Vol. 1 – Arco 2
Capítulo 25: O Homem Sem Olhos (1)
Sala Subterrânea - 4:20 da tarde, quinze de Julho.
Dentro daquele cubo de metal envolvido por tralhas e uma esquisita flora carmesim, os três ficaram sem reação em frente ao monstro: três metros de altura, músculos explodindo em todo o seu corpo como se estivessem cheios de energia, uma pele cinza e um queixo bizarramente quadrado; tão quadrado e grande que nem mesmo o saco que cobria sua cabeça era capaz de escondê-lo.
Cerrou os punhos e novamente berrou.
A sua voz chegava a ser estridente e aterrorizadora, como se viesse de uma fera demoníaca guiada totalmente pela selvageria. As ondas sonoras reverberam pelo ar e, daquela mínima distância, agrediram os ouvidos dos três de uma forma desnorteante.
— Droga… — Quando o detetive se deu conta, seu ouvido estava molhado de sangue.
Com um misto de fúria e medo, sacou a Mystery Gun e disparou uma rajada de gelo contra ele.
A criatura colocou o braço na frente do rosto para se proteger, grunhindo quando sua pele começou a ser petrificada pelo imenso frio. O grito, que já era alto, virou algo horrorizado e insuportável.
Insuportável em um nível que fez o detetive parar de congelá-lo, já que a rajada não conseguia petrificar de uma vez o corpo gigante do monstro e os seus tímpanos seriam aniquilados antes disso acontecer.
O trio pensou em simplesmente virar-se e fugir, já que a criatura era enorme demais para passar pelo corredor atrás deles, que leva de volta ao escritório do bunker. Porém, demoraram muito para chegar naquele ponto, e sabiam que deveriam lutar antes de desistir.
Precisavam derrotá-lo para adquirir acesso aos cinco corredores protegidos pelo monstro.
Então, o grito cessou e ele atacou.
Depois de firmar os seus pés de Golias sobre o chão, a fera deu um simples pulo.
A pressão gigantesca fora o suficiente para rachar o piso metálico e jogar o seu corpo abismal na direção dos três.
Voou como uma bala de canhão titânica e surgiu na frente deles em um piscar de olhos!
O punho monstruoso dele se fechou, praticamente se tornando uma bola de demolição. Foi de cima para baixo em uma velocidade surpreendente, para esmagar os três em um único golpe.
Os três, dominados por um primal instinto de sobrevivência, saíram correndo. Leonard foi para um lado, os irmãos para a direção oposta.
A bola de demolição criou uma cratera meteórica no piso. Mesmo sem atingi-los, a força da besta criou uma onda de destruição que veio na forma de uma poderosa ventania. Eles foram subjugados pelo poder dos ventos, sendo jogados brutalmente contra a parede.
— Merda… — resmungou Leonard, já ofegante.
Os irmãos estavam caídos no outro extremo da sala. Pensou em agarrar a lança-granadas amarrada em seu peito, mas sabia que aquela sala era pequena demais para uma explosão. Então, sacou o fuzil e começou a disparar contra o inimigo.
A chuva de projéteis de energia foi contra o monstro, uma bala atrás da outra. O berro de dor voltou com tudo, mas o investigador não tirou o dedo do gatilho. O grito só terminou com o fim da munição.
Com o fim dos tiros, o enorme corpo ficou cheio de pequenos sangramentos, como se atingido por uma horda de agulhas — mas nada além disso.
Ele apenas grunhiu e se preparou para saltar contra Leonard, que com a coragem de um guerreiro, largou a arma — que ficou suspensa, amarrada ao seu corpo — e estalou os punhos, pronto para lutar como um guerreiro de verdade.
Correndo.
— Fui! — Usou os seus dotes atléticos para sair em disparada, como um verdadeiro maratonista, entrando em um dos corredores que o monstro deixou desprotegido ao ir atacá-los. — Sou um detetive, vou fazer meu trabalho e encontrar alguma evidência pica. Boa sorte aí pra cês!
Adentrou correndo o primeiro corredor, gargalhando desesperadamente. O som de sua voz foi diminuindo à medida em que se distanciava.
— Mas é um cagão, em? — zombou Elin, se levantando.
— Ele fez certo. Acho que podemos lidar com esse cafajeste sozinhos — disse Einstein, gerando um orbe mágico de chamas na palma de sua mão.
O monstro, prestes a correr atrás do fujão, foi atingido pelo fogo. As chamas logo se espalharam por seu corpo e outro berro ensurdecedor saiu de sua boca.
