Subitamente, raízes vermelhas começaram a nascer a partir de sua pele. — Do nada isso começou a sair de mim durante a luta contra o Panthael..
— O quê? Como assim?!
Os cidadãos de Woodnation estão desesperados com os acontecimentos que circulam por lá. Um grupo terrorista se alocou na cidadezinha para espalhar o caos, atirando bombas e matando oficiais.
A discussão foi interrompida quando Leonard captou o nome da cidade. Ele se virou para a televisão, suando frio ao ver a matéria do jornal.
O trio terrorista já tirou a vida de diversos agentes do governo. Apenas um deles teve a identidade descoberta e o seu nome é Leonard Mystery.
Observando o seu rosto estampado na televisão, junto dos rostos de Elin e Einstein, o detetive rapidamente agarrou o hamster pelo braço e saiu correndo para fora do estabelecimento.
— Ainda quer fazer isso?
— Acha que temos tempo pra perguntinha frescurenta? — falou Leonard, afirmando: — Precisamos ir até a quarta coordenada o mais rápido possível.