Fios do Destino Brasileira

Autor(a): PMB


Volume 1

Capítulo 25.2: A Arcanjo Inerte

Pluvia Paradisi

A grande onda de flechas avançou contra o trio em alta velocidade, e Reiko estava pronta para o que viesse. Murmurou algo que Togami e Hanako não foram capazes de compreender, mas que fez seu escudo reluzir como se fosse atingido pelo sol da manhã — o objeto flutuou na frente deles, expandindo sua área para cobrir exatamente a região do ataque.

O rapaz acreditou ser sua chance para uma investida direta. A chuva dourada ficou para trás conforme ele avançou contra Midorima.

— Espada do Amanhecer… — O metal respondeu ao seu chamado, brilhando e aumentando o fio. — Lâmina do Paraíso!

A situação não seria tão simples quanto ele achou. A Guardiã fugiu do alcance de sua arma com tremenda facilidade, posicionando-se longe o suficiente para realizar mais um disparo. Sua tentativa, porém, foi frustrada ao sentir a aura de Hanako se moldar em seu próprio ataque.

— Disparo de Hemlock!

Scutum de Caelo.

Precisamente formado no ponto-alvo de Hanako, a fina e sólida parede de luz pulverizou a flecha que vinha em sua direção. Pelo canto do olho, pôde ver Togami se aproximando em alta velocidade com a lâmina em riste — um movimento ainda mais veloz de sua mão esquerda conjurou uma esfera de luz na palma desta. Conhecedor de técnicas envolvendo o elemento, o garoto fechou os olhos por instinto.

Fortis Lux. 

Ao comando da militar, até o sol foi ofuscado por sua magia, que atingiu em cheio ambas as princesas. Reiko sentiu os olhos queimarem, como se o brilho solar houvesse carimbado suas pupilas em punição aos seus pecados. Quando o efeito passou, Midorima não mais estava no campo de visão de qualquer um deles. Não foi necessária ordem nenhuma para os três se agruparem, de costas encostadas umas às outras para cobrirem o máximo de pontos cegos possíveis.

O que o trio não contava era que Midorima estaria acima deles — quando o astro-rei brilhou mais forte sobre suas cabeças, sentiram o pânico corroê-los por dentro. Com suas asas brancas abertas e sob a luz incandescente da esfera de energia criada por ela, Midorima assemelhava-se a um verdadeiro arcanjo: bela, intocável e letal. O olhar dela era de uma frieza que beirava o menosprezo, um ser superior que observa os demais rastejarem sob seu brilho em busca de abrigo. 

Sol Poenae — sussurrou a mulher, enfim liberando a enorme quantidade de mana em direção a eles.

Togami e Hanako, cada qual à sua maneira, conjuraram suas próprias barreiras para tentar frear o avanço avassalador da Guardiã inimiga. Ambas as defesas mágicas foram devoradas pelo clarão sem oferecerem resistência significativa a ele. “Acabou”, pensaram simultaneamente.

Não viam mais sentido em lutar contra o destino traçado pela Guardiã de Rafael. Logo, quando Reiko jogou seu escudo para longe, acharam que ela havia admitido a derrota, como eles já tinham feito. Desistir, contudo, era uma palavra cujo significado não existia em batalha para um Chiwa, e a princesa não seria diferente. 

— Ó, Atena, Salvadora dos Homens, Matrona do Conhecimento e da Guerra… 

A aura dourada circundou o corpo dela e, depois, a mão erguida ao céu. Seus amigos puderam ver o cabelo castanho dela voar pela emissão súbita de doses imensas de mana, ao passo que o ar tremia ao receber toda aquela energia de uma só vez. Por outro lado, Midorima analisava-a com atenção.

— Conceda-me a força que preciso proteger o que amo e sobrepujar meus inimigos! 

A cada palavra pronunciada, o conjunto de aura disforme sobre a palma de Reiko aglomerava-se de maneira mais e mais coesa. O formato vago de um escudo fez a militar compreender a jogada desesperada da herdeira, arrancando dela um sorriso incrédulo. Já ouvira aquele feitiço antes. 

— Isso só pode ser…

Escudo de Palas!

O impacto entre a barreira criada pela nobre com a esfera de luz gerou uma onda de choque poderosíssima, espalhando-se muito além da área de combate ou mesmo da região afetada pelo Expurgo Reluzente de Togami. Ainda assim, quase nada da massiva técnica ofensiva de Midorima chegou a atingi-los em terra — estavam a salvo daquela vez, graças à incrível proteção de Reiko.

