Farme! Brasileira

Autor(a): Zunnichi


Volume 2

Capítulo 65: Outros

Lucas levou bastante tempo para explicar tudo a Hurrto, a começar pelas funções da armadura no qual nem o próprio criador desta sabia existirem.

O raio de gelo, por exemplo, era algo que não lembrava nas instruções do item. A descrição também da forma que a armadura assumia o interessou.

Hurrto não tinha um controle total das funções que os itens obtiam, mas podia ter uma ideia ao avaliar materiais e realizar certas técnicas de forja.

Por isso, era bastante interessante saber que haviam fatores ocultos na armadura, e que certas coisas foram além de sua expectativa, tal como o traje submerso.

As descriçoes das propriedades de certos objetos ficava sempre incompleta, algumas vezes até subjetiva, e como a armadura não cabia nele, Lucas era sua “cobaia” de testes.

Claro, ele nunca diria isso em voz alta. O anão alisou a barba conforme escutava a história e às vezes levantava as sobrancelhas em desconfiança.

Ao chegar na parte das entidades, citando que entrou em contato com duas recentemente, as coisas tomaram um rumo diferente nos pensamentos do anão.

— Sir Lucas, você não conhece muito desses deuses e de como funciona o seu guia, correto?

— Mais ou menos. Entendi que há deuses e eles oferecem a certas pessoas um tipo de poder especial que se resume a essas telas, mas cada um se comporta de maneira individual ao outro. Também sei que há diversas dimensões e mundos, e como eles existem, acabam entregando essa coisa só para mortais que lhe chamam atenção. Eles querem manter determinadas pessoas vivas pelo máximo de tempo possível porque se divertem olhando-os usar o sistema.

— É bom você ter esse tanto de informação, mas tem coisas que você não sabe… — Ele arrastou o dedo para o lado, abrindo sua tela de sistema vermelha. — Veja bem, eu tenho o meu Guia, e Apolo foi quem me deu. Sendo assim, você também tem um “deus guardião”, no entanto eles constantemente olham para outros seres como nós, e podem acabar tanto um Guia quanto retirar seus próprios poderes num piscar de olhos.

— Podem? Então isso quer dizer que elas podem entregar o sistema de formas diferentes. Eu recebi depois de terminar um jogo, como o senhor Hurrto recebeu?

— Eu saí numa missão para coletar recursos, acabei caindo numa caverna subterrânea durante minha exploração nas minas e me deparei com um túmulo de um anão lendário. Depois de ler as inscrições, recebi meu Guia.

— Caramba, isso é foda… — Comparado a forma como Lucas recebeu o sistema, parecia até que foi dado a ele de graça e sem muito pensamento. — Certo, e você também tem algum contato com o deus do fogo, não é? Como você sabe que está agradando a entidade que te protege?

— Normalmente, ele envia mensagens ocasionais para conferir como estou. Durante o tempo dentro do Leviatã, eu fiquei num estado inconsciente, então o deus Apolo pulou de felicidade ao descobrir que sir Lucas me libertou. Desde então, tenho recebido mensagens e pedidos para forjar determinadas ferramentas, mas só coisas básicas ou simples. Você não recebeu coisas assim? Mensagens, pedidos, missões…

— Mensagem nenhuminha, só recebi de outras, como da Artemis que falei e do tal deus do gelo… Hrymir, eu acho. Também ganhei algumas mssões, mas recentemente não veio nenhuma… Ah! O que eu também sei é que temos tipo um administrador, né? Uma pessoa que mexe no sistema para nós, que atualiza e configura de acordo com os desejos e personalidade da pessoa.

— Temos…? Disso eu não sabia. Achei que todos eram diferentes entre si porque éramos pessoas diferentes. O que esse administrador faz?

— Ele é um gerente que nos analisa para oferecer nossa capacidade máxima. O seu Guia é de ferreiro porque você queria ser o melhor ferreiro, né? Então o seu gerente vai te dar missões relacionado a forja de itens para alcançar isso, aí você ganha alguma recompensa por isso. Já o meu é diferente, eu normalmente preciso realizar exercícios físicos para ganhar algo.

Hurrto ficou silencioso, analisando as palavras como um ferreiro que olhava atentamente para o fogo da fornalha. 

