Farme! Brasileira

Autor(a): Zunnichi


Volume 2

Capítulo 45: Favores

O que se sucedeu após o desastre na praça de alimentação se tornou um grande problema para Lucas.

De forma resumida, ele se tornou a pessoa mais famosa do Brasil de um dia para o outro, o único a ter uma habilidade multifuncional.

Supostamente o limite humano era de elevar suas capacidades a certo nível ou usar uma característica em específica, mas aquele rapaz ia contra todos esses preceitos e remodelou o que se julgava como “habilidade” de alguém.

Isso tudo porque o rapaz demonstrou não só um uso sobrenatural de vento, mas todos os seus atributos físicos eram fora do normal e ele ainda podia usar outros elementos.

A situação se tornou tão extrema com a fama absurda adquirida que Lucas foi forçado a procurar Xing Xong para terem uma longa conversa.

— Você está me pedindo para ter uma moradia isolada do mundo e os equipamentos de treino de última geração assim? Ora, eu poderia fornecer, mas preciso de…

— De ervas-da-manhã de alta qualidade, eu sei. — Ele jogou sua bolsa em cima da mesa entre os dois, cheia de medicinas criadas com o nível máximo de maestria. — Tenho coisa melhor, manda isso pros seus mestres pra eles verem que meu pedido é sério.

Depois disso, não demorou nem duas horas para que uma tonelada de dinheiro e o pedido de Lucas fosse acatada como um pedido de Deus.

Outra coisa que ocorreu no ínterim de ser o homem mais famoso do Brasil e o momento atual foi sua relação com Xing Xong.

Os dois se tornaram meio próximos, especialmente porque o chinês o ajudou nas questões judiciais e seu ocultamento na mídia por um longo tempo.

Eles fizeram inclusive um trato para a venda constante de itens, o que já arrecadou uma boa grana para Lucas, que agora não precisava nem trabalhar de tanta grana no bolso.

No entanto, as coisas para sua mãe, Amora e Levi ficaram complicadíssimas. A começar pela dona de casa, que se transformou numa besta ao descobrir aquelas coisas do seu filho.

— Lucas, menino! Tu nunca mais vai sair do seu quarto de novo! — Ela estava armada com um cinturão, a arma mais poderosa de casa. — Por que você nunca me falou que sabia usar essas coisas?! Por que tu foi tão doido de correr pro perigo, meu filho?!? Já basta o meu coração fraco!

— Ai, ai! — O cinturão marcou muito bem sua bunda, até os buracos do couro apareciam. — Eu tinha medo de te assustar se mostrasse isso, e mais, a senhora me escondeu esse tempo todo que era uma raider, mãe! Como eu teria coragem de falar algo do tipo se a senhora mesma trabalhava nesse ramo e sabia do perigo dele?!?

Aquilo causou um silêncio imediato em sua mãe, que colocou uma mão na boca e largou o cinturão.

— Lucas, você sabia…? Quando foi que…

— Foi quando voltou tarde pra casa. — Ele colocou uma bolsa de gelo na bunda, sentindo toda aquela ardência. — Escutei a sua conversa com Amora… Eu entendo manter escondido isso de mim, é um trabalho perigoso e a senhora não queria nos preocupar, mas exatamente por esse motivo que eu não poderia revelar que era mais que um garoto normal…

Ambas as partes ficaram mudas. Antes de qualquer coisa acontecer, Amora saiu de cena para dá-los alguma privacidade. 

A mãe de Lucas mordia os lábios para encontrar uma forma de explicar o filho porquê fez isso por tanto tempo, mas ele apenas desconversou.

Se ela não tinha coragem de dizer, era melhor manter quieto. Seria um segredo só deles, Levi jamais saberia disso e também nunca mais tocariam no assunto novamente.

Ao menos, a dona de casa morreu de felicidade e quase teve um ataque do coração ao se deparar com uma casa enorme no interior.

Fora tanta alegria que ela desmaiou assim que saiu do carro, nocauteada pela piscina e arquitetura de luxo à moda europeia.

Até Amora estava impressionada, pois ele tinha um inteiro playground com brinquedos de gato para se entreter por horas a fio, além de uma empregada que poderia lidar com quaisquer necessidades suas.