O corpo da menina bambeou por um instante antes de cair, inconsciente. A queda só não ocorreu pois Togami segurou-a por instinto, em seguida colocando-a gentilmente para repousar sobre o solo desgastado. Pela ausência de mana em seu estoque mágico, a dupla restante tinha certeza de que aquela técnica fora a única alternativa racional que ela encontrou para terem uma chance de vencer. Muito além de exibir sua capacidade defensiva, Reiko depositou neles suas fichas para a vitória.

— Obrigada por confiar na gente, Rei — murmurou Shinwa, acariciando sua bochecha de leve. — Alteza, conto com você para vencermos essa.

O sacrifício da princesa tornou-se o combustível para seus colegas que seguiam de pé. Midorima notou a maneira que a espada platinada de Togami movia-se com mais rapidez em cortes cada vez mais agressivos, enquanto as flechas de Hanako pressionavam-na a parar seus contra-ataques.

“Um golpe! Tudo que preciso é acertar um golpe!”, motivou-se o jovem ao saltar na direção da general. Seu corte horizontal foi bloqueado por mais um escudo de luz perfeitamente colocado entre ele e seu alvo, obrigando-a a se afastar de novo.

Apesar da explosão de mana em seu interior, estava ciente de que havia uma bomba-relógio atrelada à dupla. Se Midorima prolongasse o suficiente, perderiam pelo esgotamento perante à superioridade técnica da mulher, independente do quanto se esforçassem. A curva de habilidade era desleal demais.

Enquanto Togami estava ocupado tentando penetrar, a qualquer custo, a guarda alta da militar, Hanako tinha tempo para visualizar cada movimento dela de maneira isolada. Cadenciava seus disparos sem cessar, mesmo sem sucesso em qualquer um deles — Kochiwa tinha reflexos impressionantes, afiada como espinhos de uma rosa. 

Quer dizer, pareciam reflexos rápidos, mas algo chamou a atenção da princesa das fadas em meio à luta. Algo que talvez fosse capaz de dar a eles a vitória, embora arriscado demais para ser considerado uma opção prudente. Extasiada e um tanto nervosa por sua descoberta, Hanako parou de atacar.

— Togami, recue! — O garoto acatou a ordem de sua única companheira sem hesitar. — E-Eu não tenho certeza do quão c-certo é isso, mas preciso que você descarregue toda sua mana.

— O quê? — gritou o garoto, esquivando de um feixe de energia no último instante. — Pirou?

— Eu descobri a fraqueza dela! Por favor, acredite em mim só dessa vez!

Shinwa ponderou o quanto deveria depositar de confiança naquele plano absolutamente incoerente. Dentro de sua própria cabeça, perguntas e mais perguntas surgiram: o que Hanako viu naquela ideia sem pé ou cabeça? Se o plano desse errado, conseguiriam se recuperar a tempo de tentarem um novo duelo? E se falhassem nesse também? 

O olhar dele recaiu sobre o corpo inconsciente de Reiko. Ela confiou neles a chance de vencer ao dar tudo de si, mesmo sem um plano em mente — como ele não poderia fazer algo semelhante? Não tinha como hesitar, não agora. Era isso ou esperar Midorima subjugá-los com seu refinado controle de mana.

Concentrou-se um pouco e, como ordenado, deixou sua mana fluir para fora do seu corpo. Hanako foi surpreendida pela quantidade exorbitante que preencheu o ambiente, circundando o rapaz em uma densa camada branca. Para a estratégia dela, quanto mais tivesse, melhor, mas também significava que o tempo que tinha para agir seria mais curto.

— Espada do Amanhecer! — Togami ergueu sua arma para o alto, e a mana se dirigiu para ela. — Aurora Incandescente!

Perante a lâmina infundida em magia, Midorima viu-se pressionada a ultrapassar, nem que fosse apenas um pouco, os limites impostos pela Longinus à sua própria aura. Pelo menos, foi o que o espírito de Rafael, o Segundo, sussurrou aos seus ouvidos — era como se a mana de Togami gerasse nela um sentimento de rivalidade.

Um tom turquesa bem chamativo pintou em partes o branco da mana de Togami, disputando o espaço de influência com ele, conforme a general puxou uma singela flecha branca em seu arco prateado. Assim como ele, seu poder concentrou-se no objeto, cujo brilho fulminante pretendia esmagar seu oponente sem mais aberturas.

Sagitta Angelica!

A mulher subiu o tom pela primeira vez desde que a conheceram, despejando toda a energia contra Shinwa ao liberar a tensão do fio. Espada e flecha iniciaram então uma disputa de força ferrenha — Midorima tinha toda a atenção sensorial no embate mágico à sua frente, embora sua percepção de mana estivesse cobrindo seus pontos cegos.