Era bastante estranho imaginar que uma pessoa o vigiava e os pedidos do deus Apolo na verdade eram desse tal gerente. Será que sua privacidade estava desde sempre comprometida e nunca reparou?

Os dois discutiram por mais um tempo, alternando entre os tópicos frequentemente e teorizando o qual era o suposto limite do sistema, e como as outras entidades talvez afetassem o futuro dele.

Hurrto também aproveitou para explicar algo sobre outros escolhidos. Um deles foi o homem desgrenhado tirado da tal masmorra de antes, que quase matou Solein.

Ele disse que algumas vezes aparecia gente assim, que precisava ser eliminada de alguma forma por ter ido além dos ideais propostos pelo deus que o escolheu.

A pessoa que o fazia era recompensada, os deuses não gostavam de deverem favores, então se livravam logo com uma moeda de troca para que depois não fossem cobrados ou tratados como injustos.

Essa era pelo menos a persona comum dessas entidades. Alguns não ligavam para o que acontecia com seus escolhidos, outros só falavam que a pessoa fez o certo e deixava por isso.

Os perfis mudavam bastante quanto mais você analisasse o panorama, levando em conta o número gigantesco de deuses e entidades poderosas.

Além disso, o deus guardião poderia sim dar algum benefício a outro se ajudasse um dos seus protegidos, mas nunca interagia de maneira direta.

Na época em que Hurrto explorava outras dimensões com a ajuda do Guia para obter novos materiais e construir equipamentos ainda melhores, ele se deparou com outros desses escolhidos.

Era um tipo de sociedade oculta, muitos só entravam em contato uns com os outros por meio de um encontro aleatório numa dimensão aleatória.

— Existe sim um lugar de encontro para esses escolhidos, no entanto, é uma masmorra de alto nível, logo poucos chegam lá e quando chegam acabam sendo submetidos a uma vigorosa revista para saberem se foram ou não afetados por doenças e poderes místicos ou mentais de outros mundos. Eles fazem isso para se proteger, sendo sincero.

— Entendi. Alto nível você diz o que exatamente? O número mesmo?

— Não, digo no significado de contribuição, poder e influência. Veja bem, eu posso ir para lá, mas não sou mesmo forte, meus equipamentos são. Porque consigo construir equipamentos tão poderosos eu tenho uma contribuição e poder específicos, o que me faz adentrar a masmorra sem problema.

— Ou seja, se eu acabar farmando muito de alguma coisa, eu posso ir lá… Cacete, vejo isso demorando pra caramba.

— Talvez, vai depender do quanto tempo você levará… Bem, eu não me importo tanto porque já consigo ir lá e não quero. Também viverei muito tempo, mesmo parecendo velho.

— E por que você não vai lá?

— Porque eu já estou “desaparecido” há alguns anos e os caras daquela maldita masmorra vão suspeitar de mim se eu voltar, não estou afim de passar por problemas ainda.

Lucas suspeitou que teria mais coisa escondida nisso. Era uma razão meio superficial demais para ser acreditada, especialmente quando o anão falava bastante.

O rapaz suspirou e começou a retirar a armadura sobre o moletom, tinha sido uma péssima ideia colocá-lo, porque além de apertado tinha ficado meio quente por estarem perto da fornalha.

Dando de ombros, Lucas olhou para o lado de fora pela janela. Nevava bastante, e logo seu treinamento teria inicio novamente. Ele bebeu o frasco de suplemento.

— Ei, Hurrto, agora que eu pensei… você acha que eu daria um bom ferreiro?

— Por que isso de repente? Eu acho que Sir Lucas daria um ótimo ferreiro.

— Sério? Então você poderia me ensinar? 

— Hum… claro… — Uma mensagem apareceu diante dos olhos de Hurrto, fazendo-o parar por um momento. — O meu deus guardião acabou de enviar uma mensagem, ela é direcionada a você, sir Lucas.

— Pra mim? O que diz nela?

— Diz que o deus Apolo se sente satisfeito com suas atitudes e quer retribuir o favor por ter me salvado. Ele vai oferecer uma benção para você e me ordenou ensiná-lo o máximo que sei de ferraria, em troca, você deve enfrentar uma determinada masmorra.