Lucas entrou no puro alívio quando sua mãe aceitou com toda a alegria do mundo aquilo. Para uma mulher super sentimental e correta, ela era bem materialista.

A última coisa que faltava era o caso de Levi. Em um belo dia, o irmão mais velho apareceu no campus novamente, só para vê-lo andando com Natália e Drak.

Queria entender o porquê seu vampiro estava andando por aí em plena luz do dia, mas depois do que aconteceu, quem sabe eles desenvolveram algum tipo de relação.

— Ei, Levi! — chamou seu irmão, atraindo diversos olhares e pessoas loucas querendo saber quem era aquela pessoa famosa. — Ô caralho, me larga!

— Todos vocês, saiam daqui, A-GO-RA! 

O grito veio justamente de uma sobrancelhuda estressada, cujo rugido foi tão assustador que espantou todas as pessoas. 

— Eu, hein, esse pessoal não dá tregua. Agora eu tenho que andar com o Levi o tempo todo pra que eles deixem a gente em paz… Quer dizer, agora é tudo mais difícil por conta desse cara. 

Ela encarou Drak com um olhar julgador, amaldiçoando-o por dentro por estragar tanto momentos felizes e românticos que os dois podiam ter.

O quarteto teve um tempo abaixo de uma árvore no campus, meio longe dos admiradores secretos de Lucas. 

O lado ruim era que a maioria era homem. Ele queria entender o porquê tantos caras estavam interessados em chegar perto.

— Bom, eu vim conferir como você tá — disse ao seu irmão, dando um cafuné na sua cabeça. — Alguma coisa aconteceu? Teve um grande problema?

— Problemas grandes não faltam desde aquela revelação que você fez… — Um suspiro bem longo saiu de sua boca. — Sério, eu já recebi tantos e-mails de empresas, de raiders ou de pessoas esquisitas que tive que trocar e criar uma conta nova no insta. Ninguém nos deixa em paz, nem o seu amigo…

— Eu só faço o que o mestre Lucas pediu — defendeu-se o vampiro, cruzando seus braços e mais aliviado agora que estava na sombra.

— Drak, por favor, não seja tão duro ou incomode demais eles dois. — Lucas colocou a mão no ombro dele. — A coisa que menos quero é você brigando com a Natália por pensar que ela estava tentando matá-lo.

— Ah, agora que você mencionou, mestre Lucas, teve uma vez que…

— NÃO FALE NADA! — A mão de Natália tapou a boca do vampiro. — Pelo AMOR de Deus, só fecha a matraca! Eu sei exatamente o que vai dizer e não quero que você cite isso pra ele!

— Mas eu não acho demais citar isso a ele. É algo comum entre os vivos, então…

— NÃO. Ene, ah, oh, til! Nem ouse, se não eu te mato aqui!

Uma tensão apareceu entre os dois. A mera palavra “mato” ativou algo no vampiro, e os dois se encaravam como se fossem partir a garganta do outro.

Quanto a Levi, ele só se encolheu e ficou com o rosto todo corado. Lucas não entendeu, e já que ninguém queria falar nada, não insistiu.

Assim, com todos os fios soltos resolvidos — exceto o de Levi, que ainda estava incerta por coisas além de seu controle. —, ele estabeleceu uma rotina na sua nova casa.

Isolado do resto do mundo, num terreno no interior, com uma bela vista e muita muriçoca para picar seus braços, Lucas acabou se acostumando com suas corridas no frio.

Nunca que seu velho moletom surrado serviu tanto para seu dia a dia, tendo que lidar com a ventania fria da manhã.

“Os banhos são piores, ao menos”, repetia para si mesmo toda vez que saia para correr.

Como se não bastasse a mansão luxuosa, ele ainda construiu uma academia inteira lá dentro, com todos os equipamentos necessários e com seu gato de personal trainer.

Uma outra coisa interessante que aconteceu foi essa nova morada ter se tornado uma zona segura. 

Lucas havia perdido quaisquer chances de visitar sua base anterior, foi obrigado a empacotar tudo que tinha e levar o que dava para carregar nos braços.