O ataque de Hanako, porém, subverteu todas as expectativas dela. Por entre o turbilhão de energia que se encontrava em frente à mulher, uma única flecha sem qualquer mana imbuída atingiu seu ombro esquerdo, fazendo-a parar de se concentrar em sua técnica. As técnicas de luz se nulificaram, visto que seus conjuradores pararam ao mesmo tempo, e o exaurido Togami encarou a princesa.

De joelhos ao chão, lágrimas de alívio escorreram pelas laterais do rosto de Koufuku, que rapidamente as enxugou. Não podia acreditar que sua observação duvidosa se provou correta durante um combate acirrado como aquele. Tinha de admitir que, em grande parte, foi sortuda demais em sua aposta. Os pés pequenos, cobertos por botas negras com detalhes turquesa, da Guardiã de Rafael apareceram no seu campo de visão.

— Como você percebeu?

Midorima, já recuperada da perfuração, observava-a com um misto de orgulho e frustração, como se estivesse desacreditada que caiu num truque “simples” de ilusão — sua especialidade, para sua maior amargura. Amistosidade e curiosidade prevaleciam em suas palavras, apesar disto, dando espaço para Hanako ser sincera em sua resposta.

— S-Sei que arqueiros são muito mais propensos a serem focados no que veem, mas percebi que você não virou a cabeça em momento nenhum para se defender minhas flechas envenenadas — explicou Hanako, envergonhada. — A-Apostei que você não estaria vendo, mas sentindo elas chegarem em você.

— Tae já disse isso pra mim tantas vezes… Acho tão cansativo ter que fazer mais que o inconsciente — resmungou ela, de olhos fechados. — Como não preciso interagir com os meus alvos, nunca tentei consertar isso. Mas se até alunos viram, acho que preciso começar a mudar. Mais importante que isso…

A Guardiã de Rafael estendeu as mãos, envoltas pela aura turquesa, para Togami e Reiko — não demorou muito para a princesa ateniense levantar-se em um salto, energética e confusa. Os olhos azuis dela alternaram entre seu amigo, Hanako e Midorima, agora desarmada, e um grande sorriso nasceu pelos cantos de seu rosto.

— Ei, bobona, vence…

O garoto não teve tempo de provocá-la, visto que Reiko se jogou sobre ele em um abraço apertado. Togami pensou qual seria a melhor maneira de lidar com a proximidade que estava queimando seus neurônios em vergonha e desconcerto, mas tudo que conseguiu foi abraçá-la de volta por instinto.

— Obrigada, vocês dois são incríveis… — O murmúrio quase inaudível quebrou qualquer linha de pensamento que ele construíra nos últimos instantes. — Eu fiquei com tanto medo de estar agindo por impulso… Vocês conseguiram de verdade, eu ainda não acredito!

Hanako foi a próxima vítima do ataque carinhoso da Chiwa, deixando Togami de canto. Observava-as papear — e Hanako corar vez ou outra com a chuva de elogios que caía sobre ela de ambas as jovens — em silêncio e contemplação. Não que estivesse receoso de não passar antes, mas entre acreditar ser possível e realmente acontecer havia um espaço considerável. Sentiu até seus ombros relaxarem da enorme pressão que carregavam até ali.

Sua mente tranquila, porém, foi inundada por uma imagem, repetida um milhão de vezes. Olhos, milhares deles, abriram-se dentro de sua cabeça, encarando algo além do véu de sua  compreensão, quase ignorando sua existência. Uma náusea súbita o acometeu e o levou ao chão em pouco menos de cinco segundos.

— Peço desculpas pelo que minha forma material lhe causa — sussurrou a conhecida voz de Metatron. — Você está um passo mais próximo de seu destino, Shinwa. Talvez seja mesmo você. Por isso, eu preciso que você sinta o que de fato lhe aguarda.

A onda de informação sobrecarregou o cérebro do garoto. Não conseguiu captar em que momento desmaiou ou se suas amigas perceberam a perturbação dele diante do que lhe era exposto. Tudo que soube é que seu corpo deixou de processar quaisquer estímulos que vieram até ele, deixando-o à mercê do mar de escuridão dos olhos grotescos dentro de sua mente.

Entre delírios febris e memórias de algo que ele não se lembrava de ter ocorrido, Togami abraçou a inconsciência como quem recebe um velho amigo, afogando-se na escuridão criada pela sua “Bênção”.

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