— Para de ficar chorando e vem atrás da gente, bocó! — Dito isto, Einstein saiu correndo para dentro de um dos corredores junto de sua irmã.
Tomados pela adrenalina, eles adentraram o terceiro corredor e percorreram pelo breu infinito. Correram muito rápido.
Foi apenas quando a sala da onde saíram virou apenas um pequeno ponto que aparecia quando se olhava para trás, que a gritaria do monstro cessou.
Ao olhar para trás, o hamster viu a enorme silhueta da criatura no início do corredor.
Se virou e continuou correndo. Subitamente, um tremor.
Olhando novamente para trás, percebeu que o ser agora corria na direção deles. Era como um touro enfurecido e, em questão de segundos, comeu metade da distância entre eles.
— Chega. Não adianta correr — falou a artista, tirando um lança-mísseis de dentro do seu caderno e se virando. Rapidamente, ajoelhou-se e mirou no alvo. — Temos que destruí-lo enquanto temos tempo!
— Elin! Estamos embaixo do chão, e se tudo desabar sobre nós dois?!
— Esse lugar é feito de metal. Não vai acontecer.
— Você não pode fazer isso. Eu quem deveria ser o sem noção da relação!
— Para de bobagem. Todo mundo aqui é maluco!
Demorou para perceber que de nada adiantaria falar, pois ainda tentava pará-la quando o míssil foi disparado.
O projétil de sua irmã voou precisamente até alcançar o inimigo. Mas ele agarrou o objeto com a mão, como se não fosse nada. Em seguida, flexionou as pernas e saltou.
— O quê…? — Quando Einstein se deu conta, o monstro já estava caindo em cima dos dois, com o míssil em mãos prestes a explodir. — MACACOS ME MORDAM!!!
Com uma reação desesperada, se virou, agarrou a cintura de sua irmã com pressa e gerou um orbe de ar que foi disparado para trás.
O orbe mágico se dispersou após voar por poucos metros, gerando uma poderosa onda de ar que arremessou ele e sua irmã com uma força avassaladora.
Eles voaram por metros e metros, como se tivessem sido arremessados por uma catapulta. Quando o míssil explodiu nas mãos do monstro, os dois já se encontravam muito distantes.
Os dois acabariam pousando de forma violenta se não fosse pelo colchão rapidamente desenhado e materializado por Elin, surgindo magicamente debaixo deles e amortecendo a queda. O colchão entrou em seu caderno após isso.
Toda a distância percorrida devido ao artifício mágico se demonstrou útil, pois embora o corredor permanecesse naquele breu de escuridão, era possível ver uma saída há alguns metros de distância.
— Ele ia explodir a gente, mas acabou se explodindo! — exclamou o feiticeiro, gargalhando como uma criança. — Bobão demais.
— Pois é — disse Elin, pensativa. — Devemos voltar e nos encontrarmos com o Leonard, ou acha melhor seguirmos em frente?
— Agora que aquele lá morreu, acho que é melhor nos encontrarmos com ele. O que impede daquele bicho feio ser só mais um de vários monstros? É melhor ficarmos juntinhos.
— Então, vamos dar meia-volta. — Ela novamente levou o lápis até o papel de seu caderno.
Alguns segundos depois, uma moto saltou para fora do caderno e pousou na frente deles. Elin sentou na frente e o hamster se sentou atrás, segurando com força a cintura dela por puro medo de cair.
A moto partiu loucamente pelo corredor. O vento bateu no rosto deles, assim como a sensação de estar próximo de morrer atingiu o coração de Einstein. “Como ela conseguiu bater a moto três vezes em um corredor em linha reta? Meu Deus, já tá saindo fumaça!”, pensou, até que o veículo se chocou com uma parede de músculos.
A mão do monstro levantou. Ao bater de leve no chão, uma violenta onda de vento surgiu e os jogou de novo. Eles saíram voando para o lado oposto que seguiam.
Voando muito rápido. Os segundos se passavam e a saída do corredor estava dezenas de metros mais próxima. Se não morressem pela explosão que surgiria da moto ao chocar-se violentamente com o chão, seus corpos virariam purê assim que pousassem com aquele mesmo nível de violência.
— Elin, por favor, pilote isso direito! Temos que cair reto!
Seguindo o pedido, a artista sorriu e deu início a uma técnica que inventou imediatamente: o giro mortal.