Lucas ponderou sobre aquilo, não gostava muito da ideia de sair para enfrentar uma masmorra cedo assim. No entanto, queria saber o que era a benção, então era melhor realizar um acordo antes.

— Pode me mostrar os efeitos da benção antes? Aí eu decido se quero ou não. Tenho evitado entrar nas masmorras e focado só em treinar.

 

Benção do Deus do Fogo

Absorve um pouco de fogo para se curar.

Garante um usuário a resistência ao elemento fogo e reduz qualquer dano deste elemento em 30%.

Essa benção é permanente.

 

Considere um agradecimento por ter recuperado um dos meus diamantes mais lapidados. Espero lhe encontrar num futuro próximo, escolhido de Hades.

 

“Veio rápido, e essa habilidade é do caralho! Pera, Hades é meu deus guardião? Poxa, puta cara preguiçoso, nem conversa comigo.” 

— Que favor eu tenho que fazer?

— Derrotar uma masmorra chamada “Vulcão Infernal”, é cheio de monstros de fogo. 

— Tô mais que dentro, assina embaixo o meu nome que quero!

Assim que Lucas terminou de falar, uma labareda saltou da tela de sistema de Hurrto e atingiu seu peito. Uma insignia com o formato de sol apareceu e em seguida sumiu. 

Um calor circulou pelo peitoral e desceu para a barriga, igual comida apimentada, a sensação repentinamente desapareceu quando tocou no lugar.

 

Você obteve uma benção.

Bençãos só podem ser ativadas se a entidade permitir, e só se pode ter uma benção ativa por vez.

As bençãos são sinais de gratidão e apoio por parte das entidades, elas oferecem uma parte maior de seus poderes para que um indivíduo especial continue sobrevivendo.

 

— Ohh, impressionante, sir Lucas! — Ele alisou um pouco a barba e sorriu. — Bem que o deus Apolo queria te retribuir, mas não imaginei ser dessa forma…

— É raro alguém ter uma benção? 

— Mais do que raro, é quase impossível. Eu mesmo não tenho nenhuma outra além do meu próprio deus guardião, que é a resistência a fogo que você adquiriu.

“Ou seja, eu sou foda pra caralho!”

Lucas estufou o peito e começou a se achar o máximo, o poder correndo por suas veias era demais. Com isso realizar a missão seria jogo fácil. 

Ele deslizou a aba de masmorras, deparando-se com o tal Vulcão Infernal. Podia abrí-lo ali mesmo, no entanto, compensava primeiro esperar para terminar o treino e depois ir nisso.

Lucas e Hurrto ficaram um tempo jogando papo fora, já que não tinha mais nada para fazer naquele fim de mundo nevado. 

Ambos se sentiram incomodados com alguma coisa, estavam sendo observados por alguém, no entanto evitaram comentar porque sabe-se-lá que criatura se escondia nas árvores.

Cerca uma hora depois a porta abriu. Amora adentrou a casa e limpou suas patinhas sujas na entrada, recentemente ele havia adquirido a habilidade abrir portas sozinho.

— Vamos, Lucas, hora de retornar ao seu treino. 

— Já? A conversa tava boa aqui…

— Largue de preguiça e deixe o senhor Hurrto em paz, ele também vai querer trabalhar!

— Na verdade, eu não via problema em permanecer um tempo conversando mesmo… — confessou o velho, meio decepcionado.

— Só pode tá de brincadeira… Hah… — Amora revirou os olhos e saltou em cima da mesa, jogando parte de seu desdém em Lucas. — Tudo bem, vamos só ficar um tempo e depois sair, ok?

O rapaz riu levemente, adorando que podiam ao menos descansar um tempo no meio da rotina cheia. Era bom momentos assim, tranquilos e relaxados igual nenhum outro. 

Fazia um tempo que Lucas queria esse relaxamento, ficar rodeado de pessoas para conversar numa mesa e ignorar a passagem dos minutos.

Antigamente, isso era normal de acontecer entre a família, mas com os anos, ele se isolou e adquiriu peso. Não gostava tanto da sua posição atual, talvez fosse melhor passar um tempo a mais com seu irmão.

“Eca, pareço quase um pai quando penso que negligenciei ele… mas, quando voltar, talvez não faça mal tirarmos um dia para sair e jogar.”

Realmente, fazer uma coisa assim o agradaria bastante. 



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