Por permanecer tanto tempo perto da casa, acabou gerando sabe-se-lá como uma zona segura. 

Na primeira vez foi um susto, mas ao entrar naquela zona, teve uma grande paz. Aquela escuridão, o número enorme de kobolds no horizonte…

“Não são goblins?! Amém, eu já não aguentava mais aquelas coisas!!”

Isso o fez se apaixonar pelo lugar. Nunca mais homenzinhos verdes, no máximo teria que voltar no apartamento para pegar alguns resquícios dos que sobraram.

Lucas levantou da cama king size e dançou pela casa até chegar na cozinha. 

Estava pensando demais sobre os dias anteriores, não era atoa que teve a sensação de vários flashbacks passarem diante de seus olhos.

Cozinhou alguns ovos, fez um café e olhou para a janela persiana que dava para o lado de fora. 

Um grande campo se desdobrava diante de seus olhos, uma vaquinha e um cavalo aqui, grama baixa, cheiro de terra molhada no ar.

“É um paraíso, eu diria.” Claro, sua mente só pensava assim porque não trabalhava e arrando um lote. 

Lucas era o primeiro a se levantar, sua rotina logo se iniciou com uma caminhada nos arredores e um roadwork.

O último, inclusive, foi algo que aprendeu com Amora em seus treinos mais recentes. Era uma atividade que consistia em definir um ritmo na corrida e misturar isso com boxe.

Ele podia, por exemplo, correr por dez minutos, parar e praticar shadowboxing do nada, apenas para conferir seu estado de luta quando estivesse cansado.

O roadwork era nada mais que um teste constante, uma forma de testar seu condicionamento e experimentar diferentes níveis de cansaço.

“Uma pena que a essa altura já estou tão forte que preciso correr muito para me cansar, então esses socos no ar não mexem comigo também.”

Lucas terminou seu treino no topo de uma colina dali, um lugar que dava para avistar um pouco da cidade grande e o campo, além de uma pequena vila a poucos quilômetros.

Era uma vista bonita de se ver, uma das poucas coisas da qual gostava de admirar no tempo livre. Satisfeito com o treino, retornou para casa. 

Ele pretendia começar a mexer nos kobolds, quem sabe construir uma farm automática e descobrir seus drops, levando em conta que até agora não enfrentou nenhum.

Assim que subiu as escadas da varanda, escutou o ronco de um motor. Olhou para trás, uma limusine se aproximava da casa.

Seu cérebro calculou quem era. Com certeza não seria Xing Xong por causa de seus preceitos de evitar o luxo, muito menos Bianca, pois era uma mulher muito sumida.

Natália e Levi entravam fora de questão, estudantes de uma faculdade não teriam tanto dinheiro assim para comprarem um carro luxuoso.

O automóvel estacionou a uma distância curta de sua casa. A porta foi aberta por um mordomo, e então ela apareceu, Viviane.

Lucas largou um suspiro ao vê-la, largando sua toalha no ombro. A mulher chegou próximo, mas não ousou pisar num dos degraus da varanda.

— Sentiu minha falta? — perguntou, cruzando os braços.

— Sinceramente, não. Estou muito tranquilo e sossegado aqui.

— Imaginei que estaria, ô homem mais famoso do Brasil… — Sua fala ácida era cheia de sarcasmo, mais claro que seus olhos revirando. — Eu demorei pra achar onde você morava, mas no final consegui. Creio que saiba o porquê vim.

— Sei sim. Aquela coisa só não rolou mais cedo porque você sabe, problemas… — Abriu a porta, chamando-a com a mão. — Pode entrar e fique à vontade. Vou pedir pra prepararem café.

— Gentil da sua parte…

Viviane pôs os pés dentro da casa, mesmo sem se impressionar muito. Na verdade, pouco se importava com questões formais.

Tudo o que queria era a fonte de poder de Lucas, admitia com toda confiança do mundo, mas a essa altura era impossível tirar dele.

Limitada a manipular e controlá-lo da forma como queria, Viviane esperou para a chance certa de dar o bote.

Sua mente desejava um gostinho desse poderio, dessa fonte de ouro que balançava diante de seus olhos. Só precisava de uma coisa: paciência.



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