“Esse nome não está me deixando mais aliviado!”, pensou o hamster.
Dando um giro de 360 graus com o veículo radical, sua irmã acumulou força e velocidade até largar a moto e chutá-la para trás. Por fim, arrancou aquele colchão de dentro do seu caderno e o usou novamente para amortecer a queda dos dois.
— Afê, fez a mesma coisa duas vezes? Que falta de criatividade para uma artista — resmungou o irmão, decepcionado.
— Fiz um giro radical e acabei de salvar a sua vida, mas você ainda quer criatividade?!
— Não entendi bulhufas do que disse. — Isso foi culpa do som da moto explodindo lá atrás.
— Tanto faz. Aquele monstro ainda está vivo, precisamos ir embora. Não dá mais para voltar.
Ao se virarem, puderam se deparar com o ambiente fora do corredor. Um corredor mais grande e largo, igualmente escuro, coberto de paredes de vidro com pequenas entradas que davam acesso a salas brancas totalmente vazias.
Nenhum sinal de vida em todo o ambiente.
— Mas que lugar é esse, Elin? Juro que já vi esse lugar antes.
Ela permaneceu quieta, com seus olhos fixados na direção de uma das salas brancas.
— Ei?
Os olhos dela foram tomados por um cinza nebuloso. Não se moveram um único milímetro, analisando e absorvendo cada canto da sala de forma aterrorizante. Ergueu o dedo indicador e mirou até o ambiente:
— Você não… não se lembra?
— Elin!
Quando percebeu, o monstro selvagem já sobrevoava sua cabeça, após ter voado do corredor até ali com um salto. Viu ele erguer ambos os braços e levá-los em sua direção, como dois prédios em queda.
Tentou mover suas pernas, mas estava muito abatida para isso. Só se moveu quando foi chutada por Einstein. Os braços do monstro atingiram o chão e a ventania jogou os irmãos contra paredes opostas.
— Merda… — resmungou o hamster, caído dentro do quarto branco.
— Einstein, sai daí! — Já era tarde demais.
Quando Einstein se deu conta, o monstro atravessou o corpo contra o vidro da sala. O vidro não resistiu e a criatura se enfiou dentro do cubículo, deixando ele contra a parede.
Olhou para cima e encarou o rosto encapuzado da criatura selvagem. Não conseguia sentir nada além de uma raiva primitiva emanando do pedaço de pano, como se aquilo fosse apenas uma força da natureza. Inabalável, mas sem pensamentos.
Qualquer brecha para escapar era um pequeno espaço entre aquele corpo enorme e as superfícies da sala. Só que, se tentasse sair por lá, um movimento por parte do monstro seria o suficiente para transformá-lo em papa.
Sem mais tempo para pensar, viu a mão da criatura se erguer, preparada para esmagá-lo como uma mosca.
Sabendo que o sucesso e a morte estavam em uma corda bamba, Einstein decidiu usar os seus poucos neurônios para pensar em como sair daquela situação.
— Xablau! — Atirou uma esfera de chamas contra o rosto da criatura.
A gritaria infernal novamente começou. O monstro, incapaz de ver e sendo domado pela dor das chamas, começou a berrar e se debater loucamente na sala. Einstein aproveitou desse surto e rapidamente saiu correndo, passando por uma das brechas e saindo da sala.
Quando encontrou Elin, que já estava prestes a invadir a sala, a agarrou pelo braço e correu com ela para se afastar. Elin teve uma ideia na mesma hora, se soltando das mãos de seu irmão.
— Para com isso. Ele é indestrutível, temos que fugir!
— Não precisamos destruí-lo — falou, tirando o seu lança-mísseis de dentro do seu caderno. — Precisamos explodi-lo!
— Catapimbas, a sua criatividade acabou mesmo, em?
— Calado!
Então, a garota disparou o míssil na direção da sala onde o monstro se encontrava quase enclausurado. A explosão foi enorme, mas não o bastante para chegar até eles.
Então, desenhou e materializou outro míssil. Atirou de novo.
E de novo.
E de novo.
E de novo.
Após repetir o processo cinco vezes, o quarto desmoronou sobre o monstro, já enfraquecido.
“Que exagero!”, pensou o hamster. Por mais que fosse uma atitude exagerada, o monstro enfim parecia ter parado de se mover. Havia sido detido.
De qualquer forma, Elin invocou outra moto e os dois zarparam do lugar o mais rápido possível. Precisavam se reencontrar com o detetive antes que algo ocorresse com